15/04/2016

Evangelho, comentário, L. espiritual


Páscoa

Evangelho: Jo 6, 52-59

52 Disputavam, então, entre si os judeus: «Como pode Este dar-nos a comer a Sua carne?». 53 Jesus disse-lhes: «Em verdade, em verdade vos digo: Se não comerdes a carne do Filho do Homem e não beberdes o Seu sangue não tereis a vida em vós. 54 Quem come a Minha carne e bebe o Meu sangue tem a vida eterna, e Eu o ressuscitarei no último dia. 55 Porque a Minha carne é verdadeiramente comida e o Meu sangue verdadeiramente bebida. 56 Quem come a Minha carne e bebe o Meu sangue permanece em Mim e Eu nele. 57 Assim como Me enviou o Pai que vive e Eu vivo pelo Pai, assim quem Me comer a Mim, esse mesmo também viverá por Mim. 58 Este é o pão que desceu do céu. Não é como o pão que comeram os vossos pais, e morreram. Quem come deste pão viverá eternamente». 59 Jesus disse estas coisas ensinando em Cafarnaum, na sinagoga.

Comentário:

Com a Sagrada Comunhão também nós - podemos dizê-lo - nos transformamos em Cristo.

De facto, enquanto durarem as Sagradas Espécies no nosso corpo Cristo vive em nós de forma fisicamente real.

Mais, durante esses minutos somos de facto santos!

Com que piedade e sumo respeito devemos comungar!

(ama, comentário sobre Jo 6 52-59 2015.04.24)


Leitura espiritual



SANTO AGOSTINHO – CONFISSÕES

LIVRO DÉCIMO

CAPÍTULO XXXII

Os prazeres do olfato

Quanto à sedução dos perfumes, não me preocupo demais. Quando ausentes, não os procuro; quando presentes, não os recuso, mas estou sempre disposto a abster-me deles. Pelo menos assim me parece, embora talvez me engane. Trevas deploráveis me envolvem, que me esconda as minhas faculdades reais; por isso, quando o meu espírito indaga a respeito das suas forças, bem sabe que não pode confiar em si mesmo, por o seu íntimo permanecer muitas vezes insondável, até que a experiência lho manifeste. Ninguém pois se deve ter seguro nesta vida, que é tentação perpétua. Pois como podemos tornar-nos melhores, não aconteça tornar-nos piores. A nossa única esperança, a nossa única confiança, a nossa firme promessa é a tua misericórdia.

CAPÍTULO XXXIII

Os prazeres do ouvido

Os prazeres do ouvido prendem-me e subjugam-me com mais força, mas tu me desligaste, me libertaste.

Agradam-me ainda, eu o confesso, os cânticos que as tuas palavras vivificam, quando executados por voz suave e artística; todavia eles não me prendem, e deles posso desenvencilhar-me quando quero. Para assentarem no meu íntimo, em companhia com os pensamentos que lhe dão vida, buscam no meu coração um lugar de dignidade, mas eu esforço-me ou ofereço-me para ceder-lhes só o lugar conveniente.

Às vezes parece-me tributar-lhe mais atenção do que devia: sinto que as tuas palavras santas, acompanhadas do canto, me inflamam de piedade mais devota e mais ardente do que se fossem cantadas de outro modo. Sinto que as emoções da alma encontram na voz e no canto, conforme as suas peculiaridades, o seu modo de expressão próprio, um misterioso estímulo de afinidade.

Mas o prazer dos sentidos, que não deveria seduzir o espírito, muitas vezes engana-me.

Os sentidos não se limitam a seguir, humildemente, a razão; e mesmo tendo sido admitidos graças à ela, buscam precedê-la e conduzi-la. É nisso que peco sem o sentir, embora depois o perceba.

Outras vezes, porém, querendo exageradamente evitar este engano, peco por excessiva severidade; chego ao ponto de querer afastar dos meus ouvidos, e da própria Igreja, a melodia dos suaves cânticos que habitualmente acompanham os salmos de David. Nessas ocasiões parece-me que o mais seguro seria adoptar o costume de Atanásio, bispo de Alexandria. Segundo me relataram, ele mandava-os recitar com tão fraca inflexão de voz, que era mais uma declamação do que um canto.

Contudo, quando me lembro das lágrimas que derramei ao ouvir os cantos da tua Igreja, nos primórdios da minha conversão, e que ainda agora me comovem, não tanto com o canto, mas com as letras cantadas, voz clara e modulações apropriadas, reconheço novamente a grande utilidade desse costume.

Assim, oscilo entre o perigo do prazer e a constatação dos efeitos salutares do canto. Por isso, sem emitir juízo definitivo, inclino-me a aprovar o costume de cantar na igreja, para que, pelo prazer do ouvido, a alma ainda muito fraca, se eleve aos sentimentos de piedade. E quando me comovem mais os cantos do que as palavras cantadas, confesso o meu pecado e mereço penitência, e então preferiria não ouvir cantar.

Eis em que estado me encontro! Chorai comigo, e chorai por mim, vós que alimentais no coração a virtude, fonte de boas obras. Porque vós, a quem isso não afecta, sois insensíveis a tudo isso. E tu, Senhor meu Deus, escuta, olha e vê; tem piedade de mim, cura-me. Eis que me tornei um problema para mim mesmo, sob o teu olhar, e aí está precisamente o meu mal.

CAPÍTULO XXXIV

O prazer dos olhos

Resta ainda falar do prazer destes olhos carnais. Oxalá que os ouvidos fraternos e piedosos do teu templo ouvissem a minha confissão! Encerrando assim as tentações da concupiscência que ainda me perseguem, apesar dos meus gemidos e dos desejos de ser revestido do meu tabernáculo, que é o céu.

Os meus olhos apreciam as formas belas e variadas, as cores brilhantes e amenas. Oxalá elas não me acorrentassem a alma! Oxalá ela só fosse presa pelo Deus que criou coisas tão boas: ele é o meu bem, e não elas. Todos os dias, estando acordado, elas importunam-me sem o descanso das vozes que se calam, e às vezes de tudo o que existe, quando silencia. A própria rainha das cores, a luz que inunda tudo o que vemos, e onde quer que eu esteja durante o dia, acaricia-me de mil modos, mesmo quando estou ocupado noutra coisa e não lhe presto atenção.

E ela insinua-se tão fortemente que, se de repente me for tirada, a desejo, a procuro e, se a sua ausência se prolonga, a alma se entristece.

Ó luz que Tobias contemplava quando, cego, mostrava ao filho o caminho da vida, caminhando à sua frente com os passos da caridade, sem jamais se perder! Luz que via Isaac, quando os seus olhos carnais, oprimidos e velados pela velhice, mereceram não abençoar os filhos reconhecendo-os, mas reconhecê-los ao abençoá-los! Luz que via Jacob, também cego pela idade provecta, irradiou os fulgores do seu coração iluminado sobre as gerações do povo futuro, representadas nos seus filhos! E a seus netos, os filhos de José, impôs as mãos misticamente cruzadas, não na ordem em que queria dispô-los o pai, que via com os olhos corporais, mas de acordo com o seu próprio discernimento interior! Eis a verdadeira luz; ela é uma, e todos os que a veem e amam formam um único ser.

Quanto à luz corporal, de que falava, com a sua doçura sedutora e perigosa, é um dos prazeres da vida para os cegos amantes do mundo. Mas os que nela sabem encontrar motivos para te louvar, Deus, criador de todas as coisas, convertem-na em hino em teu louvor, sem se deixarem dominar por ela no sono. É assim que desejo ser. Resisto às seduções dos olhos, para que os meus pés, que começam a trilhar os teus caminhos, não fiquem enredados. Elevo a ti olhos invisíveis, para que libertes os meus pés dos seus laços. Tu não cesses de livrá-los, porque sempre se estão a prender. Tu não cessas de me livrar, e eu deixo-me cair a cada passo nas insídias espalhadas por toda parte, porque não dormirás, nem adormecerás, tu que guardas Israel.

Quantos encantos os homens acrescentaram às seduções dos olhos, com a variedade das suas artes, com a sua indústria de vestidos, de calçados, de vasos, de objectos de toda espécie, com pinturas e esculturas diversas que de longe ultrapassam os limites do necessário e moderado e da expressão piedosa. Exteriormente perseguem as produções das suas artes, e no seu interior abandonam Àquele que os criou, deturpando em si o que ele fez.

Quanto a mim, meu Deus e minha glória, encontro nisto razão para cantar-te um hino, e oferecer um sacrifício de louvor àquele que se sacrificou por mim. As belezas que da alma do artista passam para as suas mãos, provêm desta beleza, que é superior às nossas almas e pela qual a minha alma suspira dia e noite.

Entretanto, os que geram e os amantes das belezas exteriores, tiram da beleza soberana apenas o critério para julgá-las, mas não uma regra para usá-las bem. Contudo, a norma ali está, mas eles não a veem. Se a vissem, não se afastariam, e guardariam a sua força para ti, e não a dissipariam em fatigantes delícias.

Mesmo eu, que exponho e compreendo essas verdades, deixo-me enredar nessas belezas; mas tu livras-me do seu laço, tu libertas-me, porque a tua misericórdia está diante dos meus olhos. Miseravelmente eu caio, e tu levantas-me misericordiosamente, às vezes sem que eu o perceba, quando a minha queda foi suave, e outras infligindo-me uma pena, por ter ficado preso ao chão.

(Revisão de versão portuguesa por ama)


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