24/07/2010

A propósito da entrevista do Revmº Senhor D. Carlos Azevedo

Estou convencido que durante muito tempo se vão multiplicar os dizeres, escritos e falados, sobre esta entrevista, achando uns que está muito bem, outros que se ficou aquém do que poderiam esperar e, outros, com mais ruído e virulência, manifestarão um incómodo que não conseguem disfarçar.
Sim, é verdade, as palavras do Senhor Bispo incomodam, diria eu, toda a gente.

Talvez na Igreja portuguesa haja quem pense que terá dito de mais; haverá católicos que talvez aduzam que, os Senhores Bispos, não se devem meter “nestas coisas”.

Outros desejariam que o Senhor D. Carlos tivesse marcado uma data, um local para dar início à enormíssima manifestação que desejam.
Por mim, estou muito contente e satisfeito com o que ouvi. Não houve uma escolha desmesuradamente cautelosa de palavras, não houve exaltação absolutamente nenhuma, não se viu, sequer, uma tomada de posição em nome de seja quem for. O Senhor D. Carlos Azevedo falou em nome próprio com a liberdade e o direito que é reconhecido a qualquer cidadão e com a justa medida que a sua experiência pastoral e profundo conhecimento da sociedade portuguesa lhe ditaram.

É verdade… lançou uma ideia para resolver alguns dos problemas mais prementes: o desconto voluntário de parte dos salários auferidos pelos políticos ou detentores de cargos públicos. Esta é uma sugestão do Senhor Bispo, não é uma recomendação da Igreja Católica Portuguesa.

Houve políticos, pelo menos um, que seraficamente adiantou uma citação evangélica: «não saiba a tua mão direita o que faz a esquerda». Esqueceu-se porém do contexto desta recomendação de Jesus Cristo. De facto Ele disse-o a propósito da esmola. (Mt 6, 2-3)

O Senhor Bispo não falou de esmolas, falou de justiça social que é algo completamente diferente.

Quem recebe proventos – salários ou pensões – que totalizam num mês aquilo que muitos portugueses não ganham em vários anos de trabalho, tem de concordar que se situa num patamar na escala social que a enormíssima maioria não conhece, ou sequer, sonha. Que esses proventos advêm de um trabalho de altíssima qualidade, em lugares de enorme responsabilidade… pode ser, à luz da lei, estará certo, mas nem por isso deixa de constituir uma desigualdade e um enormíssimo desrespeito para com a sociedade que servem ou serviram.
Também falou, o Senhor D. Carlos, sobre bancos e banqueiros. Existindo para ganhar dinheiro, obviamente, um banco não é uma instituição de misericórdia, fundamentalmente serve-se do dinheiro de uns a quem paga 1 para emprestar a outros de quem cobra 5, mas, de facto e como muito bem frisou, esse dinheiro não lhes pertence.

Porque é que estas coisas vêm à praça pública pela voz de um Bispo da Igreja Católica Portuguesa?

Porque o momento é gravíssimo, cresce diariamente o número de pessoas, famílias inteiras que mal vivem com o pouquíssimo que têm. A Igreja Católica Portuguesa que é o maior “benemérito” da nossa sociedade através das inúmeras obras de solidariedade social, institutos, hospitais, acções directas junto das populações numa lista interminável de apoios, subsídios, ajudas faz tudo isto com o dinheiro que os católicos portugueses lhe confiam, só que, agora, devido ao momento que vivemos, esses fundos não chegam para acudir ao número crescente dos que precisam.

Não vamos dissecar palavra por palavra o que o Senhor D. Carlos disse, estabelecendo comparações e aventando críticas.
Vamos fazer o que, no fim e ao cabo, pediu à sociedade portuguesa:
Vamos, todos, ajudar conforme pudermos e a nossa consciência nos dite!

Porto, 2010.07.24

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