14/01/2021

LEITURA ESPIRITUAL Janeiro 14

 

Evangelho

 

Mt XXV 14 - 30

 

Parábola dos talentos

 

14 «Será também como um homem que, ao partir para fora, chamou os servos e confiou-lhes os seus bens. 15 A um deu cinco talentos, a outro dois e a outro um, a cada qual conforme a sua capacidade; e depois partiu. 16 Aquele que recebeu cinco talentos negociou com eles e ganhou outros cinco. 17 Da mesma forma, aquele que recebeu dois ganhou outros dois. 18 Mas aquele que apenas recebeu um foi fazer um buraco na terra e escondeu o dinheiro do seu senhor. 19 Passado muito tempo, voltou o senhor daqueles servos e pediu-lhes contas. 20 Aquele que tinha recebido cinco talentos aproximou-se e entregou-lhe outros cinco, dizendo: ‘Senhor, confiaste-me cinco talentos; aqui estão outros cinco que eu ganhei.’ 21 O senhor disse-lhe: ‘Muito bem, servo bom e fiel, foste fiel em coisas de pouca monta, muito te confiarei. Entra no gozo do teu senhor.’ 22 Veio, em seguida, o que tinha recebido dois talentos: ‘Senhor, disse ele, confiaste-me dois talentos; aqui estão outros dois que eu ganhei.’ 23 O senhor disse-lhe: ‘Muito bem, servo bom e fiel, foste fiel em coisas de pouca monta, muito te confiarei. Entra no gozo do teu senhor.’ 24 Veio, finalmente, o que tinha recebido um só talento: ‘Senhor, disse ele, sempre te conheci como homem duro, que ceifas onde não semeaste e recolhes onde não espalhaste. 25 Por isso, com medo, fui esconder o teu talento na terra. Aqui está o que te pertence.’ 26 O senhor respondeu-lhe: ‘Servo mau e preguiçoso! Sabias que eu ceifo onde não semeei e recolho onde não espalhei. 27 Pois bem, devias ter levado o meu dinheiro aos banqueiros e, no meu regresso, teria levantado o meu dinheiro com juros.’ 28 ‘Tirai-lhe, pois, o talento, e dai-o ao que tem dez talentos. 29 Porque ao que tem será dado e terá em abundância; mas, ao que não tem, até o que tem lhe será tirado. 30 A esse servo inútil, lançai-o nas trevas exteriores; ali haverá choro e ranger de dentes.’»

 


Melhoria pessoal (cont)

  O que é natural, é que o carácter evolua acompanhando o progresso da vida, que se desenvolva e actue cada vez mais de forma consciente e constante de forma a acompanhá-la de maneira capaz e consequente.

  Esta conduta é absolutamente normal e não tem que ver com ambição que é uma coisa diferente.

  Ambicionar é normalmente um desejo exagerado de obter algo que se tem como ideal para a felicidade própria e que só se satisfaz quando se obtém.

  Desde este ponto de vista, a ambição é naturalmente má porque deforma os objectivos concretos nascidos de um desejo de melhoria em algo nascido da imaginação ou de simples impulsos pouco elaborados.

Querer possuir um automóvel melhor e mais confortável parece absolutamente legítimo e normal; querer que esse automóvel seja de uma determinada marca, cor, potência e outras especificidades não parece ser um objectivo sério porque, neste caso, talvez se jogue a “felicidade”, ou aquilo que se possa considerar como tal, nesse bem concreto.

  Posso considerar-me feliz por ter um bem que satisfaz as minhas necessidades e corresponda ao meu gosto, mas não é bom que só possa ser feliz, se esse mesmo bem for aquele que imaginei já que o mesmo não acrescentará nada à minha satisfação mas, talvez unicamente, ao meu ego.

  Igualmente desejar ter meios económicos bastantes para levar uma vida confortável e proporcionar aos outros, à família, condições estáveis de vida e possível futuro, não é o mesmo que querer ter muito mais meios de fortuna que permitam qualquer devaneio, a compra seja do que for, mesmo que não seja necessário.

  À primeira poderíamos chamar “paz económica” à segunda “ambição financeira”.

  Parece óbvio existirem grandes diferenças entre as duas – mesmo sem considerar o aspecto da legitimidade -, a primeira revela equilíbrio e razoabilidade, a segunda mero desejo que se expressa em algo que se pretende obter; a primeira satisfaz de forma permanente, a segunda, uma vez obtida, tende a conduzir a uma satisfação incompleta porque, entretanto, surgiu uma outra coisa que se deseja ainda mais.

  A formação do carácter é fundamental neste aspecto pois leva a pessoa a considerar o que é razoável e o que o não é, aquilo que tem sentido numa vida normal e corrente e aquilo que não passa de um devaneio, mais ou menos vago, da imaginação.

  A pessoa pode querer dizer: ‘se eu tivesse esta coisa e aquela faria isto e aquilo!’

Às vezes mascara-se esta atitude acrescentando: ‘distribuiria desta e daquela maneira, faria esta ou aquela obra de beneficência, promoveria auxílio a muita gente.’

A pessoa que pensa assim, normalmente, passa em claro esses objectivos, isto é, não distribui nada do que tem, nem se preocupa em contribuir para o que lhe solicitam, porque considera que não alcançou aquela tal situação que, erradamente, considera ideal para o fazer.

Provavelmente passará toda a sua vida assim, egoistamente centrado num sonho que nunca se concretizará.

Como não o consegue, sente-se dispensado de fazer o bem porque se satisfaz com a ideia de que o faria se o conseguisse.

  Vem à memória, inevitavelmente, a cena evangélica da viúva pobre e das duas moedas que deitou no cofre do Templo.

Sabia que era pobre, tinha a noção que as duas moedas lhe fariam falta para a sua vida corrente e, no entanto, deu-as sem hesitar porque terá pensado, talvez, que Deus haveria de retribuir o óbolo, recompensar o sacrifício com largueza e magnanimidade.

De facto o bem que se faz diariamente pelo mundo fora é constituído, na sua maior parte, por muitas dádivas de “duas moedas”, de actos de generosidade de escasso valor mas que, somados formam um rio caudaloso que alimenta e torna mais felizes os muitos necessitados que vivem com terríveis carências e que dependem dessas duas moedas para viver.

  O carácter desta viúva era riquíssimo, não vivia isolada e conformada com a sua pobreza e a escassez de bens, ao contrário, via uma nesga de felicidade em poder “fazer bem sem saber a quem”, tinha uma visão de conjunto da vida, própria e alheia, sabia-se fazendo parte de uma sociedade em que, não obstante ocupar uma posição discretíssima, tinha um papel a cumprir e que, só ela, o podia fazer.

  Talvez seja interessante falar sobre moedas (dinheiro) para referir algo singular:

Uma moeda tem sempre duas faces, sendo que, numa delas, se inscreve o emissor da moeda, ou seja, o responsável pelo seu valor e que é, em suma, o seu primeiro e último proprietário.

A sociedade apenas usa as moedas como meio garantido de receber ou dar algo.

Com elas paga o trabalho e, o trabalhador que as recebe, com elas paga as suas despesas.

Não cabe que qualquer pessoa emita a sua própria moeda, embora, em tempos de crise aguda, como se viveu em Portugal poucos anos após a implantação da República, houvesse quem recorresse a este sistema – principalmente estabelecimentos comerciais - para garantir que os seus clientes pudessem adquirir os bens que vendiam.

Isto aconteceu, exactamente, porque a moeda emitida pelo Estado não tinha qualquer valor, dada a profundíssima degradação da economia.

  Aliás, hoje em dia, é ao que assistimos com os chamados cartões de desconto, que, na realidade, não concedem desconto nenhum porque utilizam a totalidade do preço pago pelo adquirente, durante algum tempo, o que acaba por gerar mais-valia suficiente para amortizar o tal desconto apregoado.

É passível de penalidade mais ou menos séria, quem se atreva a fabricar moeda.

A moeda, propriamente dita, não é falsa, mas sim o valor que representa porque não existe.

  Mas, se estamos a falar deste assunto, não é porque nos interesse ou caiba aqui uma discussão sobre processos de venda e compra, de negócios, mas tão só para frisar que, as tais moedas, que representam um bem, não são pertença de ninguém em particular, mas apenas uma detenção, por algum tempo e, portanto, não cabe aduzir que está garantida a fortuna de quem as tem em quantidade.

 

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