Leitura Espiritual Temas actuais do cristianismo |
São Josemaria Escrivá
21 (cont)
Explicar-me-ei
melhor com um exemplo.
Em
1932, comentando, num documento dirigido aos meus filhos do Opus Dei, alguns
dos aspectos e consequências da dignidade e responsabilidade peculiares que o
Baptismo confere às pessoas, escrevi: “impõe-se repelir o preconceito de que os
fiéis correntes não podem fazer mais do que ajudar o clero, em apostolados
eclesiásticos.
O
apostolado dos seculares não tem de ser sempre uma simples participação no
apostolado hierárquico: compete-lhes o dever de fazer apostolado.
E
isto não é porque recebam uma missão canónica, mas por serem parte da Igreja;
essa missão... realizam-na através da profissão, do ofício, da família, dos
colegas, dos amigos”.
Hoje,
depois dos ensinamentos solenes do Vaticano II, ninguém na Igreja porá em
dúvida a ortodoxia desta doutrina.
Mas,
quantos abandonaram realmente a sua concepção única do apostolado dos leigos
como um trabalho pastoral organizado de cima para baixo?
Quantos,
superando a anterior concepção monolítica do apostolado laical, compreendem que
ele possa e inclusivamente deva também existir sem necessidade de rígidas
estruturas centralizadas, missões canónicas e mandatos hierárquicos?
Quantos,
que qualificam o laicado de longa manus
Ecclesiae, não estarão a confundir ao mesmo tempo o conceito de Igreja-Povo
de Deus com o conceito mais limitado de Hierarquia?
Ou
ainda, quantos leigos entendem devidamente que só em delicada comunhão com a
Hierarquia têm direito a reivindicar o seu âmbito legítimo de autonomia
apostólica?
Poder-se-iam
formular considerações semelhantes em relação a outros problemas, porque é
realmente muito, muitíssimo, o que está ainda por conseguir, tanto na
necessária exposição doutrinal, como na educação das consciências e na própria
reforma da legislação eclesiástica.
Peço
muito ao Senhor - a oração sempre foi a minha grande arma - que o Espírito
Santo assista ao seu Povo, e especialmente à Hierarquia, na realização destas
tarefas. E peço-Lhe também que continue a servir-Se do Opus Dei, para que
possamos contribuir e ajudar, em tudo o que estiver ao nosso alcance, neste
difícil mas maravilhoso processo de desenvolvimento e crescimento da Igreja.
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Como
se insere o Opus Dei no Ecumenismo? - perguntava-me também.
Já
contei, no ano passado, a um jornalista francês - e sei que encontrou eco,
inclusivamente, em publicações de irmãos separados - o que uma vez disse ao
Santo Padre João XXIII, movido pelo encanto afável e paterno do seu trato:
“Santo
Padre, na nossa Obra, todos os homens, católicos ou não, encontraram sempre um
ambiente acolhedoresposta: não aprendi o ecumenismo de Vossa Santidade”.
Ele
riu-se emocionado, porque sabia que, já desde 1950, a Santa Sé tinha autorizado
o Opus Dei a receber como associados Cooperadores os não católicos e até os não
cristãos.
São
muitos, efectivamente - e entre eles contam-se pastores e até bispos das suas
respectivas confissões -, os irmãos separados que se sentem atraídos pelo
espírito do Opus Dei e colaboram nos nossos apostolados.
E
são cada vez mais frequentes - à medida que os contactos se intensificam - as
manifestações de simpatia e de cordial entendimento, resultantes de os sócios
do Opus Dei centrarem a sua espiritualidade no simples propósito de viver com
sentido de responsabilidade os compromissos e exigências baptismais do cristão.
O
desejo de procurar a plenitude da vida cristã e de fazer apostolado, procurando
a santificação do trabalho profissional; a vida imersa nas realidades
seculares, respeitando a sua própria autonomia, mas tratando-as com espírito e
amor de almas contemplativas; a primazia que na organização dos nossos
trabalhos concedemos à pessoa, à acção do Espírito nas almas, ao respeito da
dignidade e da liberdade que provêm da filiação divina do cristão; a defesa
contra a concepção monolítica e institucionalista do apostolado dos leigos, da
legítima capacidade de iniciativa, adentro do necessário respeito pelo bem
comum: estes e outros aspectos mais, do nosso modo de ser e trabalhar, são
pontos de fácil encontro, onde os irmãos separados descobrem - feita vida,
experimentada pelos anos - uma boa parte dos princípios doutrinários em que
eles e nós, os católicos, pomos fundamentadas esperanças ecuménicas.
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pergunta:
Mudando
de tema, gostaríamos de saber o que pensa em relação ao actual momento da Igreja.
Concretamente,
como o qualificaria?
Que
papel julga poderem ter, neste momento, as tendências que de modo geral têm
sido chamadas “progressistas” e “integristas”?
resposta:
A
meu ver, o actual momento da Igreja poderia qualificar-se de positivo, e, ao
mesmo tempo, de delicado, como todas as crises de crescimento.
Positivo,
sem dúvida, porque as riquezas doutrinais do Concílio Vaticano II colocaram a
Igreja inteira - todo o Povo sacerdotal de Deus - perante uma nova etapa,
sumamente esperançosa, de renovada fidelidade ao propósito divino da salvação
que se lhe confiou.
Momento
delicado também, porque as conclusões teológicas a que se chegou não são de
carácter - passe a expressão - abstracto ou teórico: trata-se de uma teologia
sumamente viva, quer dizer, com imediatas e directas aplicações de ordem
pastoral, ascética e disciplinar, que chegam ao mais íntimo da vida interna e
externa da comunidade cristã - liturgia, estruturas orgânicas da Hierarquia,
formas apostólicas, Magistério, diálogo com o mundo, ecumenismo, etc. - e,
portanto, também da vida cristã e da própria consciência dos fiéis.
Uma
e outra destas realidades trazem respectivamente à nossa alma, por um lado, o
optimismo cristão - a jubilosa certeza de que o Espírito Santo fará frutificar
abundantemente a doutrina com que enriqueceu a Esposa de Cristo - e, ao mesmo
tempo, a prudência por parte de quem investiga ou governa, porque,
especialmente agora, a falta de serenidade ou de ponderação no estudo dos
problemas poderia ocasionar um dano imenso.
Quanto
às tendências a que chama integristas e progressistas na sua pergunta,
torna-se-me difícil dar opinião sobre o papel que podem desempenhar neste
momento, porque, desde sempre, repeli a conveniência e inclusivamente a
possibilidade de se poderem fazer catalogações ou simplificações deste tipo.
Essa
divisão - que às vezes é levada a extremos de verdadeiro paroxismo, ou se
procura perpetuar, como se os teólogos e os fiéis em geral estivessem
destinados a uma contínua orientação bipolar - parece-me que obedece, no fundo,
ao convencimento de que o progresso doutrinal e vital do Povo de Deus terá de
ser resultante de uma perpétua tensão dialéctica.
Eu,
pelo contrário, prefiro acreditar - com toda a minha alma - na acção do
Espírito Santo, que sopra onde quer e em quem quer.
Fim da entrevista realizada por Pedro
Rodríguez, publicada em Palabra (Madrid), Outubro de 1967
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pergunta:
Quererá
V. Rev.ª explicar qual a missão central e quais os objectivos do Opus Dei?
Em
que precedentes baseou as suas ideias sobre a Associação?
Ou
será o Opus Dei algo de único, de totalmente novo dentro da Igreja e da
Cristandade?
Será
lícito compará-lo com as Ordens Religiosas e com os Institutos Seculares, ou
com associações católicas do tipo, por exemplo, da Holy Name Society, dos
Caballeros de Colón ou do Christopher Movement?
resposta:
O
Opus Dei propõe-se promover, entre pessoas de todas as classes da sociedade, o
desejo da plenitude de vida cristã no meio do mundo. Isto é, o Opus Dei
pretende ajudar as pessoas que vivem no mundo - o homem vulgar, o homem da rua
- a levar uma vida plenamente cristã, sem modificar o seu modo normal de vida,
o seu TRABALHO habitual, nem os seus ideais e preocupações.
Por
isto se pode dizer, como escrevi há muitos anos, que o Opus Dei é velho como o
Evangelho e, como o Evangelho, novo.
Trata-se
de recordar aos cristãos as palavras maravilhosas que se lêem no Génesis: que
Deus criou o homem para TRABALHAR.
Pusemos
os olhos no exemplo de Cristo, que passou quase toda a sua vida terrena
trabalhando como artesão numa terra pequena.
O
trabalho não é apenas um dos mais altos valores humanos e um meio pelo qual os
homens hão-de contribuir para o progresso da sociedade; é também um caminho de
santificação.
A
que outras organizações poderíamos comparar o Opus Dei?
A
resposta não é fácil, porque, quando se querem comparar entre si organizações
com fins espirituais, corre-se o risco de ficar pelos traços exteriores ou
pelas denominações jurídicas, esquecendo o que mais importa - o espírito que dá
vida e razão de ser a toda a actividade.
Limitar-me-ei
a dizer-lhe que, no que diz respeito às que mencionou, a Obra está muito longe
das Ordens Religiosas e dos Institutos Seculares, e mais perto de instituições como
a Holy Name Society.
O
Opus Dei é uma organização internacional de leigos, a que pertencem também
sacerdotes diocesanos (minoria bem exígua em comparação com o total de
membros).
Os
seus membros são pessoas que vivem no mundo e nele exercem uma profissão ou
ofício.
Não
entram no Opus Dei para abandonar esse trabalho, mas, pelo contrário, para
encontrar uma ajuda espiritual que os leve a santificar o seu trabalho
quotidiano, convertendo-o também em meio de santificação, sua e dos outros.
Não
mudam de estado: continuam a ser solteiros, casados, viúvos, ou sacerdotes;
procuram, sim, servir Deus e os outros homens, dentro do seu próprio estado.
Ao
Opus Dei, não interessam votos nem promessas; o que pede aos seus sócios é que,
no meio das deficiências e erros, próprios de toda a vida humana, se esforcem
por praticar as virtudes humanas e cristãs, sabendo-se filhos de Deus.
Se
alguma comparação se quer fazer, a maneira mais fácil de entender o Opus Dei é
pensar na vida dos primeiros cristãos.
Eles
viviam profundamente a sua vocação cristã; procuravam muito a sério a perfeição
a que eram chamados, pelo facto, ao mesmo tempo simples e sublime, do Baptismo.
Não
se distinguem exteriormente dos outros cidadãos.
Os
membros do Opus Dei são como toda a gente: realizam um trabalho corrente; vivem
no meio do mundo conforme aquilo que são - cidadãos cristãos que querem
responder inteiramente às exigências da sua fé.
Entrevista realizada por Peter Forbarth,
correspondente de Time (New York), em 15 de Abril de 1967.
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