Semana IV da Páscoa
Evangelho:
Jo 10 1-10
«Em verdade, em verdade vos digo que
quem não entra pela porta no redil das ovelhas, mas sobe por outra parte, é
ladrão e salteador. 2 Aquele que entra pela porta é pastor das ovelhas. 3 A
este o porteiro abre e as ovelhas ouvem a sua voz, ele as chama pelo seu nome e
as tira para fora. 4 Quando as tirou para fora, vai à frente delas e as ovelhas
seguem-no, porque conhecem a sua voz. 5 Mas não seguem o estranho, antes fogem
dele, porque não conhecem a voz dos estranhos». 6 Jesus disse-lhes esta
alegoria, mas eles não compreenderam o que lhes dizia. 7 Tornou, pois, Jesus a
dizer-lhes: «Em verdade, em verdade vos digo que Eu sou a porta das ovelhas. 8
Todos os que vieram antes de Mim são ladrões e salteadores; mas as ovelhas não
os ouviram. 9 Eu sou a porta; se alguém entrar por Mim, será salvo, entrará e
sairá e encontrará pastagens. 10 O ladrão não vem senão para roubar, matar e
destruir. Eu vim para que elas tenham vida e a tenham abundantemente.
Comentário:
O
pastor e as ovelhas!
Esta
imagem que Jesus repetirá fica bem gravada mas nossas almas ansiosas por
encontrar quem as conduza com segurança e as guie pelo caminho que conduz à
verdadeira vida.
Pouco teremos de fazer além, naturalmente, de O seguir com simples confiança e
tranquila certeza que estamos no bom caminho para a salvação.
(ama, comentário sobre Jo 10, 1-10, 2014.05.11)
Leitura espiritual
a beleza de
ser cristão
PRIMEIRA PARTE
O QUE É SER CRISTÃO?
I.
Relações que Deus estabelece com o homem.
…/13
A elevação natural da natureza humana que a Graça comporta tem lugar dentro
da própria natureza, de forma que o homem se «enraíza” em Deus; se alimenta de
Deus, se vivifica em Deus, sem jamais deixar de ser homem.
A «participação na natureza divina” e a própria natureza humana não actuam
no homem como duas forças paralelas e separadas, que se encontram no preciso
instante de levar a cabo a acção, como se o homem pusesse uma percentagem do
necessário para actuar, e o Senhor colmatasse o que pudesse faltar.
Não.
Com
o seu próprio princípio de actuar, com a sua natureza, o homem actua
livremente.
Também
a liberdade, qualidade da natureza humana, se enriquece com a Graça.
O
cristão está «enxertado” em Cristo, como São Paulo assinala na carta aos
Romanos 11, 17.
E
a seiva do enxerto mistura-se, formando uma única seiva, com a do tronco que o
sustém.
O
símil, logicamente, não alcança na ordem sobrenatural da relação entre Deus e o
homem, a mesma plenitude de sentido que consegue na ordem da natureza criada.
A
comunicação de vida entre a árvore e o enxerto é fluida, total, sem limites, de
forma que o enxerto chega a formar parte da árvore como um ramo originado na
mesma árvore.
Entre
Deus e o homem, a seiva, a Graça, não chega a converter plenamente o homem em
Deus, ainda que originando no homem o «endeusamento” de que falam não poucos
autores e sobre o que teremos ocasião de voltar.
Assim
vive com Deus, assim se chega a entender o pleno sentido das palavras de Santo
Ireneu e Santo Atanásio, que já mencionámos ao falar do segundo sentido da
Encarnação de Jesus Cristo: «o Verbo se fez homem… para que o homem se
convertesse em filho de Deus”; «o Filho de Deus fez-se homem para fazer-nos
Deus”.
O
Sentido da acção da Graça é o de levar a natureza humana acima de ela própria,
sem, ao mesmo tempo, em nenhum caso deixar de ser ela própria, até uma
perfeição, que começa a emergir na terra e que só se verá completamente
realizada na vida eterna, e que é a culminação absoluta da transformação da
pessoa humana em verdadeiro filho de Deus.
Pode
dizer-se que vivemos com Deus na nossa natureza, na nossa pessoa, em intimidade
com Deus, participando da natureza, da energia, da força de Deus, sem por um
instante deixar de ser humanos e sendo também ao mesmo tempo filhos de Deus,
divinos.
E
este viver do homem aberto a Deus, para Deus, com Deus, não podemos reduzi-lo a
um viver em busca de um modo de actuar, de um modo de levar a cabo um ideal.
Sendo
um viver entitativo, um ser e chegar a ser constante, sem nunca se converter
numa civilização acabada, o homem vive no núcleo próprio do seu existir o
choque – que ao mesmo tempo é união – entre a criatura e o Criador, entre o ser
temporal e o eterno.
O
diálogo, o encontro do homem com Deus e de Deus com o homem, não é o discutir
de duas mentes, de duas inteligências em busca de um conceito no qual assentar
um juízo, um raciocínio…; é um encontro vital, pessoal, no qual o eu da
criatura nem perde configuração ante o Eu eterno nem se vê absorvido por Ele.
Na
Graça, a criatura, o eu terreno e temporal, descobre-se vivendo pendente e
sustentado pelo Eu eterno.
Para
contemplar o mistério da graça é preciso vê-lo na sua totalidade e ter presente
que na Graça o homem descobre a relação directa da sua pessoa com Deus.
A
Graça não só lhe concede a «participação na natureza” mas que, pela acção do
Espírito Santo e com Cristo Eucaristia, actua «in persona Christi”, «na pessoa
de Cristo”.
Não
só empresta a voz e a vida a Deus, como, e verdadeiramente, vive pessoalmente
em Deus, e em seu nome.
Não
só como enviado a uma missão que deve realizar em nome de Cristo, sendo pela
graça, e nessa actuação, o próprio Cristo.
Esta
união da Graça e da natureza do homem, na pessoa de cada baptizado, torna
possível a conversão radical do cristão, de que São Paulo fala, em «outro Cristo, o próprio Cristo”.
Esta
realidade da Graça, de Deus vivendo em nós, modifica radicalmente o modo da
realização do pleno da salvação de Deus com os homens.
Antes
da vinda de Cristo, não existia a possibilidade de que os homens vivessem esta
«participação na natureza divina”, que os cristãos recebem nos sacramentos.
A
relação de Deus com as suas criaturas os homens mantinha-se desde o exterior de
Deus e desde o exterior de cada homem.
E
também era uma relação «externa”, a que unia Deus com o povo eleito, não
obstante a extraordinária e singular vinculação que quis estabelecer com o povo
hebreu, até se chamar a ele próprio: «Deus de Abraão, Deus de Isac, Deus de
Jacob”.
As
alianças sucessivas de Deus com Noé, com Abraão, com Moisés, com David levam
consigo a concessão de uma graça, de uma grande ajuda, que se convencionou
chamar graça original.
Esta
graça original eleva o homem a uma
profunda amizade com Deus, ilumina a sua inteligência para lhe conceder uma
visão de Deus que torne possível a fé, a esperança e a caridade.
O
homem do Antigo Testamento também recebe o mandamento de «amar o Senhor teu
Deus com todo o coração, com toda a alma, com todas as forças”;[i]
e sabem que Deus anunciou que chegará um tempo no qual ele actuará com os
homens de uma forma particular: «Meterei a minha lei no seu peito,
escrevê-la-ei nos seus corações; eu serei o seu Deus e eles serão o meu povo”.[ii]
Todavia
não receberam nem Cristo nem o Espírito Santo.
Santo
Agostinho resumiu muito bem com estas palavras a situação dos homens antes de
Cristo: «Abraão era melhor que eu; mas a minha condição é melhor que a de
Abraão”.
Com
a chegada de Cristo, Filho de Deus feito homem, as relações de Deus com os
homens sofrem uma mudança radical.
Mais
que na intensidade dos laços, a mudança radica na qualidade do vínculo. Deus
não quer continuar mantendo uma cooperação externa com os homens e receber
deles, como fruto do amor que Ele lhes manifesta, simplesmente gestos de
reverência, de acatamento, de amor e nem sequer somente de adoração.
Em
Cristo, Deus sela a sua aliança com os homens, dando-se a si mesmo.
Já
desapareceram os sinais externos, a circuncisão já perdeu todo o significado, a
pertença a uma das doze tribos, etc.
A
doação divina que Cristo nos concede nos Sacramentos já não é uma graça geral
que se configura principalmente como auxilio externo de Deus às criaturas, mas
que nos dá a sua própria vida.
«A
graça de Cristo é o dom gratuito que Deus nos faz da sua vida infundida pelo
Espírito Santo na nossa alma para a curar do pecado e santificá-la: é a graça santificante ou divinizadora,
recebida no Baptismo”.[iii]
Esta
graça, que nos constitui «filhos de Deus em Cristo”, recebe o nome de Graça crística; e nela se enraíza a
aliança definitiva que Deus Pai, Filho e Espírito Santo estabelece com o homem
redimido por Jesus Cristo, coma sua morte e ressurreição.
A
união tão pessoal que se origina com a «filiação divina” afecta, logicamente, o
homem na sua totalidade.
Ou
seja, no seu «ser” o no seu «actuar”.
No
seu «ser” - plano ôntico e constitutivo como se lhe queira chamar -, pela nova
vida que se nos concede nos sacramentos. O homem actualiza a sua qualidade de
filho de Deus em Cristo e recebe a participação na natureza divina que o
constitui «nova criatura”.
E
no seu «actuar” - plano prático ou ético, se quisermos -, pelos novos
horizontes que o seu olhar descobre.
O
homem já não se explica a si mesmo nem encontra os seus horizontes no que o seu
olhar alcança.
Como
a natureza é princípio de actuação, o homem começa a actuar de acordo com a sua
condição de «nova criatura”.
Os
Mandamentos transformam-se com a luz do «mandamento novo” que Cristo
estabelece, e abre-se ao homem a perspectiva de os viver com o novo espírito
das Bem-aventuranças.
Como
um breve resumo do que foi dito nesta parte, e como introdução ao estudo dos
Sacramentos, recolhemos este texto de São Josemaria Escrivá: «O cristão sabe-se
enxertado em Cristo pelo Baptismo; habilitado a lutar por Cristo, pela
Confirmação; chamado a actuar no mundo pela participação na função, real,
profética e sacerdotal de Cristo; feito uma só coisa com Cristo pela
Eucaristia, sacramento da unidade e do amor: Por isso, como Cristo, há-de viver
face a os outros homens, olhando com amor a todos e a cada um dos que o rodeiam
e â humanidade inteira” [iv]
(cont)
ernesto juliá, La belleza de ser cristiano, trad. ama)
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.