Leitura Espiritual Temas actuais do cristianismo |
São Josemaria Escrivá
34
pergunta:
Algumas
pessoas têm afirmado às vezes que o Opus Dei é organizado internamente segundo
as normas das sociedades secretas.
Que
se deve pensar de tal afirmação?
Poderia
dar-nos, a propósito dista, uma ideia da mensagem que desejou dirigir aos
homens do nosso tempo ao fundar a Obra em 1928?
resposta:
Desde
1928 não tenho deixado de pregar que a santidade não está reservada a
privilegiados, que todos os caminhos da Terra podem ser divinos, porque o cerne
da espiritualidade específica do Opus Dei é a santificação do TRABALHO.
É
preciso acabar com o preconceito de que os fiéis correntes não podem senão
limitar-se a ajudar o clero, em apostolados eclesiásticos; e fazer notar que,
para alcançar esse fim sobrenatural, os homens têm necessidade de ser e de se
sentir pessoalmente livres, com a liberdade que Jesus Cristo ganhou para nós.
Para
pregar e ensinar a praticar esta doutrina, nunca tive necessidade de segredo
algum.
Os
membros da Obra detestam o segredo, porque são fiéis correntes, pessoas
exactamente iguais às outras: ao entrarem para o Opus Dei não mudam de estado.
Repugnar-lhes-ia
trazer um letreiro nas costas que dissesse: “Reparem que estou dedicado ao
serviço de Deus”.
Isto
não seria nem laical nem secular.
Mas
os conhecidos e amigos dos sócios do Opus Dei sabem que eles fazem parte da
Obra, porque o não dissimulam, ainda que o não apregoem.
35
pergunta:
Poderia
traçar um rápido esquema da estrutura do Opus Dei à escala mundial e da sua
articulação com o Conselho Geral a que preside em Roma?
resposta:
O
Conselho Geral tem o seu domicílio em Roma, independente para cada Secção: a de
homens e a de mulheres (“Anuário Pontifício” de 1966, págs. 885 e 1226); e em
cada país existe um organismo análogo, presidido pelo Conselheiro nessa nação [i].
Não
pense numa organização poderosa, estendida capilarmente até ao último recanto
do Mundo.
Imagine
antes uma organização desorganizada, pois o trabalho dos directores do Opus Dei
destina-se principalmente a fazer com que chegue a todos os seus membros o
espírito genuíno do Evangelho - espírito de caridade, de convivência, de
compreensão, absolutamente alheio ao fanatismo - mediante uma sólida e adequada
formação teológica e apostólica.
Depois,
cada um actua com inteira liberdade pessoal e, formando de modo autónomo a sua
própria consciência, esforça-se por procurar a perfeição cristã e cristianizar
o seu ambiente, santificando o seu próprio trabalho intelectual ou manual, em
todas as circunstâncias da sua vida e no seu próprio lar.
Por
outro lado, a direcção da Obra é sempre colegial.
Detestamos
a tirania, especialmente neste governo exclusivamente espiritual do Opus Dei.
Amamos
a pluralidade: o contrário não conduziria senão à ineficácia, a não fazer nem
deixar fazer, a não progredir.
36
pergunta:
O
ponto 484 do seu código religioso, Caminho, precisa: “Sê instrumento”.
Que
sentido se deve atribuir a esta afirmação dentro do contexto das perguntas
precedentes?
resposta:
Caminho,
um código?
Não!
Escrevi
em 1934 uma boa parte deste livro, resumindo para todas as almas que dirigia -
do Opus Dei ou não - a minha experiência sacerdotal.
Não
suspeitei que trinta anos mais tarde alcançaria uma difusão tão ampla - milhões
de exemplares - em tantas línguas.
Não
é um livro somente para os sócios do Opus Dei; é para todos, mesmo para os não
cristãos.
Caminho
deve ser lido com um mínimo de espírito sobrenatural, de vida interior e de
preocupação apostólica.
Não
é um código do homem de acção.
Pretende
ser um livro que leva a viver na intimidade de Deus e a amá-lo, e a servir
todas as almas: a ser um instrumento - era esta a sua pergunta - como o
Apóstolo Paulo queria sê-lo de Cristo.
Instrumento
livre e responsável; aqueles que querem ver nas suas páginas uma finalidade
temporal, enganam-se.
Não
se esqueça que é corrente, nos autores espirituais de todos os tempos,
considerar as almas como instrumentos nas mãos de Deus.
37
pergunta:
A
Espanha ocupa um lugar de preferência na Obra?
Pode
considerar-se como ponto de partida dum programa mais ambicioso, ou um simples
sector de actividade entre muitos outros?
resposta:
A
Espanha não é senão um dos 65 países em que há sócios do Opus Dei, e os
espanhóis são uma minoria.
Geograficamente,
o Opus Dei nasceu na Espanha; mas o seu fim é universal desde o princípio.
De
resto, eu resido em Roma há vinte anos.
38
pergunta:
O
facto de alguns membros da Obra estarem presentes na vida pública do país, não
politizou, de certo modo, o Opus Dei em Espanha? Não comprometem, assim, a Obra
e a própria Igreja?
resposta:
Nem
em Espanha, nem em nenhum outro sítio!
Insisto
em que os sócios do Opus Dei trabalham com plena liberdade e sob a sua
responsabilidade pessoal, sem comprometer nem a Igreja nem a Obra, porque não
se apoiam nem na Igreja nem na Obra para realizarem as suas actividades
pessoais.
Pessoas
formadas numa concepção militar do apostolado e da vida espiritual tenderão a
ver no trabalho livre e responsável dos cristãos um modo de actuar colectivo.
Mas
digo-lhe, como não me tenho cansado de repetir desde 1928, que a diversidade de
opiniões e de comportamentos no terreno temporal e no campo teológico opinável
não constitui problema algum para a Obra: a diversidade que existe e existirá
sempre entre os sócios do Opus Dei é, pelo contrário, uma manifestação de bom
espírito, de vida honesta, de respeito pelas opiniões legítimas de cada um.
39
pergunta:
Não
lhe parece que em Espanha, e em virtude do particularismo inerente à raça
ibérica, um certo sector da Obra poderia ser tentado a utilizar o seu poder
para satisfazer interesses particulares?
resposta:
Levanta
uma hipótese que me atrevo a garantir que nunca se apresentará na nossa Obra,
não só porque nos associamos exclusivamente para fins sobrenaturais, mas ainda
porque, se alguma vez um membro do Opus Dei quisesse impor, directa ou
indirectamente, um critério temporal aos outros, ou servir-se deles para fins
humanos, seria expulso sem contemplações, porque os outros sócios se
revoltariam legitimamente, santamente.
40
pergunta:
Em
Espanha, o Opus Dei orgulha-se de reunir pessoas de todas as classes sociais.
Esta
afirmação é válida também para o resto do Mundo, ou deve admitir-se que nos
outros países os sócios do Opus Dei procedem antes de meios ilustrados, como os
estados-maiores da Indústria, da Administração, da Política e das Profissões
Liberais?
resposta:
De
facto, pertencem ao Opus Dei, tanto em Espanha como em todo o mundo, pessoas de
todas as condições sociais: homens e mulheres, velhos e jovens, operários,
industriais, empregados, camponeses, representantes das profissões liberais,
etc.
A
vocação é Deus quem a dá e para Deus não há acepção de pessoas.
Mas
o Opus Dei não se orgulha de coisa nenhuma: não e às forças humanas que as
obras de apostolado devem o seu crescimento, é ao sopro do Espírito Santo.
Numa
associação com fins temporais, é lógico publicar estatísticas que ostentem o
número, a condição e as qualidades dos sócios, e assim costumam fazer as
organizações que buscam prestígio temporal; mas este modo de actuar, quando se
procura a santificação das almas, favorece a soberba colectiva: ora Cristo quer
a humildade para cada um dos cristãos e para todos os cristãos.
Entrevista realizada por
Jacques-Guillemé-Brûlon, publicada em Le Figaro (Paris) em 16 de Maio de 1966.
(cont)
[i]
Cfr. nota ao n.º 19. A erecção do Opus Dei
como Prelatura pessoal reforçou juridicamente a unidade do Opus Dei, ficando
muito claro que toda a Prelatura - homens e mulheres, sacerdotes e leigos,
casados e solteiros - constitui uma unidade pastoral orgânica e indivisível,
que realiza os seus apostolados por meio da Secção de varões e da Secção
feminina, sob o governo e a direcção do Prelado que, ajudado pelos seus
Vigários e pelos seus Conselhos, dá e assegura a unidade fundamental de espírito
e de jurisdição entre as duas Secções.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.