Dentro do
Evangelho
Mc IV
1 De
novo começou a ensinar à beira-mar. Uma enorme multidão vem agrupar-se junto
dele e, por isso, sobe para um barco e senta-se nele, no mar, ficando a
multidão em terra, junto ao mar. 2 Ensinava-lhes muitas coisas em parábolas e
dizia nos seus ensinamentos: 3 «Escutai: o semeador saiu a semear. 4 Enquanto
semeava, uma parte da semente caiu à beira do caminho e vieram as aves e
comeram-na. 5 Outra caiu em terreno pedregoso, onde não havia muita terra e
logo brotou, por não ter profundidade de terra; 6 mas, quando o sol se ergueu,
foi queimada e, por não ter raiz, secou. 7 Outra caiu entre espinhos, e os
espinhos cresceram, sufocaram-na, e não deu fruto. 8 Outra caiu em terra boa e,
crescendo e vicejando, deu fruto e produziu a trinta, a sessenta e a cem por
um.» 9 E dizia: «Quem tem ouvidos para ouvir, oiça.» 10 Ao ficar só, os que o
rodeavam, juntamente com os Doze, perguntaram-lhe o sentido da parábola. 11 Respondeu:
«A vós é dado conhecer o mistério do Reino de Deus; mas, aos que estão de fora,
tudo se lhes propõe em parábolas, 12 para que ao olhar, olhem e não vejam, ao
ouvir, oiçam e não compreendam, não vão eles converter-se e ser perdoados.» 13 E
acrescentou: «Não compreendeis esta parábola? Como compreendereis então todas
as outras parábolas? 14 O semeador semeia a palavra. 15 Os que estão ao longo
do caminho são aqueles em quem a palavra é semeada; e, mal a ouvem, chega
Satanás e tira a palavra semeada neles. 16 Do mesmo modo, os que recebem a
semente em terreno pedregoso, são aqueles que, ao ouvirem a palavra, logo a
recebem com alegria, 17 mas não têm raiz em si próprios, são inconstantes e,
quando surge a tribulação ou a perseguição por causa da palavra, logo
desfalecem. 18 Outros há que recebem a semente entre espinhos; esses ouvem a
palavra, 19 mas os cuidados do mundo, a sedução das riquezas e as restantes
ambições entram neles e sufocam a palavra, que fica infrutífera. 20 Aqueles que
recebem a semente em boa terra são os que ouvem a palavra, a recebem, dão fruto
e produzem a trinta, a sessenta e a cem por um.» 21 Disse-lhes ainda: «Põe-se,
porventura, a candeia debaixo do alqueire ou debaixo da cama? Não é para ser
colocada no candelabro? 22 Porque não há nada escondido que não venha a
descobrir-se, nem há nada oculto que não venha à luz. 23 Se alguém tem ouvidos
para ouvir, oiça.» 24 E prosseguiu: «Tomai sentido no que ouvis. Com a medida
que empregardes para medir é que sereis medidos, e ainda vos será acrescentado.
25 Pois àquele que tem, será dado; e ao que não tem, mesmo aquilo que tem lhe
será tirado.» 26 Dizia ainda: «O Reino de Deus é como um homem que lançou a
semente à terra. 27 Quer esteja a dormir, quer se levante, de noite e de dia, a
semente germina e cresce, sem ele saber como. 28 A terra produz por si,
primeiro o caule, depois a espiga e, finalmente, o trigo perfeito na espiga. 29
E, quando o fruto amadurece, logo ele lhe mete a foice, porque chegou o tempo
da ceifa.» 30 Dizia também: «Com que havemos de comparar o Reino de Deus? Ou
com qual parábola o representaremos? 31 É como um grão de mostarda que, ao ser
deitado à terra, é a mais pequena de todas as sementes que existem; 32 mas, uma
vez semeado, cresce, transforma-se na maior de todas as plantas do horto e
estende tanto os ramos, que as aves do céu se podem abrigar à sua sombra.» 33 Com
muitas parábolas como estas, pregava-lhes a Palavra, conforme eram capazes de
compreender. 34 Não lhes falava senão em parábolas; mas explicava tudo aos
discípulos, em particular. 35 Naquele dia, ao
entardecer, disse: «Passemos para a outra margem.» 36 Afastando-se da multidão,
levaram-no consigo, no barco onde estava; e havia outras embarcações com Ele.
37 Desencadeou-se, então, um grande turbilhão de vento, e as ondas arrojavam-se
contra o barco, de forma que este já estava quase cheio de água. 38 Jesus, à
popa, dormia sobre uma almofada. 39 Acordaram-no e disseram-lhe: «Mestre, não
te importas que pereçamos?» Ele, despertando, falou imperiosamente ao vento e
disse ao mar: «Cala-te, acalma-te!» O vento serenou e fez-se grande calma. 40 Depois
disse-lhes: «Porque sois tão medrosos? Ainda não tendes fé?» 41 E sentiram um
grande temor e diziam uns aos outros: «Quem é este, a quem até o vento e o mar
obedecem?»
Comentários:
As comparações,
exemplos, que Jesus Cristo dá quando fala do Reino de Deus devem ter ficado
gravadas para sempre na mente e no coração dos que as ouviram. E em nós também,
porque por inspiração do Espírito Santo os evangelistas no-las fizeram chegar. São
palavras, explicações, simples, acessíveis que qualquer um pode perceber. Desta
forma ninguém poderá dizer que não entende. O que é importante é que ninguém
possa dizer: ninguém me explicou! Essa é a nossa tarefa o encargo de qualquer
cristão.
Como
comentar este trecho do Evangelho? Com as minhas pobres palavras humanas? Não! Deixo
o comentário mais completo, esclarecedor e definitivo que é aquele que o
próprio Senhor faz, na explicação da parábola.
Este semeador de que
Cristo fala é O Próprio Deus que não faz qualquer acepção de pessoas dando a
todos as mesmas oportunidades. Às «mãos cheias», com extraordinária
prodigalidade, vai lançando ao mundo a Sua palavra, para que todos –
absolutamente – possam usufruir de quanto contém e, sobretudo, das
oportunidades de salvação. O Reino de Deus é vasto, mas Ele chega a todo o lado
enviando os Seus apóstolos de hoje – como fez com os de ontem – a todos os
lugares da terra e, como o semeador, fica esperando com expectante interesse,
como essa palavra, essa semente lançada no coração dos homens, frutifique,
dando muitos e bons frutos ou, ao contrário, estiole e morra sem nada produzir.
Ele, O Senhor, fez o “Seu trabalho”, nós, homens, temos de fazer o nosso, isto
é, receber essa semente e cuidar com esmero desta dádiva absolutamente gratuita
para que, ao ajudá-la a crescer e frutificar, possamos distribuir a outros essa
semente, palavra e garantia de Vida Eterna.
Talvez haja quem pense que Jesus Cristo deveria falar
de outro modo, mais claro, directo. A verdade é que - desde sempre - a melhor
forma de apresentar algo novo e revelar o até então desconhecido, ė através de exemplos
gráficos, simples e assertivos que melhor possam ser compreendidos. Sobretudo
naquele tempo de escassa cultura, ensinar usando os métodos tradicionais era
algo reservado só a alguns e, o povo comum e anónimo, não tinha nem acesso nem
possuía bases que lhe permitissem compreender totalmente o que se lhes
transmitia. Seja como for, o Evangelista confirma que tudo era explicado aos
discípulos para que entendessem bem a doutrina que as parábolas encerravam.
Como já antes comentamos, as comparações que o Senhor faz com o Reino dos
Céus são tão simples e despidas de artifícios que qualquer um pode entender. Aos
que nos dedicamos ao apostolado - que devemos ser todos os cristãos - deve
servir-nos de exemplo a seguir: a nossa preocupação deve ser que nos entendam e
compreendam o que desejamos transmitir donde que, a "velha desculpa eu não
tenho jeito para falar", não tem qualquer cabimento.
É muito comum usar este texto de São Marcos para
estabelecer uma correlação com a Igreja. De facto, desde o início tem sido
submetida a autênticas tempestades que, muitas vezes, atingem proporções de
autêntica catástrofe e tal como os da barca, também nós nos perguntamos: ‘Onde
estás Senhor que pareces ausente ou desinteressado da sorte dos Teus filhos
objecto de violências incríveis, vítimas de furor persecutório que provoca
inumeráveis vítimas’? Sim… onde estás Senhor Tu que és a cabeça desta Igreja’?
É para nós um mistério do qual o demónio se serve
muitas vezes para abalar a nossa fé e confiança. Neste debate íntimo que é
lógico e naturalmente justificável, escolhamos antes rezar com redobrada
confiança pelos perseguidos e pelos que perseguem, pela paz na Igreja e nos
seus filhos.
Quantas vezes, Senhor, me ponho a
pensar que dormes, que não vês o que se passa comigo. Sofro, tenho necessidades
– julgo ter necessidades – aquela pessoa que tanto gostava morreu, desfez-se
uma família a quem tanto quero, sou humilhado, tenho necessidade de justiça,
parece-me que estou sozinho entregue a mim mesmo e às minhas dificuldades e
problemas. Dormes, Senhor? Como me admiro, que Tu, que me amas – sei que me
amas – adormeças assim, alheio à minha situação! Mas, depois, vejo que o sono é
meu, a dormência é minha, o alheamento sou eu que o vivo. Percebo que Te quero
como um “Deus particular”, só para mim, que me resolva os problemas e aplane as
dificuldades e esqueço-me do mais importante: ter fé inquebrantável em que, Tu,
sabes mais, e que tudo, absolutamente, é para bem. Omnia in bonum!
Jesus
dorme rendido pelo cansaço de um trabalho apostólico intenso. A Sua humanidade,
como a nossa, precisa de descansar. Cristo é um Homem Perfeito, mas não é um
super-homem, tem fome, sente sede, é vencido pela fadiga. Esta realidade comove
e atrai e, de certo modo, realça a humanidade do Salvador. De facto, Ele é
igual a nós em tudo excepto no pecado.
«Porque sois tão medrosos? Ainda não tendes
fé?» e poderia ter acrescentado: o que mais será preciso para que a
tenham!
De facto, só sabemos a “medida” da nossa fé, quando esta é
colocada à prova. É fácil dizer ‘acredito’, ‘creio’ quando não há nenhum risco ou
perigo ou, talvez, uma situação de confronto, aí...sim! Afirmar que se tem fé
e, mais que afirmar, sentir a fé sólida, inabalável, inamovível... aí, quando o
ambiente é adverso, contestatário, intolerante, mundano, ateu, aí... nessas
situações em que os outros nos olham com suspeita ou desprezo, troçam e fazem
pouco e se permitem teorizar sobre a “crendice” e “falta de cultura” que,
segundo eles, caracteriza os verdadeiros cristãos, aí é que se revela em toda a
sua grandeza a força da nossa fé em Jesus Cristo Nosso Senhor.
Porque
temo, Senhor?! Porque me parece que Tu dormes, que não Te dás conta da
tempestade que me assalta, da tormenta que me assedia. Mas… oiço-Te: Sim, Eu durmo, é verdade, a Minha humanidade
que, por tua causa assumi, leva-me ao cansaço e o corpo, rendido, adormece;
mas, acaso não estou no teu barco? Como podes então supor que o vento ou o mar
ou outra coisa qualquer, tem algum poder sobre Mim?! A Minha humanidade pode
adormecer mas a Minha divindade permanece e, Eu, sou o Senhor de todas as
coisas… não acreditas nisto?
Oh
Senhor, eu acredito, mas bem sabes como a minha fé é débil e que, sem Ti, me
sinto perdido. Fica comigo, Senhor, fica no meu barco, dorme, descansa que eu
fico de vela para que nada aconteça,mas, não Te esqueças, Senhor, aumenta a
minha fé!
De facto, parece que a Fé tem a ver com o medo, muita
gente tem, realmente, medo de ter Fé porque adivinha que, ao tê-la, a sua vida
“se complica” inevitavelmente. A pessoa com Fé tem um sentido diferente da vida
daquele que a não possui e, mais, obriga-se a proceder de acordo com essa mesma
fé que, de modo simples, se pode traduzir: Acreditar em Jesus Cristo.
O Senhor não dorme, isto é, nunca se alheia das
verdadeiras necessidades dos Seus irmãos os homens. Muitas vezes parece que Lhe
é indiferente mas não! Está apenas a pôr à prova a nossa fé, a nossa confiança.
A bonança que se segue à tempestade faz esquecer a
violência e o temor que aquela provocou. Assim a paz de espírito que se instala
no nosso coração depois da Confissão Sacramental. O bem alcançado passa, assim,
a ser muito mais importante que o mal-estar anterior. A absolvição que, em nome
do Pai, do Filho e do Espírito Santo, o Sacerdote nos concede, é o lenitivo
necessário e conveniente para a inquietação e humilhações que o pecado
provocou. Vale a pena!!!
A Luz do Mundo fala da luz e explica que
quem possui luz tem por obrigação iluminar o ambiente, os outros. Não pode
guardar para si um bem que lhe foi dado, exactamente para ser portador e meio
de transmissão. O que temos - tudo absolutamente - foi-nos entregue em
confiança, em primeiro lugar para que o utilizemos nos nossos esforços de
melhoria pessoal, na procura da santidade, depois para que distribuamos esses
mesmos bens pelos outros que deles possam precisar para atingir o mesmo fim.
As palavras de Jesus: «Com a medida
com que medirdes vos medirão a vós, e ainda se vos acrescentará», constituem uma autêntica sentença
a ter em conta muito cuidadosamente. De facto, dar, acrescenta sempre algo a
quem recebe, mas, o que dá, também recebe porque não se dá nada que não se
tenha recebido antes. Nós, os homens, na realidade, não temos nada nosso, tudo
nos foi dado por Deus e, quando daquilo que recebemos damos uma parte a quem
precisa, recebemos daquele a quem demos, a gratidão e de Deus, a compensação
porque, Ele, nunca Se deixa vencer em generosidade.
Nós, os cristãos, somos a «luz do
mundo» na medida em reflectimos a Luz de Deus, e não temos o direito de a
guardar só para nós. Iluminados pelo Espírito Santo, vamos – temos de ir –
espalhando à nossa volta essa claridade que tudo descobre e retira das sombras
o que deve estar à vista, mas… atenção, essa “luz” não é outra coisa que o exemplo
que damos de nós mesmos com a nossa vida e comportamento.
Este trecho de São Marcos contém uma
declaração de Jesus de extrema importância para a nossa vida de cristãos. Por
palavras Suas, diz expressamente: «Tomai
sentido no que ouvis. Com a medida que empregardes para medir é que sereis
medidos, e ainda vos será acrescentado. Pois àquele que tem, será dado; e ao
que não tem, mesmo aquilo que tem lhe será tirado.»
Todos, mais ou menos, temos esta
tendência de julgar, aferir o comportamento dos outros sem qualquer autoridade
ou direito de o fazer. Pois bem: é essa “medida” que o Senhor fala e que,
garante, será usada connosco. Somos bons? Óptimo pois, então, o Senhor
garante-nos que poderemos ser muito melhores. Somos mesquinhos, orgulhosos,
convencidos que sabemos o suficiente? Pois, então, a nossa sabedoria
revelar-se-á em ignorância e, aquilo que guardamos com tanto orgulho, ser-nos-á
tirado e ficaremos reduzidos a simples humanos sem valor, qualificação ou
merecimento.
O Senhor, por vezes, é algo enigmático no Seu discurso.
Pelo menos assim nos parece, mas, se atendermos
bem, compreenderemos o que Jesus Cristo quer dizer com as Suas palavras: Em
primeiro lugar destaca o privilégio dos filhos de Israel como povo escolhido
por Deus para ser o primeiro a receber o Seu Reino, cumprindo as promessas
feitas ao longo dos tempos tal como nos revelam os Profetas; Em segundo lugar
porque deseja que a conversão seja um acto interior, fruto de um amadurecimento
na Fé nele como Filho Unigénito de Deus e Salvador de todos os homens, e não
algo furtuito nascido de um entusiasmo ocasional sem raízes profundas. Porque
a conversão é algo pessoal; já a Fé pertence a Deus concedê-la como dom e graça
inteiramente gratuitos.
O êxito apostólico – por assim dizer – depende em grande
parte de nós próprios, é certo, mas está intimamente ligado àqueles a quem nos
dirigimos e às disposições que possam ter no momento. De facto, temos de ter em
atenção que “as condições” para sementeira podem variar devido às
circunstâncias particulares que cada um vive, donde, seja absolutamente
necessário um critério esclarecido, uma visão correcta para escolher o momento,
a ocasião mais apropriada. Ajudar-nos-á, sem dúvida, pedir ajuda ao Espírito
Santo, talvez utiizando a famosa composição de São Tomás de Aquino: “Oh!
Espírito Santo, Amor do Pai e do Filho: Inspira-me sempre o que devo pensar, o
que devo dizer, como devo dizer. O que devo calar, o que devo escrever, como
devo fazer, ara obter a Vossa Glória, o bem das almas e a minha própria
santificação”.
Haverá trabalho mais nobre e útil que semear? Penso que
não! Transmitir aos outros o que se sabe ser verdade, conhecimentos sobre um
ofício ou tarefa, formas de actuar nas diversas circunstâncias e fases da vida
corrente e, sobretudo, as verdades da Fé Cristã, além de ser trabalho
nobílissimo é serviço de Deus e a Deus. Ele, não obstante as nossas fraquezas e
debilidades, – ou talvez por isso mesmo – quer servir-se de cada um dos homens,
sem excluir ninguém, para transmitir a Sua Palavra, dar a conhecer o Seu Reino,
mas... atenção! O primeiro “campo” a semear é o nosso coração, a nossa alma, instruir-nos,
estudar, aprofundar o mais possível, de modo que, a semente que iremos utilizar
seja a melhor, a mais conveniente a que melhores frutos poderá produzir.
É preciso, também, ter presente que,
raramente quem colhe é aquele que semeou, não é este o seu encargo. Querer a
todo o custo ver a seara, pode “apagar” o verdadeiro sentido de serviço e
albergar algum sentimento de vã glória. Por isso mesmo convém, sumamente,
orientar a sementeira de acordo com as instruções do Director Espiritual que
sabe muito bem onde e como semear e, até, a ocasião mais oportuna para o fazer.
Seguindo este critério, semeemos, pois, a semente de Deus e, Ele, a fará
frutificar independentemente do “terreno” onde foi lançada.
Ao considerarmos este trecho de São
Marcos voltamos sempre à mesma reflexão: Sou cristão! Sou Filho de Deus! Sou –
devo ser – o reflexo da Sua luz que ilumina o mundo! Como poderei fazê-lo se
“ficar em casa”, não contactar os outros, enfim… se não fizer apostolado? Convençamo-nos
que ser apóstolo não é mais que reflectir nos outros a Luz que recebemos de
Cristo.
Na sua pregação, Jesus Cristo repete
muitas vezes, de forma semelhante, esta frase: «Se alguém tem ouvidos para ouvir, oiça». É um aviso sério a ter
muito em conta por todos os homens, sobretudo pelos cristãos. A Palavra que
ouvimos é Palavra de vida eterna, tem a ver com a nossa salvação, por isso é de
suma importância entender o que ouvimos, mas, principalmente, ouvir de forma a
pôr em prática o que nos é dito se não… seremos uns sujeitos passivos,
desatentos e a quem éindiferente ou pouco importa o que lhe é dito. Será uma
pena e um desperdício com resultados nefastos e, talvez, decisivos para a nossa
própria felicidade.
O que tenho, na verdade, não é meu, não
me pertence, foi-me emprestado para fazer render e passar a outros. Na medida
em que o fizer – e tenho de o fazer como obrigação cristã – ser-me-á
acrescentado e, não obstante dar, passarei a ter mais. É, de facto, um mistério
mas, para mim, é claro como água porque foi O Próprio Jesus quem o disse.
Ajuda-me, Senhor, a partilhar a luz que de Ti recebo para que outros também
possam ver como eu vejo.
‘Quem dá aos pobres empresta a Deus!’ ouvia o
meu querido Pai dizer com frequência. Mais que uma frase bonita, ela transmite
uma realidade já que foi o próprio Jesus Cristo Quem garantiu que nem um
simples copo com água dado por amor ao próximo ficará sem recompensa, assim é que o Senhor devolve com altíssimos
juros aquilo que Lhe emprestamos nas pessoas que nos pedem assistência, é,
pois, um excelente negócio a ter muito em conta.
O Reino de Deus não é algo que se
instala no espírito do homem de um momento para o outro. Começa no nosso
Baptismo em que, por obra e Graça do Espírito Santo, somos convertidos em
Filhos de Deus e, depois, ao longo da nossa vida deverá ir crescendo através da
prática das boas obras, da frequência dos Sacramentos, principalmente com a
recepção da Sagrada Comunhão Eucarística, este é o campo, a semente onde
devemos “trabalhar” com afinco, pedindo que a Graça de Deus nos robusteça a
Fé, a Esperança e a Caridade que enformarão todo o nosso ser humano.
Damo-nos conta da extraordinária Graça
que nos é concedida: saber-mos de “fonte segura” o que é o Reino de Deus? Passaram
centenas e centenas de anos em que uma incomensurável multidão de seres humanos
não sabia exactamente o que era e, em enorme maioria, nem sequer suspeitava da
sua existência, foram esses homens um pouco “desconfiados” e de escassa cultura
que nos transmitiram esse conhecimento tal como o ouviram repetidas vezes dos
lábios de Cristo. Como devemos agradecer, venerar e exaltar esses Discípulos e
Apóstolos a quem tanto devemos!
O Reino de Deus existe quer o homem queira ou não,
deseje ou não fazer parte dele. O Senhor explica abundantemente e com paciência
amorosa o que é esse Reino e as vantagens – reais – de participar no seu
anúncio a todos os homens sem distinção ou acepção. Os trabalhadores do Reino,
que devemos ser todos os cristãos, têm uma garantia de “sucesso” que é dada
pelo próprio Rei: mesmo que a sua acção seja como um grão de mostarda,
aparentemente insignificante, o resultado ultrapassa tudo o que possamos
imaginar. Grandes e pequenas sementeiras, todas darão frutos porque é O Senhor
Quem os faz surgir para os santificar e distribuir por todos.
Um grão de mostarda! Tal é o Reino de
Deus! Esse mesmo Reino que Cristo veio instaurar na, missão a que entregou a
própria Vida. Como Deus é simples! Nós, homens, temos esta tendência para O
considerar Grande e Poderoso e, consequentemente, complicado, mas não é. Não
há nada nem ninguém mais simples que Deus, porque sendo Uno tem de ser simples,
só o múltiplo é complicado e, por vezes, difícil de entender. A Deus Nosso
Senhor entendemo-Lo perfeitamente desde que, verdadeiramente, escutemos o que
nos diz.
Como
se pode ver, o Reino de Deus que Jesus Cristo veio anunciar e trazer à terra,
só existirá com o concurso do trabalho do homem. Não podemos ficar inertes à
espera que tudo aconteça como uma dádiva de Deus. Esta dádiva – aquilo que
Deus assegura no Seu Reino – serão os frutos que o nosso trabalho, bem feito,
com perseverança e persistência dará e que Ele distribuirá conforme Lhe
aprouver. No fim e ao cabo, trata-se de exercer a nossa vocação pessoal – seja
qual for – com os olhos postos no Senhor A Quem queremos oferecer o nosso
trabalho e dedicar o nosso empenho. Ora, para que tal possa ser aceite, tem de
ser algo em que nos empenhámos a sério, pondo todas as nossas capacidades e
talentos naquilo que fazemos seja semear, estudar, ensinar, construir… o quer
que seja a nossa profissão, o nosso trabalho, assim, seremos, de facto e pleno
direito, súbditos deste Reino que nos foi dado pelo próprio Rei com a Sua
imolação na Cruz.
Que extraordinário! Este Rei, Criador e
Senhor de todas as coisas, quer que O “ajudemos” na construção do Seu Reino! Sem
mérito algum da nossa parte, concede-nos essa dignidade espantosa:
construtores do Reino de Deus! É admirável a confiança que o Senhor tem em nós,
pobres criaturas cheios de fraquezas e misérias, para levar a cabo tão
portentosa tarefa. Não desperdicemos a oportunidade, não desiludamos Quem nos
convida. A paga será proporcional à tarefa: Incomensurável.
Dia após dia, passo a passo, assim é, deve ser, o
trabalho de apostolado com perseverança e confiança. Perseverança em não
esmorecer no trabalho, mesmo que os frutos tardem em surgir ou, até, não os
vejamos nunca, alguém os colherá quando for o tempo certo. A missão do apóstolo
não é colher, mas sim semear, não em seu nome mas em nome de Deus. Confiança
porque, o Senhor, não deixa nunca que o trabalho de apostolado seja em vão.
Ele, que sabe mais, decidirá quando e como os frutos hão-de aparecer e, também,
não deixará sem prémio, o trabalho efectuado em Seu Nome.
Somos, de facto, imensamente mais
afortunados que os discípulos que seguiam Jesus! Esta afirmação que faço sem
hesitar, vem-me da constatação de que, a mim, não é preciso que o Senhor me
explique as parábolas com que Se refere ao Seu Reino, aqueles se encarregaram
de, ao longo dos tempos, as irem explicando e comentando de modo que, o que
hoje nos chega é tão abundante e rico que só quem não quiser realmente entender
é que terá alguma dúvida, mas, eles, foram os primeiros e enfrentavam uma
“novidade”, algo tão “revolucionário”, grandioso e, ao mesmo tempo, simples que
não eram capazes por si sós de entender completamente o significado.
A catequese de Jesus Cristo, chega-nos
até aos dias de hoje através da Sua Igreja e do Magistério, desta Igreja que,
constantemente, propõe aos seus filhos, abundantes meios de formação e
enriquecimento espiritual. Mal de nós se não os aproveitar-mos!
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