Não abandones a tua leitura espiritual.
A leitura tem feito muitos santos.
(S. josemaria, Caminho 116)
Está aconselhada a leitura espiritual diária de mais ou menos 15 minutos. Além da leitura do novo testamento, (seguiu-se o esquema usado por P. M. Martinez em “NOVO TESTAMENTO” Editorial A. O. - Braga) devem usar-se textos devidamente aprovados. Não deve ser leitura apressada, para “cumprir horário”, mas com vagar, meditando, para que o que lemos seja alimento para a nossa alma.
Para ver, clicar SFF.
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21 Dizia-lhes mais:
«Porventura traz-se a lâmpada para se pôr debaixo do alqueire ou debaixo da
cama? Não é para ser posta sobre o candelabro? 22 Porque não há
coisa alguma escondida que não venha a ser manifesta, nem que seja feita para
estar oculta, mas para vir a público. 23 Se alguém tem ouvidos para
ouvir, oiça». 24 Dizia-lhes mais: «Atendei ao que ouvis. Com a
medida com que medirdes vos medirão a vós, e ainda se vos acrescentará. 25
Porque ao que tem, dar-se-lhe-á ainda mais e ao que não tem, ainda o que tem
lhe será tirado». 26 Dizia também: «O reino de Deus é como um homem
que lança a semente à terra. 27 Dorme e se levanta, noite e dia, e a
semente germina e cresce sem ele saber como. 28 Porque a terra por
si mesma produz, primeiramente a haste, depois a espiga, e por último a espiga
cheia de grãos. 29 E, quando o fruto está maduro, mete logo a foice,
porque chegou o tempo da ceifa». 30 Dizia mais: «A que coisa
compararemos nós o reino de Deus? Com que parábola o representaremos? 31
É como um grão de mostarda que, quando se semeia no campo, é a menor de todas
as sementes que há na terra; 32 mas, depois que é semeado, cresce e
torna-se maior que todas as hortaliças, e cria ramos tão grandes que “as aves
do céu podem vir abrigar-se à sua sombra”». 33 Assim lhes propunha a
palavra com muitas parábolas como estas, conforme eram capazes de compreender. 34
Não lhes falava sem parábolas; porém, em particular explicava tudo aos Seus
discípulos. 35 Naquele mesmo dia, ao cair da tarde, disse-lhes:
«Passemos à outra margem». 36 Eles, deixando a multidão, levaram-n'O
consigo, assim como estava, na barca. Outras embarcações O seguiram. 37
Então levantou-se uma grande tempestade de vento, e as ondas lançavam-se sobre
a barca, de tal modo que a barca se enchia de água. 38 Jesus estava
na popa a dormir sobre um travesseiro. Acordaram-n'O e disseram-Lhe: «Mestre,
não Te importas que pereçamos?». 39 Ele levantou-Se, ameaçou o vento
e disse para o mar: «Cala-te, emudece». O vento amainou e seguiu-se uma grande
bonança. 40 Depois disse-lhes: «Porque sois tão medrosos? Ainda não
tendes fé?». Ficaram cheios de grande temor, e diziam uns para os outros: 41
«Quem será Este, que até o vento e o mar Lhe obedecem?».
CONFISSÕES SANTO
AGOSTINHO
DE MAGISTRO (DO MESTRE)
CAPÍTULO XIII
A FORÇA DAS
PALAVRAS NÃO CONSEGUE MOSTRAR SEQUER
O PENSAMENTO DE
QUEM FALA
AGOSTINHO
– E também no
tocante às coisas que se contemplam com a mente, aquele que não entende,
inutilmente ouve as palavras de quem as vê, a não ser porque é útil acreditar
em tais coisas enquanto se ignoram.
Aquele porém que
as pode ver interiormente, é discípulo da verdade,
exteriormente, é
juiz de quem fala, ou melhor, das suas palavras, pois muitas vezes sabe as coisas
que foram ditas, enquanto quem as disse não as sabe.
Seria este o
caso em que alguém, acreditando nos epicuristas e julgando mortal a alma,
repetisse os argumentos já tratados pelos mais sábios sobre a sua imortalidade,
na presença de quem pode intuir as coisas espirituais.
Este julgaria
que aquele diz a verdade, ou antes considerará falácia o que diz.
Devemos pois,
acreditar que quem não sabe pode ensinar?
E, no entanto,
usa as mesmas palavras que aquele que sabe também usaria.
Por isso tudo,
nem sequer resta às palavras o papel de manifestar ao menos o pensamento de
quem fala, pois é duvidoso se este sabe ou não o que diz.
Considera também
os mentirosos e enganadores, e facilmente compreenderás que, com as palavras,
eles não só não revelam, mas até ocultam o pensamento. Jamais duvidaria que as
palavras sinceras se esforcem e façam o melhor para manifestar o espírito de
quem fala, o que conseguiriam, e seria ótimo para todos se não fosse permitido
aos mentirosos falarem.
Todavia,
repetidamente percebemos em nós mesmos e nos outros que as palavras não
expressam o pensamento, e isto pode acontecer de duas maneiras: ou quando as
palavras que gravamos e repetimos saem da boca de quem está pensando em algo
diferente, o que acontece amiúde quando cantamos um hino, ou quando, nos saem
umas palavras em vez de outras, contra a nossa vontade, por um lapso da própria
língua, também neste caso não são transmitidos os sinais das coisas que temos
na mente.
Os mentirosos,
sem dúvida, também pensam as coisas que dizem, e embora nós não saibamos se falam
a verdade, sabemos porém que eles têm em mente o que dizem, a menos que lhes aconteça
uma das coisas que mencionei, e se me objectarem que, às vezes, isto pode
ocorrer, e que, quando ocorre, isto aparece, ainda que muitas vezes possa ficar
oculto, e que eu, ao ouvir tais coisas, às vezes também possa ser enganado, não
me oporei.
E há ainda outro
caso, bastante frequente e origem de inúmeras controvérsias: quando quem fala
exprime de facto seu pensamento, mas apenas para si e para uns poucos, e não
para o interlocutor e para os demais.
Por exemplo, se
alguém em nossa presença afirmasse que o homem é superado em valor por alguns
animais, não o toleraríamos e logo refutaríamos com grande veemência esta falsa
e perniciosa afirmação, e talvez por valor ele entenda a força física, e com
tal palavra enuncie mesmo o que pensava, sem mentir, sem engano, sem ocultar as
palavras gravadas na memória, agitando na mente alguma outra coisa, sem que por
um lapso da língua fale algo diverso do que corresponde ao seu pensamento,
estaria apenas chamando com um nome diverso do nosso a coisa que pensa, e nós
teríamos concordado imediatamente com ele, se houvéssemos intuído o seu
pensamento, o que não conseguiu explicar-nos com as palavras de sua afirmação.
Dizem que a
definição pode sanar tal erro, assim, se nesta questão se
definisse o que
é valor (virtus), tornar-se-ia claro, dizm, que a controvérsia gira só
em torno da palavra, e não da coisa.
Mas, mesmo
concordando com isto, quantos bons definidores poderemos encontrar?
E isso embora se
tenha discutido bastante sobre a arte de definir, o que não é oportuno
tratarmos aqui, nem merece sempre a minha aprovação.
Nem considero o
caso de não ouvirmos bem umas coisas e disputarmos longamente sobre elas como
se as tivéssemos ouvido.
Quando, há
pouco, quis dizer “misericórdia” com uma certa palavra púnica, afirmaste ter
ouvido, daqueles que têm familiaridade com esta língua, que aquela palavra
significa “piedade”.
Eu opunha-me,
afirmando que tinhas esquecido de todo o que tinhas ouvido, pois me parecia
teres dito não “piedade”, mas “fé”, embora estivéssemos sentados bem perto, e
certamente estas duas palavras não podiam levar a um engano pela semelhança do
som.
Por um bom lapso
de tempo pensei, todavia, que não soubesses aquilo que te fora dito, e no entanto
era eu que não sabia o que havias dito, ora, se eu tivesse ouvido claramente as
tuas palavras, não teria recebido a impressão, nada absurda, que a língua
púnica indicasse com o mesmo vocábulo “piedade” e “misericórdia”.
Tais coisas
ocorrem com frequência mas, como disse, vamos deixá-las de lado, para não dar a
impressão que quero atribuir culpa às palavras pela negligência de quem ouve,
ou até pela surdez dos homens.
O que mais
aflige é o que disse acima, isto é, o não conseguirmos conhecer o pensamento de
quem fala, embora ouvindo claramente as palavras, e palavras latinas, e sendo
nós da mesma língua.
CAPÍTULO XIV
CRISTO ENSINA
INTERIORMENTE,O HOMEM AVISA EXTERIORMENTE PELAS PALAVRAS
AGOSTINHO
– Porém agora
admito que, quando as palavras tenham sido ouvidas por quem já as conhece, a
este possa parecer que quem fala tenha realmente pensado no seu significado,
mas significará talvez que também aprendeu o que agora estamos indagando, isto
é, que aquele tenha falado a verdade?
E, porventura,
os mestres pretendem que se aprendam e retenham os seus conceitos pessoais e
não as disciplinas mesmas que querem ensinar quando falam?
Mas quem seria
tão tolo em mandar o seu filho à escola para que aprenda o pensamento do
professor?
Mas quando
tiverem exposto com palavras todas as disciplinas que dizem professar, inclusive
as que concernem à virtude e à sabedoria, então os discípulos irão considerar
consigo mesmos se as coisas ditas são verdadeiras, consultando a verdade
interior conforme sua capacidade.
E é então que,
finalmente, aprendem, e, quando dentro de si descobrem que as coisas ditas são verdadeiras,
louvam os mestres sem perceber que elogiam homens mais doutrinados que doutos, se
é que aqueles, também sabem o que dizem.
Erram, pois, os
homens ao chamar de mestres outros homens, porque na maioria dos casos entre o
tempo da audição e o tempo da cognição não se interpõe tempo algum, e, como
depois da admoestação do professor, logo aprendem em seu íntimo, julga que
aprenderam pela fala do mestre exterior, que nada mais faz do que admoestar.
Mas sobre a
importância das palavras, bem considerada no seu conjunto, não é pequena, falaremos,
se Deus permitir, em outro lugar. Por ora avisei-te apenas que não lhes
atribuas importância maior do que é necessário, para que não se creias, mas
também comece a compreender quão grande é a verdade do que está escrito nos
livros sagrados que não se chame a ninguém de mestre na terra, pois o
verdadeiro e único Mestre de todos está no céu. E o que há nos céus, no-lo
ensinará Aquele que, por meio dos homens, também nos admoesta com sinais exteriores,
para que, voltados para Ele interiormente, sejamos instruídos.
Amar e conhecer
a Ele constituem a bem-aventurança, que todos afirmam buscar, mas bem poucos
são os que se alegram por tê-la encontrado.
E agora gostaria
de ter as tuas impressões sobre este meu arrazoado. Se tu soubesses que eram
verdadeiras as coisas expostas, dirias que as conhecias quando interrogado
sobre cada uma separadamente, observa, portanto, de quem as aprendeste, não
certamente de mim, a quem terias respondido, se te indagasse sobre elas.
Se, ao
contrário, sabes que não são verdadeiras, nem eu nem Aquele tas ensinou: eu,
porque nunca teria a possibilidade de ensinar, Aquele, por tu não teres ainda a
possibilidade de aprender.
ADEODATO
– Eu, na
verdade, pela admoestação das tuas palavras aprendi que servem apenas para estimular
o homem a aprender, e que já é grande resultado se por meio da palavra
transmite-se um pouco do pensamento de quem fala.
Se foi dita a
verdade, isto no-lo pode ensinar somente Aquele que, por sinais externos, avisa
o que habita dentro de nós, Aquele que, pela sua graça, hei-de amar com tanto
mais ardor quanto mais eu progredir no conhecimento.
Mas quanto a
essa tua oração, que usaste continuamente, sou-te grato particularmente por
isto: que ela previu e desfez todas as objeções que tinha preparado para te
fazer, e nada descuidaste daquilo que me suscita dúvidas, e sobre o que não me
responderia assim aquele secreto oráculo, como tuas palavras afirmaram.
PERFIL
BIOGRÁFICO
SANTO AGOSTINHO
(354-430)
“Ó Senhor,
cumpre em mim Tua obra e revela-me essas páginas!”
Com estas
palavras, o Bispo Agostinho de Hipona, aos 43 anos de idade, abre o seu coração.
Não fora fácil o caminho de sacerdote, que, dentro do silêncio das noites
africanas, invocava o auxílio divino. Agostinho conhecera os prazeres do mundo,
a sensualidade das festas pagãs, o aplauso das multidões deslumbradas por sua
oratória. E quando, finalmente, voltou-se para dentro de si, já era bispo há
pelo menos dois anos, venerado em toda a África.
Reconstruindo a sua
existência desde o princípio, ele visa a expurga-la de toda culpa, para entregá-la
novamente a Deus. Ao escrever as Confissões, numa exposição por vezes
ingénua de todos os seus sentimentos e conflitos até a reconquista da fé,
Agostinho dirige-se principalmente a Deus. Mas não esquece o rebanho que lhe
foi confiado: “Quem eu sou nesse exato momento é o que desejam saber muitos.
Mas para que desejam saber isso?
Para
congratular-se contigo, ó Senhor, ouvindo como eu avancei por obra Tua pelo Teu
caminho, e para rezar por mim, sentindo quanto o meu peso me faz retardar o
passo. Se assim for, é para esses que falo”.
A perdição da
alma reside em algumas peras
Agostinho nasceu
a 13 de Novembro de 354, em Tagaste, pequena cidade da Numídia, actual Argélia.
A sua infância e adolescência transcorreram principalmente em sua cidade natal,
no ambiente limitado de um povoado perdido entre montanhas. Mais tarde, descreveria
em cores carregadas este período. “Cometia pequenos furtos na despensa da casa
ou na mesa, por gulodice ou para ter algo a dar a meus camarada. Mesmo nos
jogos, muitas vezes conseguia, levado pela ânsia de superioridade, vitórias
fraudulentas”. Um furto de peras ficou-lhe sobretudo na memória. “Fi-lo não
premido pela necessidade, mas por desprezo à justiça e excesso de maldade”.
As suas
observações sobre a severidade do ensino da época são bem mais equilibradas, encerrando
um protesto ainda hoje válido: “Para aprender tem mais valor uma curiosidade
livre do que a coerção baseada no medo”.
“Quantas
misérias e enganos experimentei naquela época, quando era rapazinho e me propunham,
para viver direito, a obediência àqueles que me instruíam, para que nesse mundo
construísse minha imagem...”
De Tagaste,
Agostinho vai para Madaura, onde inicia os estudos de retórica. O rapaz parece
talhado para a oratória. Lê e decora trechos de poetas e prosadores latinos,
dentre os quais Virgílio e Terêncio. Adquire, com Varrão, noções de caráter
enciclopédico. Aprende regras elementares de música, física e matemática.
Recebe tinturas de filosofia, o suficiente para compreender certos poetas. Em
compensação, jamais dominará o grego.
Agostinho fará
os estudos superiores em Madaura e Cartago. Depois de longos anos receberá,
finalmente, de acordo com os programas da época, o título de vir eloquentissimus
atque doctissimus.
Onde está a
felicidade?
“Vim a Cartago,
e uma multidão de torpes amores rodeou-me de todo lado. (...) Amar e ser amado
era para mim uma coisa deliciosa, tanto mais quanto podia também possuir o
corpo da pessoa amada”. Na realidade, porém, Agostinho não era o pecador que
ele descreve nas suas Confissões. Segundo o testemunho de um adversário,
o bispo donatista (herético) Vicente de Cartena, o estudante Agostinho era um
jovem ponderado, dedicado aos livros.
Não que lhe
faltassem oportunidades mundanas. Cartago, a maior cidade do Ocidente latino
depois de Roma, era um dos grandes centros do paganismo, que dois séculos de
doutrina cristã ainda não haviam conseguido derrubar. A procissão anual à deusa
do céu (a antiga Tanit dos fenícios) atraía multidões ávidas de prazer, vindas
de todas as partes da África. Na grande metrópole realizavam-se os espetáculos
sensuais, comedias e pantomimas que contavam as aventuras eróticas de deuses e
homens. Agostinho, um rapaz de apenas dezassete anos, deixou-se cativar pela
alegria e esplendor das cerimónias em honra dos milenares deuses protectores do
império.
Em Cartago
permanece durante três anos, unindo-se a uma mulher em concubinato – o que as
leis e costumes da época consideravam perfeitamente normal. “Tinha só a ela e
era-lhe fiel, como um marido”, escreve mais tarde. “Tive de experimentar com
ela, às minhas custas, a diferença entre um compromisso conjugal criado para procriar
filhos e o acordo de um coração apaixonado, do qual a prole nasce ainda que não
desejada, mesmo que depois se seja levado a amá-la”. Referia-se a seu filho
Adeodato, nascido em 373.
“Naquele período
tão incerto, estudava os livros de eloquência, na qual desejava destacar-me com
um fim reprovável, por orgulho, pelo prazer da vaidade humana. Seguindo,
portanto, a ordem tradicional do ensino, chegara a um livro, de Cícero...”
Continha ele uma discussão imaginária entre Cícero e Hortênsio, outro grande
orador romano, em torno do valor da filosofia.
Cícero
demonstrava que a verdadeira felicidade reside na busca da sabedoria.
Agostinho
sentiu-se fascinado. Os dezanove anos da sua vida pareceram-lhe completamente
desperdiçados. A busca e a investigação tornaram-se, daquele momento em diante,
seu objectivo primordial.
De início,
decidiu dedicar-se ao estudo das Escrituras, mas logo se cansou: o admirador de
Virgílio, Terêncio e Cícero ficou desiludido diante do estilo simples da
Bíblia.
O mestre da eloquência
e um bêbado trilham caminhos iguais
De volta à
cidade natal, Agostinho abre uma escola particular, onde ensina gramática e retórica.
Gosta de ensinar, durante treze anos esta será sua profissão. Os seus múltiplos
interesses intelectuais, entre os quais o ocultismo e a astrologia, não o
impedem de tornar-se excelente professor, capaz de despertar a curiosidade dos
alunos.
No outono de 374
deixa Tagaste, transferindo-se para Cartago. Mais uma vez dedica-se ao ensino
da retórica. “Os estudantes receberam minha ordem de aprender, além de
literatura, a refletir e a habituar seu espírito na concentração sobre si
mesmos”. Os cartagineses, porém, são demasiado turbulentos. Agostinho segue
para Roma, em 383. Pouco tempo depois verificaria que os jovens romanos, embora
mais quietos e gentis, têm o hábito de abandonar as aulas na ocasião
em que devem
pagar os honorários aos mestres. A luta contra os maus pagadores dura um ano, até
que um concurso lhe dá a cátedra de eloquência em Milão.
Igrejas majestosas
ao lado de templos pagãos, teatros e circos que nada ficavam a dever aos
romanos, assim era Milão, na época a capital administrativa da parte ocidental
do império, a residência do imperador. Era, sobretudo, uma cidade onde havia a
possibilidade de fazer carreira.
Agostinho
consagrava as manhãs aos cursos de eloquência, passando as tardes nas antecâmaras
dos ministérios. Esperava obter a presidência de um tribunal ou posto de
governador de uma província. Era, à primeira vista, um homem feliz: pago pelo
Estado, personagem quase oficial, respeitado como professor. No entanto,
dominava-o uma profunda inquietude quanto aos rumos da sua existência.
Por volta dos
fins de 385, o mestre de eloquência é escolhido para recitar a saudação anual
do imperador. Agostinho sai de casa com alguns amigos, dirigindo-se ao palácio
imperial.
“Ia para
mentir”, escreverá ao lembrar a oração de louvor em honra de Valentiniano II,
então com catorze anos. No caminho encontra um “pobre mendigo bêbado, que ria e
fazia arruaça”. A cena, embora o aborreça, revela-lhe um aspecto da verdade que
procurava. O bêbado, com um pouco de dinheiro, alcançara a felicidade. “È claro
que essa não era autentica alegria, eu sei disso. Mas por acaso era autentica a
alegria que eu procurava com as minhas ambições e enredos tortuosos? Numa noite
ele digeriria o vinho e sua bebedeira passaria, eu, ao contrário, iria dormir e
acordaria com meu tormento, hoje, amanhã, quem sabe até quando...”
A inquietude é
tema tipicamente agostiniano, um aspecto permanente de seu desenvolvimento. O
despertar de seu espírito crítico levou-o a abandonar o cristianismo que sua família
professava. Agostinho adotou o maniqueísmo de Mani, profeta persa que
pregava uma doutrina na qual se misturavam Evangelho, ocultismo e astrologia.
Segundo Mani, o bem e o mal constituíam princípios opostos e eternos, presentes
em todas as coisas. Era uma religião teoricamente severa, mas cômoda na
prática: o homem não era culpado por seus pecados, pois já trazia o mal dentro
de si. Ninguém era obrigado a aceitar a fé sem antes discuti-la e compreendê-la.
A doutrina
seduziu, como ele mesmo diria: “um jovem amante da verdade, já orgulhoso e loquaz
devido às disputas mantidas na escola dos homens doutos”. O abandono do
maniqueísmo viria mais tarde, ocasionado pela insatisfação das respostas que a
doutrina oferecia. O seu lugar seria temporariamente preenchido por um profundo
ceticismo.
(Revisão trad.
portuguesa e grafismo por ama)
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