Morte
O Senhor entendeu chamar o
Pedro.
O meu querido sobrinho
Pedro!
No atordoamento Que se
segue, divido-me entre a angústia e a certeza - absoluta - que Ele faz tudo
para bem.
Quem sou eu para julgar ou
aferir?
Nas minhas memórias o
Pedro está presente de uma forma tão real e positiva que nem sequer me lembro
dele como se não estivesse aqui.
Desde pequeno me habituei
à sua presença quando o João no enviava para Santo Tirso e, depois para Carvide
ou Arcozelo.
Mesmo quando fazia
disparates - como andar pelos telhados - nunca lhe ralhei apenas lhe dizia se
gostaria que eu dissesse ao Pai que tinha partido uma perna ao cair do telhado.
Em Carvide, uma vez, tive
de tomar uma atitude drástica. Entendeu o Pedro ir dar uma voltinha na
camionete das Termas.
Teve um percalço ao fazer
marcha atrás embateu num dos poiais da porta e aquilo veio tudo por ali abaixo.
Não se matou nem nada
apenas no seu orgulho ferido.
Fui falar com o Zézinho e
logo de manhã tudo estava arranjado.
Claro que o meu Pai ao
regressar no dia seguinte de Lisboa deu-se conta das obras, mas não se
manifestou.
Então eu disse ao Pedro:
Agora vens comigo a Monte
Real falar com o Avô!
O Pedro protestou que não
queria ir etc e tal. Mas eu fui inflexível.
Lá fui ter com o meu Pai
ao escritório no hotel e disse:
Pai, está aqui o Pedro que
tem u m a coisa para lhe dizer.
Abri a porta e disse:
Pedro, avança!
E o Pedro avançou e num
jacto contou tudo.
O meu querido Pai, olhou
para ele e perguntou:
‘Atão e tu? Estás bem? Não
te aleijados nem nada?’
E o Pedro meio zonzo com a
reacção do meu Pai, respondeu:
‘Nada, Avô, estou
porreiro. O Avô desculpe!’
‘Pois’... disse o meu Pai.
‘Vê se te serve de lição!’
De regresso a Carvide
desabafa o Pedro:
‘Oh Tio... o Avô é um porreiro!’
Aproveitei para dar a
lição:
‘Olha
Pedro, o teu Avô é um “porreiro” porque só podia ser com a atitude que tomaste!
Enfrentaste a coisa, não inventaste subterfúgios, foste verdadeiro, assumiste a
responsabilidade do que fizeste,
Mas, súbita, nua e crua vem a: A Morte
Ela aí está, presente,
indiscutível, definitiva!
A morte é, assim, o acabar
a vida, o terminar de sonhos e esperanças, projectos e planeamentos o não se
"vai passar mais nada"!
A Morte!
Choca, faz estremecer,
sobretudo os vivos, os que ficam e que subitamente se dão conta que ela chegou
e levou consigo quem tanto queríamos, de quem tanto gostávamos.
Um travo amargo de perda
irreparável, de algo sem remédio nem solução e ficamos como que tontos
pensando: como é - como foi - possível?
Mas foi! E é! A morte está
presente desde o dia em que nascemos e que, pela primeira vez fomos uma pessoa.
Sim, quando perguntamos
por alguém cuja situação é grave e respondemos: está entre a vida e a morte
esquecemos que esta resposta deve ser a de sempre, desde que vimos pela
primeira vez a luz do dia.
A Morte faz parte da
condição humana, esta é a verdade e, mais, súbita ou expectável, sucede sempre.
O que podemos fazer, nós
que amámos tanto a pessoa que morreu?
Nada, absolutamente nada!
Guardamos como tesouro
genuíno as lembranças todas. De repente, como por milagre, só nos lembramos das
coisas boas.
Quem morreu deixou, de
repente, de ter defeitos, fraquezas, coisas que nos desiludiram ou magoaram.
A Morte tem esse efeito
regenerador, converte a pessoa em excelente criatura que fez muito bem e,
sobretudo, nos faz muita falta.
O que fazer?
Para um cristão esta é,
deve ser, uma consolação, um lenitivo para a dor da ausência física para passar
a ser uma certeza de que a memória permanece talvez mais viva e actuante que
nunca.
(AMA, na morte do meu
querido sobrinho Pedro, 03.11.201)
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