Páscoa
Evangelho:
Jo 12, 44-50
44
Jesus levantou a voz e disse: «Quem acredita em Mim, não é em Mim que acredita,
mas n'Aquele que Me enviou. 45 Quem Me vê a Mim, vê Aquele que Me enviou. 46 Eu
vim ao mundo como uma luz, para que todo o que crê em Mim não fique nas trevas.
47 Se alguém ouvir as Minhas palavras e não as guardar, Eu não o julgo, porque
não vim para julgar o mundo, mas para salvar o mundo. 48 Quem Me despreza e não
recebe as Minhas palavras, já tem quem o julgue; a palavra que anunciei, essa o
julgará no último dia. 49 Com efeito, Eu não falei por Mim mesmo, mas o Pai que
Me enviou, Ele mesmo Me prescreveu o que Eu devia dizer e ensinar. 50 Eu sei
que o Seu mandamento é a vida eterna. As coisas, pois, que digo, digo-as como
Meu Pai Me disse».
Comentário:
Pode parecer estranho mas, de facto, há muita
gente que prefere andar nas trevas.
Talvez não se dêem conta que, a pouca luz que
têm não lhes ilumina um caminho seguro e, muito menos, as obras que têm de
fazer para alcançar o que deve ser o supremo objectivo de todo o ser humano: a
salvação eterna!
Destes, muitos não sabem, desconhecem que há
uma outra luz que irradia de tal modo que ninguém que nela caminhe se perderá.
Mais, mesmo que por momentos ou até longos
períodos, se afastem do caminho conveniente, essa luz mantém sempre
distintamente claro o caminho a retomar.
O que temos a fazer, todos os cristãos, é
levar esta luz de Cristo Nosso Senhor, a todos os que nos rodeiam e, a melhor
forma de o fazer, é, estando na luz, irradia-la à nossa volta com o nosso
exemplo de vida.
(ama, comentário sobre Jo 12, 44-50, 2012.04.24)
Leitura espiritual
SANTO
AGOSTINHO – CONFISSÕES
CAPÍTULO
X
Que
fazia Deus antes da criação
Com certeza ainda estão
cheios do erro do velho homem os que nos dizem: “Que fazia Deus antes de criar
o céu e a terra?” – Se estava ocioso, se nada fazia, porque não continuou a
abster-se sempre de qualquer acção? Se em Deus apareceu um movimento novo, uma
vontade nova de dar o ser ao que ainda não tinha criado, como falar de uma
verdadeira eternidade se nela nasce uma vontade que não existia antes? Mas a
vontade de Deus não é uma criatura, é anterior a toda criatura; nenhuma criação
seria possível se a vontade do Criador não a precedesse. A vontade, portanto,
pertence à própria substância de Deus. Logo, se na substância de Deus nasce
algo que antes não existia, não se pode mais com verdade chamá-la eterna. E se,
desde toda eternidade, Deus quis a existência da criatura, porquê a criatura
também não é eterna?
CAPÍTULO
XI
Tempo
e eternidade
Os que assim falam não te
compreendem ainda, ó Sabedoria de Deus, luz das inteligências; não compreendem
ainda como é criado o que é criado por ti e em ti. Esforçam-se por saborear as
coisas eternas, mas o seu espírito voa ainda sobre as realidades passadas e
futuras. Quem poderá deter esse pensamento, quem o fixará por um momento, para
que tenha um rápido vislumbre do esplendor da eternidade imutável, e a compare
com os tempos impermanentes, para perceber que qualquer comparação é
impossível? Então veria que a sucessão dos tempos não é feita senão de uma
sequência infindável de instantes, que não podem ser simultâneos; que, pelo
contrário, na eternidade, nada é sucessivo, tudo é presente, enquanto o tempo
não pode ser de todo presente. Veria que todo o passado é repelido pelo futuro,
que todo o futuro segue o passado, que tanto o passado como o futuro tiram
o ser e
o seu curso daquele que é sempre presente. Quem poderá deter a inteligência
do homem para que pare e veja como a eternidade imóvel, que não é futura nem
passada, determina o futuro e o passado? Acaso poderá realizar isso a minha
mão? Ou esta minha língua, com a palavra, poderia realizar tal obra?
CAPÍTULO
XII
Deus
antes da criação
Eis minha resposta à
questão: “Que fazia Deus antes de criar o céu e a terra?” – não responderei
jocosamente como alguém para contornar a dificuldade do problema: “Preparava o
inferno para os que perscrutam esses mistérios profundos”. – Uma coisa é
compreender e outra é brincar. Não, essa não será minha resposta. Prefiro
dizer: “Não sei” – pois de facto não sei, que ridicularizar quem faz pergunta
tão profunda, ou louvar quem responde com sofismas.
Mas eu digo que tu, meu
Deus, és o Criador de toda criatura; e, se por céu e terra se entende toda a
criatura, não temo afirmar: “Antes que Deus criasse o céu e a terra, nada
fazia. De facto, se tivesse feito alguma coisa, o que poderia ser senão uma
criatura? Oxalá eu soubesse tudo o que desejo saber, como sei que nenhuma
criatura foi criada antes da criação.
CAPÍTULO
XIII
O
tempo antes da criação
Se algum espírito leviano,
vagando por tempos imaginários anteriores à criação, se admirar que o Deus
Todo-Poderoso, tu, que criaste e conservas todas as coisas, ó o autor do céu e
da terra, tenha-te mantido inactivo até ao dia da criação, por séculos sem
conta, que esse desperte e tome consciência do erro que gera a sua admiração.
Como, pois, poderiam transcorrer os séculos se tu, criador, ainda não os tinha
criado? E poderia o tempo fluir se não existisse? E como poderiam os séculos
passar, se jamais houvessem existido? Portanto, como és o criador de todos os
tempos – se é que houve algum tempo antes da criação do céu e da terra – como
se pode afirmar que ficaste ocioso? Pois também criaste esse mesmo tempo, e
este não poderia passar antes que o criasses.
Se porém, antes do céu e
da terra não havia tempo algum, porque perguntam o que fazias então? Não
poderia haver então se não existia o tempo.
Não é no tempo que és
anterior ao tempo: de outro modo não precederias a todos os tempos. Precedes
porém a todo o passado na altura da tua eternidade sempre presente; dominas
todo o futuro porque está por vir e que, quando chegar, já será passado.
Contudo, tu és sempre o mesmo, e teus anos não passam jamais. Os teus anos não
vão nem vêm; mas os nossos vão e vêm, para que todos possam existir. Os teus
anos existem simultaneamente, pois não fluem; não passam, não são expulsos
pelos que chegam, porque não passam. Os nossos, ao contrário, só existirão
todos quando não mais existirem. Os teus anos são como um só dia, e o teu dia
não é uma repetição quotidiana, é um perpétuo hoje, porque o teu hoje não cede
o lugar ao amanhã e nem sucede ao ontem. O teu hoje é a eternidade. Por isso
geraste um filho coeterno, a quem disseste: “Hoje te gerei” – Todos os tempos
são obra tua, e tu existes antes de todos os tempos; é pois inconcebível que
tenha existido tempo quando o tempo ainda não existia.
CAPÍTULO
XIV
Que
é o tempo?
Não houve, pois, tempo
algum em que nada fizesses, pois fizeste o próprio tempo. E nenhum tempo pode
ser coeterno contigo, pois és imutável; se, o tempo também o fosse, não seria
tempo. Que é pois o tempo? Quem poderia explicá-lo de maneira breve e fácil?
Quem pode concebê-lo, mesmo no pensamento, com bastante clareza para exprimir a
ideia com palavras? E no entanto, haverá noção mais familiar e mais conhecida
usada nas nossas conversações?
Quando falamos dele,
certamente compreendemos o que dizemos; o mesmo acontece quando ouvimos alguém
falar do tempo. Que é, pois, o tempo? Se ninguém me pergunta, eu sei; mas se
quiser explicar a quem indaga, já não sei. Contudo, afirmo com certeza e sei
que, se nada passasse, não haveria tempo passado; que se não houvesse os
acontecimentos, não haveria tempo futuro; e que se nada existisse agora, não
haveria tempo presente. Como então podem existir esses dois tempos, o passado e
o futuro, se o passado já não existe e se o futuro ainda não chegou? Quanto ao
presente, se continuasse sempre presente e não passasse ao pretérito, não seria
tempo, mas eternidade. Portanto, se o presente, para ser tempo, deve tornar-se
passado, como podemos afirmar que existe, se a sua razão de ser é aquela pela
qual deixará de existir? Por isso, o que nos permite afirmar que o tempo existe
é a sua tendência para não existir.
CAPÍTULO
XV
Tempo
longo, tempo breve
No entanto, dizemos que o
tempo é longo ou breve, o que só podemos dizer do passado e do futuro. Chamamos
longo, digamos, os cem anos passados, e longo, também, os cem anos posteriores
ao presente; um passado curto para nós, seriam os dez dias anteriores a hoje, e
breve futuro, os dez dias seguintes. Mas como pode ser longo ou curto o que não
existe? O passado não existe mais e o futuro não existe ainda. Por isso não
deveríamos dizer “o passado é longo” – mas o passado “foi longo” – e o futuro
“será longo”.
Senhor, que és a minha
luz, a tua verdade não escarnecerá também nisso o homem? Esse tempo passado,
foi longo quando já havia passado ou quando ainda estava presente? Porque ele
só podia ser longo enquanto existia alguma coisa que pudesse ser longa. Mas uma
vez passado, não existia mais: donde se conclui que não podia ser longo, porque
já deixara de existir. Não digamos, portanto: “O tempo passado foi longo” –
pois não encontraremos nada que pudesse ter sido longo; uma vez passado não
existe mais. Mas digamos: “O tempo presente foi longo” – porque só era longo
enquanto presente. Ainda não havia passado, ainda não havia deixado de existir,
e por isso era susceptível de ser longo. Mas logo que passou, deixou de ser longo,
porque cessou de existir.
Mas vejamos, ó alma
humana, se o tempo presente pode ser longo, porque foi-te dada a prerrogativa
de perceber e medir os momentos. Que me respondes? Por acaso cem anos presentes
são um tempo longo? Consideremos antes se cem anos podem ser presentes. Se for
o primeiro ano que corre, está presente; mas os outros noventa e nove ainda são
futuros, e portanto ainda não existem. Se estamos no segundo ano, já temos um
ano passado, o segundo presente e todos os outros no futuro. Desse período de
cem anos, seja qual for o ano que supomos presente, todos os que o precederam
serão passados, e todos os que estão por vir, futuros. Portanto, os cem anos
não podem estar simultaneamente presentes.
Vejamos agora se, pelo
menos, o ano em curso é presente. Se estamos no primeiro mês, os outros são
futuros. Como acima, se estamos no segundo, o primeiro será passado, e os
demais, futuros. Assim o ano que corre não está todo presente; e como não está
todo presente, não é portanto verdade dizer-se que o ano esteja presente. Um
ano compõe-se de doze meses, e seja qual for o mês considerado, será o único em
curso. Mas o mês em curso não é presente, mas somente o dia. Vale o que
dissemos antes: se estamos no primeiro dia, todos os outros são futuros; se
estamos no último, todos os outros são passados; se estamos entre um desses
dois dias, esse dia está entre os dias passados e os futuros.
Eis, portanto, esse tempo
presente, o único que julgávamos poder chamar de longo, reduzido ao espaço de
um só dia. Mas, examinemos esse único dia, porque nem mesmo ele é todo
presente. Compõe-se de dia e noite, num total de vinte e quatro horas; relativamente
à primeira hora, todas as outras são futuras; em relação à última hora, todas
as outras são passadas; cada hora intermediária tem atrás de si horas passadas
e diante de si horas futuras.
Mas também essa única hora
é composta de fugitivos instantes; tudo o que dela correu é passado, e tudo o
que ainda lhe resta é futuro.
Se pudermos conceber um
lapso de tempo que não possa ser subdividido em fracções, por menores que
sejam, só essa fracção poderá ser chamada de presente, mas a sua passagem do
futuro para o passado seria tão rápida, que não teria nenhuma duração. Se a
tivesse, dividir-se-ia em passado e futuro, mas o presente não em duração
alguma.
Qual seria pois, o tempo
que podemos chamar de longo? Seria acaso o futuro? Mas nós não dizemos que o
futuro é longo, porque ainda não existe, e por isso não pode ser longo.
Dizemos: “Será longo”. E
quando se dará? Se actualmente ainda está no porvir, não pode ser longo: não
existindo ainda, não pode ser longo. Mas somente poderá ser longo na hora em
que emergir do futuro, que ainda não existe, em que começar a ser e a tornar-se
presente, de modo que possa ser longo. Nesse caso o presente clama-nos, pelo
que acima dissemos, que não pode ser longo.
(Revisão
de versão portuguesa por ama)
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.