Em
seguida devemos tratar das paixões do irascível. E, primeiro, da esperança e do
desespero. Segundo, do temor e da audácia. Terceiro, da ira.
Sobre
a primeira questão oito artigos se discutem:
Art.
1 — Se a esperança é o mesmo que o desejo ou cobiça.
Art.
2 — Se a esperança pertence à potência cognitiva.
Art.
3 — Se os brutos têm esperança.
Art.
4 — Se o desespero é o contrário da esperança.
Art.
5 — Se a experiência é causa da esperança.
Art.
6 — Se a juventude e a embriaguez são causas da esperança.
Art.
7 — Se a esperança é causa do amor.
Art.
8 — Se a esperança coadjuva, ou antes, impede a nossa actividade.
Art. 1 — Se a esperança é
o mesmo que o desejo ou cobiça.
(Supra, q. 24, a . 1, III
Sent., dist. XXVI, q. 1, a . 3, q. 2, a . 3, qª 2, De Virtut., q. 4,
a . 1, Compend. Theol., part. II, cap. VII).
O
primeiro discute-se assim. — Parece que a esperança é o mesmo que o desejo ou
cobiça.
2.
Demais — As paixões diferençam-se pelos seus objectos. Ora, a esperança e a
cobiça ou desejo tem o mesmo objecto, que é o bem futuro. Logo, a esperança é o
mesmo que a cobiça ou o desejo.
3.
Demais — Nem vale dizer que a esperança acrescenta ao desejo a possibilidade de
alcançar o bem futuro. — Pois, o que se relaciona acidentalmente com o objecto
não varia a espécie da paixão. Ora, o possível se relaciona acidentalmente com
o bem futuro, que é o objecto da cobiça ou desejo e da esperança. Logo, esta
não é uma paixão especificamente diferente do desejo ou cobiça.
Mas,
em contrário. — Às diversas potências correspondem diversas paixões especificamente
diferentes. Ora, a esperança reside no irascível, ao passo que o desejo e a
cobiça, no concupiscível. Logo, a esperança difere especificamente do desejo ou
cobiça.
As paixões especificam-se pelos seus objectos. Ora, há quatro condições que
devemos considerar relativamente ao objecto da esperança. — A primeira é que
ele deve ser bom, pois, propriamente falando, não há esperança senão do bem. E,
por aqui ela difere do temor, relativo ao mal. — A segunda é que deve ser
futuro, pois a esperança não tem por objecto o bem presente já adquirido. E,
por aqui, difere da alegria, relativa ao bem presente. — A terceira, que deve
ser algo de árduo, que se alcança com dificuldade, pois, não se diz que alguém
espera um objecto insignificante, que com a maior facilidade poderá possuir. E
por aqui difere a esperança, do desejo ou cobiça, que, referente a um bem
absolutamente futuro, pertence ao concupiscível, ao passo que ela pertence ao
irascível. — A quarta é que seja possível alcançar o objecto árduo, pois
ninguém espera o que de nenhum modo pode alcançar. E por aqui a esperança
difere do desespero.
Por
onde é claro que a esperança difere do desejo, assim como as paixões do
irascível, das do concupiscível. E por isso pressupõe o desejo, assim como
todas as paixões do irascível pressupõem as do concupiscível, conforme já
dissemos 1.
DONDE
A RESPOSTA À PRIMEIRA OBJECÇÃO. — Agostinho coloca a cobiça em lugar da
esperança, porque uma e outra visa o bem futuro, e porque o bem que não é árduo
é quase reputado por nada. De modo que o desejo é considerado como tendendo
sobretudo para o bem árduo, para o qual também tende a esperança.
RESPOSTA
À SEGUNDA. — O objecto da esperança não é o bem futuro, absolutamente, mas, o
que se alcança com arduidade e dificuldade, como já dissemos.
RESPOSTA
À TERCEIRA. — O objecto da esperança não somente acrescenta a possibilidade ao objecto
do desejo, mas também a arduidade, e esta faz com que a esperança pertença a
outra potência, a saber, ao irascível, que respeita o árduo, como já dissemos
na primeira parte 2. Ora, o possível e o impossível de nenhum modo
são acidentais relativamente ao objecto da virtude apetitiva. Pois, o apetite é
um princípio de moção. Ora, nenhum ser se move senão para o termo possível,
assim, ninguém se move senão para o que julga poder alcançar. E por isto a
esperança difere do desespero, tanto quanto difere o possível do impossível.
Nota:
Revisão da tradução portuguesa por ama.
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Notas:
1.
Q. 25, a. 1.
2.
Q. 81, a. 2.
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