Questão 85: Do modo e
da ordem de inteligir.
(Supra,
q. 58 a. 4).
O
quinto discute-se assim. ― Parece que o nosso intelecto não intelige compondo e
dividindo.
1.
― Pois, composição e divisão só se podem referir a muitas coisas. Ora, o
intelecto não as pode inteligir simultaneamente. Logo, não pode inteligir
compondo e dividindo.
2.
Demais. ― Com toda composição e divisão vai junto o tempo presente, o pretérito
ou o futuro. Ora, o intelecto faz abstracção do tempo bem como de outras
condições particulares. Logo, não intelige compondo e dividindo.
3.
Demais. ― O intelecto intelige por assimilação da coisa. Ora, nas coisas não há
composição nem divisão; pois cada coisa, singularmente, designada pelo
predicado e pelo sujeito, tem unidade e identidade, se a composição for
verdadeira; assim, o homem é verdadeiramente animal. Logo, o intelecto não
compõe nem divide.
Mas,
em contrário. ― As palavras exprimem a composição do intelecto, como diz o
Filósofo. Ora, nelas há composição e divisão, como é claro nas proposições
afirmativas e negativas. Logo, o intelecto compõe e divide.
O intelecto humano intelige compondo e dividindo, necessariamente. Pois, como
sai da potência para o acto, tem certa semelhança com as coisas geradas, que
não têm a sua perfeição imediatamente, mas a adquirem sucessivamente.
Semelhantemente, o intelecto humano não adquire, imediatamente, pela primeira apreensão,
conhecimento completo da coisa; mas, primeiro, apreende-lhe algo, por exemplo,
a quididade, que é o objecto primeiro e próprio do intelecto; e em seguida,
intelige as propriedades, os acidentes, e as relações circunstantes à essência
da coisa. E então, o intelecto há-de necessariamente compor uma coisa
apreendida, com outra, ou dividi-las, e de uma composição e divisão passar para
outra, o que é raciocinar.
O
intelecto angélico, porém, e o divino comportam-se como coisas incorruptíveis
que são: imediatamente, desde o princípio, têm perfeição total. Donde, tais
intelectos têm imediata e perfeitamente o conhecimento total de uma coisa. E
assim, conhecendo a quididade da coisa, dela conhece simultaneamente tudo o que
nós podemos conhecer compondo, dividindo e raciocinando. E portanto, o
intelecto humano conhece compondo, dividindo e raciocinando. Ao passo que o
intelecto divino e o angélico conhecem, certamente, a composição, a divisão e o
raciocínio, não, porém, compondo, dividindo e raciocinando; mas pela intelecção
da simples quididade.
DONDE
A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. ― A composição e a divisão do intelecto
realizam-se por diferenciação ou comparação. Donde, conhecer muitas coisas,
compondo e dividindo, é, para o intelecto, como conhecer a diferença ou a comparação
das coisas.
RESPOSTA
À SEGUNDA. ― O intelecto abstrai, dos fantasmas; e contudo não intelige, em acto,
senão voltando-se para eles, como antes ficou dito (a. 1; q. 84, a. 7).
E, voltando-se para os fantasmas, à composição e à divisão do intelecto
adjunge-se o tempo.
RESPOSTA
À TERCEIRA. ― A semelhança da coisa é recebida no intelecto, ao modo deste e
não ao daquela. Donde, à composição e à divisão do intelecto corresponde,
certo, algo por parte da coisa, que, todavia não está na coisa do mesmo modo
por que está no intelecto. Pois, o objecto próprio do intelecto humano é a quididade
da coisa material, que está ao alcance do sentido e da imaginação. Ora, dupla é
a composição que se encontra nas coisas materiais. A primeira é a da forma e da
matéria; e a esta corresponde, no intelecto, a composição, pela qual o todo
universal é predicado da sua parte. Pois, o género é deduzido da matéria comum;
a diferença completiva da espécie, da forma; e o particular, da matéria
individual. A segunda composição é a do acidente em relação ao sujeito. E a
esta composição real corresponde a composição do intelecto pela qual o acidente
é predicado do sujeito; assim, quando se diz ― O homem é branco. Contudo,
difere a composição do intelecto da composição das coisas. Pois, na composição
das coisas há diversidade; ao passo que a composição do intelecto é sinal de
identidade das coisas compostas. Assim, o intelecto não compõe de modo a dizer
que um homem é a brancura; mas diz que um homem é branco, ou seja, tem brancura;
pois há identidade, no sujeito, entre o que é tal homem e o que tem a brancura.
E, semelhantemente, a composição da forma e da matéria. Pois, animal significa
o que tem a natureza sensitiva; racional, o que tem a natureza intelectiva; homem,
o que tem alma; Sócrates, por fim, o que tem tudo isso, com a matéria
individual.
E
conforme essa noção da identidade, o nosso intelecto compõe uma coisa com
outra, predicando.
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