Repara:
os apóstolos, com todas as suas misérias patentes e inegáveis, eram sinceros,
simples... transparentes. Tu também tens misérias patentes e inegáveis. – Oxalá
te não falte a simplicidade. (Caminho, 932)
Aqueles
primeiros doze apóstolos – a quem tenho grande devoção e carinho – eram,
segundo os critérios humanos, bem pouca coisa. Quanto à posição social, com
excepção de Mateus – que com certeza ganhava bem a vida e deixou tudo quando
Jesus lhe pediu – eram pescadores; viviam do dia-a-dia, trabalhando até de
noite para poderem alcançar o seu sustento.
Mas
a posição social é o de menos. Não eram cultos, nem sequer muito inteligentes,
pelo menos no que diz respeito às realidades sobrenaturais. Até os exemplos e
as comparações mais simples lhes eram incompreensíveis e pediam ao Mestre:
Domine, edissere nobis parabolam, Senhor, explica-nos a parábola. Quando Jesus,
com uma imagem, alude ao fermento dos fariseus, supõem que os está a recriminar
por não terem comprado pão.
Pobres,
ignorantes. E nem sequer eram simples, humildes. Dentro das suas limitações,
eram ambiciosos. Muitas vezes discutem sobre quem seria o maior, quando –
segundo a sua mentalidade – Cristo instaurasse na terra o reino definitivo de
Israel. Discutem e excitam-se até naquela hora sublime em que Jesus está
prestes a imolar-se pela humanidade, na intimidade do Cenáculo.
Fé?
Pouca. O próprio Jesus Cristo o diz. Viram ressuscitar mortos, curar todo o
tipo de doenças, multiplicar o pão e os peixes, acalmar tempestades, expulsar
demónios. Pois S. Pedro, escolhido como cabeça, é o único que sabe responder
com prontidão: Tu és o Cristo, Filho de Deus vivo. Mas é uma fé que ele
interpreta à sua maneira; por isso atreve-se a enfrentar Jesus Cristo, a fim de
que Ele não se entregue pela redenção dos homens. E Jesus tem de responder-lhe:
Retira-te de mim, Satanás; tu serves-me de escândalo, porque não tens a
sabedoria das coisas de Deus mas das coisas dos homens. Pedro raciocinava
humanamente, comenta S. João Crisóstomo, e concluía que tudo aquilo (a Paixão e
a Morte) era indigno de Cristo, reprovável. Por isso Jesus repreende-o e
diz-lhe: não, sofrer não é coisa indigna de Mim; tu pensas assim porque
raciocinas com ideias carnais, humanas.
Em
que sobressaem então aqueles homens de pouca fé? Talvez no amor a Cristo? Sem
dúvida que O amavam, pelo menos de palavra. (…) São homens correntes, com
defeitos, com debilidades, com palavras maiores do que as suas obras. E,
contudo, Jesus chama-os para fazer deles pescadores de homens, corredentores,
administradores da graça de Deus. (Cristo que passa, 2)
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