01/02/2015

Tratado do verbo encarnado 108

Questão 16: Do conveniente a Cristo no seu ser e no seu dever

Art. 5 — Se as propriedades da natureza humana podem ser atribuídas à natureza divina.

O quinto discute-se assim — Parece que as propriedades da natureza humana podem ser atribuídas à natureza divina.

1. — Pois, as propriedades da natureza humana predicam-se do Filho de Deus e de Deus. Ora, Deus é a sua natureza. Logo, as propriedades da natureza humana podem predicar-se da natureza divina.

2. Demais. — A carne faz parte da natureza humana. Ora, como diz Damasceno, afirmamos, segundo os santos Atanásio e Cirilo, a natureza encarnada do Verbo. Logo, parece que, pela mesma razão, as propriedades, da natureza humana podem predicar-se da natureza divina.

3. Demais. — As propriedades da natureza divina convêm à natureza humana de Cristo, assim, conhecer o futuro e ter o poder de salvar. Logo, parece que, pela mesma razão, as propriedades da natureza humana podem predicar-se da natureza divina.

Mas, em contrário, Damasceno diz: Quando falamos da divindade não lhe atribuímos as particularidades da humanidade, isto é, as propriedades, assim não dizemos ser a divindade passível ou um ser criável. Ora, a divindade é a natureza divina. Logo, as propriedades da natureza humana não podem predicar-se da natureza divina.

 As propriedades de um ser não podem verdadeiramente predicar-se de outro, a menos que seja idêntico com ele, assim, a faculdade de rir só convém ao homem. Ora, no mistério da Encarnação, não se identifica a natureza divina com a humana, é a mesma porém a hipóstase de ambas. Donde, as propriedades de uma natureza não podem predicar-se da outra, enquanto significadas em abstrato. Mas os nomes concretos supõem a hipóstase da natureza. Por isso, as propriedades de uma e de outra natureza podem, sem diferenças, ser predicadas dos nomes concretos. Quer o nome de que se predicam exprima uma e outra natureza, como o nome Cristo, pelo qual se entende a divindade que unge a humanidade, que é ungida, quer exprima só a natureza divina, como o nome de Deus, ou de Filho de Deus, quer, só a natureza humana, como o nome de homem ou de Jesus. Donde o dizer Leão Papa: Não importa a substância pela qual designemos Cristo, desde que, subsistindo a unidade de pessoa, o mesmo ser é totalmente o filho do homem, por causa da carne, e totalmente o filho de Deus, por causa da divindade, que lhe é comum com o Pai.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — Em Deus realmente a pessoa se identifica com a natureza, e em razão dessa identidade a natureza divina se predica do Filho de Deus. Mas, o modo de significar não é o mesmo. Por isso, certas atribuições convêm ao Filho de Deus, que não convêm à natureza divina, assim, dizemos ser o Filho de Deus gerado, mas não dizemos que o seja a natureza divina, como se estabeleceu na Primeira Parte. E semelhantemente, no mistério da Encarnação dizemos que o Filho de Deus sofreu, mas não dizemos que sofreu a natureza divina.

RESPOSTA À SEGUNDA. — A Encarnação supõe antes a união com a carne do que as propriedades da carne. Ora, cada natureza, em Cristo, uniu-se à outra, na pessoa, em razão de cuja união dizemos, de um lado, que a natureza humana se encarnou e que a natureza humana se deificou, como mostramos.

RESPOSTA À TERCEIRA. — As propriedades da natureza divina predicam-se da natureza humana, não segundo convêm essencialmente à natureza divina, mas enquanto deriva participativamente para a natureza humana. Donde, o que não pode ser participado pela natureza humana, como ser incriada ou onipotente, não é de nenhum modo dela predicado. Ora, a natureza divina nada recebe, por participação, da natureza humana. Logo, as propriedades da natureza humana de nenhum modo podem se predicar da natureza divina.

Nota: Revisão da versão portuguesa por ama.


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