Art.
3 — Se o carácter sacramental é o carácter de Cristo.
O terceiro discute-se assim. — Parece
que o carácter sacramental não é o carácter de Cristo.
1. — Pois, diz o Apóstolo: Não
entristeçais ao Espírito Santo de Deus, no qual estais selados. Ora, a
sinalação é implicada pelo nome mesmo de carácter. Logo, o carácter sacramental
deve ser atribuído antes ao Espírito Santo, que a Cristo.
2. Demais. — O carácter tem natureza
de sinal. Ora, o sinal da graça é o conferido pelos sacramentos. Mas a graça é
infundida na alma por toda a Trindade, donde o dizer a Escritura: O Senhor dará
a graça e a glória. Logo, parece que o carácter sacramental não deve ser especialmente
atribuído a Cristo.
3. Demais. — Quem recebe um carácter é
para se distinguir dos outros. Ora, a distinção entre os santos e os demais se
faz pela caridade, que só distingue entre os filhos do reino e os filhos da
perdição, no dizer de Agostinho. Por isso, como refere à Escritura, diz-se dos
filhos da perdição que têm o carácter da besta. Ora, a caridade não é atribuída
a Cristo, mas antes ao Espírito Santo conforme àquilo do Apóstolo: A caridade
de Deus está derramada em nossos corações pelo Espírito Santo, que nos foi
dado. Ou ainda ao Padre, conforme outro lugar do Apóstolo: A graça de Nosso
Senhor Jesus Cristo e, a caridade de Deus. Logo, parece que não se deve
atribuir a Cristo o carácter sacramental.
Mas, em contrário, certos definem o
carácter: O carácter é a distinção impressa pelo carácter eterno na alma
racional, segundo uma imagem que, sendo uma trindade criada, é o sinal da
Trindade criadora e conservadora, e que distingue, mediante o estado da fé, dos
que não têm essa imagem. Ora, o carácter eterno é Cristo mesmo, segundo aquilo
do Apóstolo: O qual, sendo o resplendor da glória e a figura, ou o carácter, da
sua substância. Logo, parece que o carácter se deve propriamente atribuir a
Cristo.
Como do sobredito se infere
o carácter é propriamente um sinal que marca alguém como devendo ordenar-se a
um certo fim. Assim, o dinheiro é marcado com um carácter para o fim das trocas;
e os soldados são marcados por um carácter, como destinados à milícia. Ora, um
fiel é ordenado a um duplo destino. - Primeiro e principalmente, para o gozo da
glória. E para isso é marcado com o sinal da graça, segundo aquilo da
Escritura: Com um thau marca as testas dos homens que gemem e que se doem. E
noutro lugar: Não faças mal à terra nem ao mar, nem às árvores, até que
assinalemos os servos do nosso Deus nas suas testas. - Depois, cada fiel é
destinado a receber ou a comunicar aos outros o concernente ao culto de Deus.
E a isso é propriamente destinado o carácter sacramental. Pois, todo o rito da
religião cristã deriva do sacerdócio de Cristo. Por onde, é manifesto que o carácter
sacramental e especialmente o carácter de Cristo, a cujo sacerdócio se
assemelham os fiéis pelos caracteres sacramentais, que outra causa não são
senão umas participações do sacerdório de Cristo, derivadas do próprio Cristo.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. —
O Apóstolo, no lugar aduzido, refere-se ao sinal pelo qual alguém é
destinado à glória futura, conferida pela graça. O qual é atribuído ao Espírito
Santo enquanto Deus, movido de amor, confere-nos gratuitamente um dom, o que
implica a graça; pois o Espírito Santo é amor. Donde o dizer o Apóstolo: Há
repartição de graças, mas um mesmo é o Espírito.
RESPOSTA À SEGUNDA. — O carácter
sacramental é uma realidade, em respeito do sacramento exterior; e é um
sacramento, em respeito do efeito último. Por isso, de dois modos podemos fazer
uma atribuição ao carácter. - Primeiro, enquanto sacramento. E deste modo, é o
sinal da graça invisível, que confere. - De outro modo, levando em conta a
idéia mesma do carácter. E então, um sinal que configura a um ser principal,
onde reside a autoria daquilo a que é alguém destinado. Assim, os soldados,
destinados à luta são marcados com os sinais do chefe, pelo que de certo modo,
com ele se configuram. E assim, os destinados ao culto cristão, cujo autor é
Cristo, recebem o carácter pelo qual se configuram com Cristo, a quem pois
propriamente pertence o carácter.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Pelo carácter
se distingue uma pessoa de outra por comparação a algum fim a que se ordena,
ela que recebeu o carácter. Assim o dissemos a respeito do caráter militar,
pelo qual, relativamente à luta, se distingue o soldado do rei do soldado do
inimigo. E semelhantemente, o carácter dos fiéis é o pelo qual se distinguem,
os fiéis de Cristo dos servos do diabo, quer em relação à vida eterna, quer em
relação ao culto da Igreja presente. E dessas finalidades a primeira resulta da
caridade e da graça, como o diz com procedência a objeção. E a segunda, do carácter
sacramental. Por onde e ao contrário, pelo carácter da besta podemos entender:
ou a malícia obstinada, pela qual certos são destinados à pena eterna; ou a
prática de um culto ilícito.
Nota: Revisão da versão portuguesa por
ama.