CAPÍTULO I
«SEMELHANTE A NÓS EM TUDO, EXCEPTO NO
PECADO»
A santidade da humanidade de Cristo
4. Santificados em Cristo Jesus
Passemos
agora a considerar aquilo que a santidade de Cristo significa para nós e exige
de nós.
Noutras
palavras, passemos do querigma a parénese, daquilo que está feito àquilo que se deve
fazer.
Mas,
antes de tudo, eis uma boa nova.
Existe
de facto, uma boa notícia e uma alegre nova a propósito da santidade de Cristo,
e esta alegre nova, que agora queremos receber, não é tanto porque Jesus é o
Santo de Deus, ou o facto de que também nós devemos ser santos e puros, mas sim
que Jesus nos comunica, nos dá a Sua santidade; que a Sua santidade é também a
nossa.
Mais
ainda: que Ele mesmo é a nossa santidade.
Está
escrito, na verdade, que Ele mesmo Se tornou, para nós, sabedoria, santificação e redenção. [i]
Cada
pai pode transmitir aos filhos aquilo que tem, mas não aquilo que é.
Se
o pai for um artista, um cientista, ou até mesmo um santo, não quer dizer que
os filhos nasçam também artistas, cientistas e santos.
O
mais que ele pode fazer é que os filhos apreciem estas coisas, e ensinar-lhas,
mas não transmitir-lhas como se de uma hereditariedade se tratasse.
Pelo
contrário, no baptismo, Jesus não só nos transmite aquilo que tem, mas também
aquilo que é.
Ele
é santo e faz-nos santos; é Filho de Deus e faz-nos filhos de Deus.
Depois
de termos contemplado a santidade e impecabilidade de Cristo, resta-nos, pois,
apropriar-nos ou fazer nossa tão maravilhosa santidade; revestir-nos dela e
cobrir-nos também nós «com o manto da justiça» [ii].
De
facto, como pertencemos a Cristo mais que a nós próprios, [iv]
assim, reciprocamente, Cristo pertence-nos em maior grau e é-nos mais íntimo
que nós próprios.
Compreende-se,
então, porque é que S. Paulo desejava ser julgado, não pela sua justiça ou
santidade pessoal, mas pela santidade e justiça que brota da fé em Cristo, isto
é, pela santidade que procede de Deus [v].
Considerava
como sua, não a própria santidade, mas a de Cristo!
Chegámos,
noutras palavras, à doutrina da graça de Cristo que distingue a fé cristã de
qualquer outra fé e religião conhecidas.
Para
ela, Cristo não é somente um sublime modelo de santidade, ou um simples «mestre
de justiça», mas é infinitamente mais.
É
a causa e forma da nossa santidade.
Para
se compreender a novidade desta visão, pode ajudar uma comparação com outras
religiões, por exemplo com o que sucede no budismo.
A
libertação budista é uma libertação individual e incomunicável.
O
discípulo não tem diante de si um modelo que possa ser objecto de repetição
mística ou salvífica; não possui a graça.
Ele
tem de encontrar a salvação em si próprio.
Buda
fornece-lhe uma doutrina, mas não o assiste de modo algum na sua realização.
Pelo
contrário, Jesus diz:
«Se
o Filho vos libertar sereis verdadeiramente livres» [vi].
Não
existe para o cristão uma autolibertação.
Se
somos livres é porque somos libertados por Cristo.
Dizer
que participamos da santidade de Cristo, é o mesmo que dizer que participamos
do Espírito Santo, que provém dele.
Estar
ou viver «em Cristo Jesus», equivale para S. Paulo, estar ou viver no «Espírito
Santo».
«Nisto
– escreve por sua vez São João – se conhece que nós permanecemos nele, e Ele em
nós: pois que nos deu o Seu Espírito» [vii].
Cristo
permanece em nós e nós permanecemos em Cristo, graças ao Espírito Santo.
Portanto,
é o Espírito Santo que nos santifica.
Não
o Espírito Santo em geral, mas o Espírito Santo que esteve em Jesus de Nazaré,
que santificou a Sua humanidade, que se abrigou nele como num vaso de alabastro
e que, no Pentecostes, derramou sobre a Igreja.
Por
isso, a santidade que há em nós não é uma santidade diferente, ainda que
operada pelo mesmo Espírito, mas é a mesma santidade de Cristo.
(cont)
rainiero cantalamessa, Pregador da Casa Pontifícia.
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