Art.
6 — Se é falsa a proposição, Deus se fez homem.
O sexto discute-se assim. — Parece
falsa a proposição: Deus se fez homem.
1. — Pois, homem, significando uma
substância, fazer-se homem é fazer-se em sentido absoluto. Ora, é falsa a
proposição: Deus se fez, em sentido absoluto. Logo também esta outra é falsa:
Deus se fez homem.
2. Demais. — Fazer-se homem é
mudar-se. Ora, Deus não pode ser sujeito de mudança, conforme a Escritura: Eu
sou o Senhor e não me mudo. Logo, parece falsa a proposição: Deus se fez homem.
3. Demais. — A palavra homem,
predicada de Deus, supõe a pessoa do Filho de Deus. Ora, é falsa a proposição:
Deus se fez a pessoa do Filho de Deus. Logo, esta outra também é falsa: Deus se
fez homem.
Mas, em contrário, o Evangelho: O
Verbo se fez carne. Ora, como diz Atanásio, o dito — O Verbo se fez carne — é
semelhante ao outro — Deus se fez homem.
Dizemos que um ser é feito
quando podemos atribuir-lhe uma qualificação nova. Ora, ser homem
verdadeiramente predica-se de Deus, como dissemos. Mas, no sentido em que não
convém a Deus ser homem abeterno, senão só temporalmente, pela assunção da
natureza humana. Logo, é verdadeira a proposição — Deus se fez homem. Mas essa
proposição – bem como a outra: Deus é homem — alguns entendem-na diversamente,
como se disse.
DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO.
— Fazer-se homem é fazer-se em sentido absoluto, para todos aqueles nos quais a
natureza humana começa a existir num suposto criado no tempo. Mas, dizemos que
Deus se fez homem, por ter a natureza humana começado a existir, no suposto da
natureza divina preexistente abeterno. Logo, o fazer-se Deus, homem, não é
fazer-se absolutamente falando.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Como dissemos
ser feito implica uma predicação nova atribuída a um ser. Donde, sempre que uma
predicação nova é atribuída a um ser, implicando neste uma mudança, fazer-se é
mudar-se. E isto se aplica a tudo o que se diz em sentido absoluto, assim, não
pode a brancura ou a negrura ser uma atribuição nova de um sujeito, senão
porque este sofreu uma mudança no sentido da brancura ou da cor negra. As
predicações relativas, porém, podem começar a ser atribuídas a um sujeito, sem
nenhuma mudança deste, assim um homem poderá passar à direita sem sofrer
nenhuma mudança pelo movimento do que passou à esquerda. E tais casos, não
implicam nenhuma mudança naquilo de que se diz que foi feito, pois, isto pode
resultar da mudança de outro ser. E é nesse sentido que dizemos a Deus: Senhor,
tu tens sido o nosso refúgio. — Ora, ser homem convém a Deus em virtude da
união, que é uma relação. Donde, ser homem começa a ser predicado de Deus, sem
nenhuma mudança nele, por mudança da natureza humana, assumida na Pessoa
divina. E assim, quando dizemos — Deus se fez homem — isso não implica nenhuma
mudança por parte de Deus, mas só da parte da natureza humana.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Homem supõe a
pessoa do Filho de Deus, não pura e simples, mas enquanto subsistente na
natureza humana. Donde, embora seja falsa a proposição — Deus se fez a pessoa
do Filho de Deus — contudo é verdadeira esta outra — Deus se fez homem — por se
ter unido à natureza humana.
Nota:
Revisão da versão portuguesa por ama.
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