04/01/2018

Leitura espiritual

Jesus Cristo o Santo de Deus

CAPÍTULO I

«SEMELHANTE A NÓS EM TUDO, EXCEPTO NO PECADO»

A santidade da humanidade de Cristo

4. Santificados em Cristo Jesus

Passemos agora a considerar aquilo que a santidade de Cristo significa para nós e exige de nós.
Noutras palavras, passemos do querigma a parénese, daquilo que está feito àquilo que se deve fazer.
Mas, antes de tudo, eis uma boa nova.
Existe de facto, uma boa notícia e uma alegre nova a propósito da santidade de Cristo, e esta alegre nova, que agora queremos receber, não é tanto porque Jesus é o Santo de Deus, ou o facto de que também nós devemos ser santos e puros, mas sim que Jesus nos comunica, nos dá a Sua santidade; que a Sua santidade é também a nossa.
Mais ainda: que Ele mesmo é a nossa santidade.
Está escrito, na verdade, que Ele mesmo Se tornou, para nós, sabedoria, santificação e redenção. [i]

Cada pai pode transmitir aos filhos aquilo que tem, mas não aquilo que é.
Se o pai for um artista, um cientista, ou até mesmo um santo, não quer dizer que os filhos nasçam também artistas, cientistas e santos.
O mais que ele pode fazer é que os filhos apreciem estas coisas, e ensinar-lhas, mas não transmitir-lhas como se de uma hereditariedade se tratasse.
Pelo contrário, no baptismo, Jesus não só nos transmite aquilo que tem, mas também aquilo que é.
Ele é santo e faz-nos santos; é Filho de Deus e faz-nos filhos de Deus.

Depois de termos contemplado a santidade e impecabilidade de Cristo, resta-nos, pois, apropriar-nos ou fazer nossa tão maravilhosa santidade; revestir-nos dela e cobrir-nos também nós «com o manto da justiça» [ii].
Foi escrito que «aquilo que é de Cristo é mais pertença nossa do que aquilo que é nosso» [iii].
De facto, como pertencemos a Cristo mais que a nós próprios, [iv] assim, reciprocamente, Cristo pertence-nos em maior grau e é-nos mais íntimo que nós próprios.
Compreende-se, então, porque é que S. Paulo desejava ser julgado, não pela sua justiça ou santidade pessoal, mas pela santidade e justiça que brota da fé em Cristo, isto é, pela santidade que procede de Deus [v].
Considerava como sua, não a própria santidade, mas a de Cristo!

Chegámos, noutras palavras, à doutrina da graça de Cristo que distingue a fé cristã de qualquer outra fé e religião conhecidas.
Para ela, Cristo não é somente um sublime modelo de santidade, ou um simples «mestre de justiça», mas é infinitamente mais.
É a causa e forma da nossa santidade.
Para se compreender a novidade desta visão, pode ajudar uma comparação com outras religiões, por exemplo com o que sucede no budismo.
A libertação budista é uma libertação individual e incomunicável.
O discípulo não tem diante de si um modelo que possa ser objecto de repetição mística ou salvífica; não possui a graça.
Ele tem de encontrar a salvação em si próprio.
Buda fornece-lhe uma doutrina, mas não o assiste de modo algum na sua realização.
Pelo contrário, Jesus diz:
«Se o Filho vos libertar sereis verdadeiramente livres» [vi].
Não existe para o cristão uma autolibertação.
Se somos livres é porque somos libertados por Cristo.

Dizer que participamos da santidade de Cristo, é o mesmo que dizer que participamos do Espírito Santo, que provém dele.
Estar ou viver «em Cristo Jesus», equivale para S. Paulo, estar ou viver no «Espírito Santo».
«Nisto – escreve por sua vez São João – se conhece que nós permanecemos nele, e Ele em nós: pois que nos deu o Seu Espírito» [vii].
Cristo permanece em nós e nós permanecemos em Cristo, graças ao Espírito Santo.
Portanto, é o Espírito Santo que nos santifica.
Não o Espírito Santo em geral, mas o Espírito Santo que esteve em Jesus de Nazaré, que santificou a Sua humanidade, que se abrigou nele como num vaso de alabastro e que, no Pentecostes, derramou sobre a Igreja.
Por isso, a santidade que há em nós não é uma santidade diferente, ainda que operada pelo mesmo Espírito, mas é a mesma santidade de Cristo.
Nós somos verdadeiramente «santificados em Cristo Jesus» [viii].

(cont)

rainiero cantalamessa, Pregador da Casa Pontifícia.





[i] 1Cor 1,30
[ii] Is 61,10
[iii] N. Cabasillas, Vida em Cristo, IV, 6 (PG 150,613
[iv] 1Cor 6,19-20
[v] Fl 3,9
[vi] Jo 8,36
[vii] 1 Jo 4,13
[viii] 1 Cor 6,11

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