Questão
62: Do efeito principal dos Sacramentos, que é a graça.
Art.
2 — Se a graça sacramental faz algum acréscimo à graça das virtudes e à dos
dons.
O segundo discute-se assim. — Parece que
a graça sacramental nada acrescenta à graça das virtudes e à dos dons.
1. — Pois, pela graça das virtudes e
dos dons a alma se aperfeiçoa suficientemente, tanto na sua essência como nas
suas potências, conforme resulta do que foi dito na Segunda Parte. Ora, a graça
se ordena à perfeição da alma. Logo, a graça sacramental nada pode acrescentar
à graça das virtudes e dos dons.
2. Demais. — Os defeitos da alma são
causados pelo pecado. Ora, todos os pecados são suficientemente evitados pela
graça das virtudes e dos dons; pois, não há nenhum pecado que não contrarie alguma
virtude. Logo, a graça sacramental, ordenada a purificar a alma dos seus
defeitos, nada pode acrescentar à graça das virtudes e dos dons.
3. Demais. — Toda a adição ou subtracção na forma faz variar a espécie, como diz
Aristóteles. Se, pois, a graça sacramental faz algum acréscimo à graça das
virtudes e dos dons, segue-se que a palavra graça é empregada em sentido
equívoco. E assim, nada se nos afirma de certo em dizer-se que os sacramentos
causam a graça.
Mas, em contrário, se a graça
sacramental nada acrescenta à graça dos dons e das virtudes, em vão se
conferenciam os sacramentos aos que têm os dons e as virtudes. Logo, parece que
graça sacramental algo acrescenta à graça das virtudes e dos dons.
Como dissemos na Segunda
Parte, a graça, em si mesmo considerada, aperfeiçoa a essência da alma,
fazendo-a participar de certo modo da semelhança do ser divino. E assim como da
essência da alma emanam as suas potências, assim da graça efluem certas
perfeições para as potências da alma, chamadas virtudes e dons, que aperfeiçoam
essas potências em relação aos seus actos. Ora, os sacramentos se ordenam a alguns
efeitos especiais necessários à vida cristã. Assim, o baptismo se ordena de
algum modo à regeneração especial pela qual o homem morre aos vícios e se torna
membro de Cristo; e esse é um efeito especial, além dos actos das potências da
alma. E o mesmo se dá com os outros sacramentos. Portanto, assim como as
virtudes e os dons acrescentam à graça comum uma certa perfeição
determinadamente ordenada aos actos próprios das potências, assim também a
graça sacramental acrescenta à graça comum e às virtudes e aos dons um certo
auxílio divino para se conseguir o fim do sacramento. E deste modo a graça sacramental
algo acrescenta à graça das virtudes e dos dons.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO.
— A graça das virtudes e a dos dons aperfeiçoa suficientemente a essência e as
potências da alma em relação aos actos a que geralmente se ordenam. Mas para
certos efeitos especiais, necessários à vida cristã, é preciso a graça
sacramental.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Com as virtudes
e os dons evitamos suficientemente os vícios e os pecados presentes e futuros,
porque essas virtudes e esses dons nos fortalecem para os evitarmos. Mas,
quanto aos pecados pretéritos que, como actos, já passaram, permanecendo porém,
quanto ao reato, os sacramentos conferem ao homem um remédio especial.
RESPOSTA À TERCEIRA. — A noção de
graça sacramental está para a graça comumente chamada, como a noção de espécie
para a de género. Donde, assim como a palavra animal, comumente usada e tomada
para significar o homem, não se emprega em sentido equívoco, assim também em
sentido equívoco não se emprega a graça usada na significação comum e a graça
sacramental.
Nota: Revisão da versão portuguesa por
ama.
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