Em
seguida devemos tratar a coragem. E sobre esta questão quatro artigos se
discutem:
Art.
1 — Se a coragem é contrária ao temor.
Art.
2 — Se a coragem resulta da esperança.
Art.
3 — Se a deficiência pode ser causa da coragem.
Art.
4 — Se os corajosos são mais audazes antes dos perigos do que depois de estarem
neles.
Art. 1 — Se a coragem é
contrária ao temor.
(Supra,
q. 23, a. 2).
O
primeiro discute-se assim. — Parece que a coragem não é contrária ao temor.
1. — Pois, como diz Agostinho, a coragem é um vício 1. Ora, o vício é contrário à virtude. Logo, não sendo o temor virtude, mas paixão, a coragem não lhe é contrária.
2.
Demais — A unidade é contrária à unidade. Ora, a esperança é contrária ao
temor. Logo, não o é o temor.
3.
Demais — Uma paixão exclui a sua oposta. Ora, a segurança é a excluída pelo
temor, pois, como diz Agostinho, o temor vela pela sua segurança 2.
Logo, a segurança é contrariada pelo temor e não pela coragem.
Mas,
em contrário, diz o Filósofo, que a coragem é contrária ao temor 3.
Está na natureza dos contrários distarem entre si no máximo grau 4,
como diz Aristóteles. Ora, o que dista em máximo grau do temor é a coragem.
Pois, aquele receia o dano futuro, por causa da vitória deste sobre a pessoa
que teme, ao passo que a coragem afronta o perigo iminente, por causa da sua
vitória sobre o próprio perigo. Donde e manifestamente, a coragem é contrária
ao temor.
DONDE
A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — A ira, a coragem e os nomes de todas as
paixões podem ser tomados em dupla acepção. Numa, enquanto implicam,
absolutamente, o movimento do apetite sensitivo para algum objecto bom ou mau,
e nesse sentido designam paixões. Noutra, enquanto simultaneamente com esse
movimento, implicam desvio da ordem da razão, e nesse sentido designam vícios.
Ora, é nesta última acepção que Agostinho toma a coragem, ao passo que nós a
tomamos na primeira.
RESPOSTA
À SEGUNDA. — Não pode haver pluralidade de contrários à unidade, tomada num
mesmo sentido, mas nada impede que tal se dê quando ela é tomada em sentidos
diversos. E assim, como já dissemos 5, as paixões do irascível têm
dupla contrariedade: uma, pela oposição do bem e do mal, e assim o temor é contrário
à esperança, outra, pela de aproximação e afastamento, e assim a coragem é contrária
ao temor, ao passo que a esperança o é ao desespero.
RESPOSTA
À TERCEIRA. — A segurança não significa nada de contrário ao temor, mas só a
exclusão deste, pois, dizemos que está seguro quem não teme. Donde, a segurança
opõe-se ao temor, como privação, a coragem, porém, como contrário. Ora, como
este inclui em si a privação, assim a coragem inclui a segurança.
Nota:
Revisão da tradução portuguesa por ama.
____________________
Notas:
1. Lib. LXXXIII Quaestion.
(quaest. XXX, XXIV).
2. II Confess. (cap. VI).
3. II Rhetoric. (cap. V).
4. X Metaph. (lect. V).
5.
Q. 23, a. 2, q. 40, a. 4.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.