(Cfr. Lc 8, 49-56)
Conhecer o amor de Deus em
Jesus Cristo
Na
encíclica «Deus caritas est» citei a
afirmação da primeira carta de São João: «Nós conhecemos o amor que Deus nos
tem e cremos nele» para sublinhar que na origem da vida cristã está o encontro
com uma Pessoa [1].
Dado que Deus se manifestou da maneira mais profunda através da encarnação de
Seu Filho, fazendo-se «visível» n’Ele; na relação com Cristo, podemos
reconhecer quem é verdadeiramente Deus. [2]
Mais ainda, dado que o Amor de Deus encontrou a sua expressão mais profunda na
entrega que Cristo fez da Sua vida por nós na Cruz, ao contemplar o Seu
sofrimento e morte podemos reconhecer de maneira cada vez mais clara o amor sem
limites de Deus por nós: «Tanto amou Deus ao mundo, que lhe deu Seu Filho
único, para que todo o que crer nele não pereça, mas que tenha vida eterna». ([3])
Por
outro lado, esse mistério do amor de Deus por nós não constitui só o conteúdo
do culto e da devoção ao Coração de Jesus: é, ao mesmo tempo, o conteúdo de
toda verdadeira espiritualidade e devoção cristãs. Portanto, é importante
sublinhar que o fundamento dessa devoção é tão antigo como o próprio
cristianismo. De facto, só se pode ser cristão dirigindo o olhar à Cruz de
nosso Redentor, «a quem trespassaram». [4]
A
encíclica «Haurietis aquas» lembra
que a ferida do lado e as dos pregos foram para numeráveis almas os sinais de
um amor que transformou cada vez mais incisivamente sua vida ([5]).
Reconhecer o amor de Deus no Crucificado converteu-se para elas numa experiência
interior que as levou a confessar, junto a Tomé: «Meu Senhor e meu Deus!» [6],
permitindo-lhes alcançar uma fé mais profunda no acolhimento sem reservas do
amor de Deus. [7]
Experimentar o amor de
Deus dirigindo o olhar ao Coração de Jesus Cristo
O
significado mais profundo desse culto ao Amor de Deus só se manifesta quando se
considera mais atentamente sua contribuição não só ao conhecimento, mas também,
e sobretudo, à experiência pessoal desse amor na entrega confiada a seu serviço
[8].
Obviamente, experiência e conhecimento não podem separar-se: um faz referência
ao outro. Também é necessário sublinhar que um autêntico conhecimento do Amor
de Deus só é possível no contexto de uma atitude de oração humilde e de
disponibilidade generosa. Partindo dessa atitude interior, o olhar posto no
Lado Trespassado da lança transforma-se em silenciosa adoração. O olhar no Lado
Trespassado do Senhor, do qual saem «sangue e água» [9],
ajuda-nos a reconhecer a multidão de dons de graça que daí procedem [10] e
abre-nos a todas as demais formas de devoção cristã que estão compreendidas no
culto ao Coração de Jesus.
A
fé, compreendida como fruto do Amor de Deus experimentado, é uma graça, um dom
de Deus. Mas o homem poderá experimentar a fé como uma graça só na medida em
que a aceita dentro de si como um dom, e procura vivê-lo. O culto do Amor de
Deus, ao qual convidava aos fiéis a encíclica «Haurietis aquas» [11],
deve ajudar-nos a recordar incessantemente que Ele carregou com este sofrimento
voluntariamente «por nós», «por mim». Quando praticamos este culto, não só
reconhecemos com gratidão o Amor de Deus, mas continuamos abrindo-nos a esse Amor,
de maneira que a nossa vida vai ficando cada vez mais modelada por ele. Deus,
que derramou o Seu Amor «Nos nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi
dado» [12],
convida-nos incansavelmente a acolher o Seu Amor.
O
convite a entregar-se totalmente ao amor salvífico de Cristo [13]
tem como primeiro objectivo a relação com Deus. Por esse motivo, esse culto
totalmente orientado ao Amor de Deus que Se sacrifica por nós tem uma
importância insubstituível para a nossa fé e para a nossa vida no amor.
(AMA, reflexões).
[1] Cfr. n. 1
[2] Cfr. encíclica
«Haurietis aquas», 29,41; encíclica «Deus caritas est», 12-15
[4]
Jo 19, 37; Cfr. Zacarias 12, 10
[5]
Cfr. número 52
[6]
Jo 20, 28
[8]
Cfr. encíclica «Haurietis aquas», 62
[9]
Cfr. Gv 19, 34
[10]
Cfr. encíclica «Haurietis aquas», 34-41
[11]
Cfr. ibidem, 72
[12]
Cfr. Romanos 5, 5
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