24/01/2015

Tratado do verbo encarnado 100

Questão 15: Das fraquezas atinentes à alma que Cristo assumiu com a natureza humana

Art. 7 — Se em Cristo houve temor.

O sétimo discute-se assim. — Parece que em Cristo não houve temor.

1. — Pois, diz a Escritura: O justo, como leão afoito, sem terror. Ora, Cristo era o justo por excelência. Logo, em Cristo não houve nenhum terror.

2. Demais. — Hilário diz: Pergunto àqueles, que tem tal persuasão, se é racional pensar que temesse a morte quem, expulsando da alma dos Apóstolos todo terror da morte, os exportava à glória do martírio. Logo, não é racional que houvesse em Cristo o temor.

3. Demais. — O homem só tem temor daquilo que não pode evitar. Ora, Cristo podia evitar tanto o mal da pena que sofreu, como o da culpa que atingiu os demais. Logo, em Cristo não houve nenhum temor.

Mas, em contrário, o Evangelho: Jesus começou a ter pavor e a angustiar-se.

Assim como a tristeza é causada pela apreensão do mal presente, assim o temor, pela do mal futuro. Ora, a apreensão do mal futuro, mesmo revestida de toda certeza, não causa temor. Donde o dizer o Filósofo, só há temor do que não temos nenhuma esperança de evitar, pois, o que nenhuma esperança de evitar, pois, o que nenhuma esperança temos de evitar apreendemos como um mal presente e, assim, causa antes tristeza que temor. 

Donde, o temor pode ser considerado a dupla luz. — Primeiro, quanto ao facto de o apetite sensitivo fugir naturalmente ao mal corpóreo presente, pela tristeza, e pelo temor, se for futuro. Ora, deste modo, houve temor em Cristo, como houve tristeza. — Pode ser considerado a outra luz, quanto à incerteza do acontecimento futuro, assim, quando tememos, de noite, por um som que ouvimos e cuja proveniência ignoramos. E deste modo, em Cristo não houve temor, como diz Damasceno.

DONDE A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — Dissemos que o justo não tem terror, compreendendo-se o terror como uma paixão perfeita, que priva o homem do bem da razão. E assim, não houve terror em Cristo, senão só na pro-paixão. Por isso, o Evangelho refere que Jesus começou a ter pavor e a angustiar-se, quase pela pro-paixão, como expõe Jerónimo.

RESPOSTA À SEGUNDA. — Hilário exclui de Cristo o temor no mesmo sentido em que dele exclui a tristeza, isto é, quanto à necessidade que ele impõe. Contudo, para provar que assumiu verdadeiramente a natureza humana, Jesus assumiu voluntariamente o temor, como também a tristeza.

RESPOSTA À TERCEIRA. — Embora Cristo pudesse evitar os males futuros, pelo poder da sua divindade, contudo eles eram inevitáveis, ou não facilmente evitáveis, por causa da fraqueza da carne.

Nota: Revisão da versão portuguesa por ama.


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