22/01/2019

Leitura espiritual


Rezar: como e porquê

Pergunta:

Permita-me pedir-lhe que nos confie pelo menos um pouco do segredo do seu coração. Face à convicção que na sua pessoa – como na de qualquer Papa – vive o mistério no qual que a fé crê, surge espontaneamente a pergunta:
Como é capaz de aguentar um peso semelhante, que a partir do ponto de vista humano será quase insuportável?
Nenhum homem na terra, nem sequer nenhum dos mais altos representantes das diferentes religiões, tem uma responsabilidade semelhante; ninguém está em tão estreita relação com O próprio Deus, apesar das sua declarações sobre a “co-responsabilidade” de todos os baptizados, se bem que cada um ao seu nível.

Santidade, se mo permite:
Como se dirige a Jesus?
Como dialoga na oração com esse Cristo que entregou a Pedro (para que chegassem até à sua pessoa, através da sucessão apostólica) «as chaves do Reino dos céus», conferindo-lhe o poder de «atar e desatar» todas as coisas?

Resposta:

Faz-me uma pergunta sobre a oração, pergunta ao Papa como reza. Agradeço-lhe a pergunta.
Talvez convenha iniciar a resposta com o que São Paulo escreve na Carta aos Romanos.
O Apóstolo entra directamente in medias res quando diz:
«O Espírito vem em ajuda da nossa debilidade porque nem sequer sabemos o que nos convém pedir, mas o próprio Espírito intercede com insistência por nós, com gemidos inefáveis» [i]


O que é a oração?
Comummente considera-se uma conversa.
Numa conversa há sempre um “eu” e um “tu”. Neste caso um Tu com T maiúsculo.
A experiência da oração ensina que se inicialmente o “eu” parece o elemento mais importante, logo nos damos conta que na realidade as coisas são de outro modo.
Mais importante é o “Tu”, porque a nossa oração parte da iniciativa de Deus.
São Paulo na Carta aos Romanos ensina exactamente isto.
Segundo o Apóstolo, a oração reflecte toda a realidade criada, tem em certo sentido uma função cósmica.

O homem é sacerdote de toda a criação, fala em nome dela mas enquanto guiado pelo Espírito.
Dever-se-ia meditar detidamente sobre esta passagem da Carta aos Romanos para entrar no centro profundo do que é a oração.
Leiamos: «A própria criação espera com impaciência a revelação dos filhos de Deus; pois foi submetida à caducidade – não por sua vontade, mas pelo querer daquele que lha impôs -, e fomenta a esperança de ser também ela libertada da escravidão da corrupção, para entrar na liberdade da glória dos filhos de Deus.
Sabemos efectivamente que toda a criação geme e sofre até hoje as dores do parto; não só ela, mas também nós, que possuímos as primícias do Espirito, gememos interiormente esperando a adopção dos filhos, a redenção do nosso corpo.
Porque na esperança fomos salvos» [ii]
E aqui encontramos de novo as palavras do Apóstolo já citadas:

«O espírito vem em ajuda da nossa debilidade, porque nem sequer sabemos o que nos convém pedir, mas o próprio Espírito intercede por nós com insistência, «com gemidos inefáveis»[iii]

Na oração, pois, o verdadeiro protagonista é Deus.
O protagonista é Cristo, que constantemente liberta a criatura da escravidão da corrupção e a conduz para a liberdade, para a glória dos filhos de Deus.
Protagonista é o Espírito Santo, que «vem em ajuda da nossa debilidade».
Nós começamos a rezar com a impressão que é uma iniciativa nossa: ao contrário, é sempre uma iniciativa de Deus em nós.
É exactamente assim como escreve São Paulo
Esta iniciativa reintegra-nos na nossa dignidade especial.
Sim, introduz-nos na dignidade superior dos filhos de Deus, filhos de Deus que são o que toda a criação espera.




(Cfr entrevista de Vittorio Messori a São João Paulo II, CRUZANDO EL UMBRAL DE LA ESPERANZA, Outubro de 1994)

(Tradução do castelhano por AMA)



[i] 8,26
[ii] 8, 19-24
[iii] 8, 26

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