Em
seguida devemos tratar da oração de Cristo.
E
nesta questão discutem-se quatro artigos:
Art.
1 — Se convinha a Cristo orar.
Art.
2 — Se a Cristo, considerado na sua sensibilidade, convinha orar.
Art.
3 — Se convinha a Cristo orar por si.
Art.
4 — Se a oração de Cristo sempre foi ouvida.
Art. 1 — Se convinha a
Cristo orar.
O
primeiro discute-se assim. — Parece que a Cristo não convinha o orar.
1.
— Pois, como diz Damasceno, orar é pedir
o que convém, a Deus. Ora, podendo Cristo fazer tudo, não lhe convém pedir
nada a ninguém. Logo, parece que não convinha a Cristo o orar.
2.
Demais. — Não devemos pedir, nas nossas orações, o que sabemos haver certamente
de se dar, assim, não oramos para o sol nascer amanhã. Também não é conveniente
pedir nas nossas orações o que sabemos que de nenhum modo se dará. Ora, Cristo
sabia, em tudo, o que haveria de suceder. Logo, não lhe cabia pedir nada, pela
oração.
3.
Demais. — Damasceno diz que a oração é
ascensão do nosso intelecto para Deus. Ora, o intelecto de Cristo não
precisava ascender para Deus, com quem estava sempre unido, não só pela união
hipostática mas também pela fruição da bem-aventurança. Logo, a Cristo não
convinha orar.
Mas,
em contrario, o Evangelho: Aconteceu
naqueles dias que saiu ao monte a orar e passou toda a noite em oração a Deus.
Como dissemos na Segunda Parte, a oração é um como expandir-se da nossa
vontade para com Deus, para que a satisfaça. Se, pois, Cristo tivesse uma só
vontade – a divina, de nenhum modo lhe cabia orar, pois, a vontade divina faz
por si mesma tudo quanto quer, segundo a Escritura: Quantas coisas quis todas fez o Senhor. Mas, tendo Cristo uma
vontade divina e outra, humana, e não sendo a sua vontade humana capaz, por si
mesma, de fazer o que quer, senão por virtude divina, daí vem que era natural a
Cristo orar, enquanto homem e dotado de uma vontade humana.
DONDE
A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — Cristo, como Deus, podia fazer tudo o que
queria, mas não como homem, pois, como tal, não tinha a omnipotência, como
dissemos. Contudo ele quis, mesmo como homem e Deus, fazer oração ao Pai, não
porque não fosse omnipotente, mas para nossa instrução. — Primeiro, para
mostrar que vinha do Pai, sendo por isso que disse: Falei assim, isto e, orei por atender a este povo que está à roda de
mim, para que eles creiam que tu me enviaste. Donde o dizer Hilário: Não precisava de orar, orou por nós, para
que o Filho não fosse ignorado. — Segundo, para nos dar o exemplo da
oração. E por isso diz Ambrósio: Não
escuteis com ouvidos enganosos, pensando que o Filho de Deus orava, por
fraqueza, pedindo se realizar o que não podia ele realizar. Mas, como fonte de
todo poder, como mestre da obediência, ensina-nos, com o seu exemplo, os
preceitos da virtude. Daí o dizer Agostinho: O Senhor podia, sob a forma de servo, e se o fosse necessário, orar em
silêncio, mas quis apresentar-se ao Pai como pecador, para lembrar que era o
nosso Mestre.
RESPOSTA
À SEGUNDA. — Entre as várias coisas futuras que Cristo sabia, sabia que algumas
se realizariam mediante as suas orações. E essas não era inconveniente que as
pedisse a Deus.
RESPOSTA
À TERCEIRA. — A ascensão não é mais que o movimento para o que está em cima.
Ora, o movimento, conforme Aristóteles, é susceptível de duplo sentido. - Num
sentido próprio implica a passagem a potência para o acto, enquanto é o acto do
que é imperfeito. E assim, ascender é próprio do que é potencial, e não actual,
em relação ao que está em cima. E neste sentido Damasceno diz: O intelecto humano de Cristo não precisava
de ascender para Deus, pois, estava sempre unido com Deus, tanto pela sua
existência pessoal, como pela contemplação beatífica. — Noutro sentido, o
movimento é o acto do perfeito, isto é, do que existe em acto, e assim chamamos
movimento ao inteligir e ao sentir. E neste sentido, o intelecto de Cristo sempre
ascende para Deus, pois sempre o contemplava como o que tinha uma existência
superior.
Nota:
Revisão da versão portuguesa por ama.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.