28/03/2016

Evangelho, comentário, L. espiritual


Páscoa

Evangelho: Mt 28, 8-15

8 Saíram logo do sepulcro com medo e grande alegria e correram para dar a notícia aos discípulos. 9 E eis que Jesus lhes saiu ao encontro e lhes disse: «Deus vos salve». Elas aproximaram-se, abraçaram os Seus pés e prostraram-se diante d'Ele. 10 Então disse-lhes Jesus: «Não temais; ide dizer aos Meus irmãos que vão para a Galileia; lá Me verão». 11 Enquanto elas iam a caminho, alguns dos guardas foram à cidade e noticiaram aos príncipes dos sacerdotes tudo o que tinha sucedido. 12 Tendo-se eles reunido com os anciãos, depois de tomarem conselho, deram uma grande soma de dinheiro aos soldados, 13 dizendo-lhes: «Dizei: “Os Seus discípulos vieram de noite e, enquanto nós estávamos a dormir, roubaram-n'O”. 14 Se chegar isto aos ouvidos do governador, nós o convenceremos e estareis seguros». 15 Eles, recebido o dinheiro, fizeram como lhes tinha sido indicado. E esta notícia divulgou-se entre os Judeus e dura até ao dia de hoje.

Comentário:

A Ressurreição de Jesus Cristo é o fundamento da nossa Fé.

Assim o expressamos no Credo.

A nossa Fé é a única verdadeira porque nos foi transmitida directamente por Deus como uma graça e não por exclusiva vontade nossa.

Para acreditar há que pôr-se nas mãos de Deus que sabe muito bem o que necessitamos para consolidar essa mesma Fé.

(ama, comentário sobre Mt 28, 8-15, 2015.04.06)


Leitura espiritual



SANTO AGOSTINHO – CONFISSÕES

LIVRO OITAVO

CAPÍTULO II

Visita a Simpliciano. Conversão de Vitorino

Fui ter pois com Simpliciano, pai espiritual do então bispo Ambrósio, que o amava verdadeiramente como pai. Contei-lhe os labirintos do meu erro. E quando lhe disse que havia lido alguns livros dos platónicos, traduzidos para o latim por Vitorino, outrora retórico em Roma – e do qual ouvira dizer que morrera cristão – ele me felicitou por não ter caído nas obras de outros filósofos, falazes e enganosas, segundo os elementos deste mundo, mas apenas estes, que insinuam por mil modos Deus e o seu Verbo.

Depois, para me exortar à humildade de Cristo, escondida aos sábios e revelada aos humildes, evocou a lembrança do próprio Vitorino, que conhecera intimamente, quando estava em Roma. Não guardarei silêncio sobre o que me contou dele, porque me dará azo de proclamar os grandes louvores da tua graça a seu respeito. Esse erudito ancião, profundo conhecedor de todas as ciências liberais, leitor e crítico de tantos livros de filosofia, fora mestre de muitos nobres senadores. O prestígio do seu magistério lhe valera uma estátua no foro romano, que ele aceitara (coisa que os cidadãos desse mundo têm em grande conta). Até aquela idade avançada, havia adorado os ídolos, participando de cultos sacrílegos, de que participava quase toda a nobreza romana da época que inspirava ao povo a sua devoção por Osíris, por “toda sorte de monstros divinizados, pelo lavrador Anúbis”, monstros que outrora “pegaram em armas contra Neptuno, Vénus e Minerva”, e a quem, vencidos, a própria Roma dirigia súplicas, esse velho Vitorino, que durante tantos anos havia defendido esses deuses com sua terrível eloquência, não se envergonhou de se tornar servo do teu Cristo e criança das tuas águas, dobrando o pescoço ao jugo da humildade, e dobrando a sua fronte ante o opróbrio da cruz.

Senhor, Senhor, que inclinaste os céus e o desceste, que tocaste os montes e estes fumegaram, de que modo te insinuaste naquele coração?

Segundo me contou Simpliciano, Vitorino lia as Escrituras e investigava e esquadrinhava com grande curiosidade toda a literatura cristã, e confiava a Simpliciano, não em público, mas muito em segredo e familiarmente: “Sabes que já sou cristão?” Ao que respondia aquele: “Não hei-de acreditar, nem te contarei entre os cristãos enquanto não te vir na Igreja de Cristo”. Mas ele ria e dizia: “Serão pois as paredes que fazem os cristãos?” E isto, de que já era cristão, dizia-o muitas vezes, contestando-lhe Simpliciano outras tantas vezes com a mesma resposta, opondo-lhe sempre Vitorino o gracejo das paredes.

Vitorino receava desgostar os seus amigos, os soberbos adoradores dos demónios, julgando que estes, do alto da sua babilónica dignidade, como cedros do Líbano, ainda não abatidos pelo Senhor, fariam cair sobre ele suas pesadas inimizades.

Mas depois que hauriu forças nas leituras e orações, temeu ser renegado por Cristo diante dos seus anjos, se tivesse medo de o confessar diante dos homens. Sentiu-se réu de um grande crime por se envergonhar dos mistérios de humildade do teu Verbo, não se envergonhando do culto sacrílego de demónios soberbos, que ele próprio aceitara como soberbo imitador; envergonhou-se da vaidade, e enrubesceu diante da verdade. De repente, disse a Simpliciano, segundo este mesmo contava: “Vamos à Igreja; quero tornar-me cristão”. Simpliciano, não cabendo em si de alegria, foi com ele. Recebidos os primeiros sacramentos da religião, não muito depois, deu o seu nome para receber o baptismo que renegara, causando admiração em Roma e alegria na Igreja. Viram-no os soberbos, e iraram-se; rangiam os dentes e consumiam-se de raiva.

Mas o teu servo havia posto no Senhor Deus a sua esperança, e não tinha mais olhos para as vaidades e as enganosas loucuras.

Enfim, chegou a hora da profissão de fé. Em Roma, os que se preparam para receber a tua graça, pronunciam de um lugar elevado, diante dos fieis, formulas consagradas aprendidas de cor.

Os presbíteros, dizia-me Simpliciano, propuseram a Vitorino que recitasse a profissão de fé em segredo, como era costume fazer com os que poderiam perturbar-se pela timidez. Mas ele preferiu confessar a sua salvação na presença da plebe santa, uma vez que nenhuma salvação havia na retórica que ensinara publicamente. Quanto menos, pois, devia temer diante da tua mansa grei pronunciar a tua palavra, ele que não havia temido as turbas insanas em seus discursos!

Assim, logo que subiu à tribuna para dar testemunho da sua fé, em uníssono, conforme o iam conhecendo, todos repetiram o seu nome como num aplauso – e quem ali não o conhecia? – e um grito reprimido, saiu da boca de todos os que se alegravam: “Vitorino! Vitorino!” Ao verem-no, puseram-se a gritar de júbilo, mas logo emudeceram pelo desejo de ouvi-lo. Vitorino pronunciou a sua profissão de verdadeira fé com grande firmeza, e todos queriam raptá-lo para dentro dos seus corações. E realmente fizeram-no: o seu amor e alegria eram as mãos que o arrebatavam.

CAPÍTULO III

A alegria das coisas perdidas

Bom Deus, que se passa no homem para que se alegre mais com a salvação de uma alma desesperada, quando salva de grande perigo, do que se ela sempre tivesse tido esperança, ou se o perigo tivesse sido menor? Também tu, Pai misericordioso, sentes mais alegria por um pecador arrependido do que por noventa e nove justos que não têm necessidade de penitência. Grande é o nosso prazer ao falar da alegria do pastor trazendo de volta sobre os ombros a ovelha desgarrada, e da mulher que repõe nos teus tesouros, para satisfação geral dos vizinhos, a dracma perdida. E nos arranca lágrimas a alegria das festas da tua casa quando lemos que o teu filho menor estava morto e reviveu; estava perdido e foi encontrado.

Tu te alegras em nós e em nos teus anjos, santificados pelo santo amor; pois és sempre o mesmo, e conheces do mesmo modo e sempre as coisas que nem sempre existem, nem da mesma maneira.

Mas, que se passa na alma, para que se alegre mais com as coisas que estima, encontradas ou reavidas, do que se sempre as tivesse possuído? Na verdade, tudo o atesta, e há inúmeros testemunhos que afirmam: “É assim mesmo!”

O general celebra o triunfo da vitória, e não teria vencido sem combate; e quanto mais foi árdua a batalha, tanto maior é o gozo no triunfo.

A tempestade cai sobre os navegantes com ameaça de naufrágio. Todos empalidecem diante da morte iminente. O céu e o mar se acalmam, é grande sua alegria, e nasce do muito que temeram.

Adoece uma pessoa amiga: o seu pulso revela um desfecho fatal. Todos os que desejam a sua cura sofrem com ela, por simpatia. Havendo melhora, embora ainda não recuperado o vigor de outrora, já reina tal alegria como não existia antes, quando andava sadia e forte.

Até os prazeres da vida humana, não só compensam os homens de desgraças casuais e involuntárias, mas também de moléstias premeditadas e desejadas. Não há prazer algum em beber ou comer sem que haja antes o estímulo da sede ou da fome. Os ébrios costumam comer antes alguma coisa salgada, que lhes cause sede ardente e que transformará em prazer quando acalmada com a bebida. O costume quer que as esposas não sejam entregues imediatamente aos maridos: o marido desprezaria a noiva se não tivesse que esperar e suspirar por ela.

Assim ocorre tanto na alegria torpe e vil, como na alegria lícita e permitida, na mais sincera e honesta amizade, como na aventura daquele que estava morto e tornou a viver, que se havia perdido e foi encontrado; em todos os casos uma alegria maior é precedida de uma dor também maior.

Por que isto, Senhor, meu Deus, quando tu mesmo és tua própria alegria eterna, e as criaturas à tua volta em ti se alegram? Por que esta parte do universo sofre as alternâncias de progressos e quedas, de uniões e separações? Será este o modo de ser que lhe concedeste quando, do mais alto dos céus até às profundezas da terra, desde o princípio dos tempos até o fim dos séculos, desde o anjo até o pequenino verme, e desde o primeiro movimento até o último, dispuseste todos os géneros de bens e todas as tuas obras justas, cada uma em seu lugar e tempo?

Ai de mim! Quão alto és nas alturas e quão profundo nos abismos! Jamais te afastas de nós e, contudo, quanta dificuldade para voltar a ti!

(Revisão de versão portuguesa por ama)



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