Questão 85: Do modo e da ordem de inteligir.
Art. 6 — Se o intelecto pode ser
falso.
(Supra,
q. 17, a. 3; q. 58, a. 5; I Sent., dist. XIX, q. 5, a. 1, ad 7; Cont. Gent.,
cap. LIX; III, cap. CVIII; De Verit., q. 1, a. 12; I Periherm., lect. III; III
De Anima, lect XI; VI Metaphys., lect. IV; IX, lect, IX).
O
sexto discute-se assim. ― Parece que o intelecto pode ser falso.
1.
― Pois, diz o Filósofo, que a verdade e a falsidade estão na mente. Ora, mente
e intelecto são idênticos, como antes já se disse (q. 79). Logo,
existe falsidade no intelecto.
2.
Demais. ― A opinião e o raciocínio pertencem ao intelecto. Ora, numa e noutro
pode haver falsidade. Logo, pode haver falsidade no intelecto.
3.
Demais. ― O pecado está na parte intelectiva. Ora, há falsidade no pecado,
conforme o dito da Escritura (Pr 14, 25), pois, os que praticam o
mal erram. Logo, pode haver falsidade no intelecto.
Mas,
em contrário, diz Agostinho: todos os que se enganam não lhe inteligem o
porquê. E o Filósofo diz: o intelecto é sempre verdadeiro.
Neste ponto, o Filósofo compara o intelecto com os sentidos. Pois, estes não
se enganam, em relação ao seu objecto próprio ― assim à vista em relação à cor
― salvo por acidente, sobrevindo algum impedimento ao órgão, como quando o
gosto de um febricitante julga doces as coisas amargas, porque a sua língua
está repleta de maus humores. Porém os sentidos podem enganar-se em relação aos
sensíveis comuns, como quando julgam da grandeza ou da figura; assim, se se julgar
que o sol é como tamanho de um pé, que, entretanto, é maior que a terra. E com
maior razão, eles se enganam em relação aos sensíveis por acidente; assim,
quando julgam que o fel é mel, pela semelhança da cor. E a causa disso é evidente.
Pois, cada potência, em si mesma, se ordena para o seu objecto próprio. Ora,
potências assim ordenadas comportam-se sempre do mesmo modo. Donde, enquanto
permanecem tais, não lhes erra o juízo sobre o objecto próprio.
Ora,
o objecto próprio da inteligência é a quididade da coisa, e, por isso, o
intelecto não pode enganar-se no tocante a essa quididade, em si mesma
considerada. Mas pode-o, no tocante aos acidentes da essência ou quididade,
enquanto ordena um para outro, compondo, dividindo ou raciocinando. Donde, não
pode errar em relação às proposições imediatamente conhecidas, desde que o seja
a quididade dos termos, como se dá, com os primeiros princípios, dos quais resulta
também a infalibilidade da verdade, quanto à certeza das ciências, no tocante
às conclusões.
Acidentalmente,
porém, o intelecto pode enganar-se quanto a quididade, em se tratando de coisas
compostas; não por causa do órgão, porque o intelecto não é virtude que se
sirva de órgão, mas por causa da composição interveniente na definição; quer
porque a definição de uma coisa é falsa aplicada à outra ― assim a definição do
círculo é falsa aplicada ao triângulo ― quer porque a definição é falsa, em si
mesma, implicando composição de elementos impossíveis ― assim se se admitisse,
como definição de um ser, animal racional alado. Donde, nas coisas simples, em
cujas definições não pode intervir a composição, não podemos nos enganar;
podemos, porém, ser deficientes, quanto totalmente não as atingimos, como diz
Aristóteles.
DONDE
A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ― Diz-se que há falsidade na mente, pela
composição e divisão.
E
o mesmo se deve RESPONDER À SEGUNDA OBJEÇÃO, quanto à opinião e ao raciocínio.
E
TAMBÉM À TERCEIRA, quanto ao erro dos que pecam, que consiste na aplicação ao
apetecível.
Mas,
na consideração absoluta da quididade e do que por ela é conhecido, o intelecto
nunca se engana. ― E assim se exprimem os autores aduzidos em contrário.
Nota:
Revisão da tradução para português por ama
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