São Josemaria Escrivá
Cristo que passa
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José foi, no aspecto
humano, mestre de Jesus; conviveu com Ele diariamente, com carinho delicado, e
cuidou dele com abnegação alegre. Não será esta uma boa razão para
considerarmos este varão justo, este Santo Patriarca, no qual culmina a Fé da
Antiga Aliança, Mestre de vida interior?
A vida interior não é
outra coisa senão o convívio assíduo e intimo com Cristo, para nos
identificarmos com Ele.
E José saberá dizer-nos
muitas coisas sobre Jesus.
Por isso, não deixeis
nunca de conviver com ele; ite ad Joseph, como diz a tradição cristã com uma
frase tomada do Antigo Testamento.
Mestre da vida interior,
trabalhador empenhado no seu trabalho, servidor fiel de Deus em relação
contínua com Jesus: este é José.
Ite
ad Joseph.
Com S. José o cristão
aprende o que é ser Deus e estar plenamente entre os homens, santificando o
mundo.
Ide a José e encontrareis
Jesus. Ide a José e encontrareis Maria, que encheu sempre de paz a amável
oficina de Nazaré.
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Entramos no tempo da
Quaresma: tempo de penitência, de purificação, de conversão.
Não é fácil tarefa.
O cristianismo não é um
caminho cómodo; não basta estar na Igreja e deixar que os anos passem.
Na nossa vida, na vida dos
cristãos, a primeira conversão - esse momento único, que cada um de nós
recorda, em que advertimos claramente tudo o que o Senhor nos pede - é
importante; mas ainda mais importantes e mais difíceis são as conversões
sucessivas.
É preciso manter a alma
jovem, invocar o Senhor, saber ouvir, descobrir o que corre mal, pedir perdão,
para facilitarmos o trabalho da graça divina nessas sucessivas conversões.
Invocabit me et ego
exaudiam eum, lemos na liturgia deste Domingo: Se me chamardes, Eu vos
escutarei, diz o Senhor.
Reparai nesta maravilha
que é o cuidado que Deus tem por nós, sempre disposto a ouvir-nos, atento em
cada momento à palavra do homem.
Em qualquer altura - mas
agora de modo especial, porque o nosso coração está bem disposto, decidido a
purificar-se - Ele nos ouve e não deixará de atender ao que Lhe pede um coração
contrito e humilhado.
O Senhor ouve-nos para
intervir, para Se meter na nossa vida, para nos livrar do mal e encher-nos de
bem: eripiam eum et glorificabo eum, Eu o livrarei e o glorificarei, diz do
homem.
Portanto: esperança do
Céu.
E aqui temos, como doutras
vezes, o começo desse movimento interior que é a vida espiritual.
A esperança da
glorificação acentua a nossa fé e estimula a nossa caridade. E, deste modo, as
três virtudes teologais - virtudes divinas que nos assemelham ao nosso Pai,
Deus - põem-se em movimento.
Haverá melhor maneira de
começar a Quaresma?
Renovamos a Fé, a
Esperança, a Caridade. Esta é a fonte do espírito de penitência, do desejo de
purificação.
A Quaresma não é apenas
uma ocasião de intensificar as nossas práticas externas de mortificação; se
pensássemos que era isso apenas, escapar-nos-ia o seu sentido profundo na vida
cristã, porque esses actos externos são, repito, fruto da Fé, da Esperança e do
Amor.
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A arriscada segurança do
Cristão
Qui habitat in adiutorio
Altissimi in protectione Dei coelí commorabitur - Habitar sob a protecção de
Deus, viver com Deus: eis a arriscada segurança do cristão.
É necessário
convencermo-nos de que Deus nos ouve, de que está sempre solícito por nós, e
assim se encherá de paz o nosso coração. Mas viver com Deus é indubitavelmente
correr um risco, porque o Senhor não Se contenta compartilhando; quer tudo.
E aproximar-se d'Ele um
pouco mais significa estar disposto a uma nova rectificação, a escutar mais
atentamente as suas inspirações, os santos desejos que faz brotar na nossa
alma, e a pô-los em prática.
Desde a nossa primeira
decisão consciente de viver integralmente a doutrina de Cristo, é certo que
avançámos muito pelo caminho da fidelidade à sua Palavra.
Mas não é verdade que
restam ainda tantas coisas por fazer?
Não é verdade que resta,
sobretudo, tanta soberba?
É precisa, sem dúvida, uma
outra mudança, uma lealdade maior, uma humildade mais profunda, de modo, que,
diminuindo o nosso egoísmo, cresça em nós Cristo, pois illum oportet crescere,
me autem minui, é preciso que Ele cresça e que eu diminua.
Não é possível deixar-se
ficar imóvel.
É necessário avançar para
a meta que S. Paulo apontava: não sou eu quem vive; é Cristo que vive em mim.
A ambição é alta e
nobilíssima: a identificação com Cristo, a santidade. Mas não há outro caminho,
se se deseja ser coerente com a vida divina que, pelo Baptismo, Deus fez nascer
nas nossas almas. O avanço é o progresso na santidade; o retrocesso é negar-se
ao desenvolvimento normal da vida cristã.
Porque o fogo do amor de
Deus precisa de ser alimentado, de aumentar todos os dias arreigando-se na
alma; e o fogo mantém-se vivo queimando novas coisas.
Por isso, se não aumenta,
está a caminho de se extinguir.
Recordai as palavras de
Santo Agostinho: Se disseres basta, estás perdido. Procura sempre mais, caminha
sempre, progride sempre. Não permaneças no mesmo sítio, não retrocedas, não te
desvies.
A Quaresma coloca-nos
agora perante estas perguntas fundamentais: Avanço na minha fidelidade a
Cristo?
Em desejos de santidade?
Em generosidade apostólica
na minha vida diária, no meu trabalho quotidiano entre os meus companheiros de
profissão?
Cada um que responda a
estas. perguntas, sem ruído de palavras, e verá como é necessária uma nova
transformação para que Cristo viva em nós, para que a sua imagem se reflicta
limpidamente na nossa conduta.
Se alguém quer vir atrás
de Mim, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz de cada dia, e siga-Me.
Cristo repete-o a cada um
de nós, ao ouvido, intimamente: a Cruz de cada dia.
Não só - escreve S.
Jerónimo - em tempo de perseguição, ou quando se apresenta a possibilidade do
martírio, mas em todas as situações, em todas as actividades, em todos os
pensamentos, em todas as palavras, neguemos aquilo que antes éramos e
confessemos o que agora somos, visto que renascemos em Cristo.
Estas considerações não
são, afinal, senão o eco das do Apóstolo: Outrora éreis trevas, mas agora sois
luz no Senhor. Comportai-vos como filhos da luz, porque o fruto da luz consiste
na bondade, na justiça e na verdade. Procurai o que é agradável ao Senhor.
A conversão é coisa de um
instante; a santificação é tarefa para toda a vida.
A semente divina da
caridade, que Deus pôs nas nossas almas, aspira a crescer, a manifestar-se em
obras, a dar frutos que correspondam em cada momento ao que é agradável ao
Senhor.
Por isso, é indispensável
estarmos dispostos a recomeçar, a reencontrar - nas novas situações da nossa
vida - a luz, o impulso da primeira conversão.
E essa é a razão pela qual
havemos de nos preparar com um exame profundo, pedindo ajuda ao Senhor para
podermos conhecê-Lo melhor e conhecer-nos melhor a nós mesmos.
Não há outro caminho para
nos convertermos de novo.
(Continua)