Evangelho: Jo 3 22-30
22 Depois disto, foi Jesus com os Seus discípulos para
a terra da Judeia. Convivia com eles e baptizava. 23 João estava também a baptizar
em Enon, junto a Salim, porque havia ali muita água e o povo concorria para ser
baptizado. 24 João ainda não tinha sido metido na prisão. 25 Levantou-se uma
questão entre os discípulos de João e um judeu acerca da purificação. 26 Foram
ter com João e disseram-lhe: «Mestre, O que estava contigo além Jordão, de Quem
tu deste testemunho, ei-l'O que está a baptizar e todos vão a Ele». 27 João
respondeu: «O homem não pode receber coisa alguma se lhe não for dada do céu.
28 Vós próprios sois testemunhas de que vos disse: Eu não sou o Cristo, mas fui
enviado diante d'Ele. 29 O que tem a esposa é o esposo, mas o amigo do esposo,
que está ao lado e o ouve, enche-se de gozo com a voz do esposo. Esta é a minha
alegria e ela é perfeita. 30 Convém que Ele cresça e eu diminua.
Comentário:
As
duas figuras centrais da redenção - Jesus Cristo e João Baptista -
têm uma ligação íntima e permanente o que o segundo faz - sempre - é em função
do segundo que, aliás, é a razão verdadeira da sua existência.
O
seu papel de Percursor, reveste-se especialíssima importância.
Ainda hoje em dia, por exemplo, as chamadas visitas de estado são preparadas com o envio de embaixadores cuja tarefa é exactamente aplanar as dificuldades que possam existir, para que, a visita obtenha os frutos esperados.
(ama, comentário sobre Jo 3, 22-30
2014.01.11)
Leitura espiritual
São Josemaria Escrivá
Amigos de Deus 309 a 316
309
Assim
actua o Nosso Deus. Quando aquele filho regressa, depois de ter gasto o seu
dinheiro, vivendo mal, depois - sobretudo - de se ter esquecido do pai, o pai
diz: depressa, trazei aqui o vestido mais rico e vesti-lho e colocai-lhe um
anel no dedo; calçai-lhe as sandálias. Tomai um vitelo gordo, matai-o e comamos
e celebremos um banquete. O Nosso Pai, Deus, quando recorremos a Ele com
arrependimento, tira riqueza da nossa miséria e força da nossa debilidade. Que
preparará para nós, se não O abandonarmos, se O procurarmos todos os dias, se
Lhe dirigirmos palavras carinhosas confirmadas pelas nossas acções, se Lhe
pedirmos tudo, confiados na Sua omnipotência e na Sua misericórdia? Só por o
filho voltar a Ele, depois de o atraiçoar, prepara um banquete. Que nos
concederá, a nós, que procurámos ficar sempre ao Seu lado?
Longe
da nossa conduta, portanto, a lembrança das ofensas que nos tenham feito, das
humilhações que tenhamos padecido - por mais injustas, grosseiras e rudes que
tenham sido - porque é impróprio de um filho de Deus ter um registo preparado
para apresentar depois uma lista de ofensas. Não podemos esquecer o exemplo de
Cristo. Não se muda a nossa fé cristã como quem muda um vestido: pode
enfraquecer ou robustecer-se ou perder-se. Com esta vida sobrenatural
revigora-se a fé e a alma aterra-se ao considerar a miserável nudez humana sem
o auxílio divino. E perdoa e agradece: meu Deus, se contemplo a minha pobre
vida não encontro nenhum motivo de vaidade e menos ainda de soberba; só
encontro abundantes razões para viver sempre humilde e compungido. Sei bem que
a melhor nobreza é servir.
310
Oração viva
Levantar-me-ei
e percorrerei a cidade: pelas ruas e praças procurarei aquele que amo... E não
apenas a cidade; correrei o mundo de lés a lés - por todas as nações, por todos
os povos, por carreiros e atalhos - para conquistar a paz da minha alma. E
descubro-a nas ocupações diárias, que não me servem de estorvo; que são - pelo
contrário - o caminho e a ocasião de amar cada vez mais e de cada vez mais me
unir a Deus.
E
quando a tentação do desânimo, dos contrastes, da luta, da tribulação, de uma
nova noite da alma nos ataca -violenta -, o salmista põe-nos nos lábios e na inteligência
aquelas palavras: estou com Ele no tempo da adversidade. Jesus, perante a Tua
Cruz, que vale a minha; perante as Tuas feridas, os meus arranhões? Perante o
Teu Amor imenso, puro e infinito, que vale o minúsculo fardo que Tu colocaste
sobre os meus ombros? E os vossos corações e o meu enchem-se de uma santa
avidez, confessando-Lhe - com obras - que morremos de Amor.
Nasce
uma sede de Deus, uma ânsia de compreender as Suas lágrimas; de ver o Seu
sorriso, o Seu rosto... Julgo que o melhor modo de o exprimir é voltar a
repetir, com a Escritura: como o veado deseja a fonte das águas, assim a minha
alma te anela, ó meu Deus! E a alma avança, metida em Deus, endeusada: o
cristão tornou-se um viajante sedento, que abre a boca às águas da fonte.
311
Com
esta entrega, o zelo apostólico ateia-se, aumenta dia-a-dia - pegando esta
ânsia aos outros - porque o bem é difusivo. Não é possível que a nossa pobre
natureza, tão perto de Deus, não arda em desejos de semear no mundo inteiro a
alegria e a paz, de regar tudo com as águas redentoras que brotam do lado
aberto de Cristo, de começar e acabar todas as tarefas por Amor.
Falava
antes de dores, de sofrimentos, de lágrimas. E não me contradigo se afirmo que,
para um discípulo que procura amorosamente o Mestre, é muito diferente o sabor
das tristezas, das penas, das aflições: desaparecem imediatamente, quando
aceitamos deveras a Vontade de Deus, quando cumprimos com gosto os Seus
desígnios, como filhos fiéis, ainda que os nervos pareçam rebentar e o suplício
pareça insuportável.
312
Vida corrente
Interessa-me
afirmar novamente que não me refiro a um modo extraordinário de viver
cristãmente. Que cada um de nós medite no que Deus realizou por ele e como tem
correspondido. Se formos valentes neste exame pessoal, perceberemos o que ainda
nos falta. Ontem comovi-me ao saber de um catecúmeno japonês que ensinava o
catecismo a outros que ainda não conheciam Cristo. E envergonhava-me.
Precisamos de mais fé, de mais fé! E, com a fé, a contemplação.
Recordem
com calma aquela divina advertência, que enche a alma de inquietação e, ao
mesmo tempo, Lhe traz sabores de favo de mel: redemi te, et vocavi te nomine
tuo: meus es tu redimi-te e chamei-te pelo teu nome: és meu! Não roubemos a
Deus o que é Seu. Um Deus que nos amou até ao ponto de morrer por nós, que nos
escolheu desde toda a eternidade, antes da criação do mundo, para sermos santos
na sua presença: e que continuamente nos oferece ocasiões de purificação e de
entrega.
Se
porventura ainda tivéssemos alguma dúvida, receberíamos outra prova dos Seus
lábios: não fostes vós que me escolhestes; fui eu que vos escolhi a vós, para
que possais ir longe e dar fruto; e permaneça abundante esse fruto do vosso
trabalho de almas contemplativas.
Portanto,
fé, fé sobrenatural! Quando a fé fraqueja, o homem tende a imaginar Deus como
se estivesse longe, sem se preocupar com os seus filhos. Pensa na religião como
em algo de justaposto, de exterior à vida, que usa quando não há outro remédio;
espera, não se sabe porquê, manifestações aparatosas, acontecimentos insólitos.
Quando a fé vibra na alma, descobre-se, pelo contrário, que os passos do
cristão não se separam da sua vida humana corrente e habitual. E que esta
santidade grande, que Deus nos exige, se encerra aqui e agora, nas pequenas
coisas de cada dia.
313
Agrada-me
falar de caminho, porque somos caminhantes, dirigimo-nos para a casa do Céu,
para a nossa Pátria. Mas reparemos que um caminho, mesmo que um ou outro trecho
apresente dificuldades especiais, mesmo que alguma vez nos obrigue a passar a
vau um rio ou a atravessar um pequeno bosque quase impenetrável, habitualmente
é simples, sem surpresas. O perigo é a rotina: supor que nisto, no que temos de
fazer em cada instante, não está Deus, porque é tão simples, tão vulgar!
Iam
os dois discípulos para Emaús. O seu caminhar era normal, como o de tantas
outras pessoas que transitavam por aquelas paragens. E aí, com naturalidade,
aparece-Lhes Jesus e vai com eles, com uma conversa que diminui a fadiga. Imagino
a cena: já bem adiantada a tarde. Sopra uma brisa suave. De um lado e de outro,
campos semeados de trigo já crescido e as velhas oliveiras com os ramos prateados
pela luz indecisa...
Jesus,
no caminho! Senhor, que grande és Tu sempre! Mas comoves-me quando te rebaixas
para nos acompanhares, para nos procurares na nossa lida diária. Senhor,
concede-nos a ingenuidade de espírito, o olhar limpo, a mente clara, que
permitem entender-Te, quando vens sem nenhum sinal externo da Tua glória.
314
Termina
o trajecto ao chegar à aldeia e aqueles dois que - sem o saberem - tinham sido
feridos no fundo do coração pela palavra e pelo amor do Deus feito homem, têm
pena de que Ele se vá embora. Porque Jesus despede-se como quem vai para mais
longe. Nosso Senhor nunca se impõe. Quer que O chamemos livremente, desde que
entrevimos a pureza do Amor que nos meteu na alma. Temos de O deter à força e
pedir-Lhe: fica connosco, porque é tarde e já o dia está no ocaso, cai a noite.
Somos
assim: sempre pouco atrevidos, talvez por falta de sinceridade, talvez por
pudor. No fundo pensamos: fica connosco, porque as trevas nos rodeiam a alma e
só Tu és luz, só Tu podes acalmar esta ânsia que nos consome! Porque entre as
coisas belas, honestas, não ignoramos qual é a primeira: possuir sempre Deus.
E
Jesus fica. Abrem-se os nossos olhos como os de Cléofas e os do companheiro,
quando Cristo parte o pão; e, mesmo que Ele volte a desaparecer da nossa vista,
também seremos capazes de empreender de novo a marcha - anoitece - para falar
d'Ele aos outros; porque tanta alegria não cabe num só coração.
Caminho
de Emaús. O nosso Deus encheu este nome de doçura. E Emaús é o mundo inteiro,
porque Nosso Senhor abriu os caminhos divinos da terra.
315
Com os Santos Anjos
Peço
a Nosso Senhor que, durante a nossa permanência neste chão da terra, nunca nos
afastemos do caminhante divino. Para isso aumentemos também a nossa amizade com
os Santos Anjos da Guarda. Todos necessitamos de muita companhia: companhia do
Céu e da terra. Sejamos devotos dos Santos Anjos! A amizade é muito humana, mas
também é muito divina; tal como a nossa vida, que é divina e humana. Temos
presente o que diz Nosso Senhor? Já não vos chamo servos, mas amigos.
Ensina-nos a ter confiança com os amigos de Deus, que já moram no Céu e com as
criaturas que convivem connosco, mesmo com as que parecem afastadas de Nosso
Senhor, para as atrair ao bom caminho.
Terminarei
repetindo com S. Paulo aos Colossenses: não cessamos de orar por vós e de pedir
a Deus que alcanceis pleno conhecimento da sua vontade, com toda a sabedoria e
inteligência espiritual, sabedoria que nasce da oração, da contemplação, da
efusão do Paráclito na alma.
A
fim de que tenhais uma conduta digna de Deus, agradando-Lhe em tudo, produzindo
frutos de toda a espécie de boas obras e crescendo na ciência de Deus;
confortados com toda a fortaleza pelo poder da sua graça, para ter sempre uma
perfeita paciência e longanimidade acompanhada de alegria; dando graças a Deus
Pai, que nos fez dignos de participar da sorte dos santos, iluminando-nos com a
sua luz; que nos arrebatou do poder das trevas e nos transferiu para o reino do
seu Filho muito amado
316
Que
a Mãe de Deus e nossa Mãe nos proteja a fim de que cada um de nós possa servir
a Igreja na plenitude da fé, com os dons do Espírito Santo e com a vida
contemplativa. Cada um, realizando os deveres que lhe são próprios; cada um no
seu ofício e profissão e no cumprimento das obrigações do seu estado, honre o
Senhor com alegria.
Amemos
a Igreja, sirvamo-la com a alegria consciente de quem soube decidir-se a esse
serviço por Amor. E se virmos que alguém anda sem esperança, como os dois de
Emaús, aproximemo-nos com fé - não em nome próprio, mas em nome de Cristo -
para lhe assegurarmos que a promessa de Jesus não pode falhar, que Ele vela
sempre pela sua Esposa: que não a abandona. Que as trevas passarão, porque
somos filhos da luz e estamos chamados a uma vida perdurável.
E Deus enxugará dos seus
olhos todas as lágrimas, já não haverá morte, nem pranto, nem gritos; não
haverá mais dor, porque as primeiras coisas passaram. E disse o que estava
sentado no trono: eis que renovo tudo. E indicou-me: escreve, porque todas
estas palavras são digníssimas de fé e verdadeiras. E continuou: isto é um
facto. Eu sou o Alfa e o Ómega, o princípio e o fim. Àquele que tiver sede
dar-Lhe-ei de beber gratuitamente da fonte da água da vida. Quem vencer
possuirá todas estas coisas e eu serei seu Deus e ele será meu filho.
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