Questão 31: Do prazer em si mesmo.
Art. 7 ― Se há algum prazer inatural.
O sétimo discute-se assim. ― Parece que nenhum prazer é inatural.
1. ― Pois, o prazer é, para os afectos da alma, o que o repouso é para os corpos. Ora, o apetite do corpo natural não repousa senão no seu lugar conatural. Logo, nem pode haver repouso do apetite animal, que é o prazer, senão em algo que lhe seja conatural. Logo, não há prazer inatural.
2.
Demais. ― O contrário à natureza é violento. Ora, tudo o violento gera a
tristeza, como diz Aristóteles 1. Logo, nada do que encontra a
natureza pode ser deleitável.
3.
Demais. ― A causa do prazer, como é claro pela definição do Filósofo supra
aduzida 2, está em nos sentirmos numa disposição conforme à
natureza. Ora, é natural a cada ser a disposição que lhe é conforme à natureza,
porque o movimento natural é o tendente para um termo natural. Logo, todo
prazer é natural.
Mas,
em contrário, diz o Filósofo, que certos prazeres são dolorosos e contra a
natureza 3.
Chama-se natural ao que é conforme à natureza, como diz Aristóteles 4.
Ora, a natureza no homem pode ser considerada à dupla luz. ― Primeiro, enquanto
o intelecto e a razão constituem, por excelência, a natureza humana, e esta é
que o coloca numa determinada espécie. E a esta luz, podem chamar-se prazeres
naturais aos homens, aqueles que lhes convêm de conformidade com a razão,
assim, é natural ao homem deleitar-se com a contemplação da verdade e com os actos
virtuosos. ― Num segundo ponto de vista, a natureza no homem é aquilo que
confina com a razão, i. é, que lhe é comum com os animais, e sobretudo que não
obedece à razão. E a esta luz o que diz respeito à conservação do corpo,
individualmente, como, a comida, a bebida, o sono e coisas semelhantes, ou,
especificamente, como a actividade sexual, tudo isso é considerado como
naturalmente deleitável ao homem.
Ora,
conforme esses dois pontos de vista, podem certos prazeres serem inaturais,
absolutamente, mas conaturais, relativamente. Pois, pode suceder que, num
determinado indivíduo, venha a corresponder-se algum dos princípios naturais da
espécie, e então, o que seria contrário à natureza da espécie, pode
acidentalmente ser natural a esse indivíduo, assim, é natural que a água quente
aqueça. Donde, pode dar-se que aquilo que é contra a natureza do homem, relativamente
à razão ou à conservação do corpo, se torne conatural a um determinado homem
por causa de alguma corrupção existente na natureza do mesmo. E esta corrupção
pode provir do corpo ou da alma. Quanto ao corpo, de alguma doença ― assim, os
febricitantes acham amargo o doce e reciprocamente, ou da má compleição ―
assim, há quem se deleite comendo terra, carvão ou coisas semelhantes. Quanto à
alma, quando alguém, por costume, se deleita em comer carne humana, no coito
bestial ou com indivíduos do mesmo sexo, ou em coisas semelhantes, que não são
conforme à natureza humana.
E
daqui se deduzem AS RESPOSTAS ÀS OBJECÇÕES.
Nota:
Revisão da tradução portuguesa por ama.
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Notas:
1. V Metaphys., lect. VI.
2. Q. 31, a. 1.
3. VII Ethic., lect. V, VI.
4.
II Phys., lect. I.
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