Art.
3 — Se as virtudes morais têm preeminência sobre as intelectuais.
O terceiro discute-se
assim.
— Parece que as virtudes
morais têm preeminência sobre as intelectuais.
1. — Pois, o que é mais
necessário e mais permanente é melhor. Ora, as virtudes morais são mais
permanentes mesmo que as ciências, que são virtudes intelectuais; logo, também
são mais necessárias à vida humana. Logo, têm preeminência sobre as virtudes
intelectuais.
2. Demais.
— A virtude, por essência,
torna bom quem a possui. Ora, as virtudes morais é que tornam o homem bom, não
porém as intelectuais, a não ser talvez a prudência, unicamente. Logo, as
virtudes morais são melhores que as intelectuais.
3. Demais.
— O fim é mais nobre que
os meios. Mas, como se disse, a virtude moral torna recta a intenção do fim, ao
passo que a prudência torna recta a eleição dos meios [2].
Logo, a virtude moral é mais nobre que a prudência, virtude intelectual que
versa sobre a moralidade.
Mas, em contrário.
— A virtude moral reside
em a nossa parte racional por participação, ao passo que a intelectual, por
essência, como se disse [3].
Ora, o racional por essência é mais nobre que o racional por participação.
Logo, as virtudes intelectuais são mais nobres que as morais.
SOLUÇÃO. — Em dois
sentidos podemos compreender uma coisa como maior que outra: absoluta e
relativamente. Ora, nada impede que o melhor absolutamente não o seja,
relativamente; assim, embora filosofar seja melhor que enriquecer, não o é contudo
para quem sofre necessidades. A consideração absoluta funda-se na essência específica.
Ora, como a virtude se especifica pelo seu objecto, segundo já dissemos [4],
mais nobre, absolutamente falando, é a que tem um objecto mais nobre. Ora, é
manifesto que o objecto da razão é mais nobre que o do apetite; pois, ao passo
que aquela apreende o universal, este tende para as coisas enquanto
particulares. Donde, absolutamente falando, as virtudes intelectuais, que
aperfeiçoam a razão, são mais nobres que as morais, que aperfeiçoam o apetite.
Se porem considerarmos a virtude relativamente ao acto, a moral, que aperfeiçoa
o apetite, o qual actualiza as outras potências, como já dissemos [5],
é mais nobre. E como se chama virtude àquilo que, sendo perfeição da potência,
é princípio de um ato, essa denominação convém, por essência, mais às virtudes
morais que às intelectuais, embora estas constituam, absolutamente falando,
hábitos mais nobres.
DONDE A RESPOSTA À
PRIMEIRA OBJECÇÃO.
— As virtudes morais são
mais duradouras que as intelectuais por se exercerem relativamente à vida
comum. Mas é manifesto que os objectos das ciências, que são necessárias e têm
sempre o mesmo modo de existir, são mais permanentes que os das virtudes
morais, que são actos particulares. E o serem as virtudes morais mais
necessárias à vida humana, não prova que sejam, absolutamente, as mais nobres,
senão só relativamente. Portanto, as virtudes intelectuais especulativas, por
isso mesmo que não se ordenam a outro fim, como o útil, são mais dignas. E isto
porque elas causam de certo modo, em nós, uma felicidade incoativa e a
felicidade consiste no conhecimento da verdade, como já dissemos [6].
RESPOSTA À SEGUNDA.
— As virtudes morais, e
não as intelectuais, tornam o homem bom, absolutamente falando, porque o
apetite move para o seu acto as outras potências, como já dissemos [7].
Donde, isto não prova senão que as virtudes morais são, relativamente,
melhores.
RESPOSTA À TERCEIRA.
— A prudência não só
dirige as virtudes morais na eleição dos meios, mas também na pre-instituição
do fim. Ora, o fim de cada virtude moral é atingir o meio-termo, na sua matéria
própria, e este é determinado pela razão recta dirigida pela prudência, como se
disse [8].
(Revisão
da versão portuguesa por AMA)
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