Qinta Feira Santa – Vigília Parte
1
Jo XIII, 1-15
«Antes da festa da Páscoa, sabendo Jesus que chegara a
sua hora de passar deste mundo para o Pai, Ele, que amara os seus que estavam
no mundo, amou-os até ao fim. No decorrer da ceia, tendo já o Demónio metido no
coração de Judas Iscariotes, filho de Simão, a ideia de O entregar, Jesus,
sabendo que o Pai Lhe tinha dado toda a autoridade, sabendo que saíra de Deus e
para Deus voltava, levantou-Se da mesa, tirou o manto e tomou uma toalha, que pôs
à cintura. Depois, deitou água numa bacia e começou a lavar os pés aos
discípulos e a enxugá-los com a toalha que pusera à cintura. Quando chegou a
Simão Pedro, este disse-Lhe: «Senhor, Tu vais lavar-me os pés?». Jesus
respondeu: «O que estou a fazer, não o podes entender agora, mas
compreendê-lo-ás mais tarde». Pedro insistiu: «Nunca consentirei que me laves
os pés». Jesus respondeu-lhe: «Se não tos lavar, não terás parte comigo». Simão
Pedro replicou: «Senhor, então não somente os pés, mas também as mãos e a
cabeça». Jesus respondeu-lhe: «Aquele que já tomou banho está limpo e não
precisa de lavar senão os pés. Vós estais limpos, mas não todos». Jesus bem
sabia quem O havia de entregar. Foi por isso que acrescentou: «Nem todos estais
limpos». Depois de lhes lavar os pés, Jesus tomou o manto e pôs-Se de novo à
mesa. Então disse-lhes: «Compreendeis o que vos fiz? Vós chamais-Me Mestre e
Senhor, e dizeis bem, porque o sou. Se Eu, que sou Mestre e Senhor, vos lavei
os pés, também vós deveis lavar os pés uns aos outros. Dei-vos o exemplo, para
que, assim como Eu fiz, vós façais também».
Meditação
Naquela sala "no andar superior" o ambiente é
estranho.
É um princípio de noite de festa e todos têm e sentem que,
desta vez, a refeição da Páscoa, será diferente.
Começara quando Jesus, em resposta à pergunta: «Onde queres
que preparemos a Páscoa», respondera um pouco misteriosamente: «Ide à cidade
casa de um tal e perguntai-lhe... ele vos mostrará uma sala no andar superior»;
assim fizeram e preparam a ceia.
Mais tarde compreenderiam que a resposta de Jesus
demonstrava prudência ao não revelar o local onde celebrariam a Ceia; não
convinha que esta revelação pudesse levar o traidor a transmiti-la aos chefes
do povo abreviando assim a Sua prisão, tudo teria de ser cumprido conforme as
Escrituras.
Sentaram-se à mesa e, como sempre, Jesus sentado ao meio,
com João a Seu lado, as conversas entre eles decorriam, sobre os acontecimentos
recentes e, principalmente, sobre as palavras de Jesus a propósito do que O esperava
nos próximos dias.
Não conseguiam compreender e, como Pedro, não aceitavam que
a Paixão do Senhor anunciada pelo Senhor pudesse realizar-se mas, também não
esqueciam a forma algo dura como o Mestre reagira ás palavras de Pedro que,
pobre dele, ficara como que esmagado e mergulhado em mutismo, ele, que era
sempre tão falador e disposto a dar a sua opinião e parecer sobre o que fosse.
Reconheciam nele o chefe do grupo e a sua indiscutível autoridade. No entanto o
Senhor dissera-lhe que iria jurar não O conhecer. Assim, como Pedro, olhavam-se
uns aos outros com interrogações mudas. O Mestre, pelo contrário,
apresentava-Se como costume, de semblante desanuviado, trocando palavras com
todos, fazendo perguntas.
Momentos depois o Senhor levanta-se e cingindo-Se de uma
toalha e pondo água numa bacia ajoelha-Se em frente de cada um e lava-lhes os
pés.
Durante a refeição todos os olhares, estão fixos em Jesus. Os
Seus modos parecem normais e, não fora uma estranha palidez o Seu semblante
era, como sempre, tranquilo.
As conversas correm à volta da mesa mas ao contrário do
costume, são quase em sussurro. De facto sentem uma ansiedade que mal disfarçam
que O Mestre comece - como é costume - a falar.
Quando o faz foi como se um terramoto sacudisse aquela
sala: "Um de vós irá trair-me esta noite".
A voz do Mestre tem um ligeiro requebro como que um
queixume sufocado no mais íntimo do Seu Coração. As conversas cessam
imediatamente e os olhares de uns cruzam-se com os dos outros. Sabem que são
fracos e algo volúveis e cada um se interroga interiormente: serei eu?
O Senhor percebe este desconforto que a Sua declaração
provocou. Talvez que o tivesse feito exactamente com essa intenção e também
para que, uma vez mais, tenham a certeza que, Ele, sabe tudo além de dar uma
oportunidade ao traidor de cair em si e desistir do seu propósito. Mas, o pobre
homem foge e abandona a sala.
Jesus retoma a palavra para, num longo discurso, lhes falar
de Amor, do que os espera nos dias e tempos
que se vão seguir, da fé e confiança que têm de ter n'Ele, e, finalmente,
pratica esse supremo acto de amor pelos homens oferecendo-Se como alimento para
todo o sempre e, mais, garante que o milagre se repetirá sempre que repetirem
aquelas palavras e aqueles gestos em Sua memória. Com razão a Santa Igreja
chama à Sagrada Eucaristia o Sacramento da nossa Fé porque é o penhor da
permanência até ao final dos tempos de Jesus Cristo entre nós, mas não só
penhor, mas alimento indispensável para que as vicissitudes, obstáculos
perseguições sejam vencidas e ultrapassadas, a Fé se fortaleça e crie raízes
bem profundas.
As palavras rituais – «Isto é o Meu Corpo, Este é o Meu
Sangue» – repetir-se-ão até ao final dos tempos sempre que é celebrada a
Santa Missa.
Em todos os sacrários da terra permanecerá o Santíssimo
Sacramento cuja presença é assinalada por uma pequena luz, lembrando que Ele
está ali, presente, à nossa espera; quer que O visitemos com frequência, se
possível diária, para Lhe manifestar o nosso amor incondicional.
A visita pode ser breve, com poucas palavras que não são
precisas para que Ele saiba quanto desejamos dizer-Lhe.
Quando visitamos alguém que é amigo íntimo, os nossos pais,
também não levamos um discurso preparado mas, apenas, um sorriso de alegria que
espelhe o nosso interesse, o nosso amor.
Talvez… dizer-lhe o que o Anjo de Portugal ensinou aos
Santos Pastorinhos de Fátima: “Meu Deus, eu creio, adoro, espero e amo-Te,
peço-Te perdão pelos que não creem, não adoram, não esperam e não Te amam”
e, se dispomos de mais um minuto, acrescentar: “Santíssima Trindade, Pai,
Filho e Espírito Santo, adoro-Vos profundamente e ofereço-Vos o Preciosissímo Corpo,
Sangue, Alma e Divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo, presente em todos os
sacrários da terra em reparação de todas ofensas, pecados e sacrilégios com que
constantemente Ès ofendido e pelos méritos do Teu Sacratísímo Coração e do
Imaculado Coração de Maria, peço-Vos a
conversão dos pobres pecadores”.
A Ceia termina; cantados os hinos tradicionais abandonam a
sala e saem pela noite que entretanto caíra, em direcção ao Jardim das
Oliveiras, em Getzamani.
Este horto que ficava numa colina nos arredores de
Jerusalém era um local que muitas vezes visitavam e, até, onde passavam a noite,
abrigados sobe as copas das vetustas oliveiras.
‘Não desanimemos ainda que o quadro
da nossa vida actual apresente tonalidades tenebrosas. Jesus rezou por nós,
oferecendo-nos a possibilidade de encher essa tela com a frescura, a cor e a
alegria do divino. (Javier
Echevarria,’ Getsemani, Planeta, 3ª Ed. Pg. 133)
‘Oxalá
meu Jesus, fosse verdade que nunca Vos tivesse ofendido! Mas já que o mal está
feito, rogo-Vos que vos esqueceis dos desgostos que Vos causei e, pela morte
amarga que por mim padecesTe, levai-me ao Vosso reino depois da morte; e
enquanto a vida me dure fazei que o Vosso amor reine sempre na minha alma’.
(Santo Afonso Maria de Ligório, Meditações
sobre a Paixão, Meditação XII, para 4ª F. Santa, 1)
Homilia
pronunciada em 14 de Abril de 1960, Quinta-Feira Santa.
Antes
do dia da festa da Páscoa, sabendo Jesus que era chegada a sua hora de passar
deste mundo ao Pai, tendo amado os seus, que estavam no mundo, amou-os até ao
fim. Este versículo de S. João anuncia ao leitor que vai acontecer algo de
importante nesse dia. É um preâmbulo terno e afectuoso, que corresponde àquele
que S. Lucas recolhe no seu relato: «Tenho desejado ardentemente comer
convosco esta Páscoa, antes de sofrer».
‘Devemos
começar desde já por pedir ao Espírito Santo que nos prepare de forma a
podermos compreender todas as expressões e todos os gestos de Jesus Cristo,
porque queremos viver vida sobrenatural, porque o Senhor nos manifestou a Sua
vontade de Se nos oferecer como alimento da alma e porque reconhecemos que só
Ele tem palavras de vida eterna.
A
fé leva-nos a confessar com Simão Pedro: nós acreditamos e conhecemos que tu és
Cristo, Filho de Deus. E é também ela, fundida com a nossa devoção, que nesses
momentos transcendentes nos incita a imitar a audácia de João. Assim,
aproximamo-nos de Jesus e reclinamos a cabeça no peito do Mestre que, como
acabamos de ouvir, por amar ardentemente os seus, os iria amar até ao fim.
Todos
os modos de dizer são demasiadamente pobres quando pretendem explicar, mesmo de
longe, o mistério da Quinta-Feira Santa. No entanto, não é difícil imaginar os
sentimentos do Coração de Jesus Cristo naquela tarde, a última que passava com
os seus antes do sacrifício do Calvário.
Lembremo-nos
da experiência tão humana da despedida de duas pessoas muito amigas. Desejariam
ficar sempre juntas, mas o dever - ou seja o que for - obriga-as a afastar-se
uma da outra. Não podem, portanto, continuar uma junto das outra, como seria do
seu gosto. Nestas ocasiões, o amor humano, que por maior que seja, é sempre
limitado, costuma recorrer aos símbolos. As pessoas que se despedem trocam
lembranças entre si, talvez uma fotografia onde se escreve uma dedicatória tão
calorosa, que até admira que não arda o papel. Mas não podem ir além disso,
porque o poder das criaturas não vai tão longe como o seu querer.
Ora
o que não está na nossa mão, consegue-o o Senhor. Jesus Cristo, perfeito Deus e
perfeito Homem, não deixa um símbolo, mas uma realidade. Fica Ele mesmo. Embora
vá para o Pai, permanece entre os homens. Não nos deixará um simples presente
que nos faça evocar a sua memória, alguma imagem que tenda a apagar-se com o
tempo, como uma fotografia que a pouco e pouco se vai esvaindo e amarelecendo
até perder o sentido para quem não interveio naquele momento amoroso. Sob as
espécies do pão e do vinho está Ele, realmente presente, com o seu Corpo, o seu
Sangue, a alma e a sua Divindade’. São Josemaria, Cristo que Passa, 83
O Senhor ensina-nos que devemos ser humildes e
que devemos procurar conforto nos outros quando estivermos tristes, ainda que o
que tenta consolar-nos seja mais ignorante do que nós. (Luís de Palma, A Paixão do Senhor,
Éfeso, 1991, pg. 81-82)
O
que quiser na verdade venerar a Paixão do Senhor deve contemplar de tal forma
Jesus crucificado com os olhos da alma, que reconheça a sua própria carne na
carne de Jesus. (São
Leão Magno, Sermão 15 sobre a Paixão)
O
valor do Crucifixo como ajuda para a oração e a vida cristã é evidente: não há
símbolo que nos lembre tão vivamente o infinito Amor de Deus pelo homem como
esta imagem do próprio Filho de Deus pregado na Cruz por amor de nós, para que
possamos alcançar a vida eterna. Nada pode incitar-nos mais ao arrependimento
dos nossos pecados do que essa representação de Jesus crucificado por nossas
culpas. Nada pode ser melhor âncora nas nossas tribulações e contrariedades de
cada dia que esta imagem de Cristo agonizante, que dá sentido e valor ao nosso sofrimento.
(Leo J. Trese, A Fé Explicada,
Edições Quadrante, São Paulo, 4ª Ed., nr. 338)
Quando
Jesus desperta os discípulos adormecidos e os exorta à oração, vinha de
experimentar, na Sua própria, as mais graves dificuldades. Ele não pode
estranhar que a nós nos custe orar. Mas a luta santa – a agonia de que
fala São Lucas – que o Senhor teve que enfrentar e vencer põe diante dos olhos
que não se entra por caminhos de verdadeira vida interior se não há verdadeira
luta por perseverar na oração: uma luta que, de um modo ou outro, é a de nos
acomodarmos plenamente à Vontade Divina. (Javier Echevarria, Getsemani, Planeta, 3ª Ed. Pg.
1160)
Foi
para Getsemani com os Seus, e pediu-Lhes que O acompanhassem: o «ficai aqui»
e depois «velai coMigo», apesar da sua forma imperativa, eram na
realidade um pedido, uma petição, a forma premente de expressar a Sua
necessidade humana de companhia e a necessidade imperiosa que os discípulos
tinham desse unirem à Sua oração. Faltam palavras para descrever o amor de Deus
à liberdade: convoca-nos como testemunhas da prodigiosa riqueza da Sua vida e
do seu interesse pela nossa salvação, mas nem nesses momentos transcendentes Se
impõe. (Javier Echevarria, Getsemani,
Planeta, 3ª Ed. Cap. I, 4)
Em
Getsemani, quando a Sua oração pela humanidade chegava ao cume da Sua acção
salvifíca, sentiu pena pela indiferença dos Apóstolos, que afirmavam amá-Lo, e
O amavam realmente, mas não totalmente: essa indiferença acentuou-se entre os
que, por ignorância ou pela maldade do pecado, nem sequer punham os olhos
n’Ele. (Javier Echevarria, Getsemani,
Planeta, 3ª Ed. Cap. I, 10)
Porque
Nossa Senhora não se afastou do Calvário? No fim e ao cabo, nada podia fazer, e
a sua presença não evitava nem aliviava as dores do seu Filho nem a Sua
humilhação. E não fez pela mesma razão
que uma mãe permanece junto ao leito do seu filho agonizante em lugar de se
afastar e distrair-se, já que não pode fazer nada para que continue vivendo ou
deixe de sofrer. A Virgem solidarizou-se com o seu Filho; o seu amor levou-a
sofrer com Ele. (F.
Suarez, A Virgem Nossa Senhora, pg. 294)
Nossa
Senhora abdicou dos seus direitos de mãe sobre o seu Filho, para conseguir a
salvação dos homens; e para apaziguar a justiça divina, em quanto dela
dependia, imolou o seu Filho, de modo que se pode afirmar com razão que redimiu
com Cristo a linhagem humana. (Bento
XVI, Epístola Inter sodalícia, 22.05.1918)
Tão
pouco o Senhor perdeu o ensejo para fazer o bem a quem Lhe fazia mal. Depois de
ter beijado sinceramente Judas, admoestou-o, não com a dureza que merecia, mas
com a suavidade com que se trata um doente. Chamou-o pelo seu nome, que é sinal
de amizade... Judas, com um beijo entregas o Filho do Homem? (Lc
22, 48) Com mostras de paz fazes-me a guerra? E ainda, para o mover mais
a que reconhecesse a sua culpa, fez-Lhe outra pergunta cheia de amor: «Amigo,
a que vieste?» (Mt 26, 50) Amigo, é maior a injúria que me fazes
porque foste Meu amigo, mais o dano que me fazes. "Porque se fosse um
inimigo o que maldissesse, suportá-lo-ia..., mas tu, meu amigo, meu amigo
íntimo, com quem me unia um amigável trato..." (Sal 54, 13)
Amigo, ainda que tu não me queiras, Eu sim, Amigo, porque fazes isto, a que
vieste? (Luís De la Palma, La Passión del
Señor, pg. 59-60)
Se
vês que adormeço; se descobres que me assusta a dor; se notas que me detenho ao
ver mais de perto a Cruz, não me deixes! Diz-me como a Pedro, como a Tiago,
como a João, que necessitas da minha correspondência, do meu amor. Diz-me para
seguir-te, para não voltar a deixar-te abandonado com os que tramam a Tua
morte, tenho que passar por cima do sono, das minhas paixões, da comodidade. (M. Montenegro, Via Crucis,
Palabra, 6ª Ed., Madrid, 1971, nr. 48)
Como terá sido o dia de Jesus?
Sabemos como terminou, a ceia pascal,
os acontecimentos no horto das oliveiras.
Mas, antes disso?
O Senhor não vivia por antecipação
embora conhecesse o futuro tal como aconteceria com todo o detalhe.
Estaria alegre e bem-disposto como
sempre, falando com quantos O procuravam, instruindo, doutrinando distribuindo
sem reservas o Seu interesse por cada um, escutando com simpatia as queixas, os
problemas, os pedidos. Um dia "normal", portanto.
Mas, mais que isso, talvez redobrasse
- por assim dizer - o Seu carinho por todos, talvez, para nos deixar uma última
lição: viver cada momento com a intensidade que merece, com todo o empenho e
interesse, sem pressa nem activismo, como Ele próprio disse «a cada dia a
sua preocupação».
De facto, de que vale viver o momento
presente condicionado pelo futuro?
Acaba-se sempre por não o viver em
plenitude que é o que Ele deseja e quer.
Jesus é o mesmo de sempre - hodie et semper - esperando por todos,
recebendo todos, acolhendo todos os que livremente o procuram.
Nestas circunstâncias difíceis para
tantos seres humanos, um pouco por todo o mundo, sofrendo as consequências
devastadoras desta pandemia que assola as nossas vidas, condicionando-as de
forma tão marcante e, muitas vezes, dolorosa, com as privações, o afastamento
familiar e, sobretudo, a perda de entes queridos, também eu procuro viver este
dia – esta Quinta-Feira Santa – com os meus sentidos colocados naquela sala
onde decorre a Última Ceia Pascal de Jesus Cristo.
Em primeirissímo lugar, começo por dar
graças a Deus, muitas graças, por poder fazê-lo na minha casa confortável e
amena, com saúde e com o espírito livre de tristezas e amarguras.
Sim, como sempre, sinto-me abençoado
pelo Senhor que não Se cansa de me cumular com o Seu cuidado amoroso.
Imaginei, ou melhor, vivi esta “Última
Ceia” tantas vezes ao largo da minha longa vida que posso dizer que conheço de
cor todas as palavras trocadas, os gestos, as atitudes, enfim… os detalhes de
quanto se passou naquela «sala no andar de cima» (Lc 22, 12)
que Jesus escolhera para concretizar o Seu Amor, sem medida nem limites: a
instituição da Eucaristia.
«Tomou um pão e, depois de dar graças,
partiu-o e deu-lho, dizendo: Isto é o Meu corpo, que vai ser dado por vós;
fazei isto em Minha memória. Depois de jantar, fez o mesmo com o cálice,
dizendo: Este cálice é a nova Aliança no Meu sangue, que por vós se vai
derramar» (Lc 22, 19-20)
Este milagre de puro amor – talvez
que, maior que o Sacrifício da Cruz – renova-se constantemente, por Sua Vontade
expressa, no Santo Sacrifício da Missa.
De facto, na Cruz, Cristo merece-nos a
Redenção e a Salvação Eterna, numa imolação cruenta, terrível, excepcionalmente
humilhante e completa.
Na Eucaristia a Sua humilhação é bem
expressa ao converter pão e vinho no Seu Corpo e no Seu Sangue para servir de
alimento – perene – a todos os homens.
Fico abismado com a magnitude desta
humilhação do Senhor de quanto existe em consubstanciar-Se em alimento que, por
sua vez, - na Comunhão Eucaristica e enquanto as Sagradas Espécies subsistirem
- se transforma no meu corpo e sangue!
“Apoiado nesta fé da Igreja, o
Concílio de Trento confessa “aberta e simplesmente que no fortalecedor
sacramento da Eucaristia, depois da consagração do pão e do vinho, se contém
verdadeira, real e substancialmente, Nosso Senhor Jesus Cristo, verdadeiro Deus
e verdadeiro homem, sob a aparência daquelas coisas sensíveis”. (De
SS. Eucharistia, cap. 1) Portanto, o nosso Salvador está presente
segundo a Sua humanidade, não só à direita do Pai, conforme ao modo normal de
hexistir, mas ao mesmo tempo também no Sacramento da Eucaristia segundo um modo
de hexistir que, ainda que mal possamos exprimir por palavras, podemos,
contudo, alcançar com a razão ilustrada pela fé e devemos crer firmissímamente
que é possível para Deus”. (São Paulo VI, Encíclica Mysterium Fidei)
A minha alma, o meu espírito
agustiam-se, por vezes, ao considerar os “ultrajes, as ofensas e sacrilégios
com que tantas vezes é ofendido”. (Oração do Anjo de Portugal na sua
primeira aparição aos Pastorinhos de Fátima)
Com frequência durante o dia esta
consideração faz-me realizar actos e considerações de reparação: actos de
pequenas sacrifícios ou renúncias, considerações que são preces e jaculatórias.
Sobretudo quando me aproximo da
Comunhão Eucaristica, peço por todos esses pobres seres que cometem esses actos
tão vis de desrespeito e profanação, atrevendo-me a implorar: Senhor… eles não
sabem o que fazem!
Hoje, neste ano de 2020, não posso
receber-Te na Sagrada Comunhão e limito-me a fazer a comunhão espiritual que
aprendi de São Josemaria: “Eu quisera Senhor, receber-vos com aquela pureza,
humildade e devoção com que Vos rebeu a Vossa Santíssima Mãe, com o espírito e
fervor dos Santos”.
Foi o que fiz hoje ao participar –
pela Televisão - na Santa Missa celebrada na Basília de São Pedro, pelo Papa
Francisco.
Comoveu-me aquela figura de homem
idoso, com vísiveis dificuldades motoras, mas com um espírito lúcido e
determinado.
A sua homília foi centrada nos
Sacerdotes.
Foram palavras de afecto e de
esperança, inspiradoras de confiança e aconselhando o serviço a Deus, e, por
Deus aos outros.
Fiquei envergonhado e triste por
considerar que não rezo tanto como devia pelos Sacerdotes.
Envergonhado, porque falto ao meu
dever como cristão.
Triste, por me mostrar tão ingrato por
tantos inestimáveis serviços que deles tenho recebido ao longo dos anos.
«Quando chegou a hora, pôs-se à
mesa; e com Ele os Apóstolos». (Lc 22, 14)
Quando chegou a hora?
Esta “nota” do Evangelista São Lucas
dá-me que pensar: que hora?
As horas têm a ver com o “plano de
vida” que, qualquer cristão deve ter.
Sim, um cristão não vai pela vida sem
um rumo certo e determinado e, para estar seguro de tal, tem de ter como
princípio fazer o que deve quando deve, sem ceder a tentações de adiar,
“saltar”, para um outro momento, primeiro, porque não sabe se esse momento
acontecerá e, depois, porque se não fizer o que deve quando deve as
consequências poderão ser sérias para outros que talvez estivessem à espera
da nossa acção.
Um plano de vida tem, evidentemente de
prever, considerar ”tempo” para o mundo – as tarefas quotidianas – e “tempo
para” Deus – as orações e participação em actos litúrgicos como a Santa Missa.
Mas, na verdade, esta “distinção de
tempos” não tem razão de ser, já que, as obras, as tarefas, seja o que for,
devem sempre ter como critério fazer – em tudo – a Vontade de Deus.
Se tivermos, como devemos, a
consciência da presença de Deus, esta disposição converter-se-á num
comportamento natural.
Volto para aquela «sala no andar de
cima» e observo com detalhe quanto acontece.
“Aconteceram coisas singulares que
os Evangelistas nos deixaram constantes: a rivalidade entre os Apóstolos, que
começaram a discutir qual seria o maior; o exemplo surprendente de humildade e
de serviço dado por Jesus realizando o ofício reservado ao mais ínfimo dos
escravos: «pôs-se a lavar-lhes os
pés» (Cfr. Jo 13, 4-17); Jesus derrama-Se em amor e ternura
para com os Seus discípulos. «Filhinhos» (Cfr. Jo 13, 33)
chega chamar-lhes”. (F. Fernandez Carvajal, Hablar com Dios, Tomo
II, 44)
“O próprio Senhor quis dar aquela
reunião tal plenitude de significado, tal riqueza de recordações, tal comoção
de palavras e de sentimentos, tal novidade de actos e preceitos, que nunca
terminaremos de os meditar e explorar. É uma ceia testamentária; é uma ceia
afectuosa e imensamente triste, ao mesmo tempo que misteriosamente reveladora
de promessas divinas, de visões supremas. Paira em cima a morte, com inauditos
presságios de traição, de abandono, de imolação; a conversação apaga-se em
seguida, enquanto a palavra de Jesus flui continua, nova, extremamente doce, tensa
em confidências supremas, comprimindo-se assim entre a vida e a morte”. (São
Paulo VI, Homília da Missa de Quinta-Feira Santa, 27.03.1975)
Segue-se um discurso longo, detalhado.
Jesus tem um tom de voz que denuncia a importância do que diz e, talvez, para
que fique bem gravado na memória dos que O ouvem – ou o leem, como eu – pelos
tempos fora.
Estou tão “metido” nesse discurso que
mal me dou conta que tudo já acabou, que se «cantaram os hinos» (Cfr.
Mc 14, 26) e todos se vão embora.
Já passa das vinte e duas horas, é
noite cerrada e, eu, recomponho-me das emoções vividas e apresso-me a sair
também.
“Jesus vai para o Getsamani para Se
preparar para a Paixão e Morte que se avizinham. Continua previligiando na Sua
Vida o que narra o Evangelista São João: «tendo amado os outros que estavam
no mundo» – a humanidade inteira porque ao encarnar-Se tornou-nos Seus a
todos - , «amou-os até ao fim» (Jo 13, 1) . E dirige-Se para
essa meta cumulo do Seu Amor ao Pai e – pelo Pai – aos homens Seus irmãos,
rezando no Monte da Oliveiras.” (D. Javier Echevarría, Getsemaní, Planeta,
pg. 16)
Jesus, mal chega ao local, recomenda
aos discípulos: «Orai para não cairdes em tentação.» (Lc 22, 40)
“Orai, exclamou; e repetiu-o
porfiadamente, segundo os momentos, com acentos de conselho, de petição, de
mandato. Fixou este requesito como meio necessário para não cair na tentação,
ou para não iludir o cumprimento do dever. Torna-se evidente que, com esse
recurso, a alma fica bem defendida, disposta para levar a cabo as grandes
tarefas, pois Deus não abndona os que O chamam. Reajamos sempre com este
critério de auto-defesa, para não sucumbir aos ataques do diabo, à debilidade
do homem velho que todos arrastamos (cfr. Rm 7, 22-24). (D.
Javier Echevarría, Getsemaní, Planeta, pg. 39)
Evidentemente que tenho experiência
própria – todos os cristãos têm – do poder da oração.
Quando menos espero, nas ocasiões mais
insuspeitas, a tentação, muitas vezes sob a forma de pensamentos torpes e
horíveis, atacam num crescendo tumultuosos que mais não pretendem que provocar
desassossego e distracção do que estou a fazer. Paro imediatamente para elevar
o pensamento ao Anjo da Minha Guarda num apelo à sua ajuda urgente.
Nunca falha!
Estas horas passadas no Horto das
Oliveiras continuam, ao longo dos tempos, a marcar profundamente a Igreja e os
Cristãos.
Teem-se escrito livros, meditações sem
fim mas, a verdade, é que continua um acontecimento que contém um mistério
denso e incompreensível para muitos.
Parece que, e muitos temos essa
experiência, que o sofrimento espiritual é mais profundo que o da carne e, a
verdade, é que pode provocar um verdadeiro sofrimento físico.
Há experiências pessoais que confirmam
que um grande sofrimento causado, por exemplo, com a perda de um ente querido,
pode acarretar consequências físicas de proporções graves. É o chamado
Psicosomatismo, algo bem real e conhecido.
Jesus suava sangue. (cfr. Lc 22,
44)
Não se trata de uma “fantasia” dos
Apóstolos que o constataram. Suar sangue é conhecido por hematidrose fenómeno que ocorre quando
fatores emocionais provocam o rompimento de veias capilares.
E, então, aparece um Anjo que O
conforta.
Tal suscita-nos uma pergunta: Jesus
Cristo tinha um Anjo da Guarda?
São Tomás de Aquino não afirma
expressamente que Jesus tivesse um anjo da guarda no sentido estrito da
palavra, já que o papel dos anjos da guarda, de dirigir e proteger, não Lhe era
necessário. Mesmo assim, as Sagradas Escrituras parecem indicar que havia não
só um anjo, mas toda uma falange de anjos a Seu serviço, de modo que São Tomás
observa:
“Não era de um anjo da guarda,
enquanto superior, que Ele necessitava, mas de um anjo que O servisse como
inferior. (Suma Teológica I, q. 113, a. 4 ad 1)
Quanto ao episódio do Getsémani, São
Tomás explica: “O conforto recebido do anjo não se deu a modo de instrução,
mas para manifestar a veracidade da Sua natureza humana”. (Suma
Teológica III, q.12, a. 4, ad 1)
Sinto-me como que aturdido, esmagado
por estas cenas em que me é dado participar e, uma vez mais, me dou conta do valor,
real e concreto, que, mau grado as minhas misérias, tenho para Jesus.
Sim… um valor que merece da Sua parte
tal dor, tal sacrifício!
“O
meu Senhor retirou-se para rezar.
Procurou
a solidão no silêncio do fim do dia.
A
Sua Humanidade sofria intensamente com a visão dos tormentos que se
aproximavam.
Poderia
Jesus ter suportado a flagelação, as vergastadas, os espinhos cravando-se na
Sua cabeça, os pregos rasgando a carne, o horror do suplício da Cruz?
Estou
certo que sim. Jesus era um homem perfeito e o sofrimento, por excessivo que
fosse não deveria atemorizá-lo de forma tão absoluta.
Outros
sofreram também horrores, sacrifícios inauditos de incrível crueldade.
Julgo
que o atroz sofrimento de Jesus, no Horto das Oliveiras, nascia principalmente
no Seu espírito, no Seu coração.
Ele
tinha dado tudo quanto tinha para dar, oferecido todos os meios, apontado todos
os caminhos e, agora, iam fazer pouco, escarnecê-Lo, violentá-Lo na Sua
inteireza de homem bom e recto, iam negá-Lo como Filho de Deus, Deus verdadeiro
feito homem.
Tudo
isto, e muito mais, e não só nessa noite e no dia seguinte, mas depois, em
todas as noites e todos os dias até ao final dos tempos.
Milhões
de homens e mulheres que sempre O iriam negar, escarnecer, cuspir e crucificar
outra vez. Que peso, Senhor, que peso incrível seria o conhecimento de tudo
isto!
Ah! Meu Jesus, se ainda se salvassem
todos os homens!
Se,
apesar de tudo, essas almas conhecessem a Vida Eterna no seio de Deus Pai, como
tinhas previsto e desejado desde o início dos tempos!
Mas
não, Jesus, o que mais Te dói agora, neste fim de dia no Horto das Oliveiras é
que tantos milhões de homens e mulheres se percam eternamente.
Dói-te
tanto, Senhor, não pelo Teu sacrifício ter sido inútil para esses, mas porque o
Teu coração bondoso, a Tua misericórdia infinita se entristece mortalmente com
esse fim trágico dos Teus filhos.
Não foi isso que quisesTe.
Nunca
desejas-Te outra coisa senão a eterna felicidade de todos os homens, que todos,
absolutamente todos, se salvassem e pudessem estar conTigo, com o Pai, com o
Espírito Santo, com a Tua Santíssima Mãe, com a legião de Anjos e Santos, por
toda a eternidade.
Não
tens, ali, a Tua Mãe extremosa, para Te amparar e dar consolo. Nesta hora tão
triste, de certeza que o seu coração se contrai também na dor que não pode
deixar de sentir em uníssono com o seu Filho.
Talvez,
na casa onde pernoita, vele angustiada, esperando o horror que adivinha.
Decerto
que Tu, Filho fiel, com todo o carinho e ternura lhe terás desvendado algo do
que irá acontecer nas próximas horas.
Soube,
antes que lho contasses, da tristeza que já Te invadia o coração, bastava-lhe
olhar o rosto adorado do seu divino Filho para se aperceber do vendaval de
emoções que n'Ele se chocavam.
Também
ela, a Tua Santíssima Mãe, reza com fervor repetindo o “Fiat” que pronunciara trinta e três anos antes.
Punha
nas mãos de Deus, Teu e seu Pai, toda a vida, toda a morte, todos os sofrimentos
do seu Filho.
Tem
confiança, tem esperança mas, sobretudo, sabe, que há-de voltar a ver-Te
ressuscitado e glorioso.
Esta
certeza, do sofrimento de Tua Mãe, junta-se às dores que Te partem o coração e
tornam tão grande, tão incomensurável a Tua dor, tens tanta pena, que suas
sangue e, numa fraqueza momentânea, pedes a Teu Pai que afaste esse cálice. Cfr.
Mc 14, 36
Por
momentos, Senhor, a Tua humanidade tornou-se mais evidente. Mas logo, a Tua
perfeição absoluta, reduziu a nada esse desejo legítimo, a esse desabafo: «não
se faça o que Eu quero, senão o que Tu queres!» Cfr.
14,36
Também
eu digo, faça-se a Tua vontade, Deus e Senhor de tudo e de todas as coisas e
não a minha vontade de homem!
A
Tua dor, Senhor, é uma dor de amor que só pode ser mitigada com amor.
Posso
eu, Senhor, ter sempre presente a Tua agonia enorme e inimaginável, ou estou
sempre tão ocupado, tão absorvido, tão disperso que nem sequer sou capaz de
estar conTigo uma simples hora do meu dia, inteiramente dedicada a Ti,
fazendo-Te companhia, compartilhando a Tua dor, carregando um pouco do Teu
sofrimento?
Minha
Mãe Santíssima, ajuda-me a ter uma dor de amor tão completa que me faça
despertar deste sono que me carrega o espírito e permanecer ao lado do teu
divino Filho, vigilante e decidido a não ceder nem à dor nem ao cansaço.
Jesus,
ajuda-me a acompanhar a Tua Santíssima Mãe e compartilhar com Ela estes
Mistérios Dolorosos, animando-a e confortando-a na sua dor e angústia”. (AMA, Santo Rosário, 1999)
Vou omitir algumas considerações que
tinha pensado fazer sobre os últimos momentos: A consumação da traição de Judas
e aprisão de Jesus.
Sinto que… é demais!
Sinto que… as considerações poderiam
levar-me à revolta, à indignação, a fazer juízos.
E… não quero!
Desejo antes ficar-me pela
consideração de não me deixar adormecer na vigília que devo manter – permanentemente
– sobre o meu comportamento, as minhas acções, desejos e omissões.
Estar vigilante, como Jesus pediu e
recomendou aos Discípulos adormecidos «Vigiai
e orai, para não cairdes em tentação. O espírito está pronto, mas a carne é
débil.» (MT 26, 41),
e a todos nós.
Sempre… porque só vigiando sem
descanso posso evitar ser surpreendido pelas minhas fraquezas e misérias e
sucumbir à tentação.
Segunda Parte
Jo 18
- 3 Judas, então, guiando o destacamento romano e os guardas ao serviço dos sumos
sacerdotes e dos fariseus, munidos de lanternas, archotes e armas, entrou lá. 4
Jesus, sabendo tudo o que lhe ia acontecer, adiantou-se e disse-lhes: «Quem
buscais?» 5 Responderam-lhe: «Jesus, o Nazareno.» Disse-lhes Ele: «Sou Eu!» E
Judas, aquele que O ia entregar, também estava junto deles. 6 Logo que Jesus
lhes disse: ‘Sou Eu!’, recuaram e caíram por terra. 7 E perguntou-lhes segunda
vez: «Quem buscais?» Disseram-lhe: «Jesus, o Nazareno!» 8 Jesus replicou-lhes:
«Já vos disse que sou Eu. Se é a mim que buscais, então deixai estes ir
embora.» 9 Assim se cumpria o que dissera antes: ‘Dos que me deste, não perdi
nenhum.’ 10 Nessa altura, Simão Pedro, que trazia uma espada, desembainhou-a e
arremeteu contra um servo do Sumo Sacerdote, cortando-lhe a orelha direita. O
servo chamava-se Malco. 11 Mas Jesus disse a Pedro: «Mete a espada na bainha.
Não hei-de beber o cálice de amargura que o Pai me ofereceu?» 12 Então, o
destacamento, o comandante e os guardas das autoridades judaicas prenderam
Jesus e manietaram-no. 13 E levaram-no primeiro a Anás, porque era sogro de
Caifás, o Sumo Sacerdote naquele ano. 14 Caifás era quem tinha dado aos judeus
este conselho: ‘Convém que morra um só homem pelo povo’. 15 Entretanto, Simão
Pedro e outro discípulo foram seguindo Jesus. Esse outro discípulo era
conhecido do Sumo Sacerdote e pôde entrar no seu palácio ao mesmo tempo que
Jesus. 16 Mas Pedro ficou à porta, de fora. Saiu, então, o outro discípulo que
era conhecido do Sumo Sacerdote, falou com a porteira e levou Pedro para
dentro. 17 Disse-lhe a porteira: «Tu não és um dos discípulos desse homem?» Ele
respondeu: «Não sou.» 18 Lá dentro estavam os servos e os guardas, de pé,
aquecendo-se à volta de um braseiro que tinham acendido, porque fazia frio.
Pedro ficou no meio deles, aquecendo-se também. 19 Então, o Sumo Sacerdote
interrogou Jesus acerca dos seus discípulos e da sua doutrina. 20 Jesus
respondeu-lhe: «Eu tenho falado abertamente ao mundo; sempre ensinei na
sinagoga e no templo, onde todos os judeus se reúnem, e não disse nada em
segredo. 21 Porque me interrogas? Interroga os que ouviram o que Eu lhes disse.
Eles bem sabem do que Eu lhes falei.» 22 Quando Jesus disse isto, um dos
guardas ali presente deu-lhe uma bofetada, dizendo: «É assim que respondes ao
Sumo Sacerdote?» 23 Jesus replicou: «Se falei mal, mostra onde está o mal; mas,
se falei bem, porque me bates?» 24 Então, Anás mandou-o manietado ao Sumo
Sacerdote Caifás. 25 Entretanto, Simão Pedro estava de pé a aquecer-se.
Disseram-lhe, então: «Não és tu também um dos seus discípulos?» Ele negou,
dizendo: «Não sou.» 26 Mas um dos servos do Sumo Sacerdote, parente daquele a
quem Pedro cortara a orelha, disse-lhe: «Não te vi eu no horto com Ele?» 27
Pedro negou Jesus de novo; e nesse instante cantou um galo. 28 De Caifás,
levaram Jesus à sede do governador romano. Era de manhã cedo e eles não
entraram no edifício para não se contaminarem e poderem celebrar a Páscoa. 29
Pilatos veio ter com eles cá fora e perguntou-lhes: «Que acusações apresentais
contra este homem?» 30 Responderam-lhe: «Se Ele não fosse um malfeitor, não to
entregaríamos.» 31 Retorquiu-lhes Pilatos: «Tomai-o vós e julgai-o segundo a
vossa Lei.» «Não nos é permitido dar a morte a ninguém», disseram-lhe os
judeus, 32 em cumprimento do que Jesus tinha dito, quando explicou de que
espécie de morte havia de morrer. 33 Pilatos entrou de novo no edifício da
sede, chamou Jesus e perguntou-lhe: «Tu és rei dos judeus?» 34 Respondeu-lhe
Jesus: «Tu perguntas isso por ti mesmo, ou porque outros to disseram de mim?»
35 Pilatos replicou: «Serei eu, porventura, judeu? A tua gente e os sumos
sacerdotes é que te entregaram a mim! Que fizeste?» 36 Jesus respondeu: «A
minha realeza não é deste mundo; se a minha realeza fosse deste mundo, os meus
guardas teriam lutado para que Eu não fosse entregue às autoridades judaicas;
portanto, o meu reino não é de cá.» 37 Disse-lhe Pilatos: «Logo, Tu és rei!»
Respondeu-lhe Jesus: «É como dizes: Eu sou rei! Para isto nasci, para isto vim
ao mundo: para dar testemunho da Verdade. Todo aquele que vive da Verdade
escuta a minha voz.» 38 Pilatos replicou-lhe: «Que é a verdade?» Dito isto, foi
ter de novo com os judeus e disse-lhes: «Não vejo nele nenhum crime. 39 Mas é
costume eu libertar-vos um preso na Páscoa. Quereis que vos solte o rei dos
judeus?» 40 Eles puseram-se de novo a gritar, dizendo: «Esse não, mas sim
Barrabás!» Ora Barrabás era um salteador.
Jo
19
1 Pilatos tomou então Jesus e mandou-O
flagelar.2 Depois, os soldados, tecendo uma coroa de espinhos, puseram-Lha
sobre a cabeça e revestiram-n'O com um manto de púrpura.3 Aproximavam-se d'Ele
e diziam-Lhe: «Salve, rei dos judeus!», e davam-Lhe bofetadas.4 Saiu Pilatos
ainda outra vez fora e disse-lhes: «Eis que vo-l'O trago fora, para que
conheçais que não encontro n'Ele crime algum».5 Saiu, pois, Jesus, trazendo a
coroa de espinhos e o manto de púrpura. Pilatos disse-lhes: «Eis aqui o
Homem!».6 Então os príncipes dos sacerdotes e os guardas, quando O viram,
gritaram: «Crucifica-O, crucifica-O!». Pilatos disse-lhes: «Tomai-O e crucificai-O,
porque eu não encontro n'Ele motivo algum de condenação».7 Os judeus
responderam-lhe: «Nós temos uma Lei e, segundo essa Lei, deve morrer, porque Se
fez Filho de Deus».8 Pilatos, tendo ouvido estas palavras, temeu ainda mais.9
Entrou novamente no Pretório e disse a Jesus: «Donde és Tu?». Mas Jesus não lhe
deu resposta.10 Então Pilatos disse-Lhe: «Não me falas? Não sabes que tenho
poder para Te soltar e também para Te crucificar?».11 Jesus respondeu: «Tu não
terias poder algum sobre Mim, se não te fosse dado do alto. Por isso, quem Me
entregou a ti tem maior pecado». 12 Desde este momento, Pilatos procurava
soltá-l'O. Porém, os judeus gritavam: «Se soltas Este, não és amigo de César!,
porque todo aquele que se faz rei, declara-se contra César».13 Pilatos, tendo
ouvido estas palavras, conduziu Jesus para fora e sentou-se no seu tribunal, no
lugar chamado Litóstrotos, em hebraico Gábata.14 Era o dia da Preparação da
Páscoa, cerca da hora sexta. Pilatos disse aos judeus: «Eis o vosso rei!».15
Mas eles gritaram: «Tira-O, tira-O, crucifica-O!». Pilatos disse-lhes: «Hei-de
crucificar o vosso rei?». Os pontífices responderam: «Não temos outro rei senão
César».16 Então entregou-Lho para que fosse crucificado. 17 Tomaram, pois,
Jesus que, carregando com a Sua cruz, saiu para o lugar chamado Calvário, em
hebraico Gólgota,18 onde O crucificaram, e com Ele outros dois, um de cada
lado, e Jesus no meio.19 Pilatos redigiu um título, que mandou colocar sobre a
cruz. Nele estava escrito: «Jesus Nazareno, Rei dos Judeus».20 Muitos judeus
leram este título, porque o lugar onde foi crucificado ficava perto da cidade.
Estava redigido em hebraico, em latim e em grego.21 Os pontífices dos judeus
diziam, porém, a Pilatos: «Não escrevas: Rei dos Judeus, mas: Este homem disse:
Eu sou o Rei dos Judeus».22 Pilatos respondeu: «O que escrevi, está
escrito!».23 Os soldados, depois de terem crucificado Jesus, tomaram as Suas
vestes e fizeram delas quatro partes, uma para cada soldado. Tomaram também a
túnica. A túnica não tinha costura, era toda tecida de alto a baixo.24 Disseram
entre si: Não a rasguemos, mas lancemos sortes sobre ela, para ver a quem
tocará; para que se cumprisse deste modo a Escritura, que diz: “Repartiram
entre si as Minhas vestes e lançaram sortes sobre a Minha túnica”. “Os soldados
assim fizeram. 25 Estavam, de pé, junto à cruz de Jesus, Sua mãe, a irmã de Sua
mãe, Maria, mulher de Cléofas, e Maria Madalena. 26 Jesus, vendo Sua mãe e,
junto dela, o discípulo que amava, disse a Sua mãe: «Mulher, eis o teu filho»
.27 Depois disse ao discípulo: «Eis a tua mãe». E, desde aquela hora, o
discípulo recebeu-a na sua casa. 28 Em seguida, sabendo Jesus que tudo estava
consumado, para se cumprir a Escritura, disse: «Tenho sede». 29 Havia ali um
vaso cheio de vinagre. Então, os soldados, ensopando no vinagre uma esponja e
atando-a a uma cana de hissopo, chegaram-Lha à boca. 30 Jesus, tendo tomado o
vinagre, disse: «Tudo está consumado!». Depois, inclinando a cabeça, entregou o
espírito. 31 Os judeus, visto que era o dia da Preparação, para que os corpos
não ficassem na cruz no sábado, porque aquele dia de sábado era de grande
solenidade, pediram a Pilatos que lhes fossem quebradas as pernas e fossem
retirados. 32 Foram, pois, os soldados e quebraram as pernas ao primeiro e ao
outro com quem Ele havia sido crucificado. 33 Mas, quando chegaram a Jesus,
vendo que já estava morto, não Lhe quebraram as pernas, 34 mas um dos soldados
trespassou-Lhe o lado com uma lança e imediatamente saiu sangue e água. 35 Quem
foi testemunha deste facto o atesta, e o seu testemunho é digno de fé e ele
sabe que diz a verdade, para que também vós acrediteis. 36 Porque estas coisas
sucederam para que se cumprisse a Escritura: “Não Lhe quebrarão osso algum”.37
E também diz outro passo da Escritura: “Hão-de olhar para Aquele a quem
trespassaram”. 38 Depois disto, José de Arimateia, que era discípulo de Jesus,
ainda que oculto por medo dos judeus, pediu a Pilatos que lhe deixasse levar o
corpo de Jesus. Pilatos permitiu-o. Foi, pois, e tomou o corpo de Jesus. 39
Nicodemos, aquele que tinha ido anteriormente de noite ter com Jesus, foi
também, levando uma composição de quase cem libras de mirra e aloés. 40 Tomaram
o corpo de Jesus e envolveram-n'O em lençóis com perfumes, segundo a maneira de
sepultar usada entre os judeus. 41 Ora, no lugar em que Jesus foi crucificado,
havia um horto e no horto um sepulcro novo, em que ninguém tinha ainda sido
sepultado. 42 Por ser o dia da Preparação dos judeus e o sepulcro estar perto,
depositaram ali Jesus.
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