Semana VII da Páscoa
Evangelho:
Jo 16 29-33
29
Os Seus discípulos disseram-Lhe: «Eis que agora falas claramente e não usas
nenhuma parábola. 30 Agora conhecemos que sabes tudo e que não é necessário que
alguém Te interrogue. Por isso cremos que saíste de Deus». 31 Jesus
respondeu-lhes: «Credes agora?». 32 «Eis que vem a hora, e já chegou, em que
sereis espalhados cada um para seu lado e em que Me deixareis só; mas Eu não
estou só, porque o Pai está comigo. 33 Disse-vos estas coisas para que tenhais
paz em Mim. Haveis de ter aflições no mundo; mas tende confiança, Eu venci o
mundo».
Comentário:
Qual dos presentes terá dito estas
palavras?
Alguém entre os que ouviam
Jesus, compreendeu finalmente o Seu discurso.
Porquê só alguns e não todos?
O mistério da graça assenta
fundamentalmente nesta verdade: ela é dispensada por Deus como a quem e quando
quer. Pode, com segurança, afirmar-se que o único possível mérito humano
residirá na honestidade do desejo em possui-la e na veemência e perseverança
com que a pede.
O seu desejo por compreender estará alicerçado na vontade de, compreendendo,
poder amar mais e, assim, estar mais capaz de cumprir a Vontade de a Deus.
(ama,
comentário sobre Jo16, 29-33
2014.06.01)
Leitura espiritual
a beleza de
ser cristão
PRIMEIRA PARTE
xiv -o espírito das bem-aventuranças
…/4
o sentido de cada bem-aventurança
Nesta Bem-Aventurança ([1])
ressalta conjuntamente a harmonia da acção da Fé, da Esperança e da Caridade
porque a paz é fruto da fé na Ressurreição e a esperança na vida eterna que a
Ressurreição anuncia.
E da caridade
que vence todo o pecado e reconcilia o céu e a terra no coração de Cristo com
Deus Pai.
A oitava Bem-Aventurança «os que padecem
perseguição por sede de justiça porque deles é o reino dos céus» é considerada
como a consumação e perfeição das outras sete e decerto modo pode unir-se-lhe
sem forçar o seu significado a promessa dirigida aos que são caluniados e
injuriados além de perseguidos.
Nela manifesta-se o sofrer, o morrer e o
ressuscitar de Cristo para nos libertar do pecado e ao redimir-nos devolver a
Deus «toda a honra e toda a glória» e assim cumprir «toda a justiça» como Ele
mesmo recordou a João Baptista: «Mas Jesus respondeu-lhe: deixa-me por agora
pois convém que cumpramos toda a justiça» ([2]).
Os que sofrem perseguição pela justiça e
unem os seus sofrimentos ao padecer e ressurreição de Cristo ed os que
inclusive chegam ao martírio na confissão da sua Fé são verdadeiramente
bem-aventurados.
Nem sempre se apresentam ao cristão
oportunidades de dar testemunho da sua Fé em Cristo Jesus e do seu amor a Deus
com o oferecimento da própria vida.
Em troca são muito frequentes as
situações nas quais afirmar a Fé pública e notoriamente significa actuar contra
as tendências algo generalizadas no vier comum dos homens numas e noutras
sociedades.
Estas pessoas também estão contempladas
no âmbito desta Bem-Aventurança.
Ainda que a
sua actuação seja com naturalidade e simplicidade o seu cariz cristão chocará
com o ambiente e poderá causar não poucos prejuízos ao próprio e à sua família.
Nos Actos dos Apóstolos encontramos um
claro exemplo destes bem-aventurados.
O Sinédrio põe
no cárcere alguns apóstolos e discípulos, açoitam-nos e depois de libertarem
mandam-lhes que não falem mais de Jesus Cristo: «Eles foram-se embora da
presença do Sinédrio contentes porque tinham sido dignos de padecer ultrajes
pelo nome de Jesus e no Templo e nas casas não cessavam diariamente ensinar e
anunciar Cristo Jesus» ([3]).
***
Em conformidade com o que vimos até
agora poemos sublinhar que cada uma das Bem-Aventuranças é fruto da acção
conjunta da Fé, da Esperança e da Caridade que estão sempre presentes no actuar
de um crente entrelaçadas harmoniosamente com predomínio de uma ou de outra
segundo os casos.
E ao mesmo tempo «o bom aroma de Cristo»
escondido em cada Bem-Aventurança impregna toda a actuação do cristão e confere-lhe
um esplendor que torna presente nele o próprio Cristo.
O pacífico dá
a conhecer Jesus Cristo «manso e humilde de coração) que jamais «quebra a cana
rachada».
O pobre de
espírito no seu clamor a Deus Pai sustém na esperança a quem chora e ensina-lhe
os caminhos divinos da consolação.
A acção do
Espírito Santo na alma do «limpo de coração» torna possível que em todas as
suas obras apareça o bater do coração de Cristo que quer «quen todos os homens
se salvem e cheguem ao conhecimento da Verdade».
De forma paralela e apreciando em todo o
seu valor a riqueza de horizontes a tradição que vincula um Dom do Espírito
Santo a uma Bem-Aventurança, pensamos que se pode afirmar que todos os dons
fecundam conjuntamente todo o actuar do cristão e fazem-no iluminando, desde o
mais íntimo do homem, e segundo o objecto e as circunstâncias do acto e a
intenção de quem actua, a inteligência da Fé, a memória da Esperança, a vontade
amorosa da Caridade e assim se cumpre a união com Cristo que tem lugar quando
«se vive a Verdade na Caridade» ([4]).
xv os frutos do espírito santo
Já recordámos que ao convite que Cristo
nos faz para nos convertermos o homem corresponde com a abertura do seu
espírito para chegar a ser «nova criatura no Senhor».
O cristão é um homem que sem deixar
nunca de ser homem, de ser plenamente humano, se converte em filhos de Deus e
vive já de um modo também divino a sua natural vida humana.
«Eu vos asseguro: se não vos
converterdes e fazer-vos crianças não entrareis no Reino dos Céus» [5].
O cristão faz
no seu espírito eco destas palavras do Senhor seguindo a sugestão do Apóstolo:
«Assim também vós considerai-vos como mortos para o pecado e vivos para Deus em
Cristo Jesus» [6].
A nova vida do cristão estar «vivo para
Deus em Cristo Jesus» manifesta-se como já vimos em capítulos anteriores na
conduta externa com uma série de actos que reflectem a fé, a esperança e a
caridade e que são inspirados e levados a cabo no espírito das
Bem-Aventuranças.
E nessa
conversão sem limites do homem também se expressa que nunca se conclui
totalmente para ser cristão em todos os actos do seu viver.
O natural e o sobrenatural no homem ao
ser pessoa e filho de Deus, não são realidades separadas que originam actuações
em paralelo dentro do homem.
Unidas no eu,
que podemos chamar o acto de ser de cada ser humano, até conseguir que o homem
natural criado para a vida sobrenatural, enxertado em Cristo, desenvolva no seu
viver natural a semente e a seiva do seu viver sobrenatural, do seu viver
cristão como «filho de Deus em Cristo Jesus».
Neste processo a natureza humana do
homem vai-se transformando sem nunca deixar de ser o que é até que Cristo real
e verdadeiramente viva nele.
E o cristã
descobre-se verdadeiramente « filho de Deus» e mebro do seu «povo sacerdotal» [7].
Então tem lugar a manifestação do
cristão que paulatinamente, natural e sobrenaturalmente se despoja do homem
velho e se reveste do homem novo.
Ou melhor se
reveste do homem novo ao mesmo tempo que se despoja do homem velho.
São Paulo é
explícito: «Eu vos digo, pois, e vos conjuro no Senhor a que já não vivais como
vivem os gentios (…), fostes ensinados conforme a verdade de Jesus, no que
respeita à vossa vida interior, a despojar-vos do homem velho que se corrompe
seguindo a sedução das concupiscências, a renovar o espírito da vossa mente e a
revestir-vos do homem novo, criado segundo Deus na justiça e santidade da
verdade» [8].
No homem, na pessoa humana, todo o
actuar segue o seu ser e procede do seu ser e, ao mesmo tempo, ao actuar para
fora e para dentro de si próprio o ser do homem, a pessoa, vai-se modificando,
mudando, convertendo-se moral e práticamente, sem por isso perder a sua única
identidade metafísica que também adquire novas dimensões.
O final deste processo de interacção
acontence quando cumprida a conversão do homem que lhe permite afirmar como São
Paulo: «Cristo vive em mim».
Quando se pode afirmar que a vida de um
homem manifesta o seu ser cristão, o seu ser filho de Deus em Cristo?
Numa frase simples e breve podemos
dizer: quando os seus actos reflectem que a acção dos Dons do Espírito Santo no
seu espírito está fazendo surgir nele os seus frutos; frutos do enxerto na natureza
humana da Graça sobrenatural.
«Os frutos do Espírito Santo são
perfeições que o Espírito Santo forma em nós como primícias da glória eterna» [9].
Os Frutos do Espírito Santo na nossa
alma são a manifestação mais clara de que o Reino de Deus já está em nós e que
a Graça na qual fomos enxertados em Cristo, na sua acção de nos salvar, nos
transforma.
Não só nos
transforma para nos salvar para a vida eterna mas também os frutos da salvação
reflectem-se na nossa conversão já nesta vida.
Com efeito.
É interessante
verificar que São Paulo faz a enunciação destes frutos depois de falar da
liberdade «para a qual Cristo nos libertou» [10];
liberdade na qual Deus leva a cabo a «nova criação» e liberdade na qual o homem
aceita de Deus o ser nova criatura.
Ao afirmar que «contra estes frutos não
há lei» o Apóstolo faz-nos compreender que os Frutos são a manifestação do
enraizamento na alma do cristão dessa nova vida em Cristo.
Vida contra a
qual já nenhuma lei tem força por«que a caridade perfeita expulsa o temor» [11],
e ao mesmo tempo essa vida abre sempre o espírito à Graça que Deus derrama nos
nossos corações porque ‘« a lei do espírito que dá a vida em Cristo Jesus o
libertou da lei do pecado e da morte» [12].
(cont)
ernesto juliá, La belleza de ser cristiano, trad. ama)
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