Em seguida devemos tratar das
fraquezas que Cristo assumiu em a natureza humana. E, primeiro, das fraquezas
do corpo. Segundo, das fraquezas da alma.
Na primeira questão discutem-se quatro
artigos:
Art. 1 — Se o Filho de Deus devia
assumir a natureza humana com as suas fraquezas corpóreas.
Art. 2 — Se Cristo estava
necessariamente sujeito às misérias humanas.
Art. 3 — Se Cristo contraiu alguma
fraqueza corporal.
Art. 4 — Se Cristo devia ter assumido
todas as misérias corporais dos homens.
Art.
1 — Se o Filho de Deus devia assumir a natureza humana com as suas fraquezas
corpóreas.
O primeiro discute-se assim. — Parece
que o Filho de Deus não devia ter assumido a natureza humana com as suas
fraquezas corpóreas.
1. — Pois, assim como a alma está
unida pessoalmente ao Verbo de Deus, assim também o corpo. Ora, a alma de
Cristo tinha uma absoluta perfeição, quanto à graça e quanto à ciência, como se
disse. Logo, também o seu corpo devia ser a todas as luzes perfeito, sem
nenhuma fraqueza.
2. Demais. — A alma de Cristo
contemplava o Verbo de Deus pela contemplação com que o veem os
bem-aventurados, como se disse, e assim, era bem-aventurada. Ora, a bem-aventurança
da alma glorifica o corpo. Assim, diz Agostinho: Deus fez a alma de tão potente
natureza, que da sua pleníssima bem-aventurança redunda também em a natureza
inferior, que é o corpo, não bem-aventurança, própria de quem frui e contempla,
mas, a plenitude da saúde, isto é, o vigor da incorrupção. Logo, o corpo de
Cristo foi incorruptível e sem nenhuma fraqueza.
3. Demais. — A pena resulta da culpa.
Ora, Cristo não tinha nenhuma culpa, segundo a Escritura: O qual não cometeu
pecado. Logo, também não deviam existir nele as fraquezas corpóreas, que são
penais.
4. Demais. — Ninguém, que tenha
sabedoria, assume o que o priva do seu fim próprio. Ora, as referidas fraquezas
do corpo impedem de muitos modos o fim da Encarnação. Primeiro, porque, por
elas os homens ficavam impedidos de conhecê-la, segundo aquilo da Escritura:
Vimo-lo e não tinha parecença do que era, feito um objecto de desprezo e o
último dos homens, um varão de dores e experimentado nos TRABALHOS, e o seu
rosto se achava como encoberto e parecia desprezível, por onde, nenhum caso
fizemos dele. Segundo, porque assim não se cumpria o desejo dos Santos
Patriarcas, de cuja pessoa diz a Escritura: Levanta-te, levanta-te, arma-te de
fortaleza, o braço do Senhor. Terceiro, porque mais convenientemente pela
fortaleza do que pela fraqueza podia ser superado o poder do diabo e sanada a
fraqueza humana. Logo, parece que era conveniente que o Filho de Deus assumisse
a natureza humana com as suas fraquezas ou deficiências corpóreas.
Mas, em contrário, o Apostolo: À vista
de tudo quanto ele padeceu e em que foi tentado é poderoso para ajudar também
aqueles que são tentados. Ora, ele veio para nos auxiliar, donde o dizer a
Escritura: Levantei os meus olhos para os montes, donde me virá socorro. Logo,
era conveniente que o Filho de Deus assumisse a carne sujeita às fraquezas
humanas de modo que pudesse por ela sofrer e ser tentado e assim trazer-nos
auxílio.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO.
— A satisfação pelo pecado de outrem tem, como sua matéria, as penas sofridas
por esse pecado, mas tem como princípio o hábito da alma que inclina a vontade
a satisfazer por outro, donde tira a satisfação a sua eficácia, pois, não seria
eficaz a satisfação se não procedesse da caridade, como depois se dirá. E por
isso era necessário que a alma de Cristo fosse perfeita quanto ao hábito das
ciências e das virtudes, para que tivesse a faculdade de satisfazer, e
necessário também era que o seu corpo estivesse sujeito às misérias para que
lhe não faltasse a matéria da satisfação.
RESPOSTA À SEGUNDA. — Da relação
natural que há entre a alma e o corpo resulta o redundar no corpo a glória da
alma. Mas, essa relação natural, em Cristo, depende da vontade da sua
divindade, em virtude da qual a bem-aventurança permanecia na alma, sem derivar
para o corpo, ao passo que a carne sofria os sofrimentos da natureza passível,
segundo aquelas palavras de Damasceno: Por beneplácito da divina vontade era
permitido à carne sofrer e realizar as suas operações próprias.
RESPOSTA À TERCEIRA. — A pena resulta
sempre da culpa actual ou original daquele que é punido, umas vezes, e outras,
daquele que satisfaz as penas por ele. Tal como se deu com Cristo, conforme a
Escritura: Ele foi ferido pelas nossas iniquidades, foi quebrantado pelos
nossos crimes.
RESPOSTA À QUARTA. — As fraquezas
assumidas por Cristo não impediam a fé na Encarnação, ao contrário, promovia-a,
como dissemos. Embora essas fraquezas lhe ocultassem a divindade, manifestavam-lhe
contudo a humanidade, que é via conducente à divindade, segundo o Apóstolo:
Temos acesso a Deus por Jesus Cristo. Quanto aos antigos Patriarcas, eles
desejavam em Cristo não certamente a força do corpo, mas a espiritual, pela
qual venceu o diabo e sanou a fraqueza humana.
Nota:
Revisão da versão portuguesa por ama.
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