27/11/2016

Tratado da vida de Cristo 136

Questão 49: Dos efeitos da paixão de Cristo

Art. 4 — Se pela Paixão de Cristo fomos reconciliados com Deus.

O quarto discute-se assim. — Parece que pela Paixão de Cristo não fomos reconciliados com Deus.

1. — Pois, a reconciliação não tem lugar entre amigos. Ora, Deus sempre nos amou, como o diz a Escritura: Tu amas todas as causas que existem e não aborreces nada de quanto fizeste. Logo, a Paixão de Cristo não nos reconciliou com Deus.

2. Demais. — Não pode o princípio também ser efeito; e por isso a graça, que é o princípio do mérito, não é susceptível de mérito. Ora, o amor de Deus foi o princípio da Paixão de Cristo, segundo o Evangelho: Assim amou Deus ao mundo que lhe deu a seu Filho unigénito. Logo parece que pela Paixão de Cristo não fomos reconciliados com Deus, de modo que ele então começasse a amar-nos de novo.

3. Demais. — A Paixão de Cristo cumpriu-se mediante os que o mataram, que assim gravemente ofenderam a Deus. Logo, a Paixão de Cristo é antes a causa da Indignação de Deus que a da reconciliação com ele.

Mas, em contrário, diz o Apóstolo: Fomos reconciliados com Deus pela morte do seu Filho.

A Paixão de Cristo é a causa da nossa reconciliação com Deus, de dois modos. — Primeiro, porque remove o pecado pelo qual os homens são constituídos inimigos de Deus, segundo a Escritura: Deus igualmente aborreceu ao ímpio e a sua impiedade. E noutro lugar: Aborreces a todos os que obram a iniquidade. - De outro modo, como sacrifício muito aceite de Deus. Pois, o efeito próprio do sacrifício é aplacar a Deus; assim como perdoamos a ofensa cometida contra nós quando recebemos um serviço que nos é prestado. Donde o dizer a Escritura: Se o Senhor te incita contra mim, receba ele o cheiro do sacrifício. Semelhantemente, o ter Cristo sofrido voluntariamente foi um bem tão grande, que em razão desse bem descoberto na natureza humana, Deus se aplacou no tocante a qualquer ofensa do género humano, contanto que o homem se una com a Paixão de Cristo, do modo referido.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — Deus ama em todos os homens a natureza que ele mesmo fez. Odeia-os, porém por causa da culpa que contra ele cometeram, segundo a Escritura: Aborrece o Altíssimo aos pecadores.

RESPOSTA À SEGUNDA. — Não se diz que a Paixão de Cristo nos reconciliou com Deus porque de novo nos começasse a amar, pois está na Escritura: Com amor eterno te amei. Mas porque a Paixão de Cristo eliminou a causa do ódio, quer por ter delido o pecado, quer pela compensação de um bem mais aceitável.

RESPOSTA À TERCEIRA. — Assim como os imoladores de Cristo foram homens, assim também Cristo, o morto, era homem. Mas foi maior a caridade de Cristo padecente que a iniquidade dos que o mataram. Por isso a Paixão de Cristo foi mais valiosa para reconciliar Deus com todo o género humano do que para lhe provocar as iras.

Nota: Revisão da versão portuguesa por ama.



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