15/12/2015

Tratado da vida de Cristo 59

Questão 38: Do baptismo de João

 Art. 3 — Se o baptismo de João conferia a graça.

O terceiro discute-se assim. — Parece que o baptismo de João conferia a graça.

1. — Pois, diz o Evangelho: Estava João baptizando no deserto e pregando o baptismo de penitência para a remissão de pecados. Ora, a penitência e a remissão dos pecados só é possível pela graça. Logo, o baptismo de João conferia a graça.

2. Demais. — Os que iam ser baptizados por João confessavam os seus pecados como se lê no Evangelho. Ora, a confissão dos pecados tem por fim a remissão deles, que se opera pela graça. Logo, o baptismo de João conferia a graça.

3. Demais. — O baptismo de João aproximava-se do de Cristo, mais que a circuncisão. Ora, a circuncisão remetia o pecado original. Pois, como diz Beda, na vigência da lei antiga, a circuncisão era o mesmo remédio salutar contra o ferimento do pecado original, que o baptismo costuma ser no regime da lei da graça. Logo, com maior razão, o baptismo de João conferia a remissão dos pecados. O que não pode dar-se sem a graça.

Mas, em contrário, o Evangelho: Eu na verdade vos baptizo em água para vos trazer à penitência. Lugar que Gregório assim explica numa homília: João baptiza não pelo espírito mas pela água, porque não podia perdoar os pecados. Ora, a graça, pela qual o pecado é delido, vem do Espírito Santo. Logo, o baptismo de João não conferia a graça.

 
Como dissemos, toda a doutrina e acção de João era preparatória para a de Cristo; assim como é próprio de um ministro ou de um artífice inferior preparar a matéria para a forma a ser infundida pelo artífice principal. Ora, a graça devia ser conferida aos homens por Cristo, segundo o Evangelho: A graça e a verdade foi trazida por Jesus Cristo. Logo, o baptismo de João não conferia a graça, mas só preparava para ela, de três modos. Primeiro, pela sua doutrina João induzia os ouvintes à fé de Cristo. Segundo, acostumava-os ao rito do baptismo. Terceiro, pela penitência, preparava os homens a receberem o efeito do baptismo de Cristo.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. Por essas palavras de Beda pode entender-se um duplo baptismo. Um, que João conferia, chamado baptismo de penitência, porque de certo modo induzia à penitência e era uma como afirmação pela qual os homens confessavam que haviam de fazer penitência. Outro é o baptismo de Cristo, pelo qual os pecados são perdoados; esse, João não o podia ministrar, mas apenas o pregava quando dizia: Ele vos baptizará no Espírito Santo. — Ou pode dizer-se que pregava o baptismo da penitência, isto é, inducente à penitência, a qual leva os homens ao perdão dos pecados. — Ou pode dizer-se, que pelo baptismo de Cristo, como explica Jerónimo, é dada a graça pela qual os pecados são gratuitamente perdoados; o que porém se consuma pelo Esposo é iniciado pelo paraninfo, isto é, por João. Por isso, diz que baptizará e pregará o baptismo de penitência para a remissão de pecados; não que ele próprio o consumasse, mas porque começava, preparando.

RESPOSTA À SEGUNDA. — Essa confissão dos pecados não se fazia com o fim de o perdão deles ser logo conferido pelo baptismo de João; mas de ser conseguido pela penitência consequente, e pelo baptismo de Cristo, para o qual essa penitência preparava.

RESPOSTA À TERCEIRA. — A circuncisão foi instituída como remédio do pecado original. Mas o baptismo de João não foi instituído para tal, que era só preparatório para o baptismo de Cristo, como se disse. Ora, os sacramentos produzem o seu efeito de acordo com a força da sua instituição.

Nota: Revisão da versão portuguesa por ama.



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