27/01/2016

Tratado da vida de Cristo 71

Questão 39: Do baptizado de Cristo

Art. 8 — Se convenientemente se fez ouvir, depois de Cristo baptizado, a palavra do Pai, proclamando o seu Filho.

O oitavo discute-se assim. — Parece que inconvenientemente se fez ouvir, depois de Cristo baptizado, a palavra do Pai, proclamando o seu Filho.


1. — Pois, do Filho e do Espírito Santo, por terem aparecido sensivelmente, se diz que foram visivelmente mandados. Ora, ao Pai não convém ser mandado, como está claro em Agostinho. Logo, nem aparecer.

2. Demais. — A voz significa o verbo concebido na mente. Ora, o Pai não é o Verbo. Logo, inconvenientemente se manifestou pela palavra.

3. Demais. — O homem Cristo não começou a ser Filho de Deus no baptismo, como pensavam certos heréticos; mas, desde o princípio da sua concepção foi Filho de Deus. Logo, antes na natividade do que no baptismo, que devia ter-se feito ouvir a palavra do Pai, proclamando a divindade de Cristo.

Mas, em contrário, o Evangelho: Eis uma voz dos céus, que dizia - Este é meu filho amado, no qual tenho posto toda a minha complacência.

Como dissemos, pelo seu baptismo, que foi o exemplar do nosso, Cristo devia mostrar de modo incompleto, o que no nosso aparece consumado. Ora, o baptismo que os fiéis recebem é consagrado pela invocação e pela virtude da Trindade, segundo o Evangelho: Ide e ensinai a todas as gentes, baptizando-as em nome do Padre e do Filho e do Espírito Santo. E assim, no baptismo de Cristo, como diz Jerónimo, manifesta-se o mistério da Trindade; pois, é o próprio Senhor, revestido da natureza humana, o baptizado; o Espírito Santo desceu sob a forma de pomba; foi ouvida a palavra do Pai dando testemunho do seu Filho. Donde, era conveniente que, nesse baptismo, o Pai se manifestasse verbalmente.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — A missão visível é algo mais que a simples aparição, pois, implica a autoridade de quem envia.
E assim, do Filho e do Espírito Santo, procedentes de outro, diz-se não só que aparecem, mas também que são enviados visivelmente. Ao passo que o Pai, que de ninguém procede, pode por certo aparecer, mas não pode ser visivelmente enviado.

RESPOSTA À SEGUNDA. — O Pai não se manifesta pela palavra, senão como o autor dela ou quem a profere. E sendo próprio do Pai produzir o Verbo, o que é dizer ou falar, por isso e convenientemente o Pai se manifestou pela palavra, expressão do Verbo. Por isso, a própria palavra proferida pelo Pai proclama a filiação do Verbo. E assim como a forma da pomba, pela qual se manifestou o Espírito Santo, não é a própria natureza dele; nem a forma humana, pela qual se manifestou o Filho, é a própria natureza do Filho de Deus, assim também a palavra não fez parte da natureza do Verbo ou do Pai,  quando usou dela. Por isso o Senhor diz: Vós nunca ouvistes a sua voz, nem vistes quem o representasse. Com o que, como adverte Crisóstomo, querendo iniciá-los pouco a pouco na sua sublime filosofia, ensina-lhes que Deus não usa da palavra nem tem forma, mas é superior a toda figura como a toda palavra. E assim como toda a Trindade foi a que produziu a pomba e também a natureza humana assumida por Cristo, assim também formou a palavra. Contudo, por ela se manifestou só o Pai quando falou, assim como só o Filho foi quem assumiu a natureza humana e como pela pomba só se manifestou o Espírito Santo, como está claro em Agostinho.

RESPOSTA À TERCEIRA. — A divindade de Cristo não devia manifestar-se a todos, na sua natividade, mas antes ocultar-se, com as imperfeições da idade infantil. Mas, chegado à idade perfeita, quando devia ensinar, fazer milagres e converter os homens, então, pelo testemunho do Pai, devia manifestar-se-lhe a divindade, para tornar mais crível a sua doutrina. Donde, ele próprio disse: Meu pai, que me enviou, esse é que deu testemunho de mim. E isso sobretudo no baptismo, pelo qual os homens renascem como filhos adoptivos de Deus; pois, os filhos adoptivos de Deus são-no por semelhança com o Filho por natureza, segundo o Apóstolo: Os que ele conheceu na sua presciência, também os predestinou, para serem conformes à imagem de seu Filho. Donde o dizer Hilário, que o Espírito Santo desceu sobre Jesus baptizado e fez-se ouvir a voz do Pai que dizia: Este é 'meu Filho amado; para nos dar a conhecer, pelo que se cumpriu em Cristo, que quando formos lavados na água do baptismo, das portas do céu o Espírito Santo desce sobre nós e a voz do Pai nos declara seus filhos adoptivos.


Nota: Revisão da versão portuguesa por ama.



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