Art.
6 — Se Cristo sofreu a tristeza.
O sexto discute-se assim. — Parece que
Cristo não sofreu a tristeza.
1. — Pois, diz de Cristo a Escritura:
Não será triste nem turbulento.
2. Demais. — Diz a Escritura: Não
entristecerá ao justo coisa alguma, seja o que for que lhe acontecer. E a razão
disto os estoicos davam-na dizendo, que ninguém se entristece senão pela perda
dos seus bens, ora o justo não considera bens senão a justiça e a virtude, que
não pode perder. Do contrário, estaria sujeito à fortuna, se se entristecesse
quando perdesse os bens dela. Ora, Cristo era o justo por excelência, segundo a
Escritura: Este é o nome que lhe chamaram, o Senhor nosso justo. Logo, não
sofreu a tristeza,
3. Demais. — O Filosofo diz, que toda
tristeza deve ser evitada como um mal. Ora, Cristo não tinha que evitar nenhum
mal. Logo, não sofreu a tristeza.
4. Demais. — Como diz Agostinho, Nós nos
entristecemos com o que nos contraria a vontade. Ora, Cristo não sofreu nada
contra a sua vontade, pois, como diz a Escritura, foi oferecido porque ele
mesmo quis. Logo, Cristo não sofreu a tristeza.
Mas, em contrário, diz o Senhor: A
minha alma está numa tristeza mortal. E Ambrósio: Como homem, sofreu tristeza,
pois, assumiu a minha tristeza, Pois, exprimo por certo a tristeza quando me
refiro à cruz.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO.
— Cristo não sofreu a tristeza, como paixão, no seu sentido perfeito, mas houve
nele uma tristeza incoativa, como pro-paixão. Donde o dizer a Escritura: Começou
a entristecer-se e a angustiar-se. — Ora, uma coisa é entristecer-se e outra
começar a entristecer-se.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Como diz
Agostinho, os estoicos ensinavam que há na alma do sábio três eupatias, isto é,
boas paixões, correspondentes às três perturbações - a cobiça, a alegria e o
temor. Essas três eupatias correspondentes são: a cobiça, a vontade, a alegria,
o gáudio, o medo, a cautela. Mas negavam que pudesse haver algo na alma do
sábio de correspondente à tristeza, porque a tristeza supõe um mal já
acontecido, ora, julgavam que nenhum mal podia atingir o sábio. E pensavam
assim por só considerarem como bem o honesto, que torna os homens bons, e como
sendo mal só o desonesto, que torna os homens maus. — Mas, embora o honesto
seja o principal bem do homem, e o desonesto o mal principal, por dizerem
respeito à razão, que é o principal no homem, há contudo, alguns bens humanos
secundários, relativos ao corpo ou às coisas exteriores que servem ao corpo. E,
assim sendo, pode haver tristeza na alma do sábio, quando o apetite sensitivo
venha a apreender algum dos referidos males, não vai porém essa tristeza até
perturbar a razão. E também a esta luz se entende que o justo não se
contristará, seja o que for que lhe suceda, pois, nenhum acontecimento lhe
perturba a razão, Donde, Cristo sofreu tristeza, quanto à pro-paixão, mas não
quanto à paixão.
RESPOSTA À TERCEIRA. — Toda tristeza
implica o mal da pena, mas nem sempre o mal da culpa, senão só quando procede
do afecto desordenado. Donde o dizer Agostinho: Quando estas paixões obedecem à
razão recta e lhes cedemos em tempo e lugar oportunos, quem ousará chamar-lhes
doenças ou paixões más?
RESPOSTA À QUARTA. — Nada impede que uma
coisa contrária à vontade ser, em si mesma considerada e, contudo, querida, em
razão do fim a que se ordena. Assim, não queremos em si mesmo um remédio
amargo, mas enquanto ordenado à saúde. Ora, deste modo, a morte de Cristo e a
sua paixão foram, consideradas em si mesmas, involuntárias e causas de tristeza,
embora fossem voluntárias quanto ao fim, que é a redenção do género humano.
Nota:
Revisão da versão portuguesa por ama.
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