Celibato eclesiástico: História e
fundamentos teológicos [i]
III.
Desenvolvimento do tema da continência na Igreja latina
Afirmados os pressupostos necessários
sobre o conceito e o método de investigação e exposição, analisaremos em
primeiro lugar o tema da continência dos clérigos na Igreja Latina.
O
Concílio de Elvira
Entre os testemunhos de
diversos tipos que interessam para o nosso assunto, deve ser mencionado, em
primeiro lugar, o Concílio de Elvira. Na primeira década do século IV,
reuniram-se bispos e sacerdotes da Igreja da Espanha, no centro diocesano de
Elvira, perto da Granada, para colocar sob uma regulamentação comum as diversas
circunscrições eclesiásticas da Espanha, pertencente à parte ocidental do
Império Romano, que gozava, sob o governo do César Constâncio, de uma paz
religiosa relativamente boa. No período anterior, durante a perseguição dos
cristãos, se havia constatado abusos em mais de um sector da vida cristã e havia
sofrido danos graves na observância da disciplina eclesiástica. Em 81 cânones
conciliares, são emanadas disposições relativas às áreas mais importantes da
vida eclesiástica, necessitadas de clarificação e de renovação para reafirmar a
antiga disciplina e para sancionar novas normas que se tinham tornado desnecessárias.
O Cânon 33 do Concílio
contém a já conhecida primeira lei sobre o celibato. Sob a rubrica: “Sobre os
bispos e ministros (do altar), que devem ser continentes com suas esposas”, se
encontra o seguinte texto dispositivo: “Se está de acordo sobre a proibição
total, válida para bispos, sacerdotes e diáconos, ou seja, para todos os
clérigos dedicados ao serviço do altar, que devem se abster de suas esposas e não
gerar filhos; quem fizer isso deve ser excluído do estado clerical”. O cânon 27
já havia insistido na proibição de que habitassem com os bispos e outros
eclesiásticos, outras mulheres não pertencentes à sua família. Só poderiam
levar para junto de si, uma irmã ou uma filha consagrada virgem, mas de nenhum
modo uma estranha.
Desses primeiros e
importantes textos legais se devem deduzir que muitos dos clérigos maiores da
Igreja espanhola de então, talvez inclusive a maior parte, eram viri probati, quer dizer, homens casados
antes de serem ordenados como diáconos, sacerdotes ou bispos. Todos,
entretanto, estavam obrigados depois de ter recebido a Sagrada Ordenação a
renunciar completamente do uso do matrimónio, quer dizer, à observância de uma
perfeita continência. À luz do final do Concilio de Elvira, assim como do
Direito e da História do Direito do Império Romano, dotado de uma cultura
jurídica que dominava naquela época também na Espanha, não é possível ver no
cânon 33 (junto com o cânon 27) uma lei nova.
Manifesta-se claramente,
ao contrário, como uma reacção contra a inobservância, muito estendida, de uma
obrigação tradicional e bem conhecida a que se acrescenta, nesse momento, uma
sanção: ou se aceita o cumprimento da obrigação assumida, ou se renuncia ao
estado clerical.
A introdução de uma
novidade nesse terreno, com retroactividade geral das sanções frente a direitos
adquiridos desde a Ordenação, teria causado num mundo como aquele, tão imbuído
do respeito ao legal, uma verdadeira tempestade de protestos ante a evidente
violação de um direito.
Isto já o havia percebido
Pio XI quando, na sua Encíclica sobre o sacerdócio, afirmou que essa lei
escrita supunha uma práxis precedente.
(cont)
(Revisão
da versão portuguesa por ama)
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.