12/02/2015

Tratado do verbo encarnado 119

Questão 18: Da unidade de Cristo quanto a vontade

Art. 2 — Se em Cristo havia uma vontade sensitiva, além da vontade racional.

O segundo discute-se assim. — Parece que em Cristo não havia uma vontade sensitiva além da vontade racional.

1. — Pois, diz o Filósofo, que a vontade está na razão, ao passo que no apetite sensitivo tem sua sede o irascível e o concupiscível. Ora, a sensibilidade significa o apetite sensitivo. Logo, em Cristo não havia nenhuma vontade sensitiva.

2. Demais. — Segundo Agostinho, a sensualidade é significada pela serpente. Ora, não houve em Cristo nada de serpentino, pois, teve a semelhança do animal venenoso, sem veneno, no dizer de Agostinho, comentando a Escritura. - Como Moisés no deserto levantou a serpente. Logo, em Cristo não havia nenhuma vontade sensitiva.

3. Demais. — A vontade resulta da natureza, como se disse. Ora, Cristo não teve senão uma natureza, além da divina. Logo, em Cristo não houve senão uma vontade humana.

Mas, em contrário, diz Ambrósio: É minha a vontade a que chama sua, porque, como homem, assumiu a minha tristeza. E isso significa que a tristeza respeita à vontade humana de Cristo. Ora, a tristeza diz respeito à sensibilidade, como se estabeleceu na Segunda Parte. Logo, parece que houve em Cristo uma vontade sensitiva, além da racional.

Como dissemos, o Filho de Deus assumiu — natureza humana com todas as perfeições que ela encerra. Ora, a natureza humana implica também a animal, como na espécie se inclui o género. Donde e necessariamente, o Filho de Deus assumiu, com a natureza humana, também o pertencente à perfeição da natureza animal. O que inclui o apetite sensitivo, chamado sensualidade. Donde devemos concluir, que houve em Cristo o apetite sensitivo ou sensualidade. Devemos porém saber que a sensualidade ou o apetite sensível, enquanto por natureza obedece à razão, chama-se racional por participação, como está claro no Filósofo. E, estando a vontade na razão, como se disse, pelo mesmo motivo devemos dizer, que a sensualidade é vontade por participação.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — A objecção colhe, quanto à vontade essencialmente dita que só existe na parte intelectiva. Ora, a vontade, como participação, pode residir na parte sensitiva, enquanto esta obedece à razão.

RESPOSTA À SEGUNDA. — A sensualidade é significada pela serpente, não quanto à natureza da sensualidade, que Cristo assumiu, mas, quanto à corrupção da concupiscência, que não existiu em Cristo.

RESPOSTA À TERCEIRA. — Aquilo que existe por causa de outra coisa identifica-se com esta, assim a superfície, visível pela cor, faz com esta um só visível. Semelhantemente, porque a sensualidade não se chama vontade senão por participar da razão, assim como Cristo só tem uma natureza humana, assim também lhe atribuímos uma só vontade humana.

Nota: Revisão da versão portuguesa por ama.


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