06/08/2020

Virtudes 14


Humildade 7

Aprender a render o juízo
Há momentos especialmente propícios para renovar os desejos de humildade. Por exemplo, quando se é promovido ou se começa a ter um trabalho com certa visibilidade pública. Então é a altura de se tomarem decisões que mostrem um modo cristão de trabalhar: assumir essa posição como uma oportunidade que Deus nos dá para servir ainda mais; recusar qualquer vantagem pessoal desnecessária; intensificar a nossa atenção para com os mais débeis, sem cair na tentação de os esquecer, agora que nos damos com pessoas às que antes não conseguíamos aceder. Também é o momento de dar exemplo nos êxitos e honras inerentes a esse cargo ou trabalho, de tirar importância aos aplausos que costuma receber quem manda e, por outro lado, mostrar abertura às críticas, que costumam ficar mais veladas e que têm indícios de verdade. São muitas as possíveis manifestações da simplicidade no trabalho: rir-nos de nós próprios quando nos surpreendemos, por exemplo, procurando ver se ficámos na fotografia ou se fomos citados num texto; superar a tendência para deixarmos em tudo a nossa assinatura, ou amplificar um problema quando ninguém nos pediu conselho para o resolver, como se fosse precisa a nossa opinião em todas as circunstâncias...
No ambiente profissional, familiar, até recreativo, organizam-se reuniões onde se trocam pontos de vista, talvez opostos. Somos pessoas que pretendem que os outros se submetam ao nosso modo de pensar? O que devia ser, o que devia ter sido feito... A tendência excessiva para insistir no ponto de vista pessoal pode denotar rigidez mental. É evidente que ceder não é uma coisa automática, mas em todo o caso, muitas vezes, demonstra que foram captadas as diferentes situações. Aproveitar as ocasiões para render o próprio juízo é agradável aos olhos de Deus (Cf. (São Josemaria, Caminho, 177). Com frase lapidar, Bento XVI comentava numa ocasião a triste volta que deu Tertuliano nos últimos anos da sua vida: Quando se vê apenas o próprio pensamento na sua grandeza, no final é precisamente esta grandeza que se perde (Papa Bento XVI, Audiência, 30-V-2007).
Alguma vez teremos de ouvir pessoas mais jovens, com menos experiência, mas que talvez tenham mais dotes de inteligência ou de coração, ou tenham funções às quais assiste a graça de Deus. Certamente, ninguém gosta de passar por tolo, ou por ser pessoa sem coração, mas se nos preocupar demasiado o que os outros pensam de nós, pode significar que nos falta humildade. A vida de Jesus, o Filho de Deus, é uma lição infinita para qualquer cristão investido de uma responsabilidade que a sociedade considera elevada. As aclamações de Jerusalém não fizeram esquecer ao Rei dos Reis que outros iriam crucificá-lo e que era também o Servo sofredor (cf. Jo 12, 12-19).
O rei São Luís aconselhava o seu filho que, se algum dia chegasse a ser rei, não defendesse com vivacidade a sua opinião nas reuniões do conselho real, sem antes ouvir os outros: os membros do teu conselho poderiam ter medo de contradizer-te, coisa que não convém desejar (São Luís de França, Testamento espiritual ao seu filho, futuro Filipe III, em Acta Sanctorum Augustii 5 (1868), 546). É muito salutar aprender a não opinar com superficialidade, sobretudo quando não se tem a responsabilidade última e não se conhecem os fundamentos de um assunto, para além de se carecer da graça de estado e dos dados que talvez possua quem está constituído em autoridade. Por outro lado, tão importante como a ponderação e a reflexão é a disposição para render o juízo de forma nobre e magnanimamente. Às vezes é preciso exercer a prudência de ouvir os conselheiros e mudar de parecer, e nisso se manifesta como a humildade e o senso comum engrandecem a pessoa e a tornam eficaz. A prudência no juízo é favorecida pelo trabalho em equipa: fazer equipa, juntar esforços, elaborar uma ideia e chegar a uma decisão com os outros: isso tudo é também um exercício de humildade e inteligência.

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