Tempo de Quaresma II Semana
Evangelho:
Mt 23 1-12
1 Então, Jesus falou às multidões e aos Seus
discípulos, 2 dizendo: «Sobre a cadeira de Moisés sentaram-se os
escribas e os fariseus. 3 Observai, pois, e fazei tudo o que eles
vos disserem, mas não imiteis as suas acções, porque dizem e não fazem. 4
Atam cargas pesadas e impossíveis de levar, e as põem sobre os ombros dos
outros homens, mas nem com um dedo as querem mover. 5 Fazem todas as
suas obras para serem vistos pelos homens. Trazem mais largas as filactérias, e
mais compridas as franjas dos seus mantos. 6 Gostam de ter os
primeiros lugares nos banquetes, e as primeiras cadeiras nas sinagogas, 7
das saudações na praça, e de serem chamados rabi pelos homens. 8 Mas
vós não vos façais chamar rabis, porque um só é o vosso Mestre, e vós sois
todos irmãos. 9 A ninguém chameis pai sobre a terra, porque um só é
o vosso Pai, O que está nos céus. 10 Nem façais que vos chamem
mestres, porque um só é o vosso Mestre, Cristo. 11 Quem entre vós
for o maior, seja vosso servo. 12 Aquele que se exaltar será
humilhado, e quem se humilhar será exaltado.
Comentário:
Quem se humilha será
exaltado e quem se exalta será humilhado disseste Tu, Senhor. E, como foste Tu
quem o disse, só pode ser verdade.
Quantas vezes não se
verifica!
E, quanto a mim?
Que se passará?
Sim porque eu tenho esta
prosápia permanente, esta sede de protagonismo e evidência – as minhas
filactérias – sempre olhar para cima, pescoço bem esticado para ser visto e,
naturalmente, admirado.
Aceita, Senhor, a minha
declaração formal do que sou:
Nada,
absolutamente, e trata-me assim: como nada!
(ama, meditação sobre Mt 23, 1-12, 2009.03.11)
Leitura espiritual
EXORTAÇÃO APOSTÓLICA EVANGELII GAUDIUM
DO SANTO PADRE FRANCISCO
AO EPISCOPADO, AO CLERO ÀS
PESSOAS CONSAGRADAS E AOS FIÉIS LEIGOS SOBRE O ANÚNCIO DO EVANGELHO NO MUNDO
ACTUAL
12. Embora esta missão nos exija uma
entrega generosa, seria um erro considerá-la como uma heróica tarefa pessoal,
dado que ela é, primariamente e acima de tudo o que possamos sondar e compreender,
obra de Deus. Jesus é «o primeiro e o maior evangelizador». [1]
Em qualquer forma de evangelização, o
primado é sempre de Deus, que quis chamar-nos para cooperar com Ele e
impelir-nos com a força do seu Espírito.
A verdadeira novidade é aquela que o
próprio Deus misteriosamente quer produzir, aquela que Ele inspira, aquela que
Ele provoca, aquela que Ele orienta e acompanha de mil e uma maneiras.
Em toda a vida da Igreja, deve-se
sempre manifestar que a iniciativa pertence a Deus, «porque Ele nos amou
primeiro» [2] e é «só
Deus que faz crescer» [3].
Esta convicção permite-nos manter a
alegria no meio duma tarefa tão exigente e desafiadora que ocupa inteiramente a
nossa vida. Pede-nos tudo, mas ao mesmo tempo dá-nos tudo.
13. E também não deveremos entender a
novidade desta missão como um desenraizamento, como um esquecimento da história
viva que nos acolhe e impele para diante.
A memória é uma dimensão da nossa fé,
que, por analogia com a memória de Israel, poderíamos chamar «deuteronómica».
Jesus deixa-nos a Eucaristia como
memória quotidiana da Igreja, que nos introduz cada vez mais na Páscoa[4].
A alegria evangelizadora refulge
sempre sobre o horizonte da memória agradecida: é uma graça que precisamos de
pedir.
Os Apóstolos nunca mais esqueceram o
momento em que Jesus lhes tocou o coração: «Eram as quatro horas da tarde» [5].
A memória faz-nos presente, juntamente
com Jesus, uma verdadeira «nuvem de testemunhas» [6].
De entre elas, distinguem-se algumas
pessoas que incidiram de maneira especial para fazer germinar a nossa alegria
crente: «Recordai-vos dos vossos guias, que vos pregaram a palavra de Deus» [7].
Às
vezes, trata-se de pessoas simples e próximas de nós, que nos iniciaram na vida
da fé: «Trago à memória a tua fé sem fingimento, que se encontrava já na tua
avó Lóide e na tua mãe Eunice» [8].
O crente é, fundamentalmente, «uma
pessoa que faz memória».
III. a
nova evangelização para a transmissão da fé
14. À escuta do Espírito, que nos
ajuda a reconhecer comunitariamente os sinais dos tempos, celebrou-se de 7 a 28
de Outubro de 2012 a XIII Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos,
sobre o tema A nova evangelização para a transmissão da fé cristã. Lá foi
recordado que a nova evangelização interpela a todos, realizando-se
fundamentalmente em três âmbitos.[9]
Em primeiro lugar, mencionamos o
âmbito da pastoral ordinária, «animada pelo fogo do Espírito a fim de incendiar
os corações dos fiéis que frequentam regularmente a comunidade, reunindo-se no
dia do Senhor, para se alimentarem da sua Palavra e do Pão de vida eterna»[10].
Devem ser incluídos também neste
âmbito os fiéis que conservam uma fé católica intensa e sincera, exprimindo-a
de diversos modos, embora não participem frequentemente no culto.
Esta pastoral está orientada para o
crescimento dos crentes, a fim de corresponderem cada vez melhor e com toda a
sua vida ao amor de Deus.
Em segundo lugar, lembramos o âmbito
das «pessoas baptizadas que, porém, não vivem as exigências do Baptismo»,[11] não
sentem uma pertença cordial à Igreja e já não experimentam a consolação da fé.
Mãe sempre solícita, a Igreja
esforça-se para que elas vivam uma conversão que lhes restitua a alegria da fé
e o desejo de se comprometerem com o Evangelho.
Por fim, frisamos que a evangelização
está essencialmente relacionada com a proclamação do Evangelho àqueles que não
conhecem Jesus Cristo ou que sempre O recusaram.
Muitos deles buscam secretamente a
Deus, movidos pela nostalgia do seu rosto, mesmo em países de antiga tradição
cristã.
Todos têm o direito de receber o
Evangelho.
Os cristãos têm o dever de o anunciar,
sem excluir ninguém, e não como quem impõe uma nova obrigação, mas como quem
partilha uma alegria, indica um horizonte estupendo, oferece um banquete
apetecível.
A Igreja não cresce por proselitismo,
mas «por atracção».[12]
15. João Paulo II convidou-nos a
reconhecer que «não se pode perder a tensão para o anúncio» àqueles que estão
longe de Cristo, «porque esta é a tarefa primária da Igreja»[13].
A actividade missionária «ainda hoje
representa o máximo desafio para a Igreja»[14] e «a
causa missionária deve ser (…) a primeira de todas as causas».[15]
Que sucederia se tomássemos realmente
a sério estas palavras? Simplesmente reconheceríamos que a acção missionária é
o paradigma de toda a obra da Igreja.
Nesta linha, os Bispos
latino-americanos afirmaram que «não podemos ficar tranquilos, em espera
passiva, em nossos templos»,[16] sendo
necessário passar «de uma pastoral de mera conservação para uma pastoral
decididamente missionária».[17]
Esta tarefa continua a ser a fonte das
maiores alegrias para a Igreja: «Haverá mais alegria no Céu por um só pecador
que se converte, do que por noventa e nove justos que não necessitam de
conversão» [18].
A
proposta desta Exortação e seus contornos
16. Com prazer, aceitei o convite dos
Padres sinodais para redigir esta Exortação.[19]
Para o
efeito, recolho a riqueza dos trabalhos do Sínodo; consultei também várias
pessoas e pretendo, além disso, exprimir as preocupações que me movem neste
momento concreto da obra evangelizadora da Igreja.
Os temas relacionados com a
evangelização no mundo actual, que se poderiam desenvolver aqui, são
inumeráveis.
Mas renunciei a tratar detalhadamente
esta multiplicidade de questões que devem ser objecto de estudo e
aprofundamento cuidadoso. Penso, aliás, que não se deve esperar do magistério
papal uma palavra definitiva ou completa sobre todas as questões que dizem
respeito à Igreja e ao mundo.
Não convém que o Papa substitua os
episcopados locais no discernimento de todas as problemáticas que sobressaem
nos seus territórios.
Neste sentido, sinto a necessidade de
proceder a uma salutar “descentralização”.
17. Aqui escolhi propor algumas
directrizes que possam encorajar e orientar, em toda a Igreja, uma nova etapa
evangelizadora, cheia de ardor e dinamismo.
Neste quadro e com base na doutrina da
Constituição dogmática Lumen gentium, decidi, entre outros temas, deter-me
amplamente sobre as seguintes questões:
a) A reforma da Igreja em saída
missionária.
b) As tentações dos agentes pastorais.
c) A Igreja vista como a totalidade do
povo de Deus que evangeliza. d) A homilia e a sua preparação.
e) A inclusão social dos pobres.
f) A paz e o diálogo social.
g) As motivações espirituais para o
compromisso missionário.
18. Demorei-me nestes temas,
desenvolvendo-os dum modo que talvez possa parecer excessivo.
Mas não o fiz com a intenção de
oferecer um tratado, mas só para mostrar a relevante incidência prática destes
assuntos na missão actual da Igreja.
De facto, todos eles ajudam a delinear
um preciso estilo evangelizador, que convido a assumir em qualquer actividade
que se realize. E, desta forma, podemos assumir, no meio do nosso trabalho
diário, esta exortação da Palavra de Deus: «Alegrai-vos sempre no Senhor! De
novo vos digo: alegrai-vos!» [20].
CAPÍTULO I
A TRANSFORMAÇÃO MISSIONÁRIA DA IGREJA
19. A evangelização obedece ao mandato
missionário de Jesus: «Ide, pois, fazei discípulos de todos os povos,
baptizando-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, ensinando-os a
cumprir tudo quanto vos tenho mandado» [21].
Nestes versículos, aparece o momento
em que o Ressuscitado envia os seus a pregar o Evangelho em todos os tempos e
lugares, para que a fé n’Ele se estenda a todos os cantos da terra.
I. uma
igreja “em saída”
20. Na Palavra de Deus, aparece
constantemente este dinamismo de “saída”, que Deus quer provocar nos crentes.
Abraão aceitou a chamada para partir
rumo a uma nova terra [22]. Moisés
ouviu a chamada de Deus: «Vai; Eu te envio» [23], e fez
sair o povo para a terra prometida [24].
A Jeremias disse: «Irás aonde Eu te
enviar» [25].
Naquele «ide» de Jesus, estão
presentes os cenários e os desafios sempre novos da missão evangelizadora da
Igreja, e hoje todos somos chamados a esta nova «saída» missionária.
Cada cristão e cada comunidade há-de
discernir qual é o caminho que o Senhor lhe pede, mas todos somos convidados a
aceitar esta chamada: sair da própria comodidade e ter a coragem de alcançar
todas as periferias que precisam da luz do Evangelho.
21. A alegria do Evangelho, que enche
a vida da comunidade dos discípulos, é uma alegria missionária. Experimentam-na
os setenta e dois discípulos, que voltam da missão cheios de alegria [26].
Vive-a Jesus, que exulta de alegria no
Espírito Santo e louva o Pai, porque a sua revelação chega aos pobres e aos
pequeninos [27].
Sentem-na, cheios de admiração, os
primeiros que se convertem no Pentecostes, ao ouvir «cada um na sua própria
língua» [28] a pregação
dos Apóstolos.
Esta alegria é um sinal de que o
Evangelho foi anunciado e está a frutificar.
Mas contém sempre a dinâmica do êxodo
e do dom, de sair de si mesmo, de caminhar e de semear sempre de novo, sempre
mais além.
O Senhor diz: «Vamos para outra parte,
para as aldeias vizinhas, a fim de pregar aí, pois foi para isso que Eu vim» [29].
Ele, depois de lançar a semente num
lugar, não se demora lá a explicar melhor ou a cumprir novos sinais, mas o
Espírito leva-O a partir para outras aldeias.
22. A Palavra possui, em si mesma, uma
tal potencialidade, que não a podemos prever.
O Evangelho fala da semente que, uma
vez lançada à terra, cresce por si mesma, inclusive quando o agricultor dorme [30]. A
Igreja deve aceitar esta liberdade incontrolável da Palavra, que é eficaz a seu
modo e sob formas tão variadas que muitas vezes nos escapam, superando as
nossas previsões e quebrando os nossos esquemas.
23. A intimidade da Igreja com Jesus é
uma intimidade itinerante, e a comunhão «reveste essencialmente a forma de
comunhão missioná- ria».[31]
Fiel ao modelo do Mestre, é vital que
hoje a Igreja saia para anunciar o Evangelho a todos, em todos os lugares, em
todas as ocasiões, sem demora, sem repugnâncias e sem medo.
A alegria do Evangelho é para todo o
povo, não se pode excluir ninguém; assim foi anunciada pelo anjo aos pastores
de Belém: «Não temais, pois anuncio-vos uma grande alegria, que o será para
todo o povo» [32].
O Apocalipse fala de «uma Boa Nova de
valor eterno para anunciar aos habitantes da terra: a todas as nações, tribos,
línguas e povos» [33].
(cont)
(Revisão da versão portuguesa por ama)
Notas:
[1] Paulo VI, Exort.
ap. Evangelii nuntiandi (8 de Dezembro de 1975), 7: AAS 68 (1976), 9.
[2] 1 Jo 4, 19
[3] 1 Cor 3, 7
[4] cf. Lc 22, 19
[5] Jo 1, 39
[6] Heb 12, 1
[7] Heb 13, 7
[8] 2 Tm 1, 5
[9] Cf. Propositio 7.
[10] Bento XVI, Homilia
durante a Missa conclusiva da XIII Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos
Bispos (28 de Outubro de 2012): AAS 104 (20
[11] Ibidem.
[12] Bento XVI, Homilia
na Eucaristia de inauguração da V Conferência Geral do Episcopado
Latino-americano e do Caribe (Santuário da Aparecida – Brasil, 13 de Maio de
2007): AAS 99 (2007), 437.
[13] Carta enc.
Redemptoris missio (7 de Dezembro de 1990), 34: AAS 83 (1991), 280.
[14] Ibid., 40: o. c.,
287.
[15] Ibid., 86: o. c.,
333
[16] V Conferência Geral
do Episcopado Latino-americano e do Caribe, Documento de Aparecida (29 de Junho
de 2007), 548
[17] Ibid., 370.
[18] Lc 15, 7
[19] Cf. Propositio 1.
[20] Fl 4, 4
[21] Mt 28, 19-20
[22] cf. Gn 12, 1-3
[23] Ex 3, 10
[24] cf. Ex 3, 17
[25] Jr 1, 7
[26] cf. Lc 10, 17
[27] cf. Lc 10, 21
[28] Act 2, 6
[29] Mc 1, 38
[30] cf. Mc 4, 26-29
[31] João Paulo II,
Exort. ap. pós-sinodal Christifideles laici (30 de Dezembro de 1988), 32: AAS
81 (1989), 451.
[32] Lc 2, 10
[33] Ap 14, 6
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