Novo Testamento
Evangelho
Lc XII, 22-41
Confiança em Jesus
22 Em seguida, disse aos discípulos: «É por isso que vos digo: Não vos preocupeis quanto à vossa vida, com o que haveis de comer, nem quanto ao vosso corpo, com o que haveis de vestir; 23 pois a vida é mais que o alimento, e o corpo mais que o vestuário. 24 Reparai nos corvos: não semeiam nem colhem, não têm despensa nem celeiro, e Deus alimenta-os. Quanto mais não valeis vós do que as aves! 25 E quem de vós, pelo facto de se inquietar, pode acrescentar um côvado à extensão da sua vida? 26 Se nem as mínimas coisas podeis fazer, porque vos preocupais com as restantes? 27 Reparai nos lírios, como crescem! Não trabalham nem fiam; pois Eu digo-vos: Nem Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como um deles. 28 Se Deus veste assim a erva, que hoje está no campo e amanhã é lançada no fogo, quanto mais a vós, homens de pouca fé! 29 Não vos inquieteis com o que haveis de comer ou beber, nem andeis ansiosos, 30 pois as pessoas do mundo é que andam à procura de todas estas coisas; mas o vosso Pai sabe que tendes necessidade delas. 31 Procurai, antes, o seu Reino, e o resto vos será dado por acréscimo. 32 Não temais, pequenino rebanho, porque aprouve ao vosso Pai dar-vos o Reino.» 33 «Vendei os vossos bens e dai-os de esmola. Arranjai bolsas que não envelheçam, um tesouro inesgotável no Céu, onde o ladrão não chega e a traça não rói. 34 Porque, onde estiver o vosso tesouro, aí estará também o vosso coração.»
Vigilância
35 «Estejam
apertados os vossos cintos e acesas as vossas lâmpadas. 36 Sede semelhantes aos
homens que esperam o seu senhor ao voltar da boda, para lhe abrirem a porta
quando ele chegar e bater. 37 Felizes aqueles servos a quem o senhor, quando vier,
encontrar vigilantes! Em verdade vos digo: Vai cingir-se, mandará que se ponham
à mesa e há-de servi-los. 38 E, se vier pela meia-noite ou de madrugada, e
assim os encontrar, felizes serão eles. 39 Ficai a sabê-lo bem: se o dono
da casa soubesse a que hora viria o ladrão, não teria deixado arrombar a sua
casa. 40 Estai preparados, vós também, porque o Filho do Homem chegará na hora
em que menos pensais.» 41 Pedro disse-lhe: «Senhor, é para nós que dizes essa
parábola, ou é para todos igualmente?»
Texto
MENSAGEM DO PAPA JOÃO PAULO II
PARA A QUARESMA DE 1990
Amados
irmãos e irmãs em Cristo:
1. Como todos os anos, a aproximação da
Quaresma dá-me a oportunidade de me dirigir a vós, para vos convidar a
aproveitardes este momento favorável, e este «tempo da salvação» (cf. 2 Cor 6,
2). Que ele seja vivido intensamente por todos, na sua dupla dimensão de
conversão a Deus e de amor aos irmãos. Com efeito, a Quaresma convida-nos a
mudar totalmente a mente e o coração, para escutarmos a voz do Senhor que nos
convida a voltarmos para Ele, em novidade de vida, e a sermos cada vez mais
sensíveis aos sofrimentos dos que nos rodeiam.
Este ano, desejaria propor, com especial
empenho, à reflexão comum, o problema dos expatriados e dos refugiados. O seu
número, de facto, enorme e cada vez maior, constitui uma realidade dolorosa no
mundo em que vivemos, realidade que não se confina apenas nalgumas regiões, mas
já se estendeu a todos os continentes.
Homens sem pátria, os refugiados procuram
acolhimento noutros países do mundo, que é a nossa casa comum; mas só a poucos
de entre eles é dado voltar aos Países de origem, devido às mudanças da
situação interna; para os outros arrasta-se a condição dolorosíssima de êxodo,
de insegurança e de busca ansiosa de uma posição de vida adequada. Entre eles
há crianças, mulheres, viúvas, famílias muitas vezes divididas, jovens frustrados
nas suas aspirações, adultos desarraigados da profissão, privados dos seus bens
materiais, da casa, e da pátria.
2. Perante a amplidão e a gravidade deste
problema, todos os filhos da Igreja devem sentir-se interpelados, como
seguidores de Jesus, que quis também Ele sofrer a condição de refugiado - e na
qualidade de testemunhas do seu Evangelho. Além disso, o próprio Cristo,
naquela página comovedora do mesmo Evangelho que, na liturgia latina, lemos na
segunda-feira da primeira semana da Quaresma, quis ser reconhecido e
identificado em cada refugiado: «Eu era peregrino e vós me recolhestes ... Era
peregrino e não me recolhestes» (Mt 25, 35 e 43).
Estas palavras de Cristo devem levar-nos a
um atento exame de consciência quanto à nossa atitude em relação aos exilados e
aos refugiados. Nós encontramo-los, efectivamente, quase todos os dias, no
território de muitas paróquias; tornaram-se verdadeiramente o nosso próximo
mais próximo. Eles têm necessidade da caridade, da justiça e da solidariedade
de todos os cristãos.
3. A vós, a cada um dos membros e a cada
comunidade da Igreja católica, portanto, dirijo a minha exortação premente,
nesta Quaresma, a fim de que procureis lançar mão de todos os meios existentes
para socorrer os irmãos refugiados, organizando adequadas obras de acolhimento
a fim de favorecer a sua plena inserção na sociedade civil e demonstrando para
com eles abertura de mente e calorosa cordialidade.
A solicitude pelos refugiados deve
estimular-nos a reafirmar e a evidenciar os direitos humanos, universalmente
reconhecidos, e a solicitar que também para com eles sejam efectivamente
respeitados. Como recordava a 3 de Junho de 1986, por ocasião da entrega do
Prémio Internacional da Paz João XXIII ao «Catholic Office for Emergency and Refugees»
(COERR), a Encíclica Pacem in terris daquele grande Pontífice tinha já
acentuado a urgência de os direitos dos refugiados lhes deverem ser
reconhecidos, como pessoas que são; e afirmava que «é nosso dever garantir
sempre os direitos inalienáveis, que são inerentes a todos os seres humanos e
que não são condicionados por factores naturais ou por situações
socio-políticas» (Ensinamentos IX, 1, 1986, p. 1751). Tratar-se-á, pois, de
garantir aos refugiados o direito de constituírem uma família ou de se integrarem
nela; de terem um emprego seguro, digno, com remuneração adequada; de viverem
em casas dignas de seres humanos; de usufruírem de adequada instrução escolar
para as crianças e a juventude, bem como da assistência medico-sanitária; em
suma, de fruírem todos aqueles direitos que foram solenemente sancionados desde
1951 pela Convenção das Nações Unidas sobre o Estatuto dos refugiados, e
confirmados pelo Protocolo de 1967 relativo ao mesmo Estatuto.
4. Sei bem que, face a um problema tão
grave como este, tem sido intenso o trabalho de Organismos internacionais, de
Organizações católicas e de Movimentos de índole diversa, na busca de programas
sociais adequados, aos quais numerosas pessoas dão apoio e colaboração.
Agradeço a todos, e a todos quero dirigir uma palavra de encorajamento a
demonstrarem uma sensibilidade cada vez maior, dado que, como se pode
facilmente verificar, aquilo que se faz, embora já seja muito, não é ainda
suficiente. Com efeito, o número dos refugiados aumenta sem cessar e as possibilidades
de acolhimento e de assistência mostram-se muitas vezes inadequadas.
O nosso empenhamento prioritário deve ser
o de participar, animar e apoiar com o nosso testemunho de amor, correntes
autênticas de caridade, que consigam, em todos os Países, permear a obra de
formação sobretudo da infância e da juventude, para o respeito recíproco, para
a tolerância e para o espírito de serviço, a todos os níveis, tanto a nível
pessoal, como a nível de Poderes públicos. Isto facilitará sobremaneira a
superação de muitos problemas.
5. Dirijo-me também a vós, irmãos e irmãs
exilados e refugiados, que viveis unidos na fé em Deus, na mútua caridade e na
esperança inquebrantável. O mundo todo conhece as vossas vicissitudes. E a
Igreja quer estar-vos presente com a ajuda que os seus membros se esforçam por
prestar-vos, embora sabendo que essa ajuda é insuficiente. Para suavizar os
vossos sofrimentos é necessária também a contribuição da vossa boa vontade e da
vossa inteligência. Vós possuís a riqueza da vossa civilização, da vossa
cultura, das vossas tradições e dos vossos valores humanos e espirituais, onde
podeis ir buscar a capacidade e a força para começar uma vida nova.
Exercitai-vos também vós, dentro das vossas possibilidades, na assistência e na
ajuda recíprocas, nos lugares onde temporariamente fostes acolhidos.
Nós, Católicos, acompanhar-vos-emos e vos
ampararemos na vossa caminhada, reconhecendo em cada um de vós o rosto de
Cristo, exilado e prófugo, e recordando quanto Ele disse: «Tudo o que fizestes
a um destes meus irmãos mais pequeninos, a mim o fizestes» (Mt 25, 40).
6. No início desta Quaresma, invoco a
riqueza de graça e de luz que irradia do mistério da Paixão e Ressurreição
redentora de Cristo, a fim de que cada um dos fiéis e cada uma das comunidades
eclesiais e religiosas de toda a Igreja encontrem a inspiração e as energias
necessárias para as obras de solidariedade concreta, em favor dos irmãos e
irmãs exilados e refugiados; e a fim de que estes, confortados pela ajuda
fraterna e pela atenção dos demais, reencontrem alegria e esperança para
prosseguirem no seu penoso caminho.
Que a minha Bênção seja penhor da
abundância dos dons do Senhor sobre quantos acolherem este meu premente apelo.
IOANNES PAULUS PP. II
© Copyright - Libreria Editrice Vaticana
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