24/01/2019

Leitura espiritual


Os pressupostos da Fidelidade

A fidelidade e o respeito pelos outros

Entronca-se bem aqui a necessária relação da fidelidade à verdade com a caridade.

A fidelidade à verdade não pode ser apresentada como razão ou motivo para ofender, desprezar ou prejudicar aqueles que não a enxergam como nós.

É má fidelidade aquela que se emprega em destruir violentamente as convicções dos outros: é mil vezes preferível aquele que é fiel à pessoa humana - em cujo rosto se vislumbra sempre o rosto de Cristo - aos intransigentes defensores das “suas verdades”, que violam o respeito devido à opinião alheia.

Mas a fidelidade sem caridade conduz ao fanatismo, a caridade sem fidelidade pode levar a sentimentalismos que acabem por prejudicar os princípios e as pessoas.

Um pai ou uma mãe que, por mimarem os filhos – julgando ser essa uma forma de amá-los -, lhes permitem a satisfação de todos os seus caprichos, acabarão por ser infiéis ao seu papel de forjadores de homens e mulheres úteis à sociedade, porque os terão tornado moles de vontade fracos de carácter.

Não existe fidelidade autêntica aos outros sem compromisso prévio com a verdade: são virtudes complementares.

Fiel e verídico são palavras que aparecem juntas num dicionário de sinónimos.

A palavra não é instrumento que possa ser manipulado pelos caprichos ocasionais, mas um compromisso de lealdade com aquele com quem se fala.

Uma pessoa de palavra é fidedigna, honesta, honrada, justa, veraz e sã.

Quando afirma alguma coisa, não precisa apresentar testemunhas; quando oferece a sua amizade, podemos dar-lhe as costas sem medo de sermos traídos, quando diz que ama, sabemos que entregou de verdade o seu coração.

É uma pessoa confiável – porque é fiel.

Por outro lado, quem não sabe ser veraz vai a caminho de ser um traidor, e o seu mundo ir-se-á transformando num mundo de erros.
Se o presidente de uma nação mentisse, já não seria digno de dirigir o país e deveria renunciar; um homem de finanças que tivesse montado o seu império à base de falsidades acabaria por causar maior mal à sociedade que lhe confiou as suas poupanças do que um soldado enlouquecido que disparasse a sua metralhadora no meio de uma passeata.

Dizer a verdade é, portanto ser fiel àqueles com quem nos relacionamos; e, por sua vez, ser fiel é submeter-se à palavra dada, respeitar o que se afirma; quando se diz sim, diz-se isso exactamente.

(…)

Poderíamos inclinar-nos a pensar que a pessoa que mentiu ou usou de subterfúgios sempre se há-de comportar desse modo, mas nós os homens não somos rios e podemos voltar atrás
Todo o ser humano tem direito a que lhe dêem uma oportunidade de emendar-se.
Devemos sempre considerar um acto digno o de quem afirma humildemente ”Enganei-me”, e pedir perdão àqueles a quem tenha podido prejudicar e reparar os danos que tenha causado.

Mas é diferente querer inferir desta verdade uma consequência que seria destruidora de toda a fidelidade, pensar que sempre podemos desdizer-nos das nossas livres decisões, como se não fosse necessário cumprir os compromissos assumidos.

Além de que se daria lugar a contínuas injustiças e se prejudicariam terceiros, está em jogo uma questão mais de fundo: a relação entre fidelidade e liberdade.

Trata-se de uma correspondência que é íntima e necessária.


(Cfr FIDELIDADE, de Javier Abad Gómez, 1989)

(Revisão da versão portuguesa por AMA)



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