16/01/2013

Tratado dos actos humanos 3


Art. 3 ― Se a voluntariedade pode existir sem algum acto.



(Infra, q. 71, a . 5, ad 2, II Sent., dist. XXXV, a . 3, De Maio, q. 2, a . 1, ad 2).



O terceiro discute-se assim. ― Parece que a voluntariedade não pode existir sem algum acto.


1. ― Pois, chama-se voluntariedade o que procede da vontade. Ora, nada pode proceder da vontade a não ser por algum acto, ao menos, da própria vontade. Logo, a voluntariedade não pode existir sem algum acto.

2. Demais. ― Assim como se diz que alguém quer, por um acto da vontade, assim se diz que não quer, cessando tal acto. Ora, não querer causa a involuntariedade, que se opõe à voluntariedade. Logo, esta não pode existir, cessando o acto da vontade.

3. Demais. ― O conhecimento, como já se disse, é da essência da voluntariedade 1. Ora, o conhecimento implica a existência de algum acto. Logo, a voluntariedade não pode existir sem qualquer acto.

Mas, em contrário. ― Chama-se voluntário àquilo de que somos senhores. Ora, nós somo-lo de agir ou não, de querer ou não querer. Logo, como agir e querer é voluntário, do mesmo modo o é não agir e não querer.

Chama-se voluntariedade o que procede da vontade. Ora, diz-se que uma coisa procede de outra, de duplo modo. Directamente, quando uma coisa procede de outra, que é agente, assim, a calefacção, do calor. Indirectamente, quando procede de outra porque esta não age, assim, dizemos que a submersão de um navio procede do piloto, porque este deixou de dirigi-lo. Ora, deve saber-se, que nem sempre o resultante da inacção tem como causa a inacção do agente, mas só é assim, quando este podia e devia agir. Se, pois, o piloto não pudesse dirigir o navio ou o governo deste lhe não fosse cometido, não havia de se lhe imputar a submersão causada pela sua ausência.

Como pois a vontade, querendo e agindo, pode e às vezes deve, impedir o não querer e o não agir, um e outro lhe é imputado, como proveniente dela. E assim, a voluntariedade pode existir sem nenhum acto, às vezes, sem acto externo, mas com acto interno, como quando quer não agir, outras vezes, porém, também sem acto interno, como quando não quer agir.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. ― Chama-se voluntariedade não só o que procede da vontade agente, directamente, mas também o que procede dela não agente, indirectamente.

RESPOSTA À SEGUNDA. ― Não querer tem dupla acepção. ― Ora, é tomado com força de expressão una, como infinitivo do verbo não querer. Quando, pois, digo ― não quero ler ― o sentido é ― quero não ler, e assim ― não querer ler ― significa ― querer não ler. E então não querer causa o voluntário. ― Noutra acepção, é tomado com força de oração, e então não é afirmado o acto da vontade, e portanto não querer não causa o involuntariedade.

RESPOSTA À TERCEIRA. ― O acto do conhecimento é necessário, para o voluntário, do mesmo modo por que o é o da vontade, a saber, de maneira que esteja no poder de alguém pensar, querer e agir. E então, assim como não querer e não agir, a seu tempo, é voluntário, assim também não pensar.

Nota: Revisão da tradução portuguesa por ama.
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Notas:
1. Q. 6, a. 1, 2.

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