Art. 5 — Se a Santa
Virgem, pela santificação no ventre materno, obteve a plenitude ou a perfeição
da graça.
O quinto discute-se assim. — Parece que a
Santa Virgem, pela santificação no ventre materno, não obteve a plenitude ou a
perfeição da graça.
1.
— Pois, isso constitui privilégio de Cristo, segundo o Evangelho: Nós vimos a sua glória de Filho unigénito do
Pai, cheio de graça e de verdade. Ora o próprio de Cristo a ninguém mais
deve ser atribuído. Logo, a Santa Virgem, não recebeu, na santificação, a
plenitude das graças.
2.
Demais. — Ao que tem a plenitude e a perfeição nada se lhe pode acrescentar,
pois, perfeito é ao que nada falta, segundo Aristóteles. Ora, a Santa Virgem
recebeu, depois da sua santificação um aumento de graça, quando concebeu a
Cristo; pois, diz o Evangelho: O Espírito
Santo descerá sobre ti. E ainda, quando foi da sua assunção para a glória.
Logo, parece que não teve, na sua primeira santificação, a plenitude das
graças.
3.
Demais. — Deus não faz nada em vão, como diz Aristóteles. Ora, a Santa Virgem
teria tido algumas graças em vão, cujo uso nunca exerceu; pois, o Evangelho não
nos diz que ela tivesse ensinado, o que seria o exercício da sabedoria; nem que
tivesse feito milagres, exercício da graça gratuita. Logo, não teve a plenitude
das graças.
Mas,
em contrário, o Anjo disse-lhe: Ave cheia
de graça. O que Jerónimo explica assim: Na
verdade, cheia de graça; pois, ao passo que os outros as recebem por partes, em
Maria se lhe infundiu total e simultaneamente a plenitude das graças.
Quanto mais uma coisa se aproxima do princípio, num determinado género, tanto
mais participa do efeito desse princípio; por isto diz Dionísio, que os anjos, mais próximos de Deus, mais, participam
da bondade divina, que os homens. Ora, Cristo é o princípio da graça; pela
divindade, como autor dela; pela humanidade, como instrumento. Donde o dizer o
Evangelho: A graça e a verdade foram
trazidas por Jesus Cristo. Ora, a Santa Virgem Maria foi a mais próxima de
Cristo pela humanidade, pois dela ele recebeu a natureza humana. Por isso, mais
que ninguém, devia receber de Cristo a plenitude da graça.
DONDE
A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — Deus dá a cada um a graça conforme para o que
é escolhido. E como Cristo, enquanto homem foi predestinado e escolhido para
que fosse, no dizer do Apóstolo, predestinado
Filho de Deus com poder, segundo o espírito de santificação, era-lhe
próprio ter uma plenitude de graça tal que redundasse para os outros, conforme o
Evangelho: Todos nós participamos da sua
plenitude. A Santa Virgem Maria, porém, obteve a plenitude de modo a ser a
mais chegada ao autor da graça; de maneira que recebesse em si o que é a
plenitude de todas as graças e, dando-o a luz, a graça em algum sentido
derivasse para todos.
RESPOSTA
À SEGUNDA. — Na ordem natural, o que primeiro existe é a perfeição da
disposição, por exemplo, a perfeição da matéria para receber a forma. Depois
vem a perfeição da forma superior; assim, mais perfeito é o calor em si,
proveniente da forma do fogo, que o que dispôs para a forma ígnea. Em terceiro
lugar, vem a perfeição do fim: assim, o fogo tem as suas qualidades no grau
mais perfeito, quando chegado ao seu lugar.
Semelhantemente,
tríplice perfeição houve na Santa Virgem. — A primeira, e como dispositiva, que
a tornava idónea para ser Mãe de Cristo. É essa foi a perfeição da
santificação. — A segunda perfeição da graça foi na Santa Virgem, a presença do
Filho de Deus incarnado no seu ventre. — A terceira foi a perfeição do fim, que
desfruta na glória.
Ora,
que a segunda perfeição é superior à primeira e à terceira, que a segunda, é
claro, de um modo, pela liberação do mal. Pois, primeiro, pela sua santificação
foi liberta da culpa original; depois, na concepção do Filho de Deus, foi
totalmente purifica da concupiscência; enfim, em terceiro lugar pela sua
glorificação, foi libertada também de todas as misérias da vida. — De segundo
modo, pela ordenação para o bem. Assim, primeiro, na sua santificação, alcançou
a graça, que inclina para o bem; depois, na concepção do Filho de Deus, consumou-se-lhe
a graça, tendo sido confirmada no bem; e enfim na sua glorificação,
consumou-se-lhe a graça, que lhe deu a fruição perfeita de todos os bens.
RESPOSTA
À TERCEIRA. — Não podemos duvidar que a Santa Virgem recebesse, e
excelentemente, o dom da sabedoria e a graça das virtudes e também a graça da
profecia, como Cristo a teve. Não as recebeu, porém, de modo a ter o uso de
todas essas graças e de outras semelhantes, como o teve Cristo; mas só na
medida em que convinha à sua condição. — Assim, teve o uso da sabedoria, na contemplação,
segundo o Evangelho: Maria conservava todas
essas palavras, conferindo lá no fundo do seu coração umas com as outras.
Mas, não teve o uso da sabedoria, porque ensinasse, pois isso não convinha ao
sexo feminino, segundo aquilo do Apóstolo: Eu
não permito à mulher que ensine. — Quanto à realizar milagre, não lhe convinha
durante a vida, porque, nesse tempo a doutrina devia confirmar-se pelos
milagres de Cristo; por isso só a Cristo e aos seus discípulos, portadores da
doutrina de Cristo, convinha fazer milagres. Por isso, mesmo de João Batista
diz o Evangelho, que não fez nenhum
milagre; e isso para que todos buscassem a Cristo. — E enfim, o uso da
profecia ela teve-o, como o declara o Cântico que fez: A minha alma magnifica o Senhor.
Nota:
Revisão da versão portuguesa por ama.
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