22/09/2015

Tratado da vida de Cristo 37

Questão 35: Da natividade de Cristo

Em seguida devemos tratar da natividade de Cristo, depois de termos tratado da sua concepção. E primeiro, da natividade em si mesma. Segundo, da manifestação da sua natividade.

Na primeira questão discutem-se oito artigos:

Art. 1 — Se a natividade deve ser atribuída, antes, à natureza que à Pessoa.
Art. 2 — Se a Cristo deve atribuir-se uma natividade temporal.
Art. 3 — Se pela natividade temporal de Cristo, a Santa Virgem possa ser considerada sua mãe.
Art. 4 — Se a Santa Virgem deve chamar-se Mãe de Deus.
Art. 5 — Se Cristo teve duas filiações.
Art. 6 — Se Cristo nasceu sem sua mãe sofrer dores.
Art. 7 — Se Cristo devia ter nascido em Belém.
Art. 8 — Se Cristo nasceu no tempo conveniente.

Art. 1 — Se a natividade deve ser atribuída, antes, à natureza que à Pessoa.

 O primeiro discute-se assim. — Parece que a natividade deve ser atribuída, antes, à natureza que à Pessoa.

1. — Pois, diz Agostinho (Fulgêncio): Uma natureza eterna e divina não poderia ser concebida e nascer da natureza humana, se não tivesse realmente assumido a natureza humana. Se, pois, à natureza divina convém o ser concebida e nascer, em razão da natureza humana, muito mais o convém a natureza humana.

2. Demais. — Segundo o Filósofo, o nome de natureza é derivado de nascer. Ora, as denominações fundam-se na conveniência de semelhança. Logo, parece que a natividade deve ser atribuída antes à natureza que à Pessoa.

3. Demais. — Propriamente nasce o que começa a existir, pela natividade. Ora, pela sua natividade Cristo não começou a existir, na sua Pessoa; mas sim, na sua natureza humana. Logo, parece que a natividade pertence propriamente à natureza e não à Pessoa.

Mas, em contrário, Damasceno: A natividade é da hipóstase e não da natureza.

A natividade pode ser atribuída a um ser de dois modos: como ao sujeito e como ao termo. - Como ao sujeito, é atribuída ao ser nascido. Ora, este propriamente é hipóstase e não natureza. Pois, nascer é um modo de ser gerado; porque, como um ser é gerado para existir, assim também para existir é que nasce. Ora, a existência é própria do ser subsistente; e por isso da forma não subsistente dizemos que existe só por ser o princípio da existência de algum ser. Ora, a pessoa ou hipóstase significa uma subsistência; ao passo que a natureza é a expressão da forma, que é princípio da subsistência. Por isso, a natividade é propriamente atribuída à pessoa ou à hipóstase, como ao sujeito que nasce, e não à natureza. — Mas, como ao termo a natividade é atribuída à natureza. Pois, o termo da geração e de qualquer natividade é a forma. Ora, a natureza é a expressão da forma. Donde, como diz Aristóteles, a natividade é chamada via para a natureza; pois a tendência da natureza tem como seu termo a forma ou a natureza da espécie.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — Por causa da identidade existente em Deus entre a natureza e a hipóstase, às vezes a natureza é tomada pela pessoa ou pela hipóstase. E, assim, Agostinho diz que a natureza divina foi concebida e nascida; porque a pessoa do Filho, pela sua natureza humana, foi concebida e nasceu.

RESPOSTA À SEGUNDA. — Nenhum movimento ou mudança tira a sua denominação do sujeito movido: mas, do termo do movimento, que o especifica. Por isso a natividade não recebe a sua denominação da pessoa nascida mas da natureza que é o seu termo.

RESPOSTA À TERCEIRA. — A natureza, propriamente falando, não começa a existir: mas, antes a pessoa é que começa numa determinada natureza. Pois, como dissemos, a natureza exprime o princípio da existência de um ser; ao passo que a pessoa exprime um ser subsistente.

Nota: Revisão da versão portuguesa por ama.



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