A minha modesta hospedaria está no fim de numa pequena cidade chamada Belém.
Olhava
aquele vai-vem de gente e muitos me pediam hospedagem que eu tinha de recusar
por não ter acomodações. Um jovem casal aproximou-se, ela em visível
estado de adiantada gravidez sentada num burrico que o marido conduzia pela
arreata.
Ele
disse-me que traziam já três dias de viagem e que a jovem mãe estava exausta,
precisando urgentemente de um lugar para repousar. Contristado tive de recusar.
Quando já se tinham afastado uns metros lembrei-me de um pequeno estábulo que
possuia a pouca distância onde guardava palha e sementes para o gado e recolhia
um burrico e uma vaca, chamei-os e disse-lhes que, em último recurso, poderiam
acoitar-se ali, pelo menos por essa noite, ao que muito agradecidos
aceitaram de imediato.
A
noite caía rapidamente e como aquilo não tinha condições nenhumas para albergar
gente fui com eles. Acendi uma candeia para iluminar o pobre ambiente, afastei
os dois animais - uma vaca e um burrico - para o fundo do estábulo, revirei a
palha no chão e coloquei uma bilha com água, arrastei - não sei porquê -
a pequena manjedoura para o centro e coloquei-lhe um pouco de palha fresca. Pendurei
a candeia numa trave e despedi-me desejando boa noite e dizendo que se fosse
preciso alguma coisa bastava chamarem-me. Invadia-me uma estranha sensação de
alegria talvez por achar que tinha feito algo bom... muito bom.
Mal
tinha adormecido acordei sobressaltado. Parecia-me ouvir um ruído de cânticos,
exclamações de alegria, uma agitação extraordinária.
Fui
à porta e vi a noite como que iluminada por luz iridiscente, estrelas dançando
no céu; do pequeno estábulo irradiava uma luz que cegava tudo à volta, corriam
pastores para o estábulo cantando e dançando numa excitação irreprimível e,
atrás vinha muitas mais pessoas, não sabia de onde, todos no mesmo estado de
alma. O pequeno estábulo depressa ficou imerso num mar de gente, inundado de
luz, mergulhado em cânticos. No céu coros de seres celestes dançavam de
alegria.
Na
verdade, confesso, não senti medo, sou um Judeu crente e sei muito bem que O
Nosso Deus Se manifesta como entende, mas fiquei curioso e por isso fui ao
estábulo ver o que se passava.
Não
tenho palavras suficientes para descrever o que vi... no meio do estábulo, na
pequena manjedoura estava um Menino acabado de nascer, envolto em paninhos pela
jovem Mãe, como era costume naquele tempo, e à sua volta os pastores e as
outras pessoas - que não cessavam de chegar - levantavam as mãos ao céu com
exclamações de louvor, cânticos de alegria, outros com o rosto por terra em
adoração.
Perguntei
a um pastor o que se passava e ele disse-me: 'Quando ao princípio da noite
estavamos nos campos guardando os rebanhos, apareceu-nos um Anjo no Céu que nos
disse: Levantai-vos e vão a Belém porque nasceu-vos O Salvador; encontrareis
estes sinais... um Menino deitado numa manjedoura acompanhado da Sua Mãe e, nós
viemos e encontramos tal qual o Anjo nos disse'.
Eu,
também, meio tonto, entrei no estábulo e... encontrei tal qual como descreviam.
Deixei-me
ficar extasiado com todo o espectáculo. Sem dar por isso caí de joelhos em
frente da pequenina manjedoura e fiquei a olhar para Aquele Menino que Seria,
como diziam os Anjos, O Salvador?
No
meu estábulo?
Mas
o Salvador anunciado pelos Profetas seria Alguém excepcional, de uma grandeza e
esplendor extraordinários e, Aquele Menino era um menino como outro qualquer
sem nenhum sinal de grandeza ou fora do comum! Mas, perguntei-me... e se fosse?
Quem era eu para avaliar ou julgar como deveria ser o Salvador anunciado? Por
isso, como disse, caí de joelhos e levantando as mãos ao Céu disse: 'Sê bem
vindo Menino, recebo-Te como o maior dom que alguma vez poderia ter imaginado
receber'.
Não
posso afirmar mas pareceu-me que me sorriu. A Sua Mãe sim, sorriu-me
abertamente com um misto de alegria e gratidão. Aquela Jovem Mãe estava-me
agradecida!
Ia
chegando cada vez mais gente e eu resolvi afastar-me para lhes dar lugar e
também para me recolher a ponderar o que deveria fazer.
Logo
de manhãzinha voltei ao estábulo e, nessa altura a multidão de pessoas já era
incontável. Voltei para casa. Entretanto as multidões tinham partido de Belém e
arredores e eu resolvi: vou compor a minha casa, converter duas habitações numa
só, mobilá-la o melhor possível e vou trazer o Casal e o Menino para aqui.
Com
a ajuda de parentes e amigos foi o que fiz e a meio da tarde a Jovem Mãe e o
Seu Filho estavam numa habitação condigna e José instalado noutra habitação com
um pequeno catre onde descansar. Nada de "luxos" porque não tinha
posses para tal, mas o melhor que consegui arranjar. Pelas minhas contas
conjecturava que, pelo menos, estariam ali instalados por Oito Dias, os
necessários para a as cerimónias da Apresentação no Templo e a Purificação da
Mãe tal como a Lei estabelecia. Só posso descrever aqueles Oito Dias como
"alucinantes", não paravam de chegar pessoas de todos os lados, gente
humilde e outros de posição social, que queriam ver o Menino e a Sua Mãe. Os
meus amigos e vizinhos ajudavam-me como podiam, recebendo as pessoas, dando
indicações preciosas, respondendo como podiam á catadupa de perguntas. Pensei,
então, quanto são indispensáveis os verdadeiros amigos.
Passados
dois ou três dias já me tinha inteirado sobre os meus "Hóspedes",
tinham vindo das montanhas da Judeia para se recencearem em Belém e, mal
chegados a Jovem sentiu que era chegada a hora de dar à luz. O que aconteceu
como já contei, vou apenas referir o que se seguiu.
Os
oito dias previstos passaram num ápice e sempre com autênticas multidões à
volta da minha casa.
Na
manhã do oitavo dia acompahei o Casal e o Filho ao Templo para cumprir os
preceitos. Como não possuiam bens de nota levavam duas rolas para oferecer.
No
templo não havia quem não conhecesse aquele santo homem chamado Simeão. Logo
que entrámos no Pórtico, Simeão levantou-se, tomou o Menino nos braços e rompeu
num cântico que a "História da Salvação" regista em detalhe. Todos
ficámos assombrados, em particular a Mãe do Menino e José.
Foi
uma espantosa alegria ouvir o que aquele Santo Ancião dizia levantando O Menino
nos braços. Penso sinceramente que não houve ninguém que não se sentisse
"tocado" por aquela cena entranhável. Talvez que, se fosse hoje,
haveria uma festa, levariam em ombros aquela Família, cantando, louvando a
Deus, exultando de alegria. Mas, não houve nada disso, a Jovem Mãe recolheu o
menino nos braços e terminadas as cerimónias montou o burrico com o Filho no
colo e deixou-se conduzir pelo Marido de volta à minha casa.
Cinco
dias depois acordei sobressaltado, uma luz estranha, intensa poisava sobre a
minha humilde casa. Muitos se deram conta e vieram ver o que se passava. Um
cortejo de três Dignitários sumptuosamente vestidos, acompanhados dos seus
séquitos parava à minha porta dizendo que vinham de muito longe, do Oriente,
para ver e adorar o Rei dos Reis que a estrela lhes indicara como estando ali. Pondo-se
de joelhos abriram os seus cofres e depositaram aos pés do Menino grandes
quantidades de Oiro, Incenso e Mirra,depois... retiraram-se para as suas
terras.
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