31/08/2018

Diante de Deus tu és uma criança


Diante de Deus, que é Eterno, tu és uma criança mais pequena do que, diante de ti, um miúdo de dois anos. E, além de criança, és filho de Deus. – Não o esqueças. (Caminho, 860)


Se reparardes bem, é muito diferente a queda de uma criança e a queda de uma pessoa crescida. Para as crianças, uma queda, em geral, não tem importância; tropeçam com tanta frequência! E se começam a chorar, o pai lembra-lhes: os homens não choram. Assim se encerra o incidente com o empenho do miúdo por contentar o seu pai.
(…) Se procurarmos portar-nos como eles, os tropeções e os fracassos – aliás inevitáveis – na vida interior, nunca se transformarão em amargura. Reagiremos com dor, mas sem desânimo, e com um sorriso que brota, como a água límpida, da alegria da nossa condição de filhos desse Amor, dessa grandeza, dessa sabedoria infinita, dessa misericórdia, que é o nosso Pai. Aprendi durante os meus anos de serviço ao Senhor a ser filho pequeno de Deus. E isto vos peço: que sejais quasi modo geniti infantes, meninos que desejam a palavra de Deus, o pão de Deus, o alimento de Deus, a fortaleza de Deus para se comportarem de agora em diante, como homens cristãos. (Amigos de Deus, 146)

Temas para meditar e reflectir


Formação humana e cristã – 49  


Fala-se muito de amor a propósito de tudo mas muitas vezes não se passa disso: falar.

Amar não é gostar, simpatizar, querer bem.

Quer dizer, é isso tudo mas em sumo grau e sem condições.

Evidentemente que se não gostar de alguém não a amarei.

Temos assim que na verdade o amor é o resultado de um caminho que vamos percorrendo nas nossas relações com alguém, de coração aberto e sem reservas.

Os fios que representam essas relações vão tecendo um cordão cada vez mais forte e resistente.

Este "cordão" é a correspondência, isto é, o amor dado e o amor recebido.


(AMA, reflexões)

Tratado das virtudes


Questão 67: Da duração das virtudes depois desta vida.

Art. 6 — Se a caridade subsiste, depois desta vida, na glória.

O sexto discute-se assim.
— Parece que a caridade não subsiste depois desta vida, na glória.

1. — Pois, como diz a Escritura (1 Cor 13, 10), quando vier o que é perfeito, abolido será o que é em parte, i. é, o imperfeito. Ora, a caridade é uma via imperfeita. Logo, será abolida quando chegarmos à perfeição da glória.

2. Demais. — Os hábitos e os actos se distinguem pelos seus objectos. Ora, o objecto do amor é o bem apreendido. Logo, como a apreensão desta vida difere da apreensão da vida futura, a mesma caridade não poderá subsistir numa e noutra.

3. Demais. — O que num ponto de vista é imperfeito pode alcançar a igualdade da perfeição por um aumento contínuo. Ora, a caridade da vida não pode nunca chegar a igualar-se à da pátria, por mais que aumente. Logo, a caridade da vida não subsistirá na outra.

Mas, em contrário, o Apóstolo diz (1 Cor 13, 8): A caridade nunca jamais há-de acabar.


SOLUÇÃO. — Como já dissemos [2], nada impede que aquilo que tem uma imperfeição, não pertencente à essência, venha a ser perfeito, conservando-se numericamente tal como é; assim, o homem vem a ser perfeito pelo crescimento, e a brancura, pela intensidade. Ora, a caridade é amor, a cuja essência não pertence nenhuma imperfeição; pois, pode ter por objecto tanto o possuído como o que não o é, tanto o que vemos como o que não vemos. Logo, a caridade não será abolida pela perfeição da glória, mas permanecerá numericamente a mesma.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — A imperfeição pode atingir a caridade acidentalmente, por não ser a imperfeição da essência do amor. Ora, removido o acidental, nem por isso deixa de existir a substância. Logo, abolida a imperfeição da caridade, esta não será abolida.

RESPOSTA À SEGUNDA. — A caridade não tem por objecto o conhecimento em si mesmo, porque então não seria a mesma nesta e na outra vida. Mas, tem como objecto, aquilo mesmo que é conhecido, e que é sempre o mesmo, i. é, Deus.

RESPOSTA À TERCEIRA. — A caridade da vida, aumentando não pode igualar a da pátria, pela diferença causal existente. Pois, a visão é uma causa do amor, como já se disse [3]. Ora, quanto mais perfeitamente Deus é conhecido, tanto mais perfeitamente é amado.

(Revisão da versão portuguesa por AMA)


[1] (II Sent., dist. XXXI, q. 2, a. 2; De Verit., q. 27, a. 5, ad 6; De Virtut., q. 4, a. 4, ad 7, 13, 14 ; I Cor., cap. XIII, lect. III).
[2] Q. 67, a. 3.
[3] IX Ethic. (lect. V).

Leitura espiritual


São Josemaria Escrivá

CRISTO QUE PASSA

18
           
Quando chega o Natal, gosto de contemplar as imagens do Menino Jesus.
Essas figuras que nos mostram o Senhor tão apoucado, recordam-me que Deus nos chama, que o Omnipotente Se quis apresentar desvalido, quis necessitar dos homens.
Do berço de Belém, Cristo diz-me a mim e diz-te a ti que precisa de nós; reclama de nós uma vida cristã sem hesitações, uma vida de entrega, de trabalho, de alegria.

Não conseguiremos jamais o verdadeiro bom humor se não emitarmos deveras Jesus, se não formos humildes como Ele. Insistirei de novo: vedes onde se oculta a grandeza de Deus?
Num presépio, nuns paninhos, numa gruta.
A eficácia redentora das nossas vidas só se pode dar com humildade, deixando de pensar em nós mesmos e sentindo a responsabilidade de ajudar os outros.

É corrente, às vezes até entre almas boas, criar conflitos íntimos, que chegam a produzir sérias preocupações, mas que carecem de qualquer base objectiva.
A sua origem está na falta de conhecimento próprio, que conduz à soberba: o desejo de se tornarem o centro da atenção e da estima de todos, a preocupação de não ficarem mal, de não se resignarem a fazer o bem e desaparecerem, a ânsia da segurança pessoal...
E assim, muitas almas que poderiam gozar de uma paz extraordinária, que poderiam saborear um imenso júbilo, por orgulho e presunção tornam-se desgraçadas e infecundas!

Cristo foi humilde de coração.
Ao longo da sua vida, não quis para Si nenhuma coisa especial, nenhum privilégio.
Começa por estar nove meses no seio de sua Mãe, como qualquer outro homem, com extrema naturalidade.
Sabia o Senhor de sobra que a Humanidade padecia de uma urgente necessidade d'Ele.
Tinha, portanto, fome de vir à terra para salvar todas as almas; mas não precipita o tempo; vem na Sua hora, como chegam ao mundo os outros homens.
Desde a concepção ao nascimento, ninguém, salvo S. José e Santa Isabel, adverte esta maravilha: Deus veio habitar entre os homens!

O Natal também está rodeado de uma simplicidade admirável: o Senhor vem sem aparato, desconhecido de todos.
Na Terra, só Maria e José participam na divina aventura.
Depois, os pastores, avisados pelos Anjos.
E mais tarde os sábios do Oriente.
Assim acontece o facto transcendente que une o Céu à Terra, Deus ao homem!

Como é possível tanta dureza de coração que cheguemos a acostumar-nos a estes episódios?
Deus humilha-Se para que possamos aproximar-nos d'Ele, para que possamos corresponder ao seu Amor com o nosso amor, para que a nossa liberdade se renda, não só ante o espectáculo do seu poder, como também ante a maravilha da sua humildade.

Grandeza de um Menino que é Deus!
O Seu Pai é o Deus que fez os Céus e a Terra, e Ele ali está, num presépio, quia non erat eis locus in diversorio, porque não havia outro sítio na Terra para o dono de toda a Criação!

19           

Cumpriu a vontade de Seu Pai Deus

Não me afasto da mais rigorosa verdade se vos digo que Jesus continua agora a buscar pousada no nosso coração.
Temos de Lhe pedir perdão pela nossa cegueira pessoal, pela nossa ingratidão.
Temos de Lhe pedir a graça de nunca mais Lhe fechar a porta das nossas almas.

O Senhor não nos oculta que a obediência rendida à vontade de Deus exige renúncia e entrega porque o amor não pede direitos: quer servir.
Ele percorreu primeiro o caminho.
Jesus, como obedecestes Tu?
Usque ad mortem, mortem autem crucis, até à morte e morte de Cruz.
É preciso sair de nós mesmos, complicar a vida, perdê-la por amor de Deus e das almas...
Tu querias viver e que nada te acontecesse; mas Deus quis outra coisa...
Existem duas vontades: a tua vontade deve ser corrigida para se identificar com a vontade de Deus, e não torcida a de Deus para se acomodar à tua.

Com alegria, tenho visto muitas almas que jogaram a vida - como Tu, Senhor, "usque ad mortem"! - para cumprir o que a vontade de Deus lhes pedia, dedicando os seus esforços e o seu trabalho profissional ao serviço da Igreja, pelo bem de todos os homens.

Aprendamos a obedecer, aprendamos a servir.
Não há maior fidalguia do que entregar-se voluntariamente ao serviço dos outros.
Quando sentimos o orgulho que referve dentro de nós, a soberba que nos leva a pensar que somos super-homens, é o momento de dizer que não, de dizer que o nosso único triunfo há-de ser o da humildade.
Assim nos identificaremos com Cristo na Cruz, não aborrecidos ou inquietos, nem com mau humor, mas alegres, porque essa alegria, o esquecimento de nós mesmos, é a melhor prova de amor.

20
           
Permiti-me que volte de novo à naturalidade, à simplicidade da vida de Jesus, que já vos tenho feito considerar tantas vezes.
Esses anos ocultos do Senhor não são coisa sem significado, nem uma simples preparação dos anos que viriam depois, os da sua vida púbica.
Desde 1928 compreendi claramente que Deus deseja que os cristãos tomem exemplo de toda a vida do Senhor.
Entendi especialmente a sua vida escondida, a sua vida de trabalho corrente no meio dos homens: o Senhor quer que muitas almas encontrem o seu caminho nos anos de vida calada e sem brilho. Obedecer à vontade de Deus, portanto, é sempre sair do nosso egoísmo; mas não tem por que se traduzir no afastamento das circunstâncias ordinárias da vida dos homens, iguais a nós pelo seu estado, pela sua profissão, pela sua situação na sociedade.
Sonho - e o sonho já se tornou realidade - com multidões de filhos de Deus santificando-se na sua vida de cidadãos correntes, compartilhando ideais, anseios e esforços com as outras pessoas. Preciso de lhes gritar esta verdade divina: se permaneceis no meio do mundo, não é porque Deus se tenha esquecido de vós; não é porque o Senhor vos não tenha chamado; convidou-vos a permanecer nas actividades e nas ansiedades da Terra, porque vos fez saber que a vossa vocação humana, a vossa profissão, as vossas qualidades não só não são alheias aos seus desígnios divinos, mas que Ele as santificou como oferenda gratíssima ao Pai!

21 
          
Recordar a um cristão que a sua vida não tem outro sentido senão o de obedecer à vontade de Deus não é separá-lo dos outros homens. Pelo contrário: em muitos casos, o mandamento recebido do Senhor de que nos amemos uns aos outros como Ele nos amou cumpre-se vivendo junto dos outros e tal como os outros, entregando-nos ao serviço do Senhor no mundo, para dar a conhecer melhor a todas as almas o amor de Deus; para lhes dizer que se abriram os caminhos divinos da terra.

O Senhor não se limitou a dizer que nos amava, mas demonstrou-o com obras.
Não nos esqueçamos de que Jesus Cristo encarnou para nos ensinar, para aprendermos a viver a vida dos filhos de Deus.
Recordai o preâmbulo do evangelista S. Lucas nos Actos dos Apóstolos: Primum quidem sermonem feci de omnibus, o Theophile, quae coepit Jesus facere et docere, falei de tudo o que mais notável fez e pregou Jesus.
Veio ensinar, mas fazendo; veio ensinar, mas sendo modelo, sendo o Mestre e o exemplo, com a sua conduta.
Agora, diante de Jesus Menino, podemos continuar o nosso exame pessoal: estamos decididos a procurar que a nossa vida sirva de modelo e de ensinamento aos nossos irmãos, aos nossos iguais, os homens?
Estamos decididos a ser outros Cristos?
Não basta dizê-lo com a boca. Tu - pergunto-o a cada um de vós e pergunto-o a mim mesmo - tu, que por seres cristão estás chamado a ser outro Cristo, mereces que se repita de ti que vieste facere et docere, fazer tudo como um filho de Deus, atento à vontade de seu Pai, para que deste modo possas levar todas as almas a participar das coisas boas, nobres, divinas e humanas, da Redenção?
Estás a viver a vida de Cristo na tua vida de cada dia no meio do mundo?

Fazer as obras de Deus não é um bonito jogo de palavras, mas um convite a gastar-se por Amor.
Temos de morrer para nós mesmos a fim de renascermos para uma vida nova.
Porque assim obedeceu Jesus, até à morte de Cruz, mortem autem crucis. Propter quod et Deus exaltavit illum.
Por isso Deus O exaltou.
Se obedecermos à vontade de Deus, a Cruz será também Ressurreição, exaltação. Cumprir-se-á em nós, passo a passo, a vida de Cristo; poder-se-á afirmar que vivemos procurando ser bons filhos de Deus, que passamos fazendo o bem, apesar da nossa fraqueza e dos nossos erros pessoais, por mais numerosos que sejam.

E quando vier a morte, que virá inexoravelmente, esperá-la-emos com júbilo, como tenho visto que o souberam fazer tantas pessoas santas no meio da sua existência diária.
Com alegria, porque, se imitámos Cristo em fazer o bem, - em obedecer e levar a Cruz, apesar das nossas misérias - ressuscitaremos como Cristo; surrexit Dominus vere!, que ressuscitou realmente.

Jesus, que se fez menino - meditai nisto - venceu a morte.
Com o aniquilamento, com a simplicidade, com a obediência, com a divinização da vida corrente e vulgar das criaturas, o Filho de Deus foi vencedor!

Este foi o triunfo de Jesus Cristo.
Assim nos elevou ao seu nível, ao nível dos filhos de Deus, descendo ao nosso terreno, ao terreno dos filhos dos homens.

(cont)



Pequena agenda do cristão

Sexta-Feira


(Coisas muito simples, curtas, objectivas)




Propósito:

Contenção; alguma privação; ser humilde.


Senhor: Ajuda-me a ser contido, a privar-me de algo por pouco que seja, a ser humilde. Sou formado por este barro duro e seco que é o meu carácter, mas não Te importes, Senhor, não Te importes com este barro que não vale nada. Parte-o, esfrangalha-o nas Tuas mãos amorosas e, estou certo, daí sairá algo que se possa - que Tu possas - aproveitar. Não dês importância à minha prosápia, à minha vaidade, ao meu desejo incontido de protagonismo e evidência. Não sei nada, não posso nada, não tenho nada, não valho nada, não sou absolutamente nada.

Lembrar-me:
Filiação divina.

Ser Teu filho Senhor! De tal modo desejo que esta realidade tome posse de mim, que me entrego totalmente nas Tuas mãos amorosas de Pai misericordioso, e embora não saiba bem para que me queres, para que queres como filho a alguém como eu, entrego-me confiante que me conheces profundamente, com todos os meus defeitos e pequenas virtudes e é assim, e não de outro modo, que me queres ao pé de Ti. Não me afastes, Senhor. Eu sei que Tu não me afastarás nunca. Peço-Te que não permitas que alguma vez, nem por breves instantes, seja eu a afastar-me de Ti.

Pequeno exame:

Cumpri o propósito que me propus ontem?





Evangelho e comentário


 
Evangelho: Mt 25, 1-13

1 Tendo acabado todos estes discursos, Jesus disse aos discípulos: 2 «Como sabeis, a Páscoa é daqui a dois dias, e o Filho do Homem será entregue para ser crucificado.» 3 Então, os sumos sacerdotes e os anciãos do povo reuniram-se no palácio do Sumo Sacerdote, que se chamava Caifás, 4 e deliberaram prender Jesus, à traição, e matá-lo. 5Diziam, porém: «Que não seja durante a festa, para não haver alvoroço entre o povo.» 6 Jesus encontrava-se em Betânia, em casa de Simão, o leproso. 7 Enquanto estava à mesa, aproximou-se dele uma mulher, que trazia um frasco de alabastro com um perfume de alto preço e derramou-lho sobre a cabeça. 8 Ao verem isto, os discípulos ficaram indignados e disseram: «Para quê este desperdício? 9 Podia vender-se por bom preço e dar-se o dinheiro aos pobres.» 10 Jesus apercebeu-se de tudo e disse: «Porque afligis esta mulher? Ela praticou uma boa acção para comigo. 11 Pobres, sempre os tereis convosco; mas a mim nem sempre me tereis. 12 Derramando este perfume sobre o meu corpo, ela preparou a minha sepultura. 13 Em verdade vos digo: Em qualquer parte do mundo onde este Evangelho for anunciado, há-de também narrar-se, em sua memória, o que ela acaba de fazer.»

Comentário:

São Mateus diverge um pouco de São João no relato deste episódio.

São João nomeia expressamente Judas Iscariotes como o discípulo que se terá insurgido contra a mulher que ungiu Jesus com perfume.

Seja como for ficam as palavras de Jesus Cristo que agradece sensibilizado o gesto da mulher e, mais, garante que tal há-de ser narrado para todo o sempre como, de facto, aconteceu.

(AMA, comentário sobre Mt 25, 1-13, 08.05.2018)



30/08/2018

A castidade é uma virtude


Escreveste-me, médico apóstolo: "Todos sabemos por experiência que podemos ser castos, vivendo vigilantes, frequentando os Sacramentos e apagando as primeiras chispas da paixão, sem deixar que a fogueira ganhe corpo. É precisamente entre os castos que se contam os homens mais íntegros, sob todos os aspectos. E entre os luxuriosos predominam os tímidos, os egoístas, os falsários e os cruéis, que são características de pouca virilidade". (Caminho, 124)


Não deves limitar-te a fugir da queda ou da ocasião, nem o teu comportamento deve reduzir-se, de maneira alguma, a uma negação fria e matemática. Já te convenceste de que a castidade é uma virtude e, como tal, deve desenvolver-se e aperfeiçoar-se? Não basta ser continente, cada um segundo o seu estado. Insisto: temos de viver castamente, com virtude heróica. Este comportamento é um acto positivo, com o qual aceitamos de boa vontade o pedido de Deus: Præbe, fili mi, cor tuum mihi et oculi tui vias meas custodiant, entrega-me, meu filho, o teu coração e espraia os teus olhos pelos meus campos de paz.

Pergunto-te eu, agora: como encaras tu esta batalha? Bem sabes que a luta já está vencida, se a mantivermos desde o princípio. Afasta-te imediatamente do perigo, mal percebas as primeiras chispas de paixão, e até antes. Fala, além disso, com quem dirige a tua alma; se possível antes, porque abrindo o coração de par em par não serás derrotado. Um acto repetido várias vezes cria um hábito, uma inclinação, uma facilidade. É preciso, pois, batalhar para alcançar o hábito da virtude, o hábito da mortificação, para não recusar o Amor dos Amores.

Meditai no conselho de S. Paulo a Timóteo: Te ipsum castum custodi, conserva-te a ti mesmo puro, para estarmos, também, sempre vigilantes, decididos a defender o tesouro que Deus nos entregou. Ao longo da minha vida, quantas e quantas pessoas não ouvi queixarem-se: Ah! Se eu tivesse cortado ao princípio! E diziam-no cheias de aflição e de vergonha. (Amigos de Deus, 182)

Temas para meditar e reflectir

Formação humana e cristã – 48 


Voltamos ao que já referimos para dizer que o plano de vida não deve ser um exaustivo programa que espartilhe a nossa vida, mas racional e flexível e de acordo com a nossa vida corrente.

O importante é que esse plano de vida nos leve a ter presença de Deus em cada instante do nosso dia.

Interiorizando esta verdade: 

Deus está sempre presente e vê e escuta todos os nossos actos, melhor nos defenderemos não só das tentações, mas nos dará força e ânimo para fazer o que tem de ser feito com coragem e determinação.


(AMA, reflexões)

Leitura espiritual


São Josemaria Escrivá


CRISTO QUE PASSA

15
           
Como em relação a qualquer outro aspecto da sua vida, nunca deveríamos contemplar esses anos ocultos de Jesus sem nos sentirmos afectados, sem os reconhecermos como aquilo que são: chamamentos que o Senhor nos dirige para sairmos do nosso egoísmo, do nosso comodismo.
O Senhor conhece as nossas limitações, o nosso individualismo e a nossa ambição: a dificuldade em nos conhecermos a nós mesmos e de nos entregarmos aos outros.
Sabe o que é não encontrar amor e verificar que mesmo aqueles que dizem segui-Lo o fazem só a meias.
Recordai as cenas tremendas que os evangelistas nos descrevem e em que vemos os apóstolos ainda cheios de aspirações temporais e de projectos exclusivamente humanos.
Mas Jesus escolheu-os, mantém-nos juntos de Si e confia-lhes a missão que recebeu do Pai.

Também a nós nos chama e nos pergunta como a Tiago e João: Potestis bibere calicem quem ego bibiturus sum?; estais dispostos a beber o cálice (este cálice da completa entrega ao cumprimento da vontade do Pai) que eu vou beber?
"Possumus"!
Sim, estamos dispostos! - é a resposta de João e Tiago...
Vós e eu, estamos dispostos seriamente a cumprir, em tudo, a vontade do nosso Pai, Deus?
Demos ao Senhor o nosso coração inteiro ou continuamos apegados a nós mesmos, aos nossos interesses, à nossa comodidade, ao nosso amor-próprio?
Há em nós alguma coisa que não corresponda à nossa condição de cristãos e que nos impeça de nos purificarmos?
Hoje apresenta-se-nos a ocasião de rectificar.

É necessário que nos convençamos de que Jesus nos dirige pessoalmente estas perguntas.
É Ele que as faz, não eu.
Eu não me atreveria a fazê-las a mim próprio.
Eu vou continuando a minha oração em voz alta e vós, cada um de vós, por dentro, está confessando ao Senhor: Senhor, que pouco valho!
Que cobarde tenho sido tantas vezes!
Quantos erros!
Nesta ocasião e naquela... nisto e naquilo...
E podemos exclamar também: ainda bem, Senhor, que me tens sustentado com a tua mão, porque eu sinto-me capaz de todas as infâmias...
Não me largues, não me deixes; trata-me sempre como um menino. Que eu seja forte, valente, íntegro.
Mas ajuda-me, como a uma criatura inexperiente.
Leva-me pela tua mão, Senhor, e faz com que tua Mãe esteja também a meu lado e me proteja.
E assim, possumus!, poderemos, seremos capazes de ter-Te por modelo!

Não é presunção afirmar possumus!
Jesus Cristo ensina-nos este caminho divino e pede-nos que o apreendamos porque Ele o tornou humano e acessível à nossa fraqueza.
Por isso se rebaixou tanto: Este foi o motivo porque se abateu, tomando a forma de servo aquele Senhor que, como Deus, era igual ao Pai; mas abateu-se na majestade e na potência; não na bondade e na misericórdia.

A bondade de Deus quer tornar-nos fácil o caminho.
Não rejeitemos o convite de Jesus; não Lhe digamos que não; não nos façamos surdos ao seu chamamento; pois não existem desculpas, não temos nenhum motivo para continuar a pensar que não podemos.
Ele ensinou-nos com o seu exemplo.
Portanto, peço-vos encarecidamente, meus irmãos, que não permitais que se vos tenha mostrado em vão exemplo tão precioso, mas que vos conformeis com Ele e vos renoveis no espírito da vossa alma.

16 
          
Passou pela terra fazendo o bem

Vedes como é necessário conhecer Jesus, observar amorosamente a sua vida?
Muitas vezes fui à procura da definição da biografia de Jesus na Sagrada Escritura.
Encontrei-a lendo aquela que o Espírito Santo faz em duas palavras: pertransiit benefaciendo.
Todos os dias de Jesus Cristo na terra, desde o seu nascimento até à morte, pertransiit benefaciendo, foram preenchidos fazendo o bem. Como, noutro lugar, a Escritura também diz: bene omnia fecit, fez tudo bem, terminou bem todas as coisas, não fez senão o bem.

E tu?
E eu?
Lancemos um olhar para ver se temos alguma coisa que emendar. Eu, sim, encontro em mim muito que fazer.
Como me vejo incapaz, só por mim, de fazer o bem e, como o próprio Jesus nos disse que sem Ele nada podemos, vamos tu e eu implorar ao Senhor a sua assistência, por meio de sua Mãe, neste colóquio íntimo, próprio das almas que amam a Deus.
Não acrescento mais nada, porque é cada um de vós que tem de falar, segundo a sua particular necessidade.
Por dentro, e sem ruído de palavras, neste mesmo momento em que vos dou estes conselhos, aplico esta doutrina à minha própria miséria.

17 
          
Pertransiit benefaciendo...
Que fez Jesus para derramar tanto bem, e só bem, por onde quer que passou?
Os Santos Evangelhos transmitiram-nos outra biografia de Jesus, resumida em três palavras latinas, que nos dá a resposta: erat subditus illis, obedecia.
Hoje, que o ambiente está cheio de desobediência, de murmuração, de desunião, havemos de estimar especialmente a obediência.

Sou muito amigo da liberdade e precisamente por isso amo tanto essa virtude cristã.
Devemos sentir-nos filhos de Deus e viver com o empenho de cumprir a vontade do nosso Pai, de realizar tudo segundo o querer de Deus, porque nos dá na gana, que é a razão mais sobrenatural.

O espírito do Opus Dei, que tenho procurado praticar e ensinar desde há mais de trinta e cinco anos, fez-me compreender e amar a liberdade pessoal.
Quando Deus Nosso Senhor concede a sua graça aos homens, quando os chama com uma vocação específica, é como se lhes estendesse a mão, uma mão paternal, cheia de fortaleza, repleta sobretudo de amor, porque nos busca um a um, como filhas e filhos seus, e porque conhece a nossa debilidade.
O Senhor espera que façamos o esforço de agarrar a sua mão, essa mão que Ele nos estende. Deus pede-nos um esforço, prova da nossa liberdade.
E para conseguirmos isso, temos de ser humildes, temos de sentir-nos filhos pequenos e amar a bendita obediência com que respondemos à bendita paternidade de Deus.

Convém deixar o Senhor meter-se nas nossas vidas e entrar confiadamente sem encontrar obstáculos nem recantos obscuros. Nós, os homens, tendemos a defender-nos, a apegar-nos ao nosso egoísmo.
Sempre tentamos ser reis, ainda que seja do reino da nossa miséria. Entendei através desta consideração por que motivo temos necessidade de recorrer a Jesus: para que Ele nos torne verdadeiramente livres e, dessa forma, possamos servir a Deus e a todos os homens.
Só assim perceberemos a verdade daquelas palavras de S. Paulo: Agora, porém, livres do pecado e feitos servos de Deus, tendes por fruto a santificação e por fim a vida eterna.
Porque o salário do pecado é a morte, ao passo que o dom gratuito de Deus é a vida eterna em Nosso Senhor Jesus Cristo.

Estejamos precavidos, portanto, visto que a nossa tendência para o egoísmo não morre e a tentação pode insinuar-se de muitas maneiras.
Deus exige que, ao obedecer, ponhamos em exercício a fé, porque a sua vontade não se manifesta com aparato ruidoso; às vezes o Senhor sugere o seu querer como que em voz baixa, lá no fundo da consciência; e é necessário escutar atentamente para distinguir essa voz e ser-Lhe fiel.

Muitas vezes fala-nos através doutros homens e pode acontecer que, à vista dos defeitos dessas pessoas ou pensando que não estão bem informadas ou que talvez não tenham entendido todos os dados do problema, surja uma espécie de convite a não obedecermos.

Tudo isso pode ter um significado divino, porque Deus não nos impõe uma obediência cega, mas uma obediência inteligente, e temos de sentir a responsabilidade de ajudar os outros com a luz do nosso entendimento.
Mas sejamos sinceros connosco próprios: examinemos em cada caso se o que nos move é o amor à verdade ou o egoísmo e o apego ao nosso próprio juízo.
Quando as nossas ideias nos separam dos outros, quando nos levam a quebrar a comunhão, a unidade com os nossos irmãos, é sinal certo que não estamos a actuar segundo o espírito de Deus.

Não o esqueçamos: para obedecer, repito, é preciso humildade. Vejamos de novo o exemplo de Cristo.
Jesus obedece, e obedece a José e a Maria. Deus veio à Terra para obedecer, e para obedecer às criaturas.
São duas criaturas perfeitíssimas - Santa Maria, Nossa Mãe; mais do que Ela só Deus; e aquele varão castíssimo, José.
Mas criaturas.
E Jesus, que é Deus, obedecia-lhes!
Temos de amar a Deus, para amar assim a sua vontade, e ter desejos de responder aos chamamentos que nos dirige através das obrigações da nossa vida corrente: nos deveres de estado, na profissão, no trabalho, na família, no convívio social, no nosso próprio sofrimento e no sofrimento dos outros homens, na amizade, no empenho de realizar o que é bom e justo...

(cont)


Pequena agenda do cristão

Quinta-Feira



(Coisas muito simples, curtas, objectivas)



Propósito:
Participar na Santa Missa.


Senhor, vendo-me tal como sou, nada, absolutamente, tenho esta percepção da grandeza que me está reservada dentro de momentos: Receber o Corpo, o Sangue, a Alma e a Divindade do Rei e Senhor do Universo.
O meu coração palpita de alegria, confiança e amor. Alegria por ser convidado, confiança em que saberei esforçar-me por merecer o convite e amor sem limites pela caridade que me fazes. Aqui me tens, tal como sou e não como gostaria e deveria ser.
Não sou digno, não sou digno, não sou digno! Sei porém, que a uma palavra Tua a minha dignidade de filho e irmão me dará o direito a receber-te tal como Tu mesmo quiseste que fosse. Aqui me tens, Senhor. Convidaste-me e eu vim.


Lembrar-me:
Comunhões espirituais.


Senhor, eu quisera receber-vos com aquela pureza, humildade e devoção com que Vos recebeu Vossa Santíssima Mãe, com o espírito e fervor dos Santos.

Pequeno exame:

Cumpri o propósito que me propus ontem?