Em seguida devemos tratar
das propriedades das virtudes. E, primeiro, do meio-termo das virtudes. Segundo
da conexão das virtudes. Terceiro, da qualidade delas. Quarto, da duração das
mesmas.
Sobre a primeira questão
discutem-se quatro artigos:
Art. 1 — Se a virtude
moral consiste num meio-termo.
Art. 2 — Se o meio-termo da
virtude moral é o meio-termoda razão ou o da coisa.
Art. 3 — Se as virtudes
intelectuais consistem num meio-termo.
Art. 4 — Se a virtude
teológica consiste num meio-termo.
Art.
1 — Se a virtude moral consiste num meio-termo.
([1])
O primeiro discute-se
assim. — Parece que a virtude moral não consiste num meio-termo.
1. — Pois, a noção de
termo último repugna a de termo médio. Ora, da essência da virtude é ser termo
último, conforme a opinião de Aristóteles, que a virtude é, na potência, o
último ([2]).
Logo, a virtude moral não consiste num meio termo.
2. Demais. — O máximo não
é médio. Ora, certas virtudes morais tendem ao máximo; assim, a magnanimidade
versa sobre as honras máximas, e a magnificência, sobre as máximas despesas,
como se disse2. Logo, nem toda virtude moral consiste num meio termo.
3. Demais. — Se é da
essência da virtude moral consistir num meio-termo, necessariamente ela deve
destruir-se e não aperfeiçoar-se; quando tende para um extremo. Ora, algumas
virtudes morais se aperfeiçoam tendendo para o extremo; tal o caso da
virgindade, que tende para o extremo, abstendo-se de todo prazer venéreo e
constituindo assim a castidade perfeitíssima; e em dar tudo aos pobres consiste
a misericórdia perfeitíssima ou liberalidade. Logo, não é da essência da
virtude moral consistir num meio-termo.
Mas, em contrário, diz o
Filósofo, que a virtude é um hábito electivo consiste num meio-termo ([3]).
Como do
sobredito resulta ([4]),
a virtude por essência ordena o homem para o bem. E a virtude moral,
propriamente, aperfeiçoa parte da alma em relação a uma determinada matéria.
Ora, a medida e a regra do movimento apetitivo em relação aos objectos de
apetição é a razão. Por outro lado, o bem de tudo o sujeito à medida e à regra
consiste em conformar-se com a sua regra; assim, o bem das coisas artificiadas
está em seguir a regra da arte. E por consequência, nesses casos, o mal consiste
na discordância da regra ou medida própria; o que se pode dar por sobre-excedência
ou deficiência em relação à medida, como se vê manifestamente em tudo o medido
ou regulado. E portanto, é claro que o bem da virtude moral consiste numa
adequação com a medida da razão. Ora, é claro que, entre um excesso e um
defeito, o meio-termo é a igualdade ou conformidade. Por onde é manifesto que a
virtude moral consiste num meio-termo.
DONDE A RESPOSTA À
PRIMEIRA OBJECÇÃO.
— A virtude moral tira a sua bondade da regra racional; e
tem como matéria as paixões ou operações. Ora, se compararmos a virtude moral
com a razão, a sua conformidade com esta coloca-a num como extremo, ocupando o
outro extremo a não conformidade com a razão, por excesso ou por defeito. Se porém
considerarmos a matéria da virtude moral, ela constitui um meio-termo, porque
reduz a paixão à regra racional. E por isso, o Filósofo diz, que a virtude é,
por substância, um termo médio ([5]),
enquanto impõe a sua regra à matéria própria; por outro lado, enquanto sendo o
que é óptimo e bom, i. é, enquanto conforme com a razão, ocupa um extremo.
RESPOSTA À SEGUNDA.
— O
médio e o extremo dos actos e das paixões dependem de diversas circunstâncias. Donde,
nada impede constitua uma virtude um extremo, quanto a uma circunstância, e um
meio, quanto a outras circunstâncias, pela sua conformidade com a razão. Tal é
caso da magnificência e da magnanimidade. Pois, se levarmos em conta a
quantidade absoluta do objecto para que tende o magnífico e o magnânimo, essas
virtudes constituem um extremo e um máximo. Mas, se o considerarmos em relação
a outras circunstâncias, constituirão um meio; pois tendem para um máximo que é
a conformidade com a regra da razão e consiste em agir onde, quando e por causa
do que importa; constituirão um excesso se tenderem para um máximo consistente
em agir quando, onde ou por causa do que importa; e, enfim, um defeito se não
tenderem para um máximo consistente em agir onde e quando é necessário. E é
isto que diz o Filósofo: o magnânimo, pela sua magnanimidade, está constituído
num extremo; mas por agir como deve, está num meio-termo ([6]).
RESPOSTA À TERCEIRA.
— O
que dizemos da magnanimidade dizemos também da virgindade e da pobreza. Pois, a
virgindade abstém-se de todos os prazeres venéreos, e a pobreza, de todas as
riquezas, por causa do que e segundo o que isso é necessário, a saber, segundo
a ordem de Deus e por causa da vida eterna. E se isso se der por obediência ao
que não deve ser, i. é, por alguma superstição ilícita ou ainda por vanglória,
teremos agido inutilmente. Se, por outro lado, o fizermos quando não é
necessário ou por obediência indevida, haverá vício por defeito, como o
manifestam os transgressores do voto de virgindade ou de pobreza.
(Revisão
da versão portuguesa por AMA)
[1] (IIª-IIªe,
q. 17, a. 5, ad 2 ; III Sent., dist. XXXIII, q. 1, a. 3, qª 1 De Virtut., q. 1,
a. 13; q. 4. a_ 1, ad 7 ; II Ethic., lect. VI, VII).
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.