Não abandones a tua leitura espiritual.
A leitura tem feito muitos santos.
(S. josemaria, Caminho 116)
Está aconselhada a leitura espiritual diária de mais ou menos 15 minutos. Além da leitura do novo testamento, (seguiu-se o esquema usado por P. M. Martinez em “NOVO TESTAMENTO” Editorial A. O. - Braga) devem usar-se textos devidamente aprovados. Não deve ser leitura apressada, para “cumprir horário”, mas com vagar, meditando, para que o que lemos seja alimento para a nossa alma.
Para ver, clicar SFF.
Evangelho: Mt 26, 30-56
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Evangelho: Mt 26, 30-56
Ioannes Paulus PP.
II
Fides et ratio
aos Bispos da
Igreja Católica
sobre as relações
entre Fé e Razão
…/9
96. Esta consideração permite vislumbrar a
solução de outro problema: o da perene validade dos conceitos usados nas
definições conciliares. Já o meu venerado Predecessor Pio XII enfrentara a
questão, na carta encíclica Humani generis. 112
A reflexão sobre este assunto não é fácil,
porque tem-se de atender cuidadosamente ao sentido que as palavras adquirem nas
diversas culturas e nas diferentes épocas. Entretanto, a história do pensamento
mostra que certos conceitos básicos mantêm, através da evolução e da variedade
das culturas, o seu valor cognoscitivo universal e, consequentemente, a verdade
das proposições que os exprimem. 113
Se assim não fosse, a filosofia e as ciências não poderiam comunicar entre si,
nem ser recebidas por culturas diferentes daquelas onde foram pensadas e
elaboradas. O problema hermenêutico é real, mas tem solução. O valor objectivo
de muitos conceitos não exclui, aliás, que o seu significado frequentemente
seja imperfeito. A reflexão filosófica poderia ser de grande ajuda neste campo.
Possa ela prestar o seu contributo particular no aprofundamento da relação
entre linguagem conceptual e verdade, e na proposta de caminhos adequados para
uma sua correcta compreensão.
97. Se uma tarefa importante da teologia é
a interpretação das fontes, mais delicado e exigente ainda é o trabalho
seguinte: a compreensão da verdade revelada, ou seja, a elaboração do
intellectus fidei. Como já aludi, o intellectus fidei requer o contributo duma
filosofia do ser que, antes de mais, permita à teologia dogmática realizar
adequadamente as suas funções. O pragmatismo dogmático dos inícios deste
século, segundo o qual as verdades da fé nada mais seriam do que regras de
comportamento, foi já refutado e rejeitado; 114
apesar disso, persiste sempre a tentação de compreender estas verdades de forma
puramente funcional. Neste caso, cair-se-ia num esquema inadequado, redutivo e
desprovido da necessária incisividade especulativa. Por exemplo, uma
cristologia que partisse unilateralmente «de baixo», como hoje se costuma
dizer, ou uma eclesiologia elaborada unicamente a partir do modelo das
sociedades civis dificilmente poderiam evitar o perigo de tal reducionismo.
Se o intellectus fidei quer integrar toda a
riqueza da tradição teológica, tem de recorrer à filosofia do ser. Esta deverá
ser capaz de propor o problema do ser segundo as exigências e as contribuições
de toda a tradição filosófica, incluindo a mais recente, evitando cair em
estéreis repetições de esquemas antiquados. No quadro da tradição metafísica
cristã, a filosofia do ser é uma filosofia dinâmica que vê a realidade nas suas
estruturas ontológicas, causais e inter-relacionais. A sua força e perenidade derivam
do facto de se basear precisamente sobre o acto do ser, o que lhe permite uma
abertura plena e global a toda a realidade, superando todo e qualquer limite
até alcançar Aquele que tudo leva à perfeição. 115
Na teologia, que recebe os seus princípios da Revelação como nova fonte de
conhecimento, esta perspectiva é confirmada através da relação íntima entre fé
e racionalidade metafísica.
98. Idênticas considerações podem ser
feitas a propósito da teologia moral. A recuperação da filosofia é urgente também
para a compreensão da fé que diz respeito ao agir dos crentes. Diante dos desafios
que se levantam actualmente no campo social, económico, político e científico,
a consciência ética do homem desorientou-se. Na carta encíclica Veritatis
splendor, pus em evidência que muitos problemas do mundo contemporâneo derivam
de uma «crise em torno da verdade. Perdida a ideia duma verdade universal sobre
o bem, cognoscível pela razão humana, mudou também inevitavelmente a concepção
de consciência: esta deixa de ser considerada na sua realidade original, ou
seja, como um acto da inteligência da pessoa, a quem cabe aplicar o
conhecimento universal do bem a uma determinada situação e exprimir assim um
juízo sobre a conduta justa a ter aqui e agora; tende-se a conceder à
consciência do indivíduo o privilégio de estabelecer autonomamente os critérios
do bem e do mal, e de agir em consequência. Esta visão identifica-se com uma
ética individualista, na qual cada um se vê confrontado com a sua verdade,
diferente da verdade dos outros». 116
Ao longo de toda a encíclica agora citada,
sublinhei claramente o papel fundamental que compete à verdade no campo da
moral. Ora esta verdade, na maior parte dos problemas éticos mais urgentes,
requer, da teologia moral, uma cuidadosa reflexão que saiba pôr em evidência as
suas raízes na palavra de Deus. Para poder desempenhar esta sua missão, a
teologia moral deve recorrer a uma ética filosófica que tenha em vista a
verdade do bem, isto é, uma ética que não seja subjectivista nem utilitarista.
Tal ética implica e pressupõe uma antropologia filosófica e uma metafísica do
bem. A teologia moral, valendo-se desta visão unitária que está necessariamente
ligada à santidade cristã e à prática das virtudes humanas e sobrenaturais,
será capaz de enfrentar os vários problemas que lhe dizem respeito — tais como
a paz, a justiça social, a família, a defesa da vida e do ambiente natural — de
forma mais adequada e eficaz.
99. Na Igreja, o trabalho teológico está,
primariamente, ao serviço do anúncio da fé e da catequese. 117 O anúncio, ou querigma, chama à
conversão, propondo a verdade de Cristo que tem o seu ponto culminante no
Mistério Pascal: na verdade, só em Cristo é possível conhecer a plenitude da
verdade que salva (cf. Act 4, 12; 1 Tim 2, 4-6).
Neste contexto, é fácil compreender a razão
por que, além da teologia, assuma também grande relevo a referência à
catequese: é que esta possui implicações filosóficas que têm de ser
aprofundadas à luz da fé. A doutrina ensinada na catequese pretende formar a
pessoa. Por isso a catequese, que é também comunicação linguística, deve
apresentar a doutrina da Igreja na sua integridade, 118 mostrando a ligação que ela tem com a
vida dos crentes. 119 Realiza-se,
assim, uma singular união entre doutrina e vida, que é impossível conseguir de
outro modo. De facto, aquilo que se comunica na catequese não é um corpo de
verdades conceptuais, mas o mistério do Deus vivo. 120
A reflexão filosófica muito pode contribuir
para esclarecer a relação entre verdade e vida, entre acontecimento e verdade
doutrinal, e sobretudo a relação entre verdade transcendente e linguagem humanamente
inteligível. 121 A reciprocidade
que se cria entre as disciplinas teológicas e os resultados alcançados pelas
diversas correntes filosóficas, pode traduzir-se numa real fecundidade para a
comunicação da fé e para uma sua compreensão mais profunda.
CONCLUSÃO
100. Passados mais de cem anos da
publicação da Encíclica Æterni Patris de
Leão XIII, à qual me referi várias vezes nestas páginas, pareceu-me necessário
abordar novamente e de forma mais sistemática o discurso sobre o tema da
relação entre a fé e a filosofia. É óbvia a importância que o pensamento
filosófico tem no progresso das culturas e na orientação dos comportamentos
pessoais e sociais. Embora isso nem sempre se note de forma explícita, ele
exerce também uma grande influência sobre a teologia e suas diversas disciplinas.
Por estes motivos, considerei justo e necessário sublinhar o valor que a
filosofia tem para a compreensão da fé, e as limitações em que aquela se vê,
quando esquece ou rejeita as verdades da Revelação. De facto, a Igreja continua
profundamente convencida de que fé e razão «se ajudam mutuamente», 122 exercendo, uma em prol da outra, a
função tanto de discernimento crítico e purificador, como de estímulo para
progredir na investigação e no aprofundamento.
101. Se detivermos o nosso olhar sobre a
história do pensamento, sobretudo no Ocidente, é fácil constatar a riqueza que
sobreveio, para o progresso da humanidade, do encontro da filosofia com a teologia
e do intercâmbio das suas respectivas conquistas. A teologia, que recebeu o dom
duma abertura e originalidade que lhe permite existir como ciência da fé, fez
seguramente com que a razão permanecesse aberta diante da novidade radical que
a revelação de Deus traz consigo. E isto foi, sem dúvida alguma, uma vantagem
para a filosofia, que, assim, viu abrirem-se novos horizontes apontando para
sucessivos significados que a razão está chamada a aprofundar.
Precisamente à luz desta constatação, tal
como reafirmei o dever que tem a teologia de recuperar a sua genuína relação
com a filosofia, da mesma forma sinto a obrigação de sublinhar que é
conveniente para o bem e o progresso do pensamento que também a filosofia
recupere a sua relação com a teologia. Nesta, encontrará não a reflexão dum
mero indivíduo, que, embora profunda e rica, sempre traz consigo as limitações
de perspectiva próprias do pensamento de um só, mas a riqueza duma reflexão
comum. De facto, quando indaga sobre a verdade, a teologia, por sua natureza, é
sustentada pela nota da eclesialidade 123
e pela tradição do Povo de Deus, com sua riqueza multiforme de conhecimentos e
de culturas na unidade da fé.
102. Com tal insistência sobre a
importância e as autênticas dimensões do pensamento filosófico, a Igreja
promove a defesa da dignidade humana e, simultaneamente, o anúncio da mensagem
evangélica. Ora, para estas tarefas, não existe, hoje, preparação mais urgente
do que esta: levar os homens à descoberta da sua capacidade de conhecer a
verdade 124 e do seu anseio pelo
sentido último e definitivo da existência. À luz destas exigências profundas,
inscritas por Deus na natureza humana, aparece mais claro também o significado
humano e humanizante da palavra de Deus. Graças à mediação de uma filosofia que
se tornou também verdadeira sabedoria, o homem contemporâneo chegará a
reconhecer que será tanto mais homem quanto mais se abrir a Cristo, acreditando
no Evangelho.
103. Além disso, a filosofia é como que o
espelho onde se reflecte a cultura dos povos. Uma filosofia que se desenvolve
de harmonia com a fé aceitando o estímulo das exigências teológicas, faz parte
daquela «evangelização da cultura» que Paulo VI propôs como um dos objectivos
fundamentais da evangelização. 125
Pensando na nova evangelização, cuja urgência não me canso de recordar, faço
apelo aos filósofos para que saibam aprofundar aquelas dimensões de verdade,
bem e beleza, a que dá acesso a palavra de Deus. Isto torna-se ainda mais
urgente, ao considerar os desafios que o novo milénio parece trazer consigo:
eles tocam de modo particular as regiões e as culturas de antiga tradição
cristã. Este cuidado deve considerar-se também um contributo fundamental e
original para o avanço da nova evangelização.
104. O pensamento filosófico é frequentemente
o único terreno comum de entendimento e diálogo com quem não partilha a nossa
fé. O movimento filosófico contemporâneo exige o empenhamento solícito e
competente de filósofos crentes que sejam capazes de individuar as
expectativas, possibilidades e problemáticas deste momento histórico.
Discorrendo à luz da razão e segundo as suas regras, o filósofo cristão, sempre
guiado naturalmente pela leitura superior que lhe vem da palavra de Deus, pode
criar uma reflexão que seja compreensível e sensata mesmo para quem ainda não
possua a verdade plena que a revelação divina manifesta. Este terreno comum de
entendimento e diálogo é ainda mais importante hoje, se se pensa que os
problemas mais urgentes da humanidade — como, por exemplo, o problema ecológico,
o problema da paz ou da convivência das raças e das culturas — podem ter
solução à luz duma colaboração clara e honesta dos cristãos com os fiéis
doutras religiões e com todos os que, mesmo não aderindo a qualquer crença
religiosa, têm a peito a renovação da humanidade. Afirmou-o o Concílio Vaticano II: «Por nossa parte,
o desejo de um tal diálogo, guiado apenas pelo amor pela verdade e com a
necessária prudência, não exclui ninguém: nem aqueles que cultivam os altos
valores do espírito humano, sem ainda conhecerem o seu Autor, nem aqueles que
se opõem à Igreja e, de várias maneiras, a perseguem». 126 Uma filosofia, na qual já resplandeça
algo da verdade de Cristo, única resposta definitiva aos problemas do homem, 127 será um apoio eficaz para aquela ética
verdadeira e simultaneamente universal de que, hoje, a humanidade tem necessidade.
105. Não posso concluir esta carta
encíclica sem dirigir um último apelo, em primeiro lugar aos teólogos, para que
prestem particular atenção às implicações filosóficas da palavra de Deus e
realizem uma reflexão onde sobressaia a densidade especulativa e prática da ciência
teológica. Desejo agradecer-lhes o seu serviço eclesial. A estrita conexão
entre a sabedoria teológica e o saber filosófico é uma das riquezas mais originais
da tradição cristã no aprofundamento da verdade revelada. Por isso, exorto-os a
recuperarem e a porem em evidência o melhor possível a dimensão metafísica da
verdade, para desse modo entrarem num diálogo crítico e exigente quer com o pensamento
filosófico contemporâneo, quer com toda a tradição filosófica, esteja esta em
sintonia ou contradição com a palavra de Deus. Tenham sempre presente a
indicação dum grande mestre do pensamento e da espiritualidade, S. Boaventura,
que, ao introduzir o leitor na sua obra Itinerarium mentis in Deum, convidava-o
a ter consciência de que «a leitura não é suficiente sem a compunção, o conhecimento
sem a devoção, a investigação sem o arrebatamento do enlevo, a prudência sem a
capacidade de abandonar-se à alegria, a actividade separada da religiosidade, o
saber separado da caridade, a inteligência sem a humildade, o estudo sem o
suporte da graça divina, a reflexão sem a sabedoria inspirada por Deus». 128
Dirijo o meu apelo também a quantos têm a
responsabilidade da formação sacerdotal, tanto académica como pastoral, para
que cuidem, com particular atenção, da preparação filosófica daquele que deverá
anunciar o Evangelho ao homem de hoje, e mais ainda se se vai dedicar à
investigação e ao ensino da teologia. Procurem organizar o seu trabalho à luz
das prescrições do Concílio Vaticano II 129
e sucessivas determinações, que mostram a tarefa indeclinável e urgente, que
cabe a todos nós, de contribuir para uma genuína e profunda comunicação das
verdades da fé. Não se esqueça a grave responsabilidade de uma preparação
prévia e condigna do corpo docente, destinado ao ensino da filosofia nos
Seminários e nas Faculdades Eclesiásticas. 130 É necessário que uma tal
docência possua a conveniente preparação científica, proponha de maneira
sistemática o grande património da tradição cristã, e seja efectuada com o
devido discernimento face às exigências actuais da Igreja e do mundo.
106. O meu apelo dirige-se ainda aos
filósofos e a quantos ensinam a filosofia, para que, na esteira duma tradição
filosófica perenemente válida, tenham a coragem de recuperar as dimensões de
autêntica sabedoria e de verdade, inclusive metafísica, do pensamento filosófico.
Deixem-se interpelar pelas exigências que nascem da palavra de Deus, e tenham a
força de elaborar o seu discurso racional e argumentativo de resposta a tal
interpelação. Vivam em permanente tensão para a verdade e atentos ao bem que
existe em tudo o que é verdadeiro. Poderão, assim, formular aquela ética
genuína de que a humanidade tem urgente necessidade, sobretudo nestes anos. A
Igreja acompanha com atenção e simpatia as suas investigações; podem, pois,
estar seguros do respeito que ela nutre pela justa autonomia da sua ciência. De
modo particular, quero encorajar os crentes empenhados no campo da filosofia
para que iluminem os diversos âmbitos da actividade humana, graças ao exercício
de uma razão que se torna mais segura e perspicaz com o apoio que recebe da fé.
Não posso, enfim, deixar de dirigir uma
palavra também aos cientistas, que nos proporcionam, com as suas pesquisas, um
conhecimento sempre maior do universo inteiro e da variedade
extraordinariamente rica dos seus componentes, animados e inanimados, com suas
complexas estruturas de átomos e moléculas. O caminho por eles realizado atingiu,
especialmente neste século, metas que não cessam de nos maravilhar. Ao exprimir
a minha admiração e o meu encorajamento a estes valorosos pioneiros da pesquisa
científica, a quem a humanidade muito deve do seu progresso actual, sinto o
dever de exortá-los a prosseguir nos seus esforços, permanecendo sempre naquele
horizonte sapiencial onde aos resultados científicos e tecnológicos se unem os
valores filosóficos e éticos, que são manifestação característica e
imprescindível da pessoa humana. O cientista está bem cônscio de que «a busca
da verdade, mesmo quando se refere a uma realidade limitada do mundo ou do
homem, jamais termina; remete sempre para alguma coisa que está acima do
objecto imediato dos estudos, para os interrogativos que abrem o acesso ao Mistério».
131
107. A todos peço para se debruçarem
profundamente sobre o homem, que Cristo salvou no mistério do seu amor, e sobre
a sua busca constante de verdade e de sentido. Iludindo-o, vários sistemas
filosóficos convenceram-no de que ele é senhor absoluto de si mesmo, que pode
decidir autonomamente sobre o seu destino e o seu futuro, confiando apenas em
si próprio e nas suas forças. Ora, esta nunca poderá ser a grandeza do homem.
Para a sua realização, será determinante apenas a opção de viver na verdade,
construindo a própria casa à sombra da Sabedoria e nela habitando. Só neste horizonte
da verdade poderá compreender, com toda a clareza, a sua liberdade e o seu
chamamento ao amor e ao conhecimento de Deus como suprema realização de si
mesmo.
108. Por último, o meu pensamento dirige-se
para Aquela que a oração da Igreja invoca como Sede da Sabedoria. A sua vida é
uma verdadeira parábola, capaz de iluminar a reflexão que desenvolvi. De facto,
pode-se entrever uma profunda analogia entre a vocação da bem-aventurada Virgem
Maria e a vocação da filosofia genuína. Como a Virgem foi chamada a oferecer
toda a sua humanidade e feminilidade para que o Verbo de Deus pudesse encarnar
e fazer-Se um de nós, também a filosofia é chamada a dar o seu contributo
racional e crítico para que a teologia, enquanto compreensão da fé, seja fecunda
e eficaz. E como Maria, ao prestar o seu consentimento ao anúncio de Gabriel,
nada perdeu da sua verdadeira humanidade e liberdade, assim também o pensamento
filosófico, quando acolhe a interpelação que recebe da verdade do Evangelho,
nada perde da sua autonomia, antes vê toda a sua indagação elevada à mais alta
realização. Os santos monges da antiguidade cristã tinham compreendido bem esta
verdade, quando designavam Maria como «a mesa intelectual da fé». 132 N'Ela, viam a imagem coerente da
verdadeira filosofia, e estavam convencidos de que deviam philosophari in
Maria.
Que a Sede da Sabedoria seja o porto seguro
para quantos consagram a sua vida à procura da sabedoria! O caminho para a
sabedoria, fim último e autêntico de todo o verdadeiro saber, possa ver-se
livre de qualquer obstáculo por intercessão d'Aquela que, depois de gerar a
Verdade e tê-La conservado no seu coração, comunicou-A para sempre à humanidade
inteira.
Dado em Roma, junto de S. Pedro, no dia 14
de Setembro — Festa da Exaltação da Santa Cruz — de 1998, vigésimo ano de
Pontificado.
Ioannes Paulus PP. II
Revisão da tradução portuguesa por ama
___________________________
Notas:
112 «É claro que a Igreja não pode estar
ligada a qualquer sistema filosófico efémero; aquelas noções e termos que,
segundo o consenso geral, foram compostos ao longo de vários séculos pelos
doutores católicos para se chegar a um certo conhecimento e compreensão do
dogma, sem dúvida que não se apoiam sobre fundamento tão caduco. Apoiam-se, ao
contrário, em princípios e noções ditadas por um verdadeiro conhecimento da
criação; e, para deduzirem estes conhecimentos, a verdade revelada, como se
fosse uma estrela, iluminou a mente humana por meio da Igreja. Por isso, não há
de que maravilhar-se se alguma destas noções acabou não apenas por ser usada em
Concílios Ecuménicos, mas foi aí de tal modo ratificada que não é lícito abandoná-la»
[Carta enc. Humani generis (12 de Agosto de 1950): AAS 42 (1950), 566-567; cf.
Comissão Teológica Internacional, Doc. Interpretationis problema (Outubro de
1989): Enchiridion Vaticanum, XI, nn. 2717-2811].
113 « Quanto ao próprio significado das
fórmulas dogmáticas, este permanece, na Igreja, sempre verdadeiro e coerente,
mesmo quando se torna mais claro e melhor compreendido. Por isso, os fiéis
devem rejeitar a opinião segundo a qual as fórmulas dogmáticas (ou uma parte
delas) não podem manifestar exactamente a verdade, mas apenas aproximações
variáveis que, de certa forma, não passam de deformações e alterações da mesma
» [S. Congr. da Doutrina da Fé, Decl. sobre a defesa da doutrina católica
acerca da Igreja Mysterium Ecclesiæ (24 de Junho de 1973), 5: AAS 65 (1973),
403].
114 Cf. Congr. S. Officii, Decr. Lamentabili
(3 de Julho de 1907), 26: ASS 40 (1907), 473.
115 Cf. João Paulo II, Discurso na
Pontifícia Universidade de S. Tomás (17 de Novembro de 1979), 6: L'Osservatore
Romano (ed. portuguesa de 25 de Novembro de 1979), 8.
116 N. 32: AAS 85 (1993), 1159-1160.
117 Cf. João Paulo II, Exort. ap. Catechesi
tradendæ (16 de Outubro de 1979), 30: AAS 71 (1979), 1302-1303; Congr. da
Doutrina da Fé, Instr. sobre a vocação eclesial do teólogo Donum veritatis (24
de Maio de 1990), 7: AAS 82 (1990), 1552-1553.
118 Cf. João Paulo II, Exort. ap. Catechesi
tradendæ (16 de Outubro de 1979), 30: AAS 71 (1979), 1302-1303.
119 Cf. ibid., 22: o.c., 1295-1296.
120 Cf. ibid., 7: o.c., 1282.
121 Cf. ibid., 59: o.c., 1325.
122 Conc. Ecum. Vat. I, Const. dogm. sobre
a fé católica Dei Filius, IV: DS 3019.
123 « Ninguém pode tratar a teologia como
se fosse uma simples colectânea dos próprios conceitos pessoais; mas cada um
deve ter a consciência de permanecer em íntima união com aquela missão de
ensinar a verdade, de que é responsável a Igreja » [João Paulo II, Carta enc.
Redemptor hominis (4 de Março de 1979), 19: AAS 71 (1979), 308].
124 Cf. Conc. Ecum. Vat. II, Decl. sobre a
liberdade religiosa Dignitatis humanæ, 1-3.
125 Cf. Exort. ap. Evangelii nuntiandi (8
de Dezembro de 1975), 20: AAS 68 (1976), 18-19.
126 Const. past. sobre a Igreja no mundo
contemporâneo Gaudium et spes, 92.
127 Cf. ibid., 10.
128 Prólogo, 4: Opera omnia, t. V (Florença
1891), 296.
129 Cf. Decr. sobre a formação sacerdotal
Optatam totius, 15.
130 Cf. João Paulo II, Const. ap. Sapientia
christiana (15 de Abril de 1979), arts. 67-68: AAS 71 (1979), 491-492.
131 João Paulo II, Discurso na Universidade
de Cracóvia, por ocasião dos 600 anos da Alma Mater Jaghelónica (8 de Junho de
1997), 4: L'Osservatore Romano (ed. portuguesa de 21 de Junho de 1997), 6.
132 «'e noerà tes pìsteos tràpeza » [Pseudo-Epifânio,
Homilia em louvor de Santa Maria Mãe de Deus: PG 43, 493] .
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