Art. 3 – Se a missão invisível da Pessoa divina é somente quanto ao Dom da graça santificante.
(I Sent., dist. XIV, q. 2, a. 2).
O terceiro discute-se assim. – Parece que a missão invisível da Pessoa divina não é só quanto ao dom da graça santificante.
1. – Pois, ser enviada a Pessoa divina é o mesmo que ser doada. Por onde, se a Pessoa divina é enviada só quanto aos dons da graça santificante, não será doada a Pessoa divina, mas só os seus dons. Ora, afirmá-lo é o erro dos que dizem não ser o Espírito Santo dado, mas apenas, os seus dons.
2. Demais. – A expressão – quanto – implica uma relação causal. Ora, a Pessoa divina é causa de possuirmos o dom da graça santificante e não, inversamente, conforme a Escritura (Rm 5, 5): A caridade de Deus está derramada em nossos corações pelo Espírito Santo, que nos foi dado. Logo, inconvenientemente se diz que a Pessoa divina é enviada quanto aos dons da graça santificante.
3. Demais. – Agostinho ensina: Diz-se que o Filho é enviado porque é percebido temporalmente pelo nosso espírito [1]. Ora, o Filho é conhecido, não só pela graça santificante, mas também pela graça gratuita, assim como pela fé e pela ciência. Logo, a Pessoa divina não é enviada quanto apenas à graça santificante.
4. Demais. – Rábano diz que o Espírito Santo foi dado aos Apóstolos para operarem milagres [2]. Pelo que não é um dom de graça santificante, mas da gratuidade. Logo, a Pessoa divina não é dada somente quanto à graça santificante.
Mas, em contrário, diz Agostinho, que o Espírito Santo procede temporalmente, para santificar a criatura [3]. Ora, a missão é a processão temporal. Logo, como a santificação da criatura não se opera senão pela graça santificante, segue-se que a missão invisível da Pessoa divina não existe senão pela graça santificante.
À Pessoa divina convém o ser enviada, no sentido em que existe de novo modo em alguém; e ser dada, no sentido de ser possuída por alguém. Ora, nada disto é possível senão pela graça santificante. Pois, há um modo comum pelo qual Deus está em todas as coisas pela essência, pela potência e pela presença; assim como a causa está nos efeitos que participam da sua bondade. Mas além desse modo comum, há um modo especial, que convém a natureza racional, na qual dizemos que Deus está, como o conhecido, no conhecente, e o amado, no amante. E porque, conhecendo e amando, a criatura racional atinge, pela sua operação, o próprio Deus; deste modo especial dizemos não somente que Deus está na criatura racional, mas também nela habita, como no seu templo. E assim, nenhum outro efeito pode ser a razão de estar a Pessoa divina na criatura racional, de novo modo, senão a graça santificante. Por onde, somente quanto a tal graça a Pessoa divina é enviada e procede temporalmente. – Semelhantemente, consideramo-nos possuidores só daquilo de que livremente podemos usar ou gozar. Ora, o poder de gozar a Pessoa divina só é possível pela graça santificante. – Contudo, pelo próprio dom dessa graça possuímos o Espírito Santo que habita em nós. Por onde, o próprio Espírito Santo é dado e é enviado.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJEÇÃO. – O dom da graça santificante aperfeiçoa a criatura racional, para que livremente use, não só do próprio dom criado, mas para que também goze da própria Pessoa divina. E assim, a missão invisível se opera pelo dom da graça santificante; e contudo a própria Pessoa divina é dada.
RESPOSTA À SEGUNDA. – A graça santificante dispõe a alma para receber a Pessoa divina, e é o que queremos significar quando dizemos que o Espírito Santo é dado, quanto ao dom da graça. Contudo, o próprio dom da graça vem do Espírito Santo; e isto exprimimo-lo quando dizemos que a caridade está derramada em nossos corações pelo Espírito Santo.
RESPOSTA À TERCEIRA. – Embora por alguns outros efeitos o Filho possa ser conhecido por nós, todavia não habita em nós nem é possuído por nós, por outros efeitos.
RESPOSTA À QUARTA. – Fazer milagres manifesta a graça santificante, assim como a manifesta o dom da profecia e qualquer graça gratuita. Por isso, a graça gratuita é chamada manifestação do Espírito. Assim, pois, se diz que o Espírito Santo foi dado aos Apóstolos para fazerem milagres, porque lhes foi dada a graça santificante como sinal manifestativo. Se, porém, fosse dado somente o sinal da graça santificante, sem a graça, não se diria ter sido dado o Espírito Santo, pura e simplesmente; senão talvez com alguma determinação, assim como se diz que é dado o espírito profético ou de milagres, a quem recebeu do Espírito Santo a virtude de profetizar ou de fazer milagres.
(são tomás de aquino, Suma Teológica,)
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